Algumas Notas sobre a Origem, e os Primeiros Tempos, do Espiritismo

Mais um texto de José Carlos Ferreira Fernandes revelando os movimentos sociais e culturais e as influências que deram origem ao espiritismo kardecista.

O Espiritismo originou-se no meio anglo-saxão, inicialmente norte-americano, depois britânico. Sua origem liga-se diretamente, nos Estados Unidos, ao recrudescimento da religiosidade protestante conhecido como o “Segundo Avivamento” (“The Second Awakening”), ocorrido na primeira metade do séc. XIX.  Esse movimento de pregação entusiasta do Evangelho, com ênfase em seus aspectos puritanos (a necessidade duma vida sem vícios, regrada, ordeira e produtiva, como um caminho para Deus), milenaristas (a iminente “segunda vinda” de Cristo e o inexorável Juízo Final) e místicas (o contacto mais íntimo e mais freqüente com o mundo espiritual, a experiência individual de relacionamento com Deus, com o recebimento direto, sem intermediação, de “revelações” divinas) desenvolveu-se, no período em apreço, basicamente em três regiões distintas: a) na Nova Inglaterra; b) na região oeste do estado de Nova York, e c) na região dos Apalaches, adquirindo em cada um desses focos características distintas (as missões inter-denominacionais enviadas às regiões do Oeste na Nova Inglaterra; a criação de novas denominações em Nova York; os “camp meetings” típicos da região apalachiana).

No geral, esse movimento de “despertar”, de “reavivamento”, era uma reação às tendências intelectualistas e cientificistas da sociedade, que vinham tomando forma na Europa desde o estabelecimento da “nova ciência” (a qual se baseava tanto na matematização da Natureza quanto, em geral, numa primazia absoluta da, e verdadeiro culto à, razão, mesmo na área teológica), no séc. XVII.  Tais tendências tinham ganho novo e decisivo impulso com o Iluminismo, a Revolução Francesa e o estabelecimento da sociedade industrial (inicialmente na Inglaterra, depois também noutros países da Europa), a partir do último quartel do séc. XVIII e do primeiro quartel do séc. XIX, consoante os lugares.

Essa “onda racionalista”, mesmo “materialista”, havia enfim atingido a nova nação norte-americana, cuja população era ainda, em sua virtual totalidade, constituída por crentes das diversas correntes protestantes (especialmente puritanas – calvinistas e anabatistas –, descendentes dos “não-conformistas” ingleses e europeus), que tinham na leitura da Bíblia e na vida religiosa de suas pequenas comunidades a própria base de sua vivência espiritual – e esse choque gerou uma reação. Contudo, mesmo essa reação se fez dentro do espírito da época, ou seja, dentro duma linha “experimental” e “cientificista”, ou que se pretendia como tal: a vivência com o divino adquiriu tons cada vez mais imanentes, e cada vez menos transcendentes; sentia-se que se podia “provar”, em termos “científicos” (i.e., materiais e experimentais), a existência e a ação de Deus, bem como a existência dum mundo “espiritual” e a sua interação com o mundo físico.

Especificamente nessa vertente começaram a se desenvolver fenômenos de índole por assim dizer “proto-espírita”, quando as manifestações do divino no mundo “físico” passaram a ser concebidas numa chave exclusivamente “materialista”, “corporeísta”, ou seja, sensível (i.e., podendo ser “captável” e “mensurável” pelos sentidos físicos, ou por instrumentação apropriada, operando no mundo da matéria, no mundo físico).

A região oeste do estado de Nova York, especialmente a área compreendida entre o lago de Ontário e as montanhas Adirondack, era ainda uma região de fronteira no primeiro quartel do séc. XIX; sua estrutura religiosa contava com um número muito pequeno de pastores formalmente ordenados; as famílias, no geral, promoviam a sua própria instrução religiosa, desenvolvendo-se a leitura em bases domésticas, centrada na Bíblia (na canônica versão do rei Jaime); era intensa a piedade popular, a par dum sentimento de individualismo e de independência com relação às grandes denominações religiosas. Foi nesse ambiente que Charles Grandison Finney (1792-1875), originário de Connecticut, ex-advogado e ministro presbiteriano, pregou entre 1821 e 1835, com considerável sucesso, um Evangelho que enfatizava a ação direta do Espírito Santo no indivíduo como muito mais eficaz do que um estudo teológico formal no “caminho rumo ao Senhor”; e é a ele que se deve a expressão “Burned-Over District” (“Região Abrasada”, ou “Queimada”) para se referir a toda essa área – pois, segundo ele, a sua população havia sido de tal modo “consumida” pelo zelo evangélico, o qual “ardia em seus corações”, que ninguém mais faltava para ser convertido (ou seja, nada mais havia para “queimar”).

Nesse “Burned-Over District”, paralelamente à, ou na esteira da, pregação de Finney, surgiram muitas outras e novas manifestações de religiosidade, as quais, calcadas no Cristianismo, tal como entendido pelas correntes protestantes populares, iam-se dele, ainda que insensivelmente, se afastando a pouco e pouco:

a) já em 1785, James Whittaker, líder da comunidade religiosa milenarista denominada os “shakers” (uma dissidência de “quackers” de Manchester, Inglaterra, ocorrida em 1772, e desde 1774 com seus membros estabelecidos na colônia, depois estado, de Nova York), havia fundado a comunidade de “Mount Lebanon”, o coração de toda a comunidade “shaker” dos Estados Unidos; Mount Lebanon desenvolveu-se grandemente ao longo de toda a primeira metade do séc. XIX – sua produção agrícola esmerada, com a cuidadosa seleção de sementes, sua simplicidade e funcionalidade na arquitetura e no mobiliário (com ampla e duradoura influência na vida americana, tanto então quanto depois), e a vida escrupulosamente regrada, virtuosa e puritana de seus adeptos ganharam a admiração de muitos; uma das características do milenarismo e do misticismo exacerbado das comunidades “shakers” eram as suas reuniões com música e dança, onde uma série de experiências catárticas podiam ocorrer – inclusive a comunicação com os espíritos dos mortos, a fim de que pudessem fornecer testemunhos edificantes, ou de que pudessem ser consolados; entre 1837 e 1844, por sete anos ininterruptos, uma série de “comunicações dos mortos” mediante pancadas (“raps”) ocorreram em Mount Lebanon – e, ao contrário de outras denominações, onde isso seria considerado como obra diabólica, entre os “shakers” o fenômeno foi visto (dentro de seu espírito milenarista) tanto como uma “prova” da presença do Senhor quanto como o anúncio duma nova era;

b) perto de Palmyra, no ano de 1823, Joseph Smith Jr. (1805-1844), ao que se diz, recebeu do anjo Moroni as tábuas de ouro que, traduzidas para a língua inglesa, converter-se-iam no “Livro de Mórmon”;

c) William Miller (1782-1849) começou desde 1831 a pregar na região a vinda iminente de Cristo, o fim do mundo e o Juízo Final, os quais ocorreriam em 1843 (depois recalculados para 1844); sua mais famosa discípula foi Ellen G. White, e nesse meio situa-se o embrião dos “Adventistas do Sétimo Dia”;

d) em 1848, em Hydesville, no mesmo “Burned-Over District”, iniciaram-se os fenômenos ligados às irmãs Fox.

Na esteira de toda essa efervescência mística começou a tomar forma na região um posicionamento religioso específico, com três características distintas:

a) iminência duma grande renovação moral interior do ser humano, tendo como base a Bíblia, que era, contudo, interpretada em termos estritamente pessoais, pretensamente “lógicos” (isto é, não-dogmáticos) e de forma independente (e logo antagônica) à das correntes religiosas protestantes tradicionais estabelecidas;

b) existência efetiva dum “mundo espiritual” perceptível e observável, em condições objetivas, dentro das novas conquistas da “ciência”, e com o seu aparelhamento, de tal modo convincente que essa mesma “ciência” e os “materialistas” ver-se-iam obrigados, finalmente, a curvar-se diante dos fatos e enfim admitir a existência do “espiritual” e da “mão de Deus” agindo;

c) comunicação sensorial, física, com os espíritos dos mortos, por meio de intermediários humanos privilegiados; tal comunicação viabilizaria, com suas revelações, a esperada renovação, e seria usualmente facilitada por uma situação de transe, obtida a partir de técnicas catárticas, ou mesmo hipnóticas, herdadas quer de Swedenborg, quer, mesmo, de Mesmer.

A esse posicionamento, para colocá-lo em oposição ao “materialismo” que então se percebia no mundo, deu-se o nome de “espiritualismo” (“spiritualism”); para diferenciá-lo do conceito filosófico geral e abstrato de “espiritualismo”, bem como para assinalá-lo como algo de fundamentalmente novo, revelador e revolucionário, passou-se a utilizar a expressão “novo espiritualismo” (“New Spiritualism”). Seu elemento catalisador foi Andrew Jackson Davis (1826-1910).

Nascido em Blooming Grove, no Hudson, estado de Nova York, e desde 1838 estabelecido, com a família, em Poughkeepsie, no mesmo estado, Davis tomou conhecimento das técnicas mesmeristas de “magnetismo animal” e transe induzido em 1843, aparentemente sem conseqüências; em 1844, contudo, foi objeto (como outrora Swedenborg) duma “iluminação”, sendo instruído, em transe (segundo ele próprio narra), pelos espíritos de Galeno (o médico grego do tempo de Marco Aurélio) e do próprio Swedenborg, adquirindo também (ao que se diz) dons de clarividência e de cura. No curso duma série de demonstrações de seus pretensos poderes, chamou a atenção do músico Lyon e do pastor Fishbough; o primeiro seria o seu “magnetizador”, o segundo o seu “escriba”.  A partir de novembro de 1845, e por 15 meses consecutivos, a atuação dos três resultou na obra “The Principles of Nature, Her Divine Revelations, and a Voice to Mankind”, publicada em 1847.  O livro consistia basicamente de três partes: na primeira expunha-se uma filosofia mística de índole panteísta; na segunda havia uma série de comentários aos livros do Antigo Testamento (negando-se-lhes a infalibilidade) e ao ministério de Cristo (considerando-se Jesus como um grande reformador moral e aceitando-Lhe os poderes, mas negando-se Sua divindade); na terceira, eram delineados princípios gerais para a condução da “nova” sociedade, de características que poderiam ser definidas como “socialistas utópicas”. A partir desse ponto, o “New Spiritualism”, para todos os efeitos práticos, tornou-se algo distinto das denominações cristãs.

Nesse primeiro livro de Davis (pois ele, escritor prolífico, escreveria muitos mais, cerca de 30, entre 1845 e 1885), há um trecho que é sempre citado como representando uma predição do início oficial da “nova revelação”, e referente aos fenômenos de Hydesville (págs. 675-76): “É verdade que os espíritos comunicam-se entre si, ainda que alguns se encontrem encarnados e outros vaguem nas altas esferas – e tal influxo ocorre mesmo quando a pessoa não o sente, não tendo por conseguinte consciência dele.  E isso será em breve demonstrado com uma evidência física; e o mundo irá alegrar-se com o início duma era na qual o interior dos seres humanos abrir-se-á, e a comunhão espiritual será estabelecida, de modo idêntico ao já gozado pelos habitantes de Marte, Júpiter e Saturno”.  No ano seguinte as irmãs Fox iniciaram, formalmente, aquilo que é hoje considerado o Espiritismo.

Na seqüência dos fenômenos de Hydesville, o movimento “espiritualista” espalhou-se; segundo as informações coligidas por Nandor Fodor (“Encyclopaedia of Psychic Science”), o primeiro grupo experimental foi o “New York Circle”, de 1851; por sua iniciativa, uma “New York Conference” foi formada no mesmo ano, e em 1852 realizou-se um primeiro congresso espiritualista geral, em Cleveland.  Coisas fantásticas começaram a ocorrer: médiuns curavam com a imposição das mãos, os espíritos de Mozart, Beethoven e Weber reapareciam para tocar; grupos privilegiados podiam esperar atenção especial, como o de Mountain Cove, onde, entre 1851 e 1852, “baixaram” todos os Profetas bíblicos, bem como os Apóstolos.  A propagação da “boa nova” fez surgir adeptos de Boston a Manchester, e de Long Island a Cincinnatti; também começou a arrebanhar convertidos entre gente de destaque, dentre outros o governador Tallmadge de Wisconsin, o abolicionista William Lloyd Garrison, os professores Britten (depois marido de Emma Hardinge), David Wells, Bryant e Bliss, da Universidade da Pensilvânia, e muitos outros.  De acordo com uma estimativa do “Spirit World”, havia em 1851 cerca de 100 médiuns trabalhando em Nova York, e de 50 a 60 círculos espíritas na Filadélfia.  O “North American Review” escreveu, em abril de 1855, que a Associação Espiritualista da Nova Inglaterra estimava o número de espiritualistas nos Estados Unidos na casa dos dois milhões (um número muito provavelmente exagerado).  Sem dúvida, estava-se numa “nova era”.

Juntamente com a expansão do movimento surgiu uma imprensa espiritualista bastante ativa: ao “Univercoelum” (1847) e seu sucessor “Spirit Messenger” (1849) de Springfield, ligados a Andrew Jackson Davis, seguiram-se o “The Spiritual Philosopher” (a partir de julho de 1850; seu título passaria a ser, no ano seguinte, “Spirit World”), o “Shekinah” (1852, ativo por 18 meses), o “Spiritual Telegraph” (1852, ativo até 1860), o “Christian Spiritualist” (1854-57), o “The Banner of Light” de Boston (de 1857, e que ainda existia na década de 1930) e muitos outros periódicos, sem falar, obviamente, nos livros lançados pelos expoentes do movimento.

Por tudo o que se falou até aqui (ainda que de forma breve e bastante resumida), queda-se perfeitamente claro que a origem do Espiritismo, tal como hoje é praticado e entendido, encontra-se no meio protestante popular norte-americano da primeira metade do séc. XIX, como uma reação às tendências materialistas que então se desenhavam na sociedade ocidental.  A possibilidade da comunicação física, sensorial, entre vivos e mortos (inicialmente a partir de meios bastante “primitivos”, como as pancadas – “raps” – e as “mesas girantes” – “table turning”); a idéia de se poder perscrutar o sobrenatural de modo “experimental” e “científico”; a ênfase num comportamento moral honesto e correto, dir-se-ia “burguês”; a existência de pessoas privilegiadas no que concerne ao relacionamento com as esferas espirituais; a crença de que o novo movimento haveria de se constituir numa “nova revelação”, que daria seguimento e cumprimento ao Evangelho cristão; até mesmo a nomenclatura utilizada (“medium”, “spiritualism”, e mesmo “spiritism”, são termos oriundos desse meio e dessa época, depois passados aos movimentos similares na Inglaterra e na França) e os fenômenos observados (os “raps”, as mesas girantes, o aparato da sessão mediúnica…), tudo isso, enfim, que caracteriza perfeitamente o Espiritismo, iniciou-se nos Estados Unidos e, mais especificamente, no “Burned-Over District”.

Em 1854, depois de ter passado pela Inglaterra, a febre do “New Spiritualism”, seus espíritos “batedores” (“raps”) e suas mesinhas girantes enfim atingiu Paris; pelos finais daquele ano, um certo professor Hippolyte-Léon Denizard Rivail tomou conhecimento dos fenômenos, por intermédio de dois amigos seus, Fortier e Carlotti.  Em maio de 1855, Rivail participou pela primeira vez de sessões da espécie, na casa da sra. de Plainemaison.  No dia 30 de abril de 1856, obteve, pela médium srta. Japhet (magnetizada pelo sr. Roustan), o primeiro anúncio de sua “missão” de codificador duma nova doutrina, anúncio esse que se repetiu, de forma mais clara e explícita, no dia 7 de maio seguinte, sob a mesma médium.

Calcado num ambiente em que a leitura da Bíblia era bastante comum, não admira que o Espiritismo da escola anglo-saxã histórica (i.e., o espiritismo “originário”) não fosse reencarnacionista; com efeito, para qualquer pessoa que tenha a Bíblia como uma leitura constante desde a mais tenra idade, e que viva num ambiente impregnado de citações e modelos bíblicos, jamais o reencarnacionismo (e mesmo, quase sempre, a reencarnação) poderia se configurar em algo viável, ou mesmo pensável.  Outras influências (não bíblicas) fizeram com que a escola francesa, ou melhor, com que uma das escolas francesas (a “kardecista”) tomasse uma via reencarnacionista (sendo forçada a exercer uma releitura enviesada de textos bíblicos para neles, entre outros, tentar encontrar uma justificativa à reencarnação); a influência do Espiritismo reencarnacionista cíclico evolutivo (“kardecista”) francês espalhou tal visão por boa parte da Europa e da América Latina (então sob a influência cultural francesa), assim que essa corrente conseguiu tornar-se hegemônica na França – mais especificamente, em Paris e, secundariamente, em Lião.  Mas, muito mais do que a ação dos “espíritos”, tem-se aqui a ação objetiva dos “encarnados”.

De fato, o reencarnacionismo cíclico “evolutivo” (que não existia entre os Antigos, incluindo-se os órficos, os pitagóricos, Platão e mesmo os neoplatônicos) é um fenômeno europeu e moderno, e que somente pôde desenvolver-se a partir dos finais do séc. XVIII.  Sob inspiração do aparentemente ininterrupto e inevitável “avanço científico” que então se verificava, e que era evidente a qualquer pessoa “culta”, associou-se, à luz do Iluminismo em voga, um processo sucessivo de “reencarnações” a um processo paralelo de “progresso”, ou “aperfeiçoamento”, das condições morais do indivíduo e, por tabela, da sociedade.  Portanto, a reencarnação, vista sob essas novas e específicas circunstâncias vigentes na Europa Ocidental, teria de ser “compulsória”, “cíclica” e “evolutiva”; como a ciência, cada alma humana, bem como o conjunto das almas humanas, ou seja, a sociedade, inexorável e inevitavelmente, haveriam de “evoluir” e de se “aperfeiçoarem”.  Quanto a isso, o pioneiro foi, sem dúvida, Gotthold Ephraim Lessing (1729-1781), especialmente no seu opúsculo de 1780, “Die Erziehung des Menschengeschlechts” (“A Educação do Gênero Humano”).  Os parágrafos 92 a 100 do referido opúsculo são, quanto a isso, paradigmáticos:

92. Tu tens [ainda] em teu Caminho Eterno [ó Humanidade] tanto para, em conjunto, construir, e tantas coisas para fazer! Tantos degraus para escalar! E por que não considerar como evidente que todo o vasto fluxo dessa roda [evolutiva], que leva a Humanidade cada vez mais perto da perfeição, seja posto em movimento por rodas menores e mais rápidas, cada uma das quais imprimindo sua própria contribuição individual [nesse fluxo]?

93. E é assim! O mesmo Caminho pelo qual a Raça [Humana] atinge a perfeição deve ser [ele mesmo também] obrigatoriamente trilhado por cada indivíduo, uns de modo mais rápido, outros mais lentamente.  Mas trilhados numa única vida? Poderia ele [o ser humano] ser, numa única e mesma vida, um judeu sensual e [depois evoluir para] um cristão espiritual? Poderia, numa mesma vida, ter experimentado ambas [essas condições]?

94. Certamente não! Mas por que não haveria cada ser humano individual de ter existido mais de uma vez neste Mundo?

95. É tal hipótese assim tão ridícula apenas porque ela é a mais antiga [i.e., anterior ao Cristianismo]? Porque o entendimento humano, antes de os sofismas das escolas [filosóficas e religiosas posteriores] o haver debilitado e dissipado, automaticamente o ter concebido?

96. Por que eu mesmo não posso ter já seguido esses passos em meu aperfeiçoamento, colhendo [ao longo do processo], como cabe ao ser humano, tanto castigos quanto recompensas físicas [i.e., neste mundo]?

97. E, mais uma vez, por que não percorrer novamente todos esses passos, cuja consecução tão poderosamente nos guia [progressivamente] para a Eterna Recompensa?

98. Por que não devo voltar [à vida física] tão frequentemente quanto necessário para adquirir novos conhecimentos e novas experiências? Porventura já teria conseguido tanto uma única vez [i.e., numa única existência] que um retorno absolutamente não valeria a pena?

99. Tal raciocínio [i.e., o da suficiência duma única vida] seria uma razão probante contra ela [i.e., contra a pluralidade das existências]? Ou [isso ocorre] porque esqueci-me de que já aqui estive [noutra vida]? Mas feliz sou eu por me ter esquecido; a lembrança de minha condição anterior apenas induzir-me-ia a um mau uso do presente.  E aquilo de que agora não me lembro – necessariamente esquecerei para sempre?

100. Ou então, poder-se-ia admitir como uma justificativa contra tal hipótese [da pluralidade das vidas] o fato de que muito tempo seria perdido nesse processo [de sucessivas vidas]? Perdido?  Como posso ter algo a perder? Por acaso, não é minha toda a Eternidade [i.e., não tenho todo o tempo do mundo para me aperfeiçoar]?

Até aqui, as palavras de Lessing.

A influência de Lessing rapidamente ultrapassou as fronteiras do mundo germânico, atingindo a França.  Juntamente com ideais “socialistas utópicos” para a melhoria do ser humano e da sociedade, a idéia dum “reencarnacionismo evolucionista” influenciou poderosamente vários pensadores, dentre os quais merecem destaque Pierre Leroux (1792-1871) e Jean Reynaud (1806-1863).  Os dois foram não apenas contemporâneos, mas colaboradores: Reynaud escreveu verbetes na publicação denominada “Encyclopédie Nouvelle” (1838-1841), editada por Leroux, um veículo para a sistematização de suas idéias, de nítido viés “socialista utópico”.

Leroux apresentou, de modo coordenado e consolidado, seu sistema de pensamento no seu livro “De l’Humanité” (“Sobre a Humanidade”), de 1840; em sua visão, a reencarnação servia, como em Lessing, de auxiliar no (irreversível) aperfeiçoamento, tanto do ser humano individual quanto da Humanidade (i.e., da sociedade), que, para Leroux, estavam íntima e inextricavelmente interligados.  Os trechos a seguir são paradigmáticos:

Tudo o que diz respeito à vida futura, portanto, pode ser resumido no seguinte: a vida futura é o desenvolvimento e a continuação da vida presente; a vida futura já se encontra latente na vida presente.  E, na vida presente, o ser humano é humano, ou seja, está unido à Humanidade, e, da mesma forma que a Humanidade, à Natureza exterior.

Assim, na vida futura, que é a continuação da vida presente, o ser humano ainda deverá estar unido à Humanidade e, com a Humanidade, à Natureza [i.e., ao mundo físico].

Àqueles que supõem que o destino do ser humano [após a vida terrena] resume-se numa poética viagem através dos Céus, dizemos: não provais [em absoluto, com tal idéia] que [o objetivo d]a vida futura do ser humano não venha a ser o aperfeiçoamento do [próprio] homem.  Ora, mas o aperfeiçoamento do homem não está ligado ao aperfeiçoamento da Humanidade?

Pois quem fala “ser humano” refere-se [inevitavelmente] à Humanidade.  O homem não existe de forma independente da Humanidade.  Aperfeiçoar o ser humano é aperfeiçoar a Humanidade; e aperfeiçoar a Humanidade é aperfeiçoar-se a si mesmo.

Cada ser humano é um “eu”, mas cada “não-eu” [i.e., cada “outro”] é [igualmente] [um ser humano] com direitos similares, ou, falando-se genericamente, é a [própria] Humanidade. 

E esse “eu”, que é [cada] ser humano, não existiria se o “não-eu” [i.e., o “outro”] que lhe corresponde, ou seja, seu semelhante, ou a Humanidade, deixasse de se relacionar, ou de se encontrar em comunhão, com esse “eu”.

Portanto, se a vida futura do ser humano concorre para o seu aperfeiçoamento, tal vida encontra-se intimamente ligada ao futuro da [própria] Humanidade [i.e., passar-se-á junto à Humanidade, no mundo físico].

(…)

Não, não podemos acreditar que “sobre este mundo as gerações se sucedem, fugazes, fortuitas e isoladas; que surgem, sofrem e extinguem-se, mas sem que exista qualquer relação [de continuidade] entre elas; que nenhuma voz se prolongue das raças extintas às que se lhes seguem; e que as vozes das raças viventes, do mesmo modo, logo virão a se extinguir no mesmo silêncio eterno” (cf. Benjamin Constant, “Sobre a Religião”).

Essa poesia do nada, essa negação da continuidade da vida (e, portanto, da [própria] vida) nos parece uma estranha loucura.  Se a morte pode negar a vida, então a morte é que seria a vida; mas o ser é necessário.

Uma criança nasce; por que recusar ao Criador o poder de fazer renascer, nessa criança, um ser humano que já tivesse vivido anteriormente? Tal tipo de ressurreição é impossível para Aquele que pode dar a vida? Aquele que pode fazer viver não poderia, também, fazer renascer?

Em certo sentido, nada é mais verdadeiro do que aquilo que é ordinariamente dito e ensinado pela teologia cristã, isto é, que Deus nos cria por ocasião de nosso nascimento, que nos dá a vida e nos dota duma alma quando nos faz nascer, no que, assim, parece ser uma nova vida, vivida pela primeira vez.  Na verdade, o ato do nascimento, ou, como cremos, do renascimento, não se faz [de fato] sem uma intervenção de Deus; e como poderia ser de outra forma, quando nenhum ato de nossas vidas se faz sem a permissão e a intervenção do Ser Universal? Portanto, somos, sim, como geralmente se pensa, criados quando nascemos; mas essa criação é de tal sorte que nós, os que nascemos, não somos apenas a continuação, ou, como se diz, os filhos e a posteridade, daqueles que nos antecederam [na vida física], mas, no fundo, e de fato, [também] somos, nós mesmos, essas próprias gerações passadas.  (“Sobre a Humanidade”, vol. I, edição de 1854, Perrotin Editor, Paris, págs. 213-216)

Até aqui, falou Leroux.

Reynaud repete tais idéias em sua obra “Philosophie Religieuse – Ciel et Terre” (“Filosofia Religiosa – Céu e Terra”), cuja primeira edição é de 1854 (embora englobando e sistematizando vários escritos seus desde a época da “Encyclopédie Nouvelle”), mas acrescentando-lhe noções acerca da pluralidade dos mundos habitados, bem como uma idealização da “religião druídica” dos gauleses, antepassados dos franceses.  A seguir, dois trechos bastante significativos:

Pretendeis, assim, que o véu da imortalidade, ao levantar-se, os faça tombar [i.e., os seres humanos] diante da confusão, pelo fato de seus olhos, habituados até então à limitada perspectiva desta [única] vida, passarem a ver, diante de si, um abismo de que antes não tinham conhecimento? Mas não é precisamente o conhecimento desses abismos que, ensinando à alma sua trajetória [verdadeira] no Universo, é capaz de imprimir às suas ações na Terra um significado totalmente novo? Por que nos obstinarmos em impedir nossa vida de se aprofundar nesses mistérios que nos antecedem em nossos berços, ao passo que permitimos, com entusiasmo, todo tipo de especulação acerca daqueles que se seguem às nossas tumbas? A porta pela qual entramos na vida, muito frequentemente negligenciada pela Teologia, não é menos provida de importância para nossa edificação moral do que aquela pela qual partimos; e explica muitas das misérias da existência [terrena], misérias essas que vós mesmos não cessais de combater.

Sim, indubitavelmente, é a esse aspecto da preexistência que me refiro; e quais as razões para estabelecer a impossibilidade de que já tenhamos estado no mundo anteriormente? Onde encontraríeis razão para rejeitar todos os aspectos de grandeza de tal concepção? Apenas porque não consta de vossa tradição? Mas tal crença é mais universal do que a vossa [i.e., da crença cristã numa existência única, seguida do Juízo Final].  O Oriente está repleto de tal ideal desde a mais remota antiguidade, e a irradia em todas as direções, ao passo que, quanto a vosso dogma [de uma única existência], não vislumbro época mais antiga para a sua constituição do que a triste Idade Média.  Se se examinarem as vidas de todos os homens que passaram pela Terra desde a época em que se estabeleceram religiões de sabedoria, constataríamos que a grande maioria vivia sob a consciência mais ou menos fundamentada duma existência prolongada, por vias invisíveis [i.e., metafísicas], tanto antes quanto depois dos limites de cada existência [terrena].  Há, de fato, uma espécie de simetria [em tal idéia], tão lógica, que seduz a imaginação logo à primeira vista: o passado se equilibra no futuro, e o presente não é mais que o pivô entre o que não mais é o que ainda será.  O Platonismo reacendeu a luz previamente agitada por Pitágoras, e que serviu para iluminar as mais sublimes almas que ornamentaram os tempos antigos.  Que não triunfassem [tais idéias], tal não ocorreu por falta de sublimidade; e tal sublimidade, capaz de enobrecer mesmo os seus erros, dar-lhes-á sempre uma autoridade impressionante.  Os que inicialmente experimentaram os caminhos do Céu poderiam se confundir na pressa, mas seu fracasso não é, em absoluto, razão para abandonarmos seu exemplo.  Mas, além de tudo (e por que eu não o admitiria?), por mais admiração que venha a nutrir pelo espiritualismo helênico e alexandrino, a memória da religião de nossos antepassados me impressiona ainda mais.  O antigo Druidismo fala ao meu coração.  Este mesmo solo em que vivemos hoje abrigou, antes de nós, uma nação de heróis, certos de terem vivido neste mundo muito antes de sua encarnação atual, fundando assim a sua esperança de imortalidade na convicção de sua própria preexistência.  Eles não são apenas os nossos predecessores, eles são os nossos pais; o seu sangue ainda pulsa em nossas veias, e é isso que, talvez, instintivamente, predisponha a nossa raça [francesa] a essa ardente fruição da vida e, ao mesmo tempo, a essa soberba indiferença diante da morte, sempre tão natural. Tenhamos ou não tal percepção, não estaria essa tradição [da pluralidade das vidas] viva nas profundezas secretas de nossas almas? Esquecida na confusão da Idade Média, ainda desconhecida para nós, pode estar esperando [apenas] o sinal para a sua ressurreição.  A França, ainda substancialmente a filha da Gália, possui, assim, essa forte herança, e seria uma falta de piedade nacional rejeitá-la, como se se tratasse de algo ultrapassado, e inútil para se meditar a respeito.  (“Céu e Terra”, 4ª edição, Furne & Cia. Editores, 1864, págs. 210-213)

O raciocínio que oponho à vossa hipótese [i.e., à visão contrária às múltiplas vidas] é bem simples, e segue diretamente dos princípios sobre os quais gira todo o movimento do Universo: que cada alma humana faz sua primeira aparição na vida no nível de desenvolvimento em que o animal cessa, e onde se inicia o ser livre [i.e., pensante].  A história de Adão é, em essência, a história comum de todos os seres humanos.  Por uma operação especial do Criador, no instante do tempo e do espaço atribuídos pelas leis da Harmonia do Todo, a alma recebe o sopro divino de sua perfectibilidade [i.e., sua inteligência e racionalidade], nela despertando os poderes necessários para cumprir seu destino: a razão brilha, o coração se ilumina, a consciência se abre, e o ser humano é, assim, criado.  Criado, mas não concluído – acaba de vir à luz, a sua inteligência tenta seus primeiros esforços para adquirir conhecimento; seu caráter ainda é vacilante, sua vontade ainda não se ligou indelevelmente quer ao bem, quer ao mal; a inocência [ou: ignorância?] nele ainda reina, mas ainda não fez florescer nem a bondade, nem a santidade.  Para fortificar-se, a alma deve [a seguir] aperfeiçoar-se, arrancando de si os imperativos do instinto cego, suscitando em seu lugar as forças morais; numa palavra, ela deve trabalhar em si mesma [seu aperfeiçoamento]; e as condições de vida que lhe são atribuídas, perpetuamente [i.e., em cada sucessiva existência], conformes ao estágio [alcançado] de seu desenvolvimento, são sempre o justo efeito do emprego de sua liberdade [i.e., de sua razão, para a prática do bem].  [Viaja, assim, d]e vida em vida, de mundo em mundo, desaparecendo de um para reaparecer noutro, sempre levada [a encarnar-se], pelas virtudes atrativas que a fazem florescer, na sociedade [específica] que lhe convém, dotada das forças plásticas necessárias para formar os órgãos de que necessita, com diferentes graus de retidão e de felicidade, nas fases sucessivas de seu infinito aperfeiçoamento; e, nascida [inicialmente] nas regiões mais atrasadas do Universo, é lançada [a seguir sucessivamente] às regiões intermediárias, após uma seqüência de eventos de maior ou de menor duração, ganhando progressivamente a sublime e inefável recompensa dos méritos que, com a graça de Deus, vai adquirindo.  Continuamente, pela operação incessante do Criador, novas almas vêm do nada [i.e., são criadas], e labutam por seus ganhos, cada uma à sua maneira, através da imensidão dos mundos.  Aqui nos encontramos como num lugar de passagem, e estais sendo vítimas duma ilusão quando imaginais, [raciocinando] sobre as aparências, que a Terra é para nós [apenas] um teatro de criação quotidiano.  (idem, pág. 221-222)

Até aqui, falou Reynaud.

Portanto, o ambiente filosófico-cultural presente na França nos meados do séc. XIX era, em termos de “investigações psíquicas”, no geral, e no que se referia ao assunto “reencarnação”, em particular, bem diferente daquele vigente nos EUA e mesmo na Inglaterra no mesmo período – e engendrariam “espiritismos” diferentes.

Nos EUA, tanto a gestação das tendências “proto-espíritas” quanto, afinal, o irromper do “New Spiritualism” deram-se no âmbito dum processo de “avivamento” levado a cabo por correntes cristãs protestantes puritanas; naquela sociedade (bem como na Inglaterra, depois), não havia ocorrido uma ruptura drástica na esfera religiosa; a população continuava, esmagadoramente, ligada a suas diversas igrejas cristãs protestantes, sendo a leitura da Bíblia algo corriqueiro.  Nesse ambiente, não havia lugar para o florescimento de doutrinas reencarnacionistas; a “evolução permanente da alma” (e da sociedade), temas que eram tão importantes nos EUA e na Inglaterra quanto na França, haveriam de se expressar de modo distinto, sem o uso do instrumental reencarnacionista (p.ex., nas descrições do “Summerland” e das “cidades celestiais”).

Por outro lado, na França, “descristianizada” desde o Iluminismo, e anti-clerical desde a Revolução, já estava plenamente estabelecida, ao menos em certos círculos, uma doutrina filosófica de reencarnacionismo cíclico evolutivo.  Se nos EUA e na Inglaterra (onde a influência das correntes religiosas protestantes era ainda forte, mesmo nos meios intelectuais, e a leitura da Bíblia ainda formava o cerne da educação) o reencarnacionismo era algo não apenas virtualmente desconhecido, mas mesmo impensável, tal não ocorria na França.  A Igreja havia sofrido erosão em sua autoridade desde o Iluminismo, e boa parte de seu arcabouço de poder (inclusive sua representação estamental no governo, bem como seus privilégios fiscais e a posse de grandes extensões de propriedade) havia sido, para todos os fins práticos, ou eliminada, ou bastante diminuída.  De qualquer modo, a intelectualidade francesa já havia, em boa medida, se desligado doutrinal (quando não moralmente) da Igreja (e, mesmo, do Cristianismo), ensejando o florescimento duma série de “visões alternativas” do mundo e das coisas, que iam do misticismo exacerbado (cristão ou não) ao ateísmo militante.  Dentre essas “visões alternativas”, estava o reencarnacionismo cíclico evolutivo.

Se o espiritismo anglo-saxão, por mais inovador que fosse, seguiu “enquadrado” pela Bíblia, o espiritismo francês mostrou-se bem mais multifacetado, até que triunfasse uma visão de índole reencarnacionista.

Não admira, assim, que os “espíritos” anglo-saxões revelassem a seus “médiuns” um mundo espiritual não reencarnacionista; e que os “espíritos” franceses, nas mãos de Rivail e de sua “entourage” embebida nas influências de Lessing, Leroux e Reynaud, e em todo o mistifório pseudo-celta e pseudo-druídico dos “antepassados gauleses”, revelassem a seus “médiuns” um mundo no qual a reencarnação cíclica evolutiva fluía suavemente, como uma “lei natural”, quase que “óbvia”, impondo-se ao fim como um “dogma”.

De fato, tudo leva a crer que o professor Rivail era reencarnacionista antes de Allan Kardec se tornar espírita (p.ex., o jornalista e dramaturgo Victorien Sardou, figura importante no círculo espírita inicial de Kardec, era com certeza um seguidor de Reynaud, cf. “Secular Spirituality: Reincarnation And Spiritism in Nineteenth-century France”, Lynn L. Sharp, pág. 61, e nota 50, pág. 87); e, se alguma dúvida ainda pairar acerca da visão de Kardec sobre o Druidismo, bastam dois exemplos: a) o primeiro é a sua assunção dum pseudônimo de “caráter celta” (qualquer que tivesse sido sua efetiva origem, ou as circunstâncias de sua adoção, “Allan Kardec” era um nome “celta”, mais especificamente “bretão”, ligado, assim, mesmo inconscientemente, ao Druidismo então popular); e b) o segundo é o texto “O Espiritismo entre os Druidas”, publicado na “Revista Espírita”, de abril de 1858, em que inúmeros “paralelos” entre as duas “doutrinas” (inclusive no que tange à “tábua de classificação de espíritos”) são apresentados.

Deve-se enfatizar, assim, que o Espiritismo (como gênero, i.e., como a doutrina que admite a comunicação sensorial, física, entre vivos e mortos, a partir da vontade de pelo menos uma das partes, e através de pessoas com acesso privilegiado a ambas as esferas, atuando como “meio” de ligação entre elas, e, portanto, denominadas “médiuns”) nasceu e desenvolveu-se inicialmente no mundo anglo-saxão (EUA, depois Inglaterra), e que as comunicações dos mortos, nessa fase, de forma esmagadora, tinham um caráter não-reencarnacionista (e, algumas vezes, explicitamente anti-reencarnacionista).  Mesmo aqueles pesquisadores ou grupos de fora dos EUA e da Inglaterra que seguiram mais de perto, e mais fielmente, o Espiritismo anglo-saxão (o “New Spiritualism”, ou simplesmente “Spiritualism”, como se denominava), como o russo Alexandre Aksakov, ou o francês Zéphyr-Joseph Piérart, não comungavam de crenças reencarnacionistas, e nem obtinham, em suas comunicações mediúnicas, elementos que corroborassem uma visão reencarnacionista do Além.

Esse Espiritismo anglo-saxão, que, a partir dos fenômenos das irmãs Fox (1848), iniciou o fenômeno espírita, que dotou-o de seu vocabulário (“Spiritualism”, mesmo “Spiritism”, bem como “médium”, são termos originados nessa época, sendo que “Spiritism” era uma denominação um tanto pejorativa – os adeptos da escola anglo-saxã preferiam dar a seu movimento o nome de “New Spiritualism”, ou simplesmente “Spiritualism”, e chamavam-se a si próprios “Spiritualists”, e não “Spiritists”), fez perfilar entre seus destacados membros pessoas como o já citado visionário e pioneiro Andrew Jackson Davis (1826-1910), o investigador científico sir William Crookes (1832-1919), os pesquisadores Alexandre Nicolaievitch Aksakov (1832-1903), Frederick William Henry Myers (1843-1901) e Henry Sidgwick (1838-1900 – primeiro presidente da SPR), o simpatizante progressivamente céptico Frank Podmore (1856-1910; no dizer de Nandor Fodor, “…from being a believer he gradually developed to a very sceptical critic, whose caution was excessive and coupled with exceptional scientific and literary gifts”), o entusiasta propagandista sir Arthur Conan Doyle (1858-1930), escritor e criador do famoso detetive Sherlock Holmes, e os médiuns e escritores William Howitt (1792-1879), Daniel Dunglas Home (1833-1886) e William Stainton Moses (1839-1892), entre muitos outros, e apenas para citar alguns dos vultos que foram contemporâneos, ou imediatamente pós-contemporâneos, de Kardec.

E deve-se notar que o surgimento duma corrente “reencarnacionista” no Espiritismo era algo absolutamente inesperado, até que surgisse.  Pois, imediatamente antes do lançamento de “O Livro dos Espíritos”, o panorama das “pesquisas psíquicas” na França era dominado por duas vertentes – nenhuma delas reencarnacionistsa.

A primeira dessas vertentes era a do “magnetismo animal”, ou “mesmerismo” (que pode ser considerado um proto-hipnotismo, centrado num suposto “fluido universal” que influenciaria a mente e os pensamentos).  Tratava-se de algo já velho de muitas décadas, e era conhecido de amplos setores do público francês (embora sempre carregasse um caráter polêmico, e estivesse enfrentando cada vez mais hostilidade por parte do meio científico).  Linha de investigação por si só riquíssima de história, possuía um universo próprio, pleno de interpretações e de variantes, das mais racionalistas (com as daquele infeliz Abade Faria, oriundo de Goa, na Índia Portuguesa, que ligava os fenômenos “mesmeristas” exclusivamente ao poder da imaginação – ele inspiraria a personagem homônima do romance “O Conde de Monte Cristo”) às mais místicas (como as de Louis Alphonse Cahagnet, que, desde 1847, ligava os fenômenos obtidos com os “sonâmbulos”, i.e., com os “hipnotizados”, à comunicação com os espíritos dos mortos).

O “magnetismo animal” tinha surgido com o médico austríaco Franz Anton Mesmer (1733-1815), daí também ser denominado “mesmerismo”.  Mesmer havia levado suas doutrinas (e sua terapêutica para casos de “perturbação mental”) a Paris (1778-1784), onde encontrou retumbante sucesso, e onde suas idéias acabaram se aclimatando; após dificuldades durante a Revolução Francesa e o Primeiro Império, quando muitos de seus mais destacados seguidores e simpatizantes, que eram nobres, haviam sido dispersos ou mortos, a corrente tinha experimentado um autêntico renascimento, com as pesquisas de Armand-Marie-Jacques de Chastenet, marquês de Puységur (1751-1825), continuadas pelo incansável Jules Denis, barão du Potet de Sennevoy (1796-1881), considerado o maior “magnetizador” (i.e., “hipnotizador”, ou, se se quiser, “controlador de sonâmbulos”) da França, ainda em plena atividade, e prestígio, nos meados do séc. XIX.

O “magnetismo animal” levava a cabo todo um conjunto de “pesquisas científicas” e “procedimentos terapêuticos”, em que os “magnetizadores” (“hipnotizadores”) exerciam influência sobre os “sonâmbulos” (“hipnotizados”), através da conveniente manipulação do “fluido animal universal”.  Nesse movimento, os maiores vultos eram justamente os “magnetizadores”, geralmente estudiosos de grande cultura formal e/ou oriundos de altos extratos econômico-sociais (alguns mesmo nobres, como Puységur e du Potet), capazes de manipular o “fluido universal” e utilizá-lo para fins terapêuticos; os “sonâmbulos”, geralmente pessoas de menos cultura e de extratos sociais mais humildes, muitas vezes mulheres, eram “hiper-sensitivos” nos quais o “fluido universal” manifestava-se de modo intenso e desordenado, e que tinham de ser convenientemente “enquadradas” pelos especialistas “magnetizadores”.

Pelos meados do séc. XIX, já havia toda uma vasta literatura mesmerista consolidada, e circulavam também periódicos que tratavam dessa matéria, sendo o mais famoso o “Journal du Magnetisme”, que circulou entre 1845 e 1861, editado pelo próprio barão du Potet.

A segunda vertente era, justamente, o recentíssimo “Spiritualism”, ainda na tradição anglo-saxã (não reencarnacionista), que se centrava principalmente (embora não somente) em Zéphyr-Joseph Piérart (1818-1879), que havia trabalhado, aliás, com o barão du Potet.

Havia, assim, na França, no que dizia respeito a esse conjunto de tendências que poderiam ser chamadas tanto de “proto-espíritas” quanto, também, de “proto-hipnóticas” e, ainda, de “proto-psicanalíticas”, três “pontos soltos” entre, diga-se, os anos 1854-1857:

a) a filosofia (pois era apenas, até então, uma percepção filosófica, ligada a círculos “socialistas utópicos”) reencarnacionista cíclica evolutiva.  Como visto, tinha origem no Iluminismo e na sua otimista e racional “visão de progresso”; engendrara a seguir, por Lessing, a concepção de que a existência de muitas vidas (“pluralidade de vidas”) fazia parte dum processo de evolução do ser humano; havia sido a seguir, na França, detalhada e reelaborada por Leroux; e, por fim, havia sido ligada a vários outros conceitos complementares, como a pluralidade dos mundos e a “tradição reencarnacionista druídica”, de cunho nacionalista “gaulês”, por Reynaud;

b) os fenômenos “mesmeristas’, ou do “magnetismo animal” (i.e., de índole hipnótica), obtidos por “magnetizadores” em “sonâmbulos”, fenômenos esses ligados tradicionalmente ao “fluido animal universal”, ou “fluido universal” (Mesmer, depois Puységur e du Potet), ou mesmo apenas ao poder da imaginação e da sugestionabilidade (Abade Faria; depois, Alexandre Bertrand), mas com certos círculos (Cahagnet) já aventando a hipótese de que, a partir desse “fluido”, ocorressem, ou pudessem ocorrer, comunicações dos mortos; enfim,

c) os novíssimos fenômenos “físicos” do “New Spiritualism” de origem norte-americana, das “batidas” (“raps”) às psicografias (ainda em estágio de consolidação de sua metodologia), explicitamente considerados, desde o início, como evidência da comunicação entre os vivos e os mortos (Piérart).

Caberia ao professor Rivail, de maneira hábil, unir esses três pontos, criando, numa síntese de grande apelo, mais uma espécie dentro do gênero “Espiritismo”, o espiritismo reencarnacionista cíclico evolutivo:

a) com um “trade mark” específico, “spiritisme”, derivado diretamente do vocábulo inglês “spiritism”, que o ‘New Spiritualism” havia rejeitado como depreciativo; isso possibilitou uma diferenciação do “produto”, facilitando também sua apresentação e sua propagação;

b) com um vocabulário consolidado, ao menos em seus conceitos mais centrais, que trai, contudo, sua tripla origem: 1) da filosofia reencarnacionista evolutiva, a própria idéia das múltiplas existências como um processo de aperfeiçoamento contínuo do ser humano, idéia essa que Rivail consubstanciou, brilhantemente, na palavra “reencarnação” (que funcionou, asism, como mais um “trade mark” do Kardecismo, possibilitando a diferenciação e a segregação com relação a outras posturas de índole reencarnacionista); 2) do magnetismo animal, os conceitos (reelaborados) de “fluido universal”, e da “fluidomania” em geral, bem como os papéis do “magnetizador” (agora o “chefe da sessão”) e do “sonâmbulo” (agora o “médium”); 3) do “New Spiritualism”, o próprio vocábulo “spiritisme” (da palavra em língua inglesa “spiritism” – embora Kardec reelaborasse sua significação, e transformasse o que era uma designação pejorativa, e portanto não assumida, numa bandeira que os “espíritas” passaram a portar com orgulho e com ciumento exclusivismo), assim como a palavra “médium” (que substituiu a antiga nomenclatura “sonâmbulo”, dos tempos do magnetismo animal); também, todo o aparato da sessão (“séance”) mediúnica, além, é claro, da “espinha dorsal” que caracterizaria a doutrina (a possibilidade de comunicação sensorial, física, entre vivos e mortos, a partir da vontade de pelo menos uma das partes, e mediante a intermediação de certos indivíduos com acesso privilegiado ao Além);

3) com um “texto canônico” fixado e consolidado, escrito “racionalmente” a partir da compilação (também “racional”, mesmo “científica”) das comunicações dos “espíritos superiores”, vazado numa linguagem simples e direta, mas igualmente elegante, portador duma mensagem atraente e ao mesmo tempo carregada de “autoridade”, fácil de ler e também fácil de manusear (a partir de sua divisão cuidadosa em tópicos, bem como com sua estrutura de “perguntas-e-respostas”, que já era empregada nos catecismos católicos) – “O Livro dos Espíritos”, um compêndio didático digno dum pedagogo experiente e competente como o professor Rivail – agora “Allan Kardec”.

“O Livro dos Espíritos” foi lançado em abril de 1857; a partir dessa data, “Rival” como que cessa de existir, e “Allan Kardec” inicia sua jornada (aqui, ao menos, se pode falar, sem dúvida, ainda que metaforicamente, em “reencarnação”…).  Quase dois anos haviam se passado desde o primeiro contacto de Rivail com as “mesas girantes”, em maio de 1855, na casa da sra. de Plainemaison; e quase um ano desde que, entre os fins de abril e o início de maio de 1856, sua “missão” de “codificador” lhe havia sido revelada pela mediunidade da srta. Japhet.

Assim, em cerca de um ano (entre maio de 1856 e abril de 1857), todo um enorme elenco adicional de “perguntas” foram postas aos, e pretensamente respondidas pelos, “espíritos superiores”, a partir dum número indeterminado de médiuns: “mais de dez médiuns”, na expressão vaga que consta nas “Obras Póstumas”, embora, aparentemente, as duas irmãs srtas. Baudin (Julie e Caroline, com c.16 e c.18 anos, respectivamente, em 1857) e a srta. Japhet (1837-1885; “magnetizada” por Roustan) tenham tido um papel destacado.  Também são citadas como médiuns, nessa ocasião, pelas “Obras Póstumas”, a sra. Roger, magnetizada por Fortier; a srta. Aline Carlotti (filha do amigo corso de Rivail, que primeiro lhe havia falado acerca das “mesas girantes”); e a sra. Ermance Dufaux (nascida, ao que consta, em 1841), embora, ao contrário das duas irmãs Baudin e de Céline Japhet, seu papel na composição de “O Livro dos Espíritos”, se é que tiveram algum, não se mostre suficientemente claro nas “Obras Póstumas”.  Ao longo desse intervalo de um ano, “foi da comparação e da fusão de todas essas respostas, coordenadas, classificadas e, muitas vezes, refundidas no silêncio da meditação, que formei a primeira edição de ‘O Livro dos Espíritos’”, nas palavras do próprio Kardec (cf. “Obras Póstumas”).

Fosse como fosse, o empreendimento mostrou-se bem sucedido na França.  Tanto o vetusto “magnetismo animal” de du Potet quanto o espiritismo no modelo “anglo-saxão” (o “New Spiritualism” não reencarnacionista) de Piérart definharam, de modo tal que, à época da morte do Codificador (1869), o Kardecismo dominava, inconteste, o panorama do Espiritismo francês.  Seu surgimento, assim, foi inesperado; seu triunfo (ao menos sobre seus dois “concorrentes”) foi rápido.  Uma vaga de “literatura espírita”, a começar pelas obras do próprio Kardec, seguiu-se, bem como inúmeros periódicos.  Os mais famosos foram, sem dúvida, a “Revista Espírita” (“Revue Spirite”), mensal, editada por Kardec a partir de janeiro de 1858, e a “Revista Espiritualista” (“Revue Spiritualiste”), de Piérart, bimensal, logo depois, naquele mesmo ano.

Lentamente, os nomes de Leroux e de Reynaud, dos magnetizadores “mesmeristas” (exceto naquilo que pudessem ser considerados como precursores de técnicas hipnóticas) e de Piérart caíram no esquecimento (enquanto a “Revue Spirite” de Kardec se consolidava, a “Revue Spiritualiste” de Piérart definhava, até cessar de circular em 1873).  Fora dos domínios do Espiritismo anglo-saxão (EUA, Inglaterra), a própria história e importância do “New Spiritualism” foi paulatinamente esmaecendo.  Nos países de tradição “kardecista” (i.e., nos países de “colonização cultural” francesa), “Espiritismo” e “Kardecismo” tornaram-se sinônimos, e todos os eventos anteriores, ou contrários, à Codificação passaram a ocupar, quando muito, um espaço exíguo na “história oficial”, na “narrativa canônica” da “História do Espiritismo”.  Abriu-se, assim, uma nítida diferença, às vezes um verdadeiro fosso, entre as vertentes “anglo-saxã” e “kardecista”, entre o “Spiritualism” e o “Spiritisme”, entre os “Spiritualists” e os “Spirites” (ou, como são conhecidos em língua inglesa, os “Spiritists”).

A divergência entre as duas principais correntes espíritas centrou-se, claro, principalmente, no dogma da reencarnação compulsória cíclica evolutiva, que, desde o início, espantou os espíritas da corrente anglo-saxã, já que estes últimos não obtinham declarações de tal índole em suas sessões mediúnicas.

Esse espanto pode ser sentido no próprio artigo do Conselheiro Aksakov publicado no “The Spiritualist” londrino, em 1875, acerca da origem do “dogma do reencarnacionismo” entre os espíritas franceses.  Não se trata, em absoluto, de desconhecimento, por parte do nobre russo, de correntes reencarnacionistas filosóficas, mas sim do espanto do pesquisador espírita (adepto do “New Spiritualism”…) diante do fato de que as comunicações mediúnicas, que tinham, quer na Inglaterra (e EUA), quer na França, a mesma pretensa origem (os espíritos dos mortos), pudessem ser tão divergentes (e irreconciliáveis) num ponto tão importante.  Nas próprias palavras de Aksakov: “When ‘Spiritism’, newly baptized with this name, and embodied in form of a doctrine by Kardec, began to spread in France, nothing astonished me more than the divergence of this doctrine from that of ‘Spiritualism’, touching the point of Reincarnation.   This divergence was the more strange because the sources of the contradictory affirmations claim to be the same, namely, the spirit-world and communications given by spirits”; e, noutro trecho do mesmo artigo: “That the propagation of this doctrine by Kardec was a matter of strong predilection is clear; from the beginning, Reincarnation has not been presented as an object of study, but as a dogma; to sustain it he has always had resource to writing mediums, who it is well known pass so easily under the psychological influence of preconceived ideas…”.

Essa discrepância, claro, nunca foi satisfatoriamente resolvida, e, na “versão canônica” da história espírita kardecista, foi simplesmente varrida para debaixo do tapete.  O espanto diante da reencarnação, e a rejeição a tal “dogma” (pois ela era, e sempre foi, desde então, vista pelos “spiritualists” como um dogma, uma imposição arbitrária não amparada suficientemente por dados empíricos), foi geral nos meios espíritas anglo-saxões.  Segundo nota Nandor Fodor (na mesma “Encyclopaedia of Psychic Science”), Andrew Jackson Davis considerou o reencarnacionismo kardecista “uma magnífica casa construída sobre areia” (ou seja, uma doutrina teoricamente bela, mas sem fundamentos sólidos); a oposição do médium Daniel Dunglas Home foi intensa, como também o foi a de William Howitt, que fez ver que, se tal teoria fosse verdadeira, existiriam forçosamente milhões de espíritos que, ao morrerem, teriam procurado em vão, no outro mundo, por seus parentes, filhos e amigos (situação não presente nas comunicações obtidas pelos médiuns britânicos e norte-americanos). Isso não significa que o Espiritismo da escola anglo-saxã rejeitasse totalmente a reencarnação; o que ele rejeitou foi o reencarnacionismo compulsório cíclico evolutivo; na visão da escola anglo-saxã, a “evolução espiritual” teria outros modos mais eficientes de ocorrer, além da repetição de vidas terrestres.  Conforme o depoimento do mesmo William Howitt de janeiro de 1866 (colhido por Emma Hardinge Britten em sua obra “Nineteenth Century Miracles”, cap. VIII, pág. 55):

“O sr. Pezzani, na edição do ‘Avenir’ de 2 de novembro [de 1865], crê ter refutado o sr. Piérart com o argumento de que, sem a reencarnação, o caos e a injustiça prevaleceriam em toda a criação de Deus.  Pois, segundo ele, neste mundo há ricos e pobres, oprimidos e opressores, e sem [a consideração do princípio d]a reencarnação, a justiça de Deus não poderia agir.  Ou seja, na concepção do sr. Pezzani, Deus não tem condições [ou: poder], no futuro infinito [i.e., fora do mundo físico], para punir e corrigir [de outras formas] todo e qualquer erro, a não ser mandando as almas reencarnarem em sucessivas vidas [no mundo físico].  Para o sr. Pezzani,  bem como para os seus confrades reencarnacionistas, a melhor maneira de se ir de Paris a Londres é viajar várias vezes [sucessivamente] de Paris a Calais, indo e vindo.  Nós, ingleses, por outro lado, cremos que o melhor é ir-se diretamente para Londres […] E, acerca das noções do sr. Pezzani sobre a injustiça de Deus, caso não se supusesse a reencarnação, se as almas voltassem a encarnar, mesmo nesse caso [no curso natural dos acontecimentos] não cessaria a injustiça entre os homens, a riqueza e a pobreza, a opressão e os erros, ou seja, todos os enigmas da desigualdade social permaneceriam do mesmo modo que agora”.

Mas, como mencionado, a escola anglo-saxã repelia o “reencarnacionismo”, não a reencarnação em si.  P.ex., um dos espíritos-guias (“controles”) de Stainton Moses, chamado “Imperator”, havia ensinado que a reencarnação podia ocorrer em certos casos excepcionais, como uma segunda chance a almas que se haviam por demais aviltado moralmente, tendo, por assim dizer, praticamente perdido a sua personalidade, ou para espíritos superiores em missão especial na Terra.  Conan Doyle, por sua vez, ponderou que, sendo algo concernente ao seu próprio futuro, a reencarnação, para um espírito, poderia ser-lhe tão desconhecida e misteriosa como o é para nós (ou seja, que os espíritos poderiam, mesmo quando “desencarnados”, não se lembrar de encarnações anteriores).

A situação nunca chegou a se harmonizar; a divisão entre as duas escolas tornou-se bastante explícita por ocasião do Congresso Espírita Internacional de Liège (1923); a última das conclusões adotadas pela Seção de Filosofia do Quinto Congresso Internacional Espírita de Barcelona, de 1934, referente à reencarnação, assim rezava:

“Previsto existirem diferenças, de momento irredutíveis, entre os que consideram a Reencarnação como processo necessário para a Evolução e os que crêem poder a Evolução efetuar-se sem esse processo, foi aprovada transacionalmente e como prova de tolerância a conclusão seguinte: os espíritas de todo o mundo, reunidos em Congresso, afirmam unanimemente a sobrevivência da personalidade humana depois da morte corporal, considerando-a cientificamente provada como um fato.  Os espíritas latinos e hindus, representados neste Congresso pelos delegados de Bélgica, Brasil, Cuba, Espanha, França, Índia, México, Portugal, Porto Rico, Argentina, Colômbia, Suíça e Venezuela, afirmam a Reencarnação como lei de vida progressiva, segundo a frase de Allan Kardec: ‘Nascer, morrer, renascer e progredir sempre’; e aceitam-na como uma verdade de fato.  Os espíritas não latinos, representados no Congresso pelos delegados da Inglaterra, Irlanda, Holanda e África do Sul, consideram não ter demonstração suficiente para estabelecer a doutrina da Reencarnação formulada por Kardec.  Cada escola, portanto, fica em liberdade para proclamar as suas convicções a respeito da Reencarnação”.

A situação permanecia virtualmente inalterada por ocasião do Congresso Espiritista Internacional de Londres (1960), tendo o delegado brasileiro, Hélcio Pires, no relatório publicado no “Mundo Espírita” de 30 de novembro de 1960, declarado: “A Reencarnação é ainda o ponto principal e o único obstáculo a um entendimento geral entre os espíritas de todo o mundo”.

Embora generalizações possam ser injustas ou, mesmo, exageradas (e, de qualquer modo, admitirem sempre exceções, às vezes notáveis), pode-se dizer que, no geral, a corrente “anglo-saxã” do Espiritismo se caracterizou por um menor grau de dogmatismo e de formalização teórica, a par duma maior ênfase nos fenômenos físicos e nas pesquisas correlatas (seja exemplo cabal disso a constituição da SPR – a “Society for Psychical Research”, em 1882); e que a corrente “francesa” (também chamada “kardecista”, ou “latina”) tem exibido um alto grau de dogmatização teórica (centrado, ao menos formalmente, nas obras da Codificação de Kardec), a par duma ênfase muito maior na psicografia, quando comparada às manifestações de efeitos físicos e, mesmo, à experimentação.

JCFF.

120 respostas a “Algumas Notas sobre a Origem, e os Primeiros Tempos, do Espiritismo”

  1. Marciano Diz:

    “a) já em 1785, James Whittaker, líder da comunidade religiosa milenarista denominada os “shakers” (uma dissidência de “quackers” de Manchester, …”
    .
    Seria “quackers” mesmo, “charlatães”, ou “quaker”, os religiosos?

  2. Marciano Diz:

    O anjo chamava-se Moroni, e os que acreditavam na história eram “morons”. Deve ser daí que vem o nome mormon.

  3. Marcos Arduin Diz:

    O Livro de Mórmon narra a história de duas migrações européias pré colombianas para a América, das quais JAMAIS se obteve qualquer indício de terem ocorrido. São histórias bem absurdas. As duas migrações não tiveram futuro, mas da segunda, após uma guerra, todos os seus membros pereceram, exceto Moroni, que era filho de Mórmon.

  4. Marcos Arduin Diz:

    Bem, Zé…
    Eu diria que sua síntese até que está razoavelmente boa, tanto que não tenho reparos a fazer. A coisa vai por aí mesmo. Se me permitir, gostaria de mandá-la ao Alamar Régis só pra ver o que ele acha a respeito (não o levo tão a sério assim…).
    .
    A questão aqui do DOGMA da reencarnação, bem, continuo não achando nenhum argumento dos espiritualistas que a considerem injusta ou errada, etc e tal. Os do contra que listou não dizem nada que não sejam argumentos infantis.
    .
    Supondo como foi sugerido que o tal dogma reencarnacionista tenha sido imposto por Kardec (o que eu acho estranho, pois nas tantas quantas sessões que fez junto a vários colegas, se isso não fosse ensinamento dos espíritos, imagino que vários deles aparecessem por lá para desmenti-lo…), seria isso um GRAVE PROBLEMA? Kardec achou que esse dogma, sob a forma o qual apresentou, era lógico e racional.
    .
    Dogma só representa um problema quando nos induz ao mal (como o dogma científico dos nazistas que dizia que as raças inferiores eram tão prejudiciais que deveriam ser eliminadas…) ou quando provado falso. Os cristãos _ tá muitos deles, para não dizer que estou enfiando todos no mesmo saco _ insistem no dogma da INFABILIDADE BÍBLICA, segundo o qual a Bíblia é revelação de Deus, exata e infalível e absolutamente verdadeiras sobre TUDO quando o que se manifesta. Sabemos que muito do que é dito na Bíblia já se comprovou ser falso…
    Neste caso temos um dogma furado e a firme crença nele não o torna verdadeiro.
    .
    Não me consta que já se tenha provado a falsidade da reencarnação, nem que na forma apresentada por Kardec, fosse ilógica e irracional. Enquanto isso não acontecer, nós espíritas continuamos na nossa.

  5. Vitor Diz:

    Oi, Arduin
    já se provou a falsidade e a irracionalidade da reencarnação sim, pelo menos da forma como proposta por Kardec. Stevenson PROVOU que a reencarnação NÃO se dá na concepção, ao contrário do que diz o LE, já que há casos de reencarnação que só ocorrem depois do nascimento. Publiquei no blog um caso assim, em que há abundância de documentos comprovadores. Além disso, Stevenson DETONOU com a ideia de karma também, o que joga a reencarnação proposta por Kardec na lata do lixo! Mais que isso, reuniu casos em que o espírito RETROGRADA, indo parar no corpo de um animal. Esses últimos não são casos fortes, claro, mas é mais um ponto que pode pulverizar a crença kardecista.

  6. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Marciano,

    São “quakers” (“quacres”, como alguns dizem em língua portuguesa), religiosos. Erro (involuntário!) de digitação… Sds,

    JCFF.

  7. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Arduin,

    Não estou aqui entrando no mérito sobre a realidade da reencarnação (muito menos sobre o reencarnacionismo, e muito menos ainda sobre o reencarnacionismo cíclico evolutivo proposto por Kardec). A questão histórica é que Kardec impôs o reencarnacionismo cíclico evolutivo como um DOGMA – uma “revelação”, uma “verdade” obtida junto aos espíritos, e que não foi, nunca, por parte dos kardecistas (a começar pelo próprio Kardec) objeto de estudo, mas sim um princípio doutrinário. “Reenvarnação”, para os espíritas kardecistas, não é algo que se discute, é algo que se aceita como parte do “pacote”, com as justificativas de que “os espíritos assim ensinaram” (o que é historicamente falso, a maioria não o ensinou até à época do próprio Kardec), e de que a coisa é “lógica” (o que, tendo em vista o suposto caráter “científico” do Espiritismo, não tem peso algum).

    Assim sendo, fora de qualquer discussão, a reencarnação (e quando dizem “reencarnação” os kardecistas querem dizer “reencarnacionismo cíclico evolutivo”) é um dogma. Pode estar “certo” ou “errado”, pode ser “lógico” ou “ilógico”, mas não se constituiu, nunca, na escola kardecista, num item a ser estudado; ou numa hipótese de trabalho que, revelada por ALGUNS espíritos, deveria também ser testada. E isso desde o início: foi imposto como um princípio a ser aceito.

    E o que quero deixar claro é que Kardec não tinha nenhuma base empírica para agasalhar esse princípio; mesmo que seja fato que os espíritos que ele consultou lhe tenham mostrado isso, deve-se levar em conta que sua base de pesquisa era muitíssimo estreita, ainda, nos meados da década de 1850. Porque ele estava consultando alguns espíritos que se manifestavam a partir de médiuns (principalmente do sexo feminino, e principalmente adolescentes) dum círculo bem específico de Paris, um círculo, e um meio, em que idéias reencarnacionistas evolutivas já estavam há muito presentes. Na própria França, havia espíritos que não ensinavam, em absoluto, o reencarnacionismo (p.ex., os da escola de Piérart), isso sem falar na enorme quantidade de espíritos que haviam se manifestado, até então, nos EUA e na Inglaterra. A única justificativa para se levar mais em conta o que os espíritos do “círculo de Kardec” revelavam, em oposição a praticamente todos os outros espíritos, é que os tais espíritos dos “mais de dez médiuns” (quem eram esses médiuns, afinal, e quantos eram? Que credenciais tinham?) fossem, de algum modo, “especiais”. Ora, isso é algo para se provar, não para se supor… E o que Kardec, consciente ou inconscientemente, fez, foi justamente isso: algo como “os meus espíritos são melhores que os espíritos dos outros”… Mas, por quê seriam?

    Portanto, o reencarnacionismo, na época do lançamento d’ “O Livro dos Espíritos”, era, em termos do Espiritismo visto como um todo, um tema no mínimo controverso; deveria ser tratado não como um dogma, ou um princípio doutrinário, mas como uma área para posteriores pesquisas – se o posicionamento de Kardec fosse, de fato, científico.

    Se os argumentos dos espíritas da corrente anglo-saxã são ou não “infantis” (eu não os acho tão infantis assim, mas… isso vai da cabeça de cada um), isso não importa; o que importa, creio, para os espíritas, é se o reencarnacionismo é ou não é verdadeiro, é ou não é algo que, efetivamente, ocorre aos espíritos ao longo de sua “jornada”; e isso somente pode ser respondido, na medida em que uma questão desse quilate pode vir a sê-lo, através do testemunho dos próprios espíritos. E, na época em que Kardec lançou a primeira edição de “O Livro dos Espíritos”, e começou a publicar a sua “Revista Espírita” (1857-1858), o reencarnacionismo não era ensinado pela maioria dos testemunhos dos “espíritos”, quer nos EUA, quer na Inglaterra; e, mesmo na França, somente com Kardec e seus “mais de dez” médiuns (de novo: quantos? Quais? Quem? Com que credenciais? Eram ou não sugestionáveis?) o ensinaram. Conveniente, não?

    Não lhe parece que alçar não apenas o reencarnacionismo, mas um “reencarnacionismo cíclico evolutivo”, à condição de dogma (porque foi, e é, um dogma…) foi algo, no mínimo, prematuro por parte de Kardec? Por que tanta pressa? Por que “O Livro dos Espíritos” foi executado “a toque de caixa”, com o testemunho de tão poucos médiuns, e apenas médiuns duma região e duma tendência específica, e não levou em conta o que a maioria das manifestações dos espíritos, NO MUNDO, ensinavam?

    A principal oposição da corrente anglo-saxã não foi à reencarnação em si, mas ao reencarnacionismo colocado como dogma, algo indiscutível – e, para os Kardecistas, é um dogma, e é indiscutível, fale o sr. o que quiser. Tanto que, diante dos fatos inquestionáveis (de que Kardec o impôs em seu sistema, sem discussão, e sem uma adequada base empírica – somente se fiando EM SEUS MÉDIUNS, i.e., nalguns médiuns, sobre os quais ele tinha controle, nalgum grau que fosse), normalmente os kardecistas apelam para a “lógica” e a “justiça” do reencarnacionismo cíclico evolutivo. De novo: não é uma questão de lógica, se o Espiritismo é “a doutrina comunicada pelos Espíritos”; é uma questão de “ser verdadeiro”. E fica aqui a pergunta: quem estava mentindo (porque alguém estava…), os espíritos “anglo-saxões” (e os espíritos franceses de Piérart) ou os espíritos consultados pelos “mais de dez médiuns” (quantos? Quais? Quem? Etc…) de Kardec? Qual dos grupos tem mais valor, e por quê? Não adianta simplesmente falar em “lógica”, porque, se o problema é de índole lógica, não há necessidade alguma de se evocarem espíritos. Pois, se o que eles revelarem estiver de acordo com a nossa “lógica”, aceitamos, e, se não, rejeitamos. Portanto, a evocação de “espíritos” torna-se totalmente dispensável. Nesse ponto, eu tomo o espiritismo da escola anglo-saxã, o “new spiritualism”, como eles o denominavam (e como seus remanescentes ainda o denominam) como muito mais honesto, muito mais autêntico, e, mesmo, muito mais lógico, ao fim das contas, do que o “spiritisme” de Kardec – porque eles, sim, levaram em conta, ou procuraram levar em conta, o que os “espíritos” revelavam. Além da possibilidade da comunicação sensorial entre vivos e mortos, a partir da vontade de pelo menos uma das partes, e através de pessoas dotadas de dons especiais para tanto (i.e., além da definição original de “espiritismo”), não impuseram nenhum dogma, não forçaram nada, deixaram o “Além” se revelar. Sinceramente, se eu tivesse que ser “espírita”, não seria um “kardecista”. É isso. Sds,

    JCFF.

  8. Matusalém Diz:

    As pesquisas de Stevenson são consideradas pelo seu próprio autor como evidência de reencarnação. Não são provas! Há muitas coisas a serem pesquisadas em tais pesquisas. Quanto à reencarnação evolucionistas já era falada há milênios, através do próprio livro esotérico judeu da CABALA. Portanto, evolução espiritual, não é uma criação europeia.
    Obrigado

  9. Marciano Diz:

    JCFF,
    Tenho o maior respeito por vc e, embora não partilhe de suas crenças, evidentemente, sei que vc é uma pessoa muito séria. Já eu, espero que me perdoe por esse pecadilho, sou dado a umas pilhérias de vez em quando. Claro que eu sabia que era um erro involuntário de digitação, vc não faria esse tipo de brincadeira, mas tratando-se de Joseph Smith e de sua história bizarra, parece até um lapso freudiano. No fundo, vc deve saber que JS era um charlatão. Um abraço.
    Arduin,
    Bom vê-lo de volta aqui.
    Eu sempre imaginei o que diria um sujeito como o Alamar aqui, ele é do tipo espírita nervosinho. Eu acho que ele se julga importante demais para comentar aqui. Espírito superior, essas coisas, mas ele é um cara divertido.
    Um abraço pra vc também, irmão.
    Gostaria de comentar mais, só que estou sem tempo para pensar seriamente.
    Um abraço pra vc também, Vítor.

  10. Marcelo Diz:

    Sr. José Carlos.
    Interessante a sua abordagem sobre a origem do espiritismo anglo-saxão no chamado Segundo Avivamento nos EUA. Período no qual se destacou a presença de pregadores cujas lideranças não se preocupavam muito com a formação dos seus ministros, o que levou ao surgimento de diversas figuras heterodoxas como o já citado no seu texto Charles Grandison Finney, que em suas memórias admitia não possuir uma formação adequada e preferir NÃO ATUAR em grandes cidades ou congregações muito CULTAS. Seu texto é bastante pertinente nos dias atuais, aqui no Brasil, pois vemos algo semelhante acontecer com as chamadas denominações neopentecostais, em que não há a preocupação nos seus pastores de perseguir o padrão proposto por John Wesley no seu “Discurso ao Clero” de 1756, levando a doutrinas estranhas ao cristianismo (como o muito criticado, por cristãos e não cristãos, evangelho da prosperidade).
    .
    Não vou me alongar nessas elucubrações, pois não creio ser este o objetivo do blog. Gostaria apenas de solicitar um melhor esclarecimento quanto a 2 pontos que não parecem muito claros no seu texto:
    .
    1) Como se deu a transmissão do “New Spiritualism” dos EUA para a Inglaterra? Creio que conhecer a forma como isso aconteceu é importante, pois o que ocorreu foi algo contrário ao que normalmente acontecia. O comum, para a época, seria que ideias europeias fossem importadas por outros países (os países da Europa eram o centro econômico e, por consequência, o centro cultural do mundo) e não o contrário.
    2) “(…)qualquer pessoa que tenha a Bíblia como uma leitura constante desde a mais tenra idade, e que viva num ambiente impregnado de citações e modelos bíblicos, jamais o reencarnacionismo (e mesmo, quase sempre, a reencarnação) poderia se configurar em algo viável, ou mesmo pensável.” Porém o sr não crê que a leitura constante da Bíblia seja um impedimento à comunicação com os mortos. Por que? Acredito que foi justamente a falta de um preparo dos ministros (como o de Charles G. Finney já citado) bem como das congregações como um todo, que permitiu o surgimento de ideias pouco ortodoxas.
    .
    Deixo abaixo dois links com trechos das memórias de Charles Finney e do “Discurso ao Clero” de John Wesley.
    .
    http://www.gospeltruth.net/Port/memorias_ch5_fin.htm
    http://www.slideshare.net/revpdn/texto-2-discurso-ao-clero-john-wesley
    .
    Um abraço.

  11. Marcos Arduin Diz:

    “Oi, Arduin
    já se provou a falsidade e a irracionalidade da reencarnação sim, pelo menos da forma como proposta por Kardec. Stevenson PROVOU que a reencarnação NÃO se dá na concepção, ao contrário do que diz o LE, já que há casos de reencarnação que só ocorrem depois do nascimento.”
    – KKKKK. Ian Stevenson PROVOU… Ô Vitor! Cadê o reconhecimento do Dawkings, do Hyman, do Randi, do Weissman, do Polidoro & Cia Bela cética de que o Stevenson PROVOU alguma coisa sobre reencarnação? Quem, além de seus fãs, acha que ele PROVOU alguma coisa? Stevenson pode ter INTERPRETADO os resultados de suas pesquisas dessa forma muito particular. Suponho, pois não li nada dele, que ele tenha se deparado com situações que na DE chamamos de SUBJUGAÇÃO, onde o espírito obsessor domina de tal maneira o obsediado, que age através dele, como uma extensão de sua vida. Se me lembro direito, Stevenson cita o caso onde um camarada “morreu” e depois passou a falar e agir como se fosse um dos fundadores da Bauhaus, o Kandinski. Lembro-me também de um caso aqui no Brasil, que saiu até no Globo Repórter (falaram lá no ECAE). Um garoto morreu afogado e tempos depois, sua prima, que morava longe de onde ele viveu e mal se conheceram (ou não se conheceram), passou a dizer que era ele, agir como menino e a se expressar de forma distinta de como ela era. Depois, “ele” anunciou sua partida, foi feita uma reza e após dormir, a menina acordou como ela era antes. Disse que o tempo todo ficara ali, mas não interferiu na atuação do espírito do primo.
    Essa reencarnação a la Stevenson é bem gozada. O que somos antes da “reencarnação”? Que espírito estava na pessoa antes dessa “reencarnação”? Ele foi criado assim como a criança nasceu, ou já existia e se uniu ao ovo?
    .
    “Publiquei no blog um caso assim, em que há abundância de documentos comprovadores. Além disso, Stevenson DETONOU com a ideia de karma também, o que joga a reencarnação proposta por Kardec na lata do lixo!”
    – Bumm! Como foi essa detonação?
    .
    “Mais que isso, reuniu casos em que o espírito RETROGRADA, indo parar no corpo de um animal. Esses últimos não são casos fortes, claro, mas é mais um ponto que pode pulverizar a crença kardecista.”
    – Nossa! Então quer dizer que ele entrevistou algum cachorro ou outro bicho que se lembrou de ter sido certo humano identificado assim ou assado? Essa eu queria ver! Bem, num livro cristão, anti-reencarnacionista, trazia um comentário de que Silvester Stalonne se lembrava de ter sido certos tipos de pessoas em vidas passadas e também se lembrava de ter sido… cavalo. Vai ver que foi algum condutor de rinquinchá meio retardado e por isso pensou que tivesse sido um cavalo.
    .
    Você me diverte, Vitor.

  12. Vitor Diz:

    Oi, Arduin
    .
    01. Céticos como Carl Sagan e Sam Harris reconheceram o valor das pesquisas de Stevenson.
    .
    02. Caso que detona a ideia de que o espírito se liga na concepção: http://obraspsicografadas.org/2012/ruprecht-schulz-estranho-caso-de-reencarnao-que-legitima-o-suicdio-e-o-aborto/
    .
    03. A refutação à ideia do karma baseia-se no fato de os ferimentos que o agressor inflige na vítima são reproduzidos na vida seguinte na própria vítima, e não no agressor, como seria esperado pelo espiritismo kardecista.
    .
    04. Os casos de pessoas que lembram a vida de animais incluem lembranças de outra vida como humano, esta sim, verificada. Ou seja, se essa vida como humano realmente existiu, então isso ajuda a pensar que a vida [intermediária] como animal também seja verídica, e não fruto de fantasia. É claro que aqui não existem evidências fortes [ainda], mas mostra que o espiritismo kardecismo é fruto de puro dogma, descartando ideias como a metempsicose de forma muito rápida.

  13. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Matusalém,

    Que eu saiba, a Cabala é um construto medieval, emergindo nos sécs. XII-XIII dC, em certos meios místicos judaicos, no sul da França e na Espanha. Mas o sr., claro, poderá esclarecer detalhadamente o assunto, mostrando as evidências históricas pertinentes (inclusive epigráficas e documentais, com citações e alusões INEQUIVOCAMENTE CABALÍSTICAS) que a façam retroceder assim tantos “milhares” de anos. E lembre-se que mostrar a existência dum misticismo judaico, ou duma interpretação “mística” do Tanac, ou de trechos do Tanac, NÃO É a mesma coisa que demonstrar a existência da “Cabala”, menos ainda do reencarnacionismo, e muito menos ainda dum reencarnacionismo cíclico evolutivo. Espero ansiosamente por seus esclarecimentos; não tenha pressa. O que não vale é apelar para a desculpa de que a coisa foi passada oralmente e em segredo, por gerações e gerações de “iniciados”, e que só “emergiu” na Idade Média… A não ser nalguns casos, muito bem documentados e justificados, isso é fantasia, não evidenciação histórica (uma exceção, porque bem documentada, diz respeito à passagem dos textos védicos oralmente, por muitas e muitas gerações do clero bramânico – os mais antigos manuscritos védicos remanescentes datam do séc. X dC, sim, séc. X depois-de-Cristo, e são oriundos do Nepal; mas aqui se tem todo um corpo estamental, o dos brâmanes, cuja função era justamente essa; e também o caráter da própria civilização hindu tradicional, profundamente marcada pela oralidade – nada disso está presente na cultura judaica, e depois na greco-romana, com sua ênfase na palavra escrita).

    De meu conhecimento, nem egípcios, nem mesopotâmicos, nem judeus, nem persas (zoroastrianos) foram reencarnacionistas. Nem a religião indo-européia, tanto quanto se a pode reconstituir, o foi, primitivamente. E ela pode ser reconstituída, quer a partir dos mitos greco-romanos, quer a partir de reminiscências pré-zoroastrianas presentes no Avesta, quer a partir dos mais antigos hinos védicos, os constantes no Rig-Veda.

    Na própria Índia, o reencarnacionismo cíclico (NÃO-EVOLUTIVO) somente tomou corpo a partir duma série de reflexões, poder-se-ia dizer mesmo de índole “filosófica” ou “teológica”, que a casta sacerdotal (ou, ao menos, que alguns de seus membros), os brâmanes, efetuou sobre os Vedas, e que se consubstanciaram nos Upanishades, lá pelos séculos VIII-VII aC, mais ou menos; nessa mesma época, pode ter surgido, na Grécia, a Irmandade Órfica (também um reencarnacionismo cíclico não-evolutivo). Pelo séc. VI aC, surgiram os pitagóricos (de novo: reencarnacionismo não-evolutivo).

    Nem na Mesopotâmia, nem no Egito, nem na Pérsia, que se saiba, surgiram, nas estruturas religiosas tradicionais, elementos reencarnacionistas. Tais elementos sempre foram, na Antiguidade, presentes apenas nalguns grupos minoritários, à exceção da Índia, onde as reflexões inicialmente constantes nos Upanishades foram se tornando mais e mais comuns (por causa da influência bramânica) – mas isso sem retirar o caráter não-reencarnacionista que emana do Rig-Veda, e mesmo dos costumes e ritos funerários tradicionais hindus.

    É possível que a influência órfica e pitagórica inspirasse a visão reencarnacionista que acabou se ligando ao platonismo (cf. o “Timeu”); mas não era uma visão evolutiva. Também os druidas (ou, ao menos, alguns druidas) nutriam idéias reencarnacionistas (disso há vários testemunhos dos escritores clássicos), mas é difícil saber se tais idéias se originaram nalgum processo de investigação teológica autóctone, ou, ao contrário, surgiram a partir de influências, mesmo indiretas, de correntes órficas e/ou pitagóricas, via gregos (p.ex., via Massália, em particular, ou via comércio com o mundo grego, em geral, que foi intenso entre os séculos Vi e IV aC).

    O reencarnacionismo, assim (exceto na Índia), sempre foi minoritário no mundo antigo; e nenhuma de suas manifestações (hinduísmo dos Upanishades, orfismo, pitagorismo, “druidismo” tardio, platonismo – e depois neo-platonismo) foi evolutiva – o reencarnacionismo cíclico evolutivo foi um construto ocidental europeu, ligado, mais especificamente, ao Iluminismo e à sua crença na “contínua evolução” (leia-se: “aperfeiçoamento”) da sociedade e do ser humano. Mas, claro, o sr., sr. Matusalém, poderá também nos esclarecer esse assunto, mostrando, em detalhe, todas as evidências históricas pertinentes. Sds,

    JCFF.

  14. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Marcelo,

    Não é fácil, nem rápido, muito menos simples, comentar sobre suas observações. Mas, bem, vamos lá…

    Havia um inter-relacionamento muito grande entre os EUA e o Reino Unido na primeira metade do séc. XIX (especialmente no período de c. 1820-c.1860), por causa das características específicas da onda migratória de ingleses (e também de escoceses e, durante a, e depois da, Grande Fome, de irlandeses) para os EUA (e também para o Canadá britânico); essas pessoas mantinham ainda laços com seus parentes no Velho Continente, e algumas vezes até voltavam para lá, temporária ou definitivamente; e o mesmo ocorria entre os EUA e o Canadá (o Canadá, apesar de ser colônia britânica, sempre teve laços econômicos e humanos bastante fortes com os EUA). O “fluxo triangular” (EUA – Reino Unido – Canadá) de pessoas e de idéias era intenso, facilitado inclusive por uma língua comum. E, se muitos dos migrantes eram pessoas humildes, mesmo pobres (isso era especialmente verdadeiro no caso dos explorados camponeses irlandeses católicos), havia muitos migrantes (principalmente entre ingleses e escoceses) que eram artesãos ou operários qualificados, e, mesmo, da pequena burguesia – muitos deles cristãos não-conformistas, i.e., protestantes não-anglicanos. Há muitos exemplos disso, e as peripécias da própria família Blackwell podem perfeitamente servir de ilustração. O patriarca da família, Samuel Blackwell, era um cristão congregacionista, refinador de açúcar em Bristol, que, em 1832, decidiu mudar-se para os EUA com toda a sua família, julgando a situação trabalhista em Bristol perigosa, por causa das sucessivas greves. Estabeleceu uma refinaria em Nova Jersey, que funcionou até 1836, quando foi vítima dum incêndio; a família então mudou-se para Cincinnati, Ohio, em 1838, a fim de reiniciar o negócio, agora utilizando beterrabas (e não cana) para a produção de açúcar; mas, nesse mesmo ano, Samuel faleceria, deixando esposa e nove filhos: Anna Blackwell (1816-1900), Marian Blackwell (1818-1897), Elizabeth Blackwell (1821-1910), Samuel Charles Blackwell (1823-1901), Henry Blackwell (1825-1909), Emily Blackwell (1826-1910), Ellen Blackwell (1828-1901), Howard Blackwell (1830-1866) e George Washington Blackwell (1832-1912), este último nascido nos EUA logo após a chegada da família. Apesar das dificuldades após a morte de Samuel, todos lograram estudar, e todos, de algum modo, conseguiram levar suas vidas. Anna Blackwell seguiu carreira de escritora, de jornalista e de tradutora; retornou à Inglaterra e viveu entre a Inglaterra e a França, sendo, como já citado, uma das poucas inglesas adeptas de Kardec (e que traduziu “O Livro dos Espíritos” para a língua inglesa); Elizabeth tornou-se a primeira mulher a formar-se médica (formou-se em 1849, e depois seguiu à Europa para prosseguir em seus estudos entre 1849-1851); Emily, por sua vez, tornou-se a 3ª mulher a formar-se médica (1854); Samuel Charles foi um abolicionista ativo; e Henry, além de ser um dos fundadores do Partido Republicano, foi ativo defensor do voto feminino. Veja esses exemplos: essa família era inglesa ou americana? Ou era ambas as coisas? Influenciaram os EUA ou a Inglaterra? Ou ambos os países, ao mesmo tempo?

    E esse é apenas um exemplo; o que quero dizer é que havia um fluxo muito intenso tanto de homens quanto de idéias entre a nova república norte-americana, o Canadá britânico e o Reino Unido, tornado possível pelo fato de que boa parte dos migrantes era formada (ao menos no caso dos ingleses e escoceses) por pessoas alfabetizadas e, até certo ponto, qualificadas, constituindo grupos sociais relativamente numerosos mais ou menos semelhantes em termos de nível de escolaridade e de interesses culturais em ambos os lados do Oceano Atlântico – uma “commonwealth anglo-saxã cultural”, muito mais do que uma relação clara “ex-colônia e ex-metrópole”. Claro, não eram todos os migrantes assim, mas um número razoável sem dúvida o era. As grandes ondas migratórias que, posteriormente, seriam dirigidas aos EUA foram um tanto diferentes (embora ingleses e escoceses sempre continuassem a chegar); isso iniciou-se com as sucessivas migrações dos camponeses irlandeses esfaimados (e, pior, católicos…), durante a, e depois da, Grande Fome; e continuou, principalmente após a Guerra da Secessão, com as grandes massas de alemães, de italianos (principalmente do sul…), de judeus orientais do Grande Pálio de Assentamento (no que haviam sido outrora províncias do Reino da Polônia, agora parte do Império Russo), de chineses, de japoneses, até mesmo de “turcos” (i.e., de portadores de passaporte do Império Otomano – na maioria, árabes)… Quando a situação chegou a esse ponto, entre c.1870-c.1900, houve oposição quanto a se admitirem esses “estranhos”. Mas isso é outra história. Afinal, havia dúvidas sérias, e supostamente cientificamente embasadas, acerca do fato de que “latinos” tivessem o mesmo grau de capacidade intelectual dos nórdicos; ou de que “raças asiáticas”, como chineses, japoneses, árabes ou judeus, pudessem se comparar favoravelmente às “raças européias”.

    Assim, fortes influências recíprocas entre EUA, Canadá e Reino Unido, originárias em qualquer dos pólos, por ocasião do surgimento do “new spiritualism”, era algo previsível, porque o relacionamento “de fato” entre esses países (quaisquer que fossem os posicionamentos oficiais) era bem íntimo, e, até certo ponto, igualitário, em termos humanos.

    Quanto ao fato de a leitura constante da Bíblia ser um impedimento à comunicação com os mortos, o que quis dizer é que uma pessoa que, rotineiramente, leia a Bíblia, não pode se sentir encorajada a procurar a comunicação com os mortos, quer por causa das proibições explícitas constantes no Pentateuco, quer pela ausência de exemplos dessa prática (e os poucos exemplos, como o da pitonisa de Endor, são sempre apresentados numa luz francamente desfavorável).

    Isso não quer dizer, claro, que não se encontre um “jeito”. Para tudo há jeito. A partir do instante em que as pessoas começam a ler a Bíblia “livremente”, sem apoiar-se em qualquer estrutura de exegese, ou, pior, sem um conhecimento mínimo acerca das circunstâncias históricas ligadas a seus vários livros (e tendendo a aplicar-lhes uma interpretação literal), as maiores aberrações são possíveis. Josué e a conquista da Terra Santa podem perfeitamente justificar massacres (como os de Cromwell na Irlanda); certas passagens de São Paulo podem justificar a insensatez de qualquer investigação científica, ou racional; e quem quiser “provar” que a Terra é plana (e que tem “quatro cantos”), que se encontra imóvel e firme no Universo, ou que as águas estão divididas entre os mares e “o alto”, etc., haverá de encontrar bom suporte literal na Bíblia. O que creio que ocorreu, no caso específico do “new spiritualism”, foi justamente um desses desvios – afinal, não se estavam, a rigor, “invocando espíritos”, mas as “almas” “baixavam” para dar testemunhos. Pois Deus não havia falado muitas vezes em sonhos? E as pessoas não sonhavam com seus entes queridos que já haviam partido? Por que Deus, obviamente a partir de Sua exclusiva vontade, não poderia permitir que os mortos aparecessem, para exortar os vivos, ou, mesmo, para serem por eles exortados?

    De qualquer modo, essa tendência sempre foi minoritária; o Espírito Santo pretensamente “baixou” em muitos (e muitas) durante o Grande Avivamento, mas apenas uns poucos fizeram isso evoluir para práticas proto-espíritas e, depois, espíritas, porque, apesar de tudo, apesar da enorme liberdade de interpretação que a “leitura individual” da Bíblia proporcionava, as grandes denominações cristãs protestantes conseguiram, no geral, manter algum tipo de “controle” sobre a coisa. Quanto à situação brasileira, creio que é um tanto mais grave, já que o nível cultural mesmo das denominações tradicionais é relativamente baixo; mas, por outro lado, nós brasileiros nunca levamos nenhum tipo de ideologia tão a sério assim, e comumente acendemos várias velas, para Deus, o Diabo e todos os possíveis intermediários – a ignorância tanto pode ser um perigo quanto um antídoto, e, aqui, creio que vale o princípio homeopático, o semelhante cura o semelhante – o veneno é anulado pelo veneno. Espero que seja assim, mesmo…

    Essa é, ao menos, a minha impressão geral sobre o assunto. Muito mais poderia ser discutido e analisado, mas tornaria o tamanho da resposta enorme. Creio que os tópicos aqui citados possam ser de alguma utilidade para futuras investigações. Sds,

    JCFF.

  15. Marcelo Diz:

    OK.

    Obrigado.

  16. Matusalém Diz:

    Caro José Carlos Ferreira, infelizmente pelo meu pouco tempo,não posso esclarecê-lo detalhadamente sobre a cabala. No entanto, convido- o que estudes a história do Semeon Bar Yohai(o mestre do Zohar) , um dos maiores cabalistas da hitória, foi sentenciado à morte pelo imperador romano Trajano. Isto no final do I século. Igualmente como a igreja de Romana fazia com seus hereges.
    Portanto, recomendo que estudes a reencarnação entre os judeus e irás entender melhor. Quanto às religiões reecanacionistas pelo mundo, ora meu caro, fazem parte da grande maioria, observe:
    No ocidente temos:
    • Cientologia
    • Cristianismo primitivo ou apostolar(dezenas de evangelhos gnósticos
    • Espiritismo ou Doutrina Espírita (França, 1857)
    • Igreja Católica Liberal
    • Judaismo (esotérico)
    Orientais
    • Ayyavazhi
    • Budismo (segundo autores não-budistas; ver Renascimento (budismo)[1]
    • Caodaísmo
    • Confucionismo
    • Hinduísmo (Índia, 3000 a.C.)
    • Jainismo
    • Seicho-No-Ie
    • Seita dos essênios
    • Taoísmo
    • Bahaismo
    • Druismo – No Líbano
    Religiões de mistérios
    • Cristianismo Esotérico
    • Rosacrucianismo
    Religiõs antigas na Europa
    • Wicca
    • Druidas
    • Cátaros ( religião e povo destruídos pela ambição da religião católica romana)

    Filosofias Espiritualistas
    Teosofia – Eubiose – Antroposofia, etc..
    Portanto, sem a reencarnação ficaria difícil conciliar a Evolução dos seres em geral com a espiritualidade. Somente com o conhecimento da palingenesia chega-se a um consenso entre o conhecimento científico moderno com a espiritualidade.

    Abraço

  17. Matusalém Diz:

    Retificando,
    onde se lê: fazem parte da grande maioria;

    leia-se: faz parte da grande maioria

  18. Gorducho Diz:

    Não poderia o Sr. JCFF disponibilizar este interessantíssimo trabalho em .pdf para facilitar estudo e arquivamento? Eu por exemplo praticamente ignorava a fase pré-Davis na América; e nunca me ocorrera associar e.g. o Segundo Avivamento com uma fase proto-espiritualism. Parabéns como sempre ao Sr. JCFF. Só que estudar com a merecida profundidade on line fica incomodo (eu acho…).

  19. Vitor Diz:

    Gorducho,
    aí quem tem que fornecer em pdf sou eu. Dessa vez não forneci o pdf porque era só copiar e colar no word o texto e depois com o programa pdf 995 transformar em pdf… geralmente apenas forneço em pdf quando o número da página é importante para referências dentro do próprio texto. Mas vá lá… pode baixar aqui: http://www.4shared.com/office/yZiXn3tz/Origens_do_Espiritismo.html?

  20. Matusalém Diz:

    Queria dizer ao Vitor, que a proposta reencarnacionista espírita, não está “engessada” ou mesmo dogmática. Se com adventos de pesquisadores chegarem a comprovar novas formas de processamento reencarnacionista, os espírita a aceitaram, sem problema algum. Pois o espíritismo é uma ciência filosófica que caminha com a própria evolução da humanidade!

    Queria dizer ao colega JOSÉ CARLOS FERREIRA FERNANDES: Quanto à evolução no conceito reencarnacionistas das doutrinas antigas, é importante se dizer que ; cada conhecimento vem de acordo com o avança intelectual e moral da humanidade. Por isso, na antiguidade existia uma forma insipiente de enteder a nobre lei da Palingenesia.
    Observe abaixo matéria do Judaísmo e suas definições de evolução – mesmo insipiente – de um dos seus mais importantes livros, o Zohar.

    Muitos ficam igualmente surpresos ao descobrir que a reencarnação era uma crença aceita por numerosos das mentes notáveis nas quais se baseia a civilização Ocidental. Embora o Judaísmo, obviamente, não concorde necessariamente com todas suas idéias e filosofias, mesmo assim Platão, por exemplo, (em Meno, Fedo, Timeus, Fedro e a República), partilha a crença na doutrina da reencarnação. Ele parece ter sido influenciado pelas primeiras mentes clássicas gregas, como Pitágoras e Empédocles. No século Dezoito, na Era do Iluminismo e Racionalismo, pensadores como Voltaire (“Afinal, não é mais surpreendente nascer duas vezes que nascer uma vez”) e Benjamim Franklyn expressaram uma afinidade pela noção da reencarnação. No século Dezenove, Schopenhauer escreveu (Parerga e Paralipomena), “Se um asiático me pedisse uma definição de Europa, eu seria forçado a responder-lhe: É aquela parte do mundo que é assombrada pela incrível ilusão de que o presente nascimento da pessoa é sua primeira entrada na vida…” Dostoievski (em Os Irmãos Karamazov) refere-se à idéia, ao passo que Tolstoi parece ter sido categórico em afirmar que tinha vivido antes. Thoreau, Emerson, Walt Whitman, Mark Twain e muitos outros reconheceram e/ou partilharam alguma forma de crença na reencarnação. Deve-se registrar, no entanto, que algumas clássicas autoridades da Torá, mais especificamente, a autoridade do Século Dez, Saadia Gaon, negaram a reencarnação como dogma judaico. Emunot V’Deyot 6:3.

    O Talmud relata que o sábio do segundo século, Rabi Shimon bar Yochai e seu filho Elazar se refugiaram numa caverna para escapar à perseguição romana. Durante os treze anos que se seguiram, eles estudaram noite e dia, sem distração. Segundo a tradição cabalista (Ticunei Zohar 1a) foi durante estes treze anos que ele e seu filho primeiro compuseram os principais ensinamentos do Zohar. OCULTO POR MUITOS séculos, o Zohar foi publicado e disseminado por Rabi Moshe de Leon, no Século Treze.

    Embora o Zohar seja geralmente considerado uma obra de um único volume, compreendendo o Zohar, Tikunei Zohar e Zohar Chadash, na verdade é uma compilação de diversos pequenos tratados ou sub-seções. Segue abaixo apenas alguns deles.

    O Zohar (I 131a): “Rabi Yossi respondeu: ‘Aqueles corpos que não são merecedores e não atingiram seu propósito, serão considerados como não tendo sido… ‘ Rabi Yitschac [discordou e] disse: ‘Para estes corpos o Eterno providenciará outros espíritos, e se forem considerados merecedores, eles obterão uma morada no mundo; caso contrário, eles serão cinzas sob os pés dos justos.’ Cf Zohar II 105b.

    O Zohar III 216a; Ticunei Zohar 6 (22b), 32 (76b) sugerem três ou quatro chances. Ticunei Zohar 69 (103a) sugere que MESMO QUE SEJA FEITO UM PEQUENO PROGRESSO A CADA VEZ, *(observe um conceito evolucionista, mesmo insipiente, devida à época) A ALMA RECEBE MIL OPORTUNIDADES DE REENCARNAÇÃO PARA ATINGIR SUA PLENITUDE. Zohar III 216a sugere que uma pessoa essencialmente justa que passa pela provação de perambular de cidade em cidade, de casa em casa – até para tentar vender pela insistência (Zohar Chadash Ticunim 107a) – é como se ele passasse por muitas reencarnações.

    Depois que a alma deixou o corpo e o corpo permanece sem vida, é proibido deixá-lo insepulto (Moed Katon, 28a; Baba Kama, 82b). Pois um corpo morto que é deixado insepulto por 24 horas causa uma fraqueza nos membros do Chariot e impede que o desígnio de D’us seja cumprido; pois talvez D’us tenha decretado que ele deveria passar pela reencarnação imediatamente, no dia em que morreu, o que seria melhor para ele, mas como o corpo não foi enterrado, a alma não pode ir até a presença do Eterno, nem ser transferida para outro corpo. Pois uma alma não pode entrar num segundo corpo até que o primeiro seja sepultado…” Zohar III 88b.

    Portanto, a Cabala não é construto medieval, emergindo nos sécs. XII-XIII dC, como você disse..
    A disseminação de seu conhecimento é que foi conhecido na europa naqueles tempos..

  21. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Matusalém,

    É usual às seitas (e correntes) “novas”, “modernas”, “heterodoxas”, apresentarem-se (ou melhor, tentarem se apresentar) como antigas (ou como a “restauração” da “antiga e verdadeira” via duma religião, ou filosofia, que teria sido “adulterada”, ou “esquecida”, pelos contemporâneos), a fim de auferir o “prestígio da tradição” e, desse modo, mascarar sua origem recente e a sua potencial “heterodoxia”. Isso tem ocorrido amiúde ao longo da História, é um padrão até bem conhecido; e sempre continuará a ocorrer.

    Por exemplo, ocorreu com uma série de correntes místicas, proto-gnósticas e, depois, gnósticas, entre os séculos I aC e II dC, que faziam remontar suas doutrinas a sábios antiqüíssimos (p.ex., “Hermes Trimegisto”, Zoroastro, mesmo Moisés…). A quantidade de “fakes” que gerou foi algo realmente impressionante, e que apenas recentemente vem sendo conhecida em seus muitos detalhes, a partir dos achados papirológicos.

    Do mesmo modo, a “revolta protestante” do séc. XVI estava, pretensamente, restaurando a Igreja tal qual era na época “dos Apóstolos”, mais especialmente antes do amaldiçoado Constantino haver “criado” a Igreja romana…

    Também os “reencarnacionistas”, principalmente os evolutivos, a partir dos meados do séc. XIX (e passando pelos teosofistas e por todo o mistifório da “New Age”) procuravam (e procuram) ligar suas sandices aos egípcios, aos babilônios, aos “Vedas” (!!!), até mesmo à Atlãntida e à Lemúria… Mas o fato é que (repito) o reencarnaiconismo cíclico evolutivo é um construto europeu ocidental moderno, surgindo na primeira metade do séc. XIX – isso é um fato. E nem saduceus, nem fariseus, nem essênios, nem judeus em geral, nem cristãos primitivos foram “reencarnacionistas” – foram convenientemente pintados como tais, sem nenhuma base histórica, a fim de procurar dar respeitabilidade às NOVAS correntes reencarnacionistas (e espíritas) modernas. Aí vale todo o tipo de mistificação, do “reencarnacionismo” de Orígenes ao pretenso “concílio de Constantinopla”, que o “proibiu”…

    Igualmente, as doutrinas da “Torá Oral” judaica, que acabaram sendo consolidadas nos dois Talmudes (de Jerusalém e da Babilônia), e que se foram gestando progressivamente entre os sécs. III aC e X dC (mais intensamente desde a época dos Hasmoneus, e mais coerentemente desde os finais do séc. I dC), culminando nas grandes academias de Sura e de Pumbedita, na Babilônia, eram mostradas como tendo sido, “desde o início”, ensinadas pelo próprio Moisés, ao lado da “Torá Escrita”.

    O mesmo se diga da multidão de “evangelhos” gnósticos, todos posteriores aos Quatro Evangelhos Canônicos (e, mesmo, ao fechamento do Novo Testamento), mas se fazendo (falsamente) recuar ao próprio Jesus (a evidência literária e, principalmente, papirológica, quanto a isso, é esmagadora – basta pesquisar).

    A única evidência para todas essas (pseudo)-genealogias das “novas correntes” (sejam elas quais forem) são os próprios documentos que as mencionam (assim como a única evidência de “Lêntulo” é a “carta” que o menciona como autor). Quando se analisam essas pretensões de antiguidade à luz da investigação histórica (e também com a ajuda das ciências auxiliares – análise e datação dos manuscritos remanescentes, evidência literária indireta, epigrafia, arqueologia, etc.), tudo isso se desmancha, como um castelo de cartas. Porque, caro sr. Matusalém, não passa disso.

    O misticismo judaico, claro, tem raízes antigas, pelo menos desde as amargas experiências da profanação do Templo por Antíoco IV Epifânio, gerando uma literatura cada vez mais abundante. Mas “misticismo”, em si, não é sinônimo de “Cabala”, muito menos de “reencarnação”. A Cabala, no geral (com o Zohar), e o reencarnacionismo, em particular, É, sim, um construto medieval – não foi algo “oculto por muitos séculos” e apenas “publicado” na Idade Média, surgiu NA PRÓPRIA Idade Média. Ligar as origens da Cabala, ou do Zohar, às “priscas eras”, mesmo ao final do séc. I dC ou ao início do séc. II dC (mais especificamente, à figura do tanaíta rabi Simeon bar-Yochai), é, em termos de evidenciação histórica, algo no mínimo extremamente improvável e altamente problemático, e confundir lendas de origem (que procuravam dar aos novos, revolucionários e, muitas vezes, heterodoxos sistemas místicos cabalistas uma “origem antiga” e, assim, “tradicional” e “respeitável”, A FIM DE OS JUSTIFICAR, ligando-os inclusive a um conhecido e respeitado vulto do período tanaíta) com História efetiva.

    Veja-se, a respeito, p.ex., a cuidadosa pesquisa sobre a origem do Zohar em http://www.talkreason.org/articles/zohar.cfm. Aí há cuidadosa investigação histórica, não mistifórios, fantasias ou “lendas de origem”.

    Basicamente esse mesmo tipo de argumento, caríssimo sr. Matusalém, vale para aqueles itens do “mish-mash” que o sr. elencou como “evidências” que teriam alguma “antiguidade”. Não me leve a mal, caro sr., mas, quanto a isso, praticamente nada lá se aproveita. Sds,

    JCFF.

  22. Matusalém Diz:

    José Carlos F Fernandes, voce disse: “Mas o fato é que (repito) o reencarnaiconismo cíclico evolutivo é um construto europeu ocidental moderno, surgindo na primeira metade do séc. XIX – isso é um fato.”
    Óbvio que sim, já lhe falei que todo o conhecimento vem com o tempo, até mesmo Jesus, em seu tempo, disse que falava por parábolas. Faz-se necessário que os povos cresçam, evoluam, neste caso novos conhecimentos serão adquiridos e também melhormente entendidos!
    Somente digo uma coisa, o conhecimento da espiritualidade sem a reencarnação, não tem sentido, pois sabemos que tudo evolui, nós estamos sempre em evolução!

  23. Matusalém Diz:

    José Carlos Ferreira Fernandes, você disse: Ligar as origens da Cabala, ou do Zohar, às “priscas eras”, mesmo ao final do séc. I dC ou ao início do séc. II dC (mais especificamente, à figura do tanaíta rabi Simeon bar-Yochai), é, em termos de evidenciação histórica, algo no mínimo extremamente improvável e altamente problemático, e confundir lendas de origem (que procuravam dar aos novos, revolucionários e, muitas vezes, heterodoxos sistemas místicos cabalistas uma “origem antiga” e, assim, “tradicional” e “respeitável…
    Eu então lhe pergunto, e a bíblia, o que realmente tem de provável? Quantas lendas e manipulações existem?
    Sabemos que grande parte dos trechos bíblicos não passam de textos manipulados por copistas com interesses variados. Sem falar nas mudanças de traduções, interpretações, muitas delas interesseiras..
    Saiba o senhor que o cristianismo nascente era composto por diversas correntes, muitas delas reencarnacionistas (que o diga Orígenes, um dos pais da igreja e reencarnacionista), no entanto este caso não tinha o interesse de Roma.

  24. Matusalém Diz:

    Para conhecimento:
    OS CÁTAROS: Na idade média, marcada pela violencia e pela sede de poder da igreja Católica Romana, o Catarismo chocou-se frontalmente com o dogmatismo da Igreja. A religião cátara propunha, como aspectos básicos, a Reencarnação do espírito, a concepção da terra como materialização do Mal, por encher a alma de desejos e prende-la às coisas efêmeras do mundo, e do céu como a do Bem, numa concepção dualista do mundo. Mas o principal ponto de discordância, e talvez o mais original, tenha sido a de que os cátaros não admitiam qualquer tipo de intemediação entre o homem e Deus.
    Esta crença chocou-se frontalmente com a religião hegemônica em toda Europa, a base da estrutura social, cultural econômica e religiosa do Feudalismo. Durante muito tempo os cátaros foram relativamente poucos, com o tempo, començou a extender-se pela Occitania, até chegar a um ponto cujo resultado era demasiado incômodo tanto para Roma como para a França.

    Um bastião religioso no centro da Europa não fazia mais que estorvar a cristalização do cristianismo de Roma no continente, e um território não católico era um pretexto ideal da Coroa da França para anexar as terras do Languedoc e expandir-se.
    Por esta razão, e também pela força que assumiu o catarismo, a Igreja Católica fez tudo para combater sua expansão, clasificando o movimento como heresia, em 1209, o infalível Papa Inocêncio II estimulou os fiéis a ir para as cruzadas contra os hereges, com cerca de 20.000 cavaleiros os cruzados massacraram o povo, muitos morreram torturados ou na fogueira, sendo esta a primeira cruzada feita contra cristãos e em território franco. O presente que o santo Papa prometeu em compensação para aqueles que participaram da campanha era a partilha e doação das terras aos barões que as conquistassem, ou seja, converter-se-iam em senhores feudais.
    A Cruzada Albigesa (devido à cidade de Albi), comandadada por Simon de Montfort (1209 – 1224) e pelo Rei Luis VIII (1226-1229) durou 40 anos. A perseguição arrasou a região dos Cátaros, a resistência teve que enfrentar-se com duas forças enormes, o poder militar do Rei de França e o poder espiritual da Igreja Católica.
    Na primeira fase da cruzada, foi destruída a cidades de Béziers (1209), onde 60.000 pessoas morreram. Destruída a cidade, os cruzados marcham para Carcassone, onde Simon de Montfort se apossa dos condados de Trencavel (carcassone, Béziers), conquistando também Alzonne, Franjeaux, Castres, Mirepoix, Pamiera e Albi.
    Em 1216, ouve outra investida contra os cátaros. Simon morre em 1218, acabando também a cruzada, sem, entretanto, extinguir a heresia. Amaury, filho de Montfort, oferece as terras conquistadas por seu pai a Felipe Augusto, rei da França que as recusa, seu filho Luís VIII acabará aceitando as terras.
    Em 1224 Luís VIII liderando os barões do norte, empreendeu uma nova cruzada que durou cerca de três anos alcançando muitas conquistas até chegar a Avignon, onde termina o cerco contra os hereges. O resultado dessa disputa foi um acordo imposto pelo rei da França aos Senhores feudais das áreas conquistadas e conseqüentemente os domínios disputados passariam para a coroa da França (Tratado de Meaux, 1229).
    Militarmente, apesar de terem o apóio de pequenos condados, os cátaros não conseguiram resistir ao genocidio das cruzadas, mas elas não conseguiram erradicar o Catarismo de forma definitiva. Foi a Inquisição, a instituição que realmente conseguiu exterminar definitivamente o catarismo.
    No chamado País Cátaro viviam outras pessoas cuja religião era o catolicismo, Perguntado sobre como distinguir entre os hereges e os outros, o legado papal (inquisidor) respondeu: “Matem-nos a todos. Deus se encarregará dos seus”.

  25. Matusalém Diz:

    Para encerrar,
    José Carlos Ferreira, você disse:” Do mesmo modo, a “revolta protestante” do séc. XVI estava, pretensamente, restaurando a Igreja tal qual era na época “dos Apóstolos”, mais especialmente antes do amaldiçoado Constantino haver “criado” a Igreja romana…”
    Afirmo-te que se não fosse o império romano, o cristianismo conhecido, dogmático, que somente com admitiu 04 evangelhos e dominado por epístolas de Paulo não existiria no ocidente. Possivelmente, religiões européias teriam prosperado e o cristianismo conhecido seria apenas uma seita em vias de extinção!

  26. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Matusalém:

    Os presentes apontamentos referem-se às suas três últimas mensagens.

    Sobre a primeira: então, estamos de acordo acerca do reencarnacionismo cíclico evolutivo. Ótimo. Quanto a “ter que ser assim”, ou ao fato de que “o conhecimento da espiritualidade, sem a reencarnação”, não ter sentido, a discussão sobre tais tópicos foge à evidenciação histórica, e entra em debates de índole filosófico-religiosa. Entendo que é esse o seu posicionamento, o qual respeito, embora discorde dele. De qualquer modo, este não é o fórum apropriado para discutir, especificamente, essas questões. E nem mesmo a “reencarnação” é algo tão antigo assim – repito: na própria Índia, não é algo velho “de 3000 aC”; nada há sobre reencarnação, p.ex., no mais antigo dos Vedas, o Rig Veda; a doutrina surgiu e consolidou-se ao longo da redação dos Upanishads, c. séc. VIII – séc. IV aC (e mesmo além).

    Sobre a sua segunda mensagem, entendo, então, que o sr. pôde verificar as dificuldades de se ligar a composição da Cabala, em geral, e do “Zohar”, especificamente, a uma data tão antiga quanto a dos tanaítas. Muito bem. Sobre a Bíblia, que é um conjunto de livros, não um único livro, escritos e compilados ao longo de séculos, há, sim, uma grande variabilidade em termos da aplicabilidade da “investigação histórica”. Por isso mesmo a exegese bíblica não pode ser literalista, e deve levar em conta uma série de fatores, do conjunto (e contexto) das passagens ao tipo de composição, estilo literário, época, finalidade, público-alvo, etc. Sobre lendas, sim, as há. Sobre manipulações, gostaria que o sr. fosse mais específico. Sobre os “erros de copistas”, esses vêm sendo levados em consideração e corrigidos diante dos melhores manuscritos disponíveis, pelos melhores exegetas, e não é de hoje (que o digam o próprio Orígenes com sua Hêxapla, Luciano de Antióquia, Hesíquio de Alexandria e o próprio Eusébio de Cesaréia – só para citar alguns que viveram entre os meados do séc. III dC e os inícios do séc. IV dC; isso sem falar no próprio São Jerônimo). Sobre manipulações “interesseiras”, gostaria, também, que o sr. fosse mais específico. Sobre pretensas correntes “reencarnacionistas” na Igreja primitiva, eu sugeriria fortemente que o sr. reexaminasse suas evidências históricas, isso não passa de fantasia; e Orígenes não era reencarnacionista, digam o que disserem.

    Sobre a sua terceira mensagem, que versa sobre os cátaros, não vou discutir esse assunto aqui. Mas torná-los simples “mártires”, perseguidos, como se, sob sua influência, também não perseguissem, sinceramente, é uma simplificação abusiva. E suas doutrinas estavam muito mais ligadas a um dualismo gnóstico exacerbado, que considerava a matéria como algo intrinsecamente mau (um posicionamento, diga-se de passagem, totalmente contrário ao ensinamento bíblico) do que a qualquer “reencarnacionismo cíclico”, muito menos evolutivo: segundo eles, não havia “evolução” na matéria, apenas perdição.

    Aguardo, sr. Matusalém, suas evidências de que o Zohar tenha sido composto antes dos sécs. XII-XIII dC (ou mesmo depois). Basta elencar as datas dos mais antigos manuscritos sobreviventes, bem como dos eventuais fragmentos remanescentes; e também elencar todas as citações inequivocamente ligadas ao Zohar e à sua composição por bar-Yochai e seus discípulos, que datem do período entre os sécs. II dC e XII dC. Se, de fato, a datação do Zohar (e da Cabala) é assim tão antiga, é impossível que não se encontrem testemunhos, ainda que poucos. Ou será que o resultado efetivo, histórico, para o período que vai do séc. II dC ao XII dC, em termos de referências, fragmentos, etc., é nulo, e a “coisa” só começa no séc. XIII dC?

    Sds,

    JCFF.

  27. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Matusalém:

    Sobre seu último comentário (que apareceu apenas depois de eu já ter lhe enviado minha resposta anterior), isso não passa de “wishful thinking”, e algo, de qualquer modo, inverificável. Acerca do crescimento e do desenvolvimento do Cristianismo, eu sugeriria que o sr. adquirisse o livro “O Crescimento do Cristianismo – Um Sociólogo Reconsidera a História”, de Rodney Stark. Vale a pena comprá-lo. Duas resenhas:

    http://ciberteologia.paulinas.org.br/ciberteologia/wp-content/uploads/2009/05/01ocrescimentodocristianismo.pdf

    http://www.pucsp.br/rever/resenha/stark01.htm

    Sds,

    JCFF.

  28. Matusalém Diz:

    Jose Carlos, você acredita na evolução do universo, nos bilhões de galáxias existentes, que o planeta terra é o terceiro planeta do sistema solar e que além disso, é um dos menores do sistema? Acreidita que o homem já foi à lua, já enviou sondas a outros planetas? Acredita na evolução dos seres em geral, inclusive da espécie humana? Acredita nas descobertas da genética, na paleontologia, arqueologia? Acredita também nos bilhões de anos da existência desse pequeno nosso planeta? E que o sol é apenas uma estrela de médio porte?
    Abraço

  29. NVF Diz:

    Esses textos do JCFF sobre os bastidores de Allan Kardec são muito interessantes e necessários. Deixo meus parabéns, talvez como uma pequena forma de estimular que continuem sendo publicados aqui.

  30. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Matusalém,

    No contexto deste “blog”, e, mais ainda, especificamente no contexto do que é tratado neste tópico, suas indagações são apenas diversionismo – do mesmo modo que sua citação (cheia de meias-verdades) acerca dos “cátaros”. Voltando ao fio da meada, e atendo-nos ao tema originariamente em debate, volto a solicitar-lhe o especial obséquio de evidenciar a data de composição do Zohar que o sr. defende. Também, a data da assunção, por parte do Hinduísmo, da reencarnação, que o sr. defende (3000 aC). Também, que os judeus da época do Segundo Templo (especialmente fariseus e essênios) eram reencarnacionistas. E que Orígenes era reencarnacionista. Não tenha pressa; reúna as evidências com calma, e depois mande-as para o Vítor, que, tenho certeza, as há de publicar. E eu as hei de ler com redobrado prazer, e analisá-las com todo o detalhe pertinente.

    Só não vale, mais uma vez ouso lembrar-lhe, caro sr. Matusalém, alegar que essa coisas eram ensinadas “ocultamente” a conventículos de “iniciados” durante séculos, e só depois foram “publicadas”…

    Leve o tempo que quiser – se necessário, tanto tempo quanto o da vida de seu macróbio orago, o patriarca bíblico. Com as minhas mais cordiais saudações,

    JCFF.

  31. Matusalém Diz:

    Por favor, reitero que tu me respondas, se possível for:

    Jose Carlos,
    Acreditas na evolução do universo, nos bilhões de galáxias existentes, que o planeta terra é um pequeno planeta, terceiro do sistema solar e que além disso, é um dos menores do sistema?
    Acreditas que o homem já foi à lua, já enviou sondas a outros planetas?
    Acreditas na evolução de todos seres em geral, inclusive na evolução da espécie humana, como seus ancestrais os homo neanderthalensis e Sapiens Sapiens?
    Acreditas nas descobertas da engenharia genética, na paleontologia, arqueologia, biologia, astrofísica?
    Acreditas nos bilhões de anos da formação do Universo conhecido?

  32. Vitor Diz:

    Matusalém, respondo por mim: eu não acredito nessas coisas, eu concluo que elas aconteceram e acontecem. Concluir é muito diferente de acreditar. E muito melhor…

  33. Matusalém Diz:

    Para reflexão:
    O Rabino Yossef Benzecry da Sinagoga Beit Chabad, do Recife, confirma a crença na vida após a morte:

    O Judaísmo não crê que a vida acabe com a morte. Pelo contrário, a morte, dentro da concepção judaica, é uma continuação desta Vida, se bem que num plano diferente: o plano da alma. Conseqüentemente, a morte conduz, necessariamente, à vida da alma. Segundo a doutrina judaica, é muito difícil fazer-se uma idéia de como é a Vida no Além-túmulo, por ser algo que ultrapassa todas as concepções do cérebro humano. Vivendo esta Vida, presos no solo do mundo, não temos qualquer oportunidade de imaginar o que se passa na outra, tornando-se muito difícil conceber algo que nunca provamos. Exemplificando, seria a mesma coisa que tentar explicar a alguém o gosto de uma fruta desconhecida. Para tanto, ter-se-ia de usar artifícios de linguagem, como comparações com algo que se aproxime rio sabor da fruta, o que se tornaria complexo e difícil.
    Passagens da Bíblia que as outras religiões deturpam para esconder a Reencarnação:

    Salmo 19:8, em Hebraico transliterado: “Torát Iavéh temimáh mshibat nefésh. ‘edut Iavéh neemanoáh machkimat péti”.

    Tradução: “O ensinamento de Deus é perfeito, faz o espírito voltar. O testemunho de Deus é verdadeiro, transforma o simples em sábio.”

    No entanto, a tradução feita pelas seguintes bíblias alteram o sentido original da reencarnação:
    – Bíblia Protestante da SBB (Sociedade Bíblica do Brasil): “A Lei do Senhor é perfeita, e refrigera a alma.”
    – Bíblia Mensagem de Deus (Edições Loyola): “A lei do Senhor é sem defeito, ela conforta a alma.”
    – Bíblia de Jerusalém (Edições Paulinas): “A lei de Iahvéh é perfeita, faz a vida voltar.”

  34. Matusalém Diz:

    Eu coloquei Vitor o verbo acreditar, pois nao fui eu quem projetou, pesquisou, analisou, trabalhou, esteve presente nesses intentos científicos, entendeste?

  35. Vitor Diz:

    Matusalém,
    mas não é preciso ter estado presente nesses intentos científicos para sair do “acreditar” e entrar no “saber”.

  36. Marcos Arduin Diz:

    “01. Céticos como Carl Sagan e Sam Harris reconheceram o valor das pesquisas de Stevenson.”
    – Reconheceram em qual sentido? Eventualmente dizer que seguiu alguma metodologia científica ou que casos por ele listados eram complicados demais para explicações fáceis é uma coisa, mas dizer que chegaram às mesmas conclusões é muito outra.
    .
    “02. Caso que detona a ideia de que o espírito se liga na concepção: http://obraspsicografadas.org/2012/ruprecht-schulz-estranho-caso-de-reencarnao-que-legitima-o-suicdio-e-o-aborto/
    – Também há outra possibilidade: o espírito do suicida pode ter se aproximado do schultz e o influenciado.
    .
    “03. A refutação à ideia do karma baseia-se no fato de os ferimentos que o agressor inflige na vítima são reproduzidos na vida seguinte na própria vítima, e não no agressor, como seria esperado pelo espiritismo kardecista.”
    – Quem disse que o Espiritismo espera necessariamente isso? Nunca ouviu falar em somatização? É quando pessoas, por razões de traumas psicológicos, fazem produzir em seus corpos sintomas de doenças que não têm.
    Com os espíritos é semelhante a coisa. Há alguns romances da Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho que relata situações em que espíritos, por manterem-se em ódio e ressentimento, conservam em seus perispíritos as marcas dos ferimentos dos quais morreram. Quando perdoam de fato, esses ferimentos desaparecem. Então o caso das vítimas com marcas, seriam situações assim: o dano no perispírito repercutiu na formação do corpo físico.
    .
    “04. Os casos de pessoas que lembram a vida de animais incluem lembranças de outra vida como humano, esta sim, verificada. Ou seja, se essa vida como humano realmente existiu, então isso ajuda a pensar que a vida [intermediária] como animal também seja verídica, e não fruto de fantasia. É claro que aqui não existem evidências fortes [ainda], mas mostra que o espiritismo kardecismo é fruto de puro dogma, descartando ideias como a metempsicose de forma muito rápida.”
    – Onde foi mesmo que Stevenson fez suas pesquisas? Foi na Índia? Sim, pois da mesma forma que Home teve a honra de encontrar várias Marias Stuarts, Marias Antonietas, Henriques VIII, Júlios Césares e outros tantos reis, fantasias eu diria que são frutos da vaidade e orgulho típicos dos britânicos daquela época, imagino que na Índia, talvez por baixa estima ou por falsa humildade, alguém se recordasse de ter sido algum animal. E que animal foi esse? Seria alguma vaca ou boi? Ah! Entendo: foi um animal sagrado…

  37. Marcos Arduin Diz:

    “A questão histórica é que Kardec impôs o reencarnacionismo cíclico evolutivo como um DOGMA – uma “revelação”, uma “verdade” obtida junto aos espíritos, e que não foi, nunca, por parte dos kardecistas (a começar pelo próprio Kardec) objeto de estudo, mas sim um princípio doutrinário.”
    – Sabe, Zé, o Kardec talvez fosse um bom intelectual no sentido de saber juntar dois mais dois. Não era segredo em sua época de que era observável o progresso científico e (não tanto, mas factual) progresso moral da humanidade ou ao menos de considerável parte dela. Se cada nascido era uma alma nova em folha, então o progresso humano só era devido à educação apenas, já que o nascido não trazia qualquer herança de vida anterior. Mas AO LONGO DO TEMPO, Kardec compilou situações onde observou que crianças ou adultos traziam alguma bagagem que não seria fruto do meio em que se educaram. Foi daí então que surgiu o tal “reencarnacionismo cíclico-evolutivo”.
    .
    Quanto à sua “imposição dogmática”, você esperava o que? Vendo que a coisa encerrava um princípio lógico em si mesma, então porquê ficar jogando com as possibilidades? Até onde iria o Cristianismo se os cristãos ficassem dizendo: _ Deus existe e é Deus… Mas Júpiter pode existir também e também ser Deus…
    .
    ““Reenvarnação”, para os espíritas kardecistas, não é algo que se discute, é algo que se aceita como parte do “pacote”, com as justificativas de que “os espíritos assim ensinaram” (o que é historicamente falso, a maioria não o ensinou até à época do próprio Kardec), e de que a coisa é “lógica” (o que, tendo em vista o suposto caráter “científico” do Espiritismo, não tem peso algum).”
    – Mas Zé, o que é científico no Espiritismo são as experimentações mediúnicas. O Espiritismo também é Filosofia e nesta nem sempre pode haver uma demonstração científica. Quando isso acontece, ou comprova-se a filosofia ou ela dança diante do fato científico.

    “Assim sendo, fora de qualquer discussão, a reencarnação (e quando dizem “reencarnação” os kardecistas querem dizer “reencarnacionismo cíclico evolutivo”) é um dogma. Pode estar “certo” ou “errado”, pode ser “lógico” ou “ilógico”, mas não se constituiu, nunca, na escola kardecista, num item a ser estudado; ou numa hipótese de trabalho que, revelada por ALGUNS espíritos, deveria também ser testada. E isso desde o início: foi imposto como um princípio a ser aceito.”
    – Exatamente, pois faltava ao Kardec os elementos para se testar da dita cuja. Mas o tempo foi passando e alguns casos puderam ser encontrados e verificados de alguma forma.

    “E o que quero deixar claro é que Kardec não tinha nenhuma base empírica para agasalhar esse princípio; mesmo que seja fato que os espíritos que ele consultou lhe tenham mostrado isso, deve-se levar em conta que sua base de pesquisa era muitíssimo estreita, ainda, nos meados da década de 1850. Porque ele estava consultando alguns espíritos que se manifestavam a partir de médiuns (principalmente do sexo feminino, e principalmente adolescentes) dum círculo bem específico de Paris, um círculo, e um meio, em que idéias reencarnacionistas evolutivas já estavam há muito presentes. Na própria França, havia espíritos que não ensinavam, em absoluto, o reencarnacionismo (p.ex., os da escola de Piérart), isso sem falar na enorme quantidade de espíritos que haviam se manifestado, até então, nos EUA e na Inglaterra. A única justificativa para se levar mais em conta o que os espíritos do “círculo de Kardec” revelavam, em oposição a praticamente todos os outros espíritos, é que os tais espíritos dos “mais de dez médiuns” (quem eram esses médiuns, afinal, e quantos eram? Que credenciais tinham?) fossem, de algum modo, “especiais”. Ora, isso é algo para se provar, não para se supor… E o que Kardec, consciente ou inconscientemente, fez, foi justamente isso: algo como “os meus espíritos são melhores que os espíritos dos outros”… Mas, por quê seriam?”
    – Não vejo o que uma coisa tem a ver com outra. Nenhum espírito tem credencial que o abone que não seja a consistência, lógica e verdade eventualmente verificável do que afirma. Por que digo que Ramatis é um pseudossábio? Porque disse até coisas sensatas, mas falou um monte de baboseiras que se confirmaram falsas. Então não é um espírito confiável.
    Então Kardec POR ACASO manteve-se junto a um grupo que contatava espíritos reencarnacionistas e ele gostou da ideia. E pelo jeito, outros gostaram também, pois como você mesmo salientou, a escola de Kardec prevaleceu na França sobre as outras escolas reencarnacionistas.

    “Portanto, o reencarnacionismo, na época do lançamento d’ “O Livro dos Espíritos”, era, em termos do Espiritismo visto como um todo, um tema no mínimo controverso; deveria ser tratado não como um dogma, ou um princípio doutrinário, mas como uma área para posteriores pesquisas – se o posicionamento de Kardec fosse, de fato, científico.”
    – Repetindo: até onde vai uma ideia se não damos a ela nenhuma ênfase de solidez? Por que Kardec deveria adotar tal procedimento se achou que a proposta reencarnacionista que lhe foi feita era lógica e razoável? E quem não gostou dela apresentou-lhe argumentos contrários bem embasados, lógicos e consistentes?

    “Se os argumentos dos espíritas da corrente anglo-saxã são ou não “infantis” (eu não os acho tão infantis assim, mas… isso vai da cabeça de cada um), isso não importa; o que importa, creio, para os espíritas, é se o reencarnacionismo é ou não é verdadeiro, é ou não é algo que, efetivamente, ocorre aos espíritos ao longo de sua “jornada”; e isso somente pode ser respondido, na medida em que uma questão desse quilate pode vir a sê-lo, através do testemunho dos próprios espíritos. E, na época em que Kardec lançou a primeira edição de “O Livro dos Espíritos”, e começou a publicar a sua “Revista Espírita” (1857-1858), o reencarnacionismo não era ensinado pela maioria dos testemunhos dos “espíritos”, quer nos EUA, quer na Inglaterra; e, mesmo na França, somente com Kardec e seus “mais de dez” médiuns (de novo: quantos? Quais? Quem? Com que credenciais? Eram ou não sugestionáveis?) o ensinaram. Conveniente, não?”
    – Bem, tal reencarnacionismo deu certo. ELE FAZ SENTIDO. Já os outros sistemas reencarnacionistas, que sentido fazem dentro da evolução humana?

    “Não lhe parece que alçar não apenas o reencarnacionismo, mas um “reencarnacionismo cíclico evolutivo”, à condição de dogma (porque foi, e é, um dogma…) foi algo, no mínimo, prematuro por parte de Kardec? Por que tanta pressa? Por que “O Livro dos Espíritos” foi executado “a toque de caixa”, com o testemunho de tão poucos médiuns, e apenas médiuns duma região e duma tendência específica, e não levou em conta o que a maioria das manifestações dos espíritos, NO MUNDO, ensinavam?”
    – Como já disse, aquele reencarnacionismo faz sentido dentro da condição da humanidade. Ele explica o seu progresso e dá um horizonte moral para as dores, sofrimentos, injustiças, etc e tal. Coisa que a fé cristã não dá e o não reencarnacionismo das escolas espiritualistas também não.

    “A principal oposição da corrente anglo-saxã não foi à reencarnação em si, mas ao reencarnacionismo colocado como dogma, algo indiscutível – e, para os Kardecistas, é um dogma, e é indiscutível, fale o sr. o que quiser. Tanto que, diante dos fatos inquestionáveis (de que Kardec o impôs em seu sistema, sem discussão, e sem uma adequada base empírica – somente se fiando EM SEUS MÉDIUNS, i.e., nalguns médiuns, sobre os quais ele tinha controle, nalgum grau que fosse), normalmente os kardecistas apelam para a “lógica” e a “justiça” do reencarnacionismo cíclico evolutivo. De novo: não é uma questão de lógica, se o Espiritismo é “a doutrina comunicada pelos Espíritos”; é uma questão de “ser verdadeiro”. E fica aqui a pergunta: quem estava mentindo (porque alguém estava…), os espíritos “anglo-saxões” (e os espíritos franceses de Piérart) ou os espíritos consultados pelos “mais de dez médiuns” (quantos? Quais? Quem? Etc…) de Kardec? Qual dos grupos tem mais valor, e por quê? Não adianta simplesmente falar em “lógica”, porque, se o problema é de índole lógica, não há necessidade alguma de se evocarem espíritos. Pois, se o que eles revelarem estiver de acordo com a nossa “lógica”, aceitamos, e, se não, rejeitamos. Portanto, a evocação de “espíritos” torna-se totalmente dispensável. Nesse ponto, eu tomo o espiritismo da escola anglo-saxã, o “new spiritualism”, como eles o denominavam (e como seus remanescentes ainda o denominam) como muito mais honesto, muito mais autêntico, e, mesmo, muito mais lógico, ao fim das contas, do que o “spiritisme” de Kardec – porque eles, sim, levaram em conta, ou procuraram levar em conta, o que os “espíritos” revelavam. Além da possibilidade da comunicação sensorial entre vivos e mortos, a partir da vontade de pelo menos uma das partes, e através de pessoas dotadas de dons especiais para tanto (i.e., além da definição original de “espiritismo”), não impuseram nenhum dogma, não forçaram nada, deixaram o “Além” se revelar. Sinceramente, se eu tivesse que ser “espírita”, não seria um “kardecista”. É isso. Sds,”
    – Você é muito repetitivo, sabia? Em todos os parágrafos sempre repetiu a mesma coisa sobre dogma como se pela repetição quisesse me convencer do dislate de Kardec.
    Zé, os espíritos SÃO APENAS HUMANOS SEM CORPO FÍSICO. E Kardec já tinha visto isso logo no início. Ficar sem o corpo físico não conferia ao espírito suprema sabedoria, nem suprema moralidade. Assim então não é de se estranhar que em sociedades onde a reencarnação é uma ideia pouco conhecida, os espírito pouco falassem dela, ou a desconhecessem ou mesmo a repudiassem. O que você esperaria se o Espiritismo houvesse começado na Índia ou China, onde a ideia reencarnacionista é mais comum?
    E tem mais uma coisa: você faz acusações a Kardec e por acaso acha que os médiuns anglossaxônicos não tinham seus próprios preconceitos? Eram eles santos que recebiam as comunicações e as aceitavam numa boa? Já não falei aqui que Edgar Cayce, médium americano, repudiava a reencarnação e ficava estarrecido quando seus consulentes lhe diziam que ele falara que haviam sido tal e qual tipos de pessoas em vidas passadas?
    Bem, Zé, você pode saber muita coisa, mas nessas questões espirituais, médiuns, espiritismos, etc e tal, o buraco é bem mais embaixo.

  38. Antonio G. - POA Diz:

    Vitor escreveu: “Concluir é muito diferente de acreditar”. Simples, assaz óbvio. Mas é uma expressão perfeita. Vale um pouco de reflexão.
    A convicção fruto de uma conclusão é muito mais sólida do que uma crença baseada em um dogma. Mudar de opinião sobre uma conclusão é fato raro. Renunciar a uma crença, acontece todo dia.
    .
    Sds.

  39. NVF Diz:

    Também é digno mudar de opinião sobre uma conclusão. Mudar as conclusões diante de fatos novos também é raro, diante do orgulho intelectual.

  40. Matusalém Diz:

    Realmente Vitor, o termo mais correto seria a conclusão, pois isto quer dizer algo definitivo, provado,estudado metodicamente.
    Já com a crença, esta sim, a qualquer momento poderia ser modificada, isto é , depende, se essa crença não estiver maculada pelo princípio da fé “cega”, fanática, como muitos ainda costumam ter!

    PS. nunca vi um verdadeiro cientista não mudar de conclusão com o surgimento de fatos novos!

  41. Matusalém Diz:

    Para encerrar minha explanação nestas questões, sinceramente falando discordo amplamente de que KARDEC foi DOGMÁTICO. Envio-lhe uma frase dele, que cai por terra qualquer dúvida quanto a isto! Observem:
    “O ESPIRITISMO CAMINHANDO COM O PROGRESSO, NÃO SERÁ JAMAIS ULTRAPASSADO, PORQUE, SE NOVAS DESCOBERTAS LHE DEMONSTRAREM QUE ESTÁ EM ERRO SOBRE UM PONTO, MODIFICAR-SE-Á SOBRE ESSE PONTO, SE UMA NOVA VERDADE SE REVELA, ELE A ACEITARÁ.” (KARDEC)

  42. Gorducho Diz:

    (…) sinceramente falando discordo amplamente de que KARDEC foi DOGMÁTICO.
    Listo de memória alguns dos dogmas. Note o Sr. que nenhum desses tem a ver com uma eventual existência de “espíritos” – i.e., algum tipo de entidade imaterial e individual que se conserve após a morte dos terráqueos (e de outros mundos, claro, não valerá se isso houver só para a Terra). São só dogmas.
    —————————————————————<br/.
    Dogma i) Existência do Deus dos Escolásticos [LE, 1 a 16].
    Dogma ii) Reencarnação Romântica (Socialismo Utópico).
    Dogma iii) “Lei” do “Progresso” das almas e da humanidade em geral (Romantismo + Socialismo Utópico).
    Dogma iv) Código Penal dos defuntos (não sei a origem desse dogma).
    Dogma v) Fluídos (dogma do Mesmerism porém adotado pelos Espíritas).
    E por aí irá se se quiser ir pensando…

  43. Marcelo Esteves Diz:

    Parabéns, José Carlos, por mais um texto brilhante.
    .
    Saudações

  44. Matusalém Diz:

    Ô gorducho, dogmas não se mudam, e esta não é a proposta de Allan Kardec. Entendeste?

  45. Gorducho Diz:

    Ô gorducho, dogmas não se mudam, e esta não é a proposta de Allan Kardec. Entendeste?
    Sim, entendi. Utilizando a definição “espiritismo” absolutamente sensata do Kardec [LE, Introdução I] – aproveitando o termo Americano porém sem uso em França, o que me parece legítimo –, o Sr. tem razão. Relembrando: Quem quer que acredite haver em si alguma coisa mais do que matéria, é espiritualista. Não se segue daí, porém, que creia na existência dos Espíritos ou em suas comunicações com o mundo visível. Em vez das palavras espiritual, espiritualismo, empregamos, para indicar a crença a que vimos de referir-nos, os termos espirita e espiritismo (…)
    Então espiritismo é a crença na sobrevivência de alguma individualidade após a morte de todos ou alguns seres terráqueos, e a possibilidade dessas individualidades se comunicarem com os terráqueos.
    A meu ver uma definição incontrovertível. Ocorre que o próprio Kardec rapidamente se encarregou de desvirtuar a definição original, “viajando” metafisicamente e elaborando uma “Doutrina Espírita”, com os dogmas em tela, e talvez outros que agora não lembro… Ainda, note que, de repente e não se sabe de donde, até Jesus Cristo apareceu na história (!!). Então, sim, baseando-nos nas “declarações de propósito”, e na definição original do Kardec, concordo inteiramente com o Sr. Porém, na implementação prática, não vejo uma eventual existência da “DE”, no sentido utilizado na prática pela maioria dos adeptos e particularmente a FEB ; sem algum desses dogmas.

  46. Antonio G. - POA Diz:

    Jesus Cristo “apareceu” no LE por uma razão muito simples: Allan Kardec (HLDR) era católico (alguns biógrafos dizem que era protestante, por ter sido educado na Suíça). De qualquer forma, era cristão. Nada mais óbvio do que Jesus ter seu lugar reservado na DE como “special guest star”…

  47. Marcos Arduin Diz:

    Ei, Balofo
    Há algum problema com os EVENTUAIS DOGMAS na DE? Kardec já dizia desde o começo que não eram coisas intocáveis, como costumam ser dos dogmas da fé cristã… O que importa se algo é dogma? Importa apenas se é útil ou inútil, se nos dá alguma razão para sermos bons ou maus, etc e tal… Dogmas existem até na Ciência, sacou? Então não vejo nenhuma catástrofe alguém por aqui haver “descoberto” que há dogmas na DE…
    .
    Seu Antônio Gê da Aeronáutica de Poá o lance com o tal Jesus é o seguinte: ele foi um pária social, desconhecido, condenado como criminoso, mas que deixou um conjunto de ensinamentos morais os quais Kardec viu serem o melhor que se podia achar no mercado. Nem havia sentido plagiá-lo e elaborar o seu próprio. Já que havia algo tão bom disponível, ele o usou para mostrar as consequências morais que derivavam da Doutrina Espírita. Simples assim e nada a ver com qualquer suposta religião cristã que ele professasse nos tempos de juventude.

  48. Antonio G. - POA Diz:

    Aeronáutica de Poá é muito bom…
    Seu Arduin, deve ser porque eu sou meio leso, mas não consegui entender exatamente em que ponto discordamos. Eu disse que AK era cristão e que reservou um lugar de destaque para o Cristo na doutrina que ele “fundou”. Você acha que não foi assim? O que é que não foi assim? Ele não era cristão? Ou você acha que o fato de ele ser cristão não tem nada a ver com a presença do Cristo na DE?

  49. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Caro sr. Arduin:

    Eu pensei que tivesse sido suficientemente claro em meus argumentos, mas parece que deve ter faltado alguma coisa; procurarei, então, ser mais claro agora. Porque, a meu ver, há em nossa troca de comentários uma confusão entre “lógica”, “verdade” e “demonstração” (ou plausibilidade) científica.

    Uma doutrina pode ser “lógica”, até mesmo mais “consoladora” do que outras, e até mesmo mais seguida (i.e., esposada por mais pessoas) do que outras, e nada disso, quer isolada, quer cumulativamente, a faz “verdadeira”: a) quanto a ser mais “lógica” ou não, isso depende muito duma série de circunstâncias, inclusive do grau de profundidade a que se queira levar uma análise – coisas que parecem à primeira vista “mais lógicas”, quando analisadas em maior detalhe, podem apresentar problemas que inicialmente não tinham sido vislumbrados; e, mesmo que não venha a ser esse o caso, isso não prova, necessariamente, que a doutrina em questão seja “verdadeira”; b) o mesmo se pode dizer acerca do “potencial de consolo” duma doutrina – pessoas diferentes (e civilizações diferentes, e épocas diferentes) podem ter visões, ou necessidades, bem distintas em termos de “consolo”; e, mesmo que se possa chegar a algum tipo de “absoluto”, ou de “consenso”, nessa questão (algo que eu, pessoalmente, considero extremamente problemático), isso também não provaria, necessariamente, que a doutrina “mais consoladora” fosse a “verdadeira”; enfim, c) uma doutrina, ou corrente ideológico-religiosa, pode ser seguida por multidões, e isso (creio que aqui podemos concordar facilmente…) não a faz, necessariamente, “verdadeira”, em comparação, p.ex., com uma outra com pouquíssimos seguidores. Quero crer, p.ex., que a Igreja Universal do Reino de Deus tenha muito mais seguidores, no Brasil (e seguidores entusiastas, praticantes, não apenas simpatizantes) do que o Espiritismo Kardecista, mas isso não significa (apenas baseado nisso) que aquela seja “mais verdadeira” do que este – ou que qualquer um desses posicionamentos, ou mesmo qualquer outro posicionamento religioso, com mais ou com menos “adeptos”, seja, por isso mesmo, “mais” ou “menos” distante da “Verdade” (e o sr. pode mudar os sujeitos desse exemplo à vontade). Mesmo porque graus de adesão variam ao longo do tempo, e podem ter causas bastante prosaicas, p.ex., a moda, ou uma catástrofe específica…

    Creio, sr. Arduin, que, ao menos até este ponto, podemos concordar.

    Supondo, agora, que existam espíritos, e que eles sobrevivem à morte física, mantendo inclusive sua individualidade (penso que concordamos, ao menos em linhas gerais, quanto a isso), “algo” lhes acontece no “Além”. Há inumerabilíssimas opções, que vêm sendo apresentadas ao longo dos séculos; tomando apenas umas três: podem reencarnar; ou então sofrer um juízo individual, esperando pelo Juízo Final, quando ressuscitarão em carne, recompondo-se assim os indivíduos originais, no “Céu” ou no “Inferno”; podem passar para “outras dimensões” (não me refiro a outros mundos neste Universo, nem necessariamente a “outros Universos” físicos, mas a outras “realidades metafísicas”, em planos distintos, e totalmente apartados, deste nosso mundo espaço-temporal… legal, não?). De qualquer modo, ALGUMA COISA acontece (de novo, supondo-se que existam espíritos, que eles sobrevivam à morte física, e que eles mantenham, cada um deles, uma individualidade).

    Creio que, até aqui, ainda podemos concordar.

    Pois bem: indo um pouco além, podemos supor que, além de sobreviverem à morte física, e de manterem sua personalidade, os espíritos: a) mantêm o seu grau de inteligência; e b) podem perceber o que lhes aconteceu (mesmo que não imediatamente, e mesmo que alguns possam até demorar um pouco mais para isso do que outros), ainda mais pelo fato de (além de conservarem sua individualidade e inteligência) já não mais estarem eles, os espíritos, amarrados pelas limitações da matéria. Encontram-se quer “diante do tribunal de Deus”, quer “na erraticidade”, quer “na transposição para outras dimensões”; o que seja; mas disso (qualquer que seja a “verdade”) acabarão tendo consciência. Ou seja, terão consciência de como as coisas, de fato, são no Além (e, se de fato há reencarnação, lembrar-se-ão de suas vidas passadas, e de tudo de bom e de mau que porventura fizeram, etc.). Creio, caríssimo sr. Arduin, que, ao menos em linhas gerais, podemos chegar juntos até aqui.

    O que quero dizer com tudo isso é que não apenas há uma “verdade” (o “algo” que, EFETIVAMENTE, acontece aos espíritos – supondo que eles existam, e que sobrevivam à morte física, e que mantenham a sua personalidade…), mas também que os espíritos ao fim tomarão consciência dela ao partirem de seus corpos físicos. Mesmo que (no caso de se reencarnarem) venham a “esquecer” disso ao longo de suas vidas mortais na matéria, enquanto lá estão, na Ultratumba, no Além, no Hades, nos Campos Elíseos, no Limbo, no Inefável Incorpóreo, etc., terão, ao fim, consciência do que lhes ocorreu, e mais, saberão qual é, afinal, “a Verdade”.

    É claro que pode-se admitir, em termos estritamente operacionais, que, num dado instante do tempo, haverá espíritos mais “conscientes” e espíritos menos “conscientes’, tendo em vista seu grau de discernimento, e mesmo de inteligência. Isso pode-se supor, com ou sem “reencarnação” e “evolução”. Do mesmo modo que há homens e homens, haverá, também, espíritos e espíritos. Mas tal constatação, ou hipótese, não enfraquece o que anteriormente se estabeleceu – que os espíritos, no Além, qualquer que seja seu “estado”, acabarão sabendo o que lhes ocorreu, e acabarão vislumbrando a “Verdade”, qualquer que seja ela.

    Agora suponha, sr. Arduin, que esses espíritos possam, de fato, se comunicar com os vivos, a partir de suas vontades, e mediante certas pessoas extraordinárias, os tais dos “médiuns” (ad argumentandum tantum!!!). Quanto a isso, dois dilemas podem ser, ao menos didaticamente, considerados:

    A) A capacidade de comunicação aumenta com o grau de discernimento e de inteligência dos espíritos, ou então independe disso;

    B) Os espíritos com maior discernimento possuem algum poder para controlar, ou mesmo para impedir, a comunicação dos espíritos mais “brutos” (que, muito provavelmente, poderiam passar noções “erradas” do Além, quer por ignorância, quer por simples malícia); ou então não têm tal poder; ou então o têm, mas não querem fazê-lo, já que competiria aos seres humanos aplicar seu próprio discernimento.

    Quanto a isso, parece haver um consenso razoável no meio espírita de que espíritos de vários “graus de discernimento” podem se comunicar, e, de fato, se comunicam – testemunha disso é a própria “tábua classificadora” de espíritos que consta n’ “O Livro dos Espíritos” de Kardec, e que foi inclusive associada a uma pretensa classificação druídica semelhante na edição de abril de 1858 da “Revista Espírita”. Ou seja, os espíritos de “maior discernimento”, diga-se, os “espíritos superiores”, ou não têm poder para impedir (ao menos, para impedir totalmente) a manifestação de espíritos mais “levianos”, “inferiores”, “zombeteiros” ou mesmo “despeitados”; ou então não estão muito interessados em fazê-lo. Eis as regras do jogo.

    Diante dessa (se me é permitida tal expressão) “democracia ectoplasmática”, abrem-se tanto potencialidades quanto dificuldades. Dentre estas últimas encontra-se, claro, o problema de como julgar as mensagens, de como identificar aquelas que seriam “certas”, ou ao menos “úteis”, daquelas que seriam “enganosas”, mesmo “mentirosas”. Como é sabido, Kardec elenca alguns critérios para tal tipo de filtragem das comunicações da Ultratumba: o da linguagem digna e nobre, o da lógica e do bom senso, e o do consenso das comunicações dos espíritos.

    Todos esses critérios são, em si, interessantes, mas (e, mais uma vez, creio que podemos nos entender quanto a isso, caríssimo sr. Arduin) são de aplicação operacional no mínimo complicada (eu iria mesmo além, e diria simplesmente inviável). Linguagem digna e nobre pode ser forjada por espíritos zombeteiros ou “inferiores” – trata-se dum critério muitíssimo fraco; quanto à “lógica” e ao “bom senso”, são critérios por demais genéricos (afinal, “lógica” de quem? “Bom senso” de quem? Quem iria julgar, quem iria aplicar tais critérios? Kardec? Mas por que não Howitt, ou Aksakov, ou Piérart? Isso para não falar em Podmore, ou em Bertrand, ou em Leymarie, ou em Pappus, ou em Blavatsky, ou em Fodor… e por aí vai… Em quê, exatamente, todos esses nomes são “inferiores” uns aos outros, ou “preferíveis” uns aos outros? E, dependendo do juiz, a sentença proferida seria fatalmente diferente, não só em detalhes, mas mesmo em pontos importantes – Kardec, Aksakov, Podmore e Blavatsky, quase certamente, dariam quatro “sentenças” muitas vezes profundamente diferentes, e divergentes, quando aplicassem a uma mesma pretensa revelação mediúnica os critérios de “lógica” e de “bom senso”…).

    Assim, por eliminação, o único critério com alguma possibilidade real de aplicação seria, justamente, o do consenso das comunicações, mas mesmo esse é problemático, já que, implicitamente, favoreceria a maioria (“vox spiritorum, vox veritatis”…); mas desde quando a “maioria” está sempre “certa”? E, se a maioria dos espíritos que se comunicam tendem a ter algum tipo de falta de discernimento (e é perfeitamente razoável pensar-se que o número de “inferiores”, num determinado instante de tempo, supere, e em muito, o dos “superiores”), então o “consenso” tenderia a ser justamente o consenso dos piores… A não ser, claro, que, por algum motivo, os “superiores” pudessem se impor numericamente, impedindo ou restringindo as manifestações de seus confrades ectoplásmicos menos dotados… Mas não é isso que ocorre – todos podem falar! Tanto que há uma “escala” de classificação dos espíritos!

    Por conseguinte, o fato de a esmagadora maioria das manifestações espíritas nos EUA e na Inglaterra (dos espíritos anglo-saxões) ser de índole não-reencarnacionista, e mesmo, muitas vezes, anti-reencarnacinista, poderia tanto se dever ao fato de que foram efetuadas por espíritos “inferiores” ou zombeteiros (ponto para Kardec), ou então poderia dar-se justamente o contrário: o fato de a esmagadora maioria das manifestações reencarnacionistas, e reencarnacionistas cíclicas evolutivas, centrarem-se no minúsculo “grupo de Kardec”, no seu conventículo parisiense de médiuns adolescentes mesmerizadas sabe Deus como, é que poderia se dever ao fato de terem sido obtidas por espíritos “inferiores” (ponto para o “New Spiritualism”) – e acabaram se impondo nas comunicações posteriores principalmente por auto-sugestão, por exemplo, uma vez que o “paradigma” havia sido imposto como um dogma. Como saber qual das duas hipóteses é a verdadeira?

    Se se seguisse única e exclusivamente o número (aplicando-se o “consenso das comunicações dos espíritos”, critério esposado pelo próprio Kardec, e ao qual não falta uma certa “lógica”, algo que é tão de seu gosto, sr. Arduin), a resposta seria bem simples e óbvia: dever-se-ia considerar como válida a via anglo-saxã, porque, por ocasião do lançamento d’ “O Livro dos Espíritos”, em 1857, a esmagadora maioria das comunicações nos EUA e na Inglaterra, por quase dez anos, desde 1848, não era reencarnacionista, e, mesmo na França (escola de Piérart), havia um número não desprezível de comunicações não reencarnacionistas. EXATAMENTE NESSA OCASIÃO, 1857, A VIA REENCARNACIONISTA CÍCLICA EVOLUTIVA ERA MINORITÁRIA. “Vox spiritorum, vox veritatis”… Ou não?

    Mas isso, a rigor, não diz muita coisa – podia ser minoritária, mas ainda assim “verdadeira”. Ou não; afinal, como julgar? A única coisa que se pode dizer, melhor, que se poderia dizer, em 1857, supondo-se que os espíritos de fato existiam, e de que sobreviviam à morte física, e de que se comunicavam com os vivos via médiuns, e de que, na Ultratumba, acabavam obtendo consciência do que lhes havia acontecido, conhecendo como era a própria estrutura da Ultratumba, de como funcionavam as coisas “no outro lado”, é, enfim, de que o mais provável era um Além não-reencarnacionista. Mas isso Kardec, sem base empírica alguma, simplesmente desprezou, colocando sua visão de mundo individual, sua “lógica particular”, como superior à esmagadora maioria das comunicações dos espíritos de que então, mundialmente, se dispunha – mas raios, o Espiritismo não é a doutrina ensinada pelos espíritos? Não é assim? No entanto, o Espiritismo Kardecista (e isso é um fato…), na sua própria concepção, no seu próprio texto canônico, ignorou a maioria das comunicações dos “espíritos” de que então se dispunha, e elegeu o reencarnacionismo cíclico evolutivo “à la” Lessing, Leroux e Reynaud à condição de dogma, de princípio fundante, fechando qualquer discussão a respeito. Em quê Kardec era superior aos outros para arvorar sua via (ou melhor, a via de seu conventículo) como devendo se impor às demais? Em quê ele era superior a Piérart, por exemplo?

    Isso é ser lógico, sr. Arduin? Digo mais, isso é ser “científico”?

    Ora, Kardec poderia muito bem ter registrado suas comunicações reencarnacionistas; poderia tê-las catalogado cuidadosamente, comparando inclusive eventuais diferenças obtidas com cada médium. Poderia até ter escrito textos em que defendesse esse ponto-de-vista sob a óptica especificamente “lógica” (justiça divina, resolução do “problema do mal”, etc.), e publicado tudo isso, e mais, enviado tudo isso a várias publicações periódicas espíritas que então já existiam nos EUA e na Inglaterra – e mesmo ao jornal magnetista do barão du Potet, em Paris. Tudo isso ele poderia ter feito, e tudo isso seria não apenas necessário, mas também meritório: iniciaria um DEBATE que talvez pudesse se mostrar frutuoso. Fosse ele um “cientista”, mesmo um “pesquisador”, teria não apenas agido assim, mas teria inclusive comparado temas semelhantes, e respectivas “respostas” dadas pelos espíritos de “seu” grupo, com os de outros grupos (p.ex., os dos círculos não-reencarnacionistas na própria França), e inclusive com as comunicações dos EUA e da Inglaterra. Mas não fez nada disso. Quanto ao reencarnacionismo cíclico evolutivo, NÃO HOUVE debate algum. Simplesmente Kardec tomou o que obtinha no seu grupo (um grupo então minoritário…) como A verdade – ao menos, no caso do reencarnacionismo cíclico evolutivo. Não tomou as revelações reencarnacionistas que, pretensamente, obteve em seu meio como uma hipótese de trabalho que deveria ser cotejada com outras, mas como a Revelação Divina, da qual ele foi o Quinto Evangelista. “Pax tibi, Caratace, Evangelista meus!” O Espiritismo Kardecista, parece-me, não é, em absoluto, a doutrina dos espíritos (se é que essas vaporosas entidades, de fato, existem, ou mesmo se é que podem nos comunicar com alguma segurança ou coerência o que quer que seja), mas, de fato, simplesmente, a doutrina do professor Rivail, que ele próprio codificou. Seu próprio caráter monolítico, ordenado, direto, superficialmente sem contradições, trai uma origem individual, e não coletiva. Nisso há muito mais do que simples “codificação” – há autoria, convenientemente disfarçada, claro, pelos pronunciamentos pretensamente de origem sobrenatural dumas quantas moçoilas adolescentes, muitas vezes em transe, mas, de qualquer modo, sempre altamente sugestionáveis e influenciáveis… É isso que é ser-se “lógico” e “científico”?

    Pois, para piorar, nem sequer se sabe, atualmente, quantos médiuns foram utilizados na codificação (“mais que dez”… mas quantos?), nem suas identidades, e nem o peso relativo de suas contribuições individuais (o único testemunho independente, quanto a isso, é o de Céline Japhet ao Conselheiro Aksakov; pode ser que nele haja exageros, frutos de simples despeito ou mesmo inveja, mas seria ele, em seu conjunto, falso? Não haveria um fundo de verdade na história que ela conta? Por que, logo após compilada a “doutrina”, as médiuns iniciais, em pouco tempo, “desapareceram”? Mediunismo “descartável”?).

    É perfeitamente compreensível que, na edição comercial de “O Livro dos Espíritos”, constasse apenas o texto “consolidado”; mas nalgum lugar deveria constar (ou ser conservado) um texto completo, “com aparato crítico”, ou seja, com as respostas efetivas, não editadas, de cada médium para cada pergunta, a par do texto final considerado, com justificativa circunstanciada sobre os métodos de consolidação, de harmonização, de aceitação ou de rejeição, quer de trechos específicos, quer de respostas inteiras. No entanto, sequer se conhecem os critérios utilizados por Kardec para a consolidação, a harmonização, a aceitação ou a rejeição das informações oriundas da Ultratumba, e, mesmo, se uma edição (ainda que manuscrita) com esse indispensável “aparato crítico” chegou a ser confeccionada (quase certamente não), já que as informações do Codificador-Evangelista que, a respeito, constam nas “Obras Póstumas” são absolutamente lacônicas: aproximadamente entre maio de 1856 e abril de 1857, nas suas próprias palavras, “foi da comparação e da fusão de todas essas respostas, coordenadas, classificadas e, muitas vezes, refundidas no silêncio da meditação, que formei a primeira edição de ‘O Livro dos Espíritos’”. Em poucas palavras: EU coordenei, EU classifiquei, EU refundi, no silêncio de MINHA meditação, e assim EU formei a primeira edição da Nova Revelação, a partir das comunicações de [mais de dez…] médiuns de meu círculo parisiense [danem-se todas as outras comunicações de espíritos do resto do mundo]. Ou seja, tem-se que confiar total e incondicionalmente na “visão superior” do professor Rivail, que, “no silêncio da [sua superior] meditação”, comparou e refundiu as respostas (Como? Quais? Quem disse o quê? Houve muitas divergências? Como, na prática, foram utilizados os critérios de discernimento?), coordenando-as e classificando-as. Muito científico, sem dúvida… Como o sr. mesmo gosta de dizer, sr. Arduin, considerar que, de fato, a codificação presente n’ “O Livro dos Espíritos” repousa em critérios minimamente científicos e racionais é ASQ – “acredite se quiser”…

    E ponha-se crença nisso. É preciso ter muita, muita fé, para se ser um kardecista.

    Mas pode-se ainda ir além. Os tais “critérios de discernimento” das mensagens dos espíritos que Kardec engendrou eram tremendamente limitados, falhos, não operacionais – creio que isso ficou claro nos últimos parágrafos. Mas a assimetria das comunicações em cada lado do Canal da Mancha, ainda assim, é notável. Tudo bem; não sabemos ao certo o que ocorre na Ultratumba; há espíritos e espíritos; uns dizem que existe reencarnação, outros que não existe. Fosse como fosse, o fato é que se haveria de esperar que, tanto nos EUA como na Inglaterra e na França, SURGISSE UM PADRÃO. Com algumas diferenças e desvios, tudo bem, mas, na média, um padrão deveria emergir desse conjunto de comunicações, que em 1857 já ocorriam por quase dez anos. Suponha-se, apenas para fins de argumentação, que a visão de Kardec do Além estivesse correta: há reencarnação, que é cíclica, purgativa e evolutiva. Ora, então, por que alguns bondosos espíritos “superiores” não “baixaram” nos EUA e na Inglaterra, ensinando isso? Ou seja, por que esse ensinamento específico NÃO CONSTA em quase dez anos (à época) de inúmeras comunicações “espirituais” nos EUA e na Inglaterra? Mesmo que fossem minoritários – por que os “espíritos superiores”, que sabem a “Verdade”, não se manifestaram, mas, ao contrário, calaram-se, surgindo como que de repente num grupinho específico em Paris, meio que do nada? Isso não faz sentido algum; isso não é “lógico”… Por que essa diferença? Por que não uma relativa semelhança nas comunicações? Afinal, se está tratando de norte-americanos, ingleses (e escoceses) e franceses, todos povos europeus ocidentais, membros duma mesma matriz civilizacional, representantes da civilização cristã européia ocidental, num mesmo período histórico; havia diferenças, mas as semelhanças entre esses povos, em termos de herança cultural, de nível educacional e tecnológico, mesmo de religião, etc., eram muito mais pronunciadas do que as eventuais diferenças. Raios, por que, então, essa diferença tão marcante, tão nítida, no que dizia respeito às mensagens do Além?

    Quanto à situação das comunicações mediúnicas, tais como se apresentavam no fatídico ano de 1857, há três hipóteses, e creio que apenas três:

    A) Os espíritos, tanto os “superiores” quanto os “médios”, revelaram ao mundo anglo-saxão (e a parte do mundo francês) as coisas como efetivamente eram na Ultratumba; o reencarnacionismo cíclico evolutivo é falso, não importando quão “lógico” pareça, ou quão “consolador” se mostre; os espíritos que se manifestaram ao “grupo de Kardec”, ao contrário, eram uma súcia de zombeteiros, despeitados e ignorantes; e tal grupo (ou, ao menos, seus líderes mais destacados), já embebidos na filosofia reencarnacionista evolutiva de Leroux e de Reynaud, caiu direitinho na esparrela, espalhando depois esse equívoco pelo mundo (o fato de ser majoritário atualmente não é, como se viu, por si só, nenhuma garantia de “veracidade”, como não o é qualquer caráter pretensamente “lógico” ou “consolador” que a coisa possa vir a ter – o tornar-se majoritário pode dever-se simplesmente a auto-sugestão, ao “wishful thinking” e ao “efeito manada”, a partir do estabelecimento duma doutrina consoladora, embora falsa); ou então

    B) Os espíritos que “fizeram a festa” no mundo anglo-saxão entre 1848 e 1857 (e mesmo depois), e na França, no mesmo período, em círculos como os de Piérart, eram, substancialmente, uma súcia de zombeteiros, despeitados e ignorantes; durante todo esse período, os inefáveis espíritos “superiores” mantiveram-se substancialmente quietos, e somente se manifestaram a um grupo bem determinado, em Paris, escolhendo especificamente um certo professor Rivail para ser o Codificador de sua Nova Revelação; a progressiva vitória do ponto de vista explicitamente esposado por esse grupo (o reencarnacionismo cíclico evolutivo) é, inclusive uma evidência adicional de sua superioridade e de sua veracidade; mais uma vez, Deus falou aos pequeninos, e do grupo de Kardec, como Nova Jerusalém, espalhou-se a verdadeira luz, ao menos em linhas gerais, acerca da Ultratumba;

    C) Não houve, em nenhum dos casos, comunicação alguma (ou, ao menos, quase nenhuma) por parte de pretensos espíritos de mortos; e a evidência disso é que, em cada ambiente, as mensagens tomaram formas distintas (e continuaram a tomar tais formas, mesmo depois); sendo quase absolutamente desconhecidas no meio anglo-saxão as idéias reencarnacionistas de Lessing, de Leroux, de Reynaud, os “espíritos” (de fato, quase sempre, se não sempre, o inconsciente dos médiuns, se não coisa pior…) não as ensinaram (e assim também em certos círculos espíritas franceses, que beberam diretamente no “New Spiritualism”); por outro lado, especificamente no “círculo de Kardec”, e em seu entorno, já fortemente influenciado por ideais socialistas utópicos e reencarnacionistas, quase que “naturalmente” as mocinhas mesmerizadas metralharam ao Grande Druida suas doutrinas reencarnacionistas cíclicas evolutivas. Cada meio, especificamente, moldou as comunicações e as revelações à sua imagem e semelhança, que eram (se não na totalidade, ao menos na esmagadora maioria) oriundas do inconsciente dos próprios “encarnados”, daquilo que eles (quase sempre sinceramente) supunham que a Ultratumba “deveria ser”, a partir de “sonâmbulos”/“médiuns” ora mais, ora menos, sugestionados por seus “magnetizadores”, não dos inefáveis e vaporosos espíritos; e o triunfo do reencarnacionismo kardecista na França (e depois, progressivamente, de vários tipos de reencarnacionismos semelhantes, embora não iguais, no próprio meio anglo-saxão, desde os fins do séc. XIX, a partir, p.ex., de influências ocultistas e teosóficas) deveu-se a fatores exclusivamente humanos, que nada tinham, e que nada têm, a ver com o que quer que ocorra na Ultratumba – principalmente: a) pela sua veia exótica (“quem teria sido eu noutra vida? Napoleão? Públio Lêntulo? Uma princesa egípcia? Um ‘lucumon’ etrusco? Um nababo da Índia?”); b) pela bem montada atratividade do produto, qual seja, por sua lógica superficial, bem como pelo seu poder de, ao menos numa primeira análise, explicar o “problema do mal” (“Sofro porque estou purgando pecados pretéritos” – mas quais? E por que deles não me lembro? Ah, isso não interessa… Sofro porque mereço, e ponto final). Mas, por mais fascinante que seja, nada disso tem origem sobrenatural.

    Qual das hipóteses lhe parece mais razoável, sr. Arduin? Qual lhe parece mais “lógica”?

    O professor Rivail (agora “Allan Kardec”) é usualmente apresentado como uma pessoa singularmente dotada nos seus pensamentos e nas suas análises, quer sob o prisma religioso, quer sob o ponto-de-vista filosófico, quer considerando-se os aspectos científicos; e a espécie de Espiritismo que ele engendrou, o Espiritismo Kardecista (reencarnacionista cíclico evolutivo) é considerada, por seus adeptos, como possuidora, em sumo grau, ou, ao menos, em grau superior ao de todas as outras fés ou filosofias ignaras, dessa tripla base: é religião, é filosofia, é ciência. Tudo isso é muito bonito, e até pode fazer bem ao ego, mas (e creio não estar exagerando, e nem enxergando coisas que não existem, se me permite, sr. Arduin, o sarcarsmo…) é fundamentalmente equivocado, como qualquer investigação um pouco mais profunda acerca da origem, e da história inicial, do Espiritismo, torna claro.

    Sobre o aspecto científico, especificamente, acredito que tudo o que vem sendo discutido aqui tenha aclarado enfim a situação real. E esta é que Kardec não foi nem um pouco “científico”, ou “lógico”: a) ele não utilizou nenhum critério científico discernível (além da sua própria predileção) para harmonizar as (pretensas) revelações espirituais de seu círculo mediúnico – tanto que não há nenhum testemunho documental sobre a criteriologia adotada, e mais, nem sequer sabemos quantos médiuns foram responsáveis pela “codificação”, nem qual a parte, ou o peso relativo, de cada um deles, e nem o possível grau de discrepâncias entre as diversas revelações; b) ele não cotejou as revelações espirituais que obteve, NUM PERÍODO DE APROXIMADAMENTE UM ANO, NUM CÍRCULO MEDIÚNICO ESPECÍFICO E BEM DELIMITADO, com uma multidão de revelações espirituais QUE VINHAM SENDO OBTIDAS AO LONGO DE QUASE DEZ ANOS, EM VÁRIOS CÍRCULOS MEDIÚNICOS NOS EUA, NA INGLATERRA E ATÉ NA FRANÇA, especialmente no que diz respeito ao reencarnacionismo – um tema central, que deveria ter sido estudado com a devida cautela; c) desde o início, o reencarnacionismo cíclico evolutivo não foi apresentado por Kardec como uma hipótese a ser discutida, ou como um objeto de estudo a levar a posteriores e mais cuidadosas investigações, mas sim como um DOGMA, como um princípio fundante de sua doutrina – diga-se o que se quiser dizer; quanto a isso, as palavras do Conselheiro Aksakov, em seu artigo de 1875, são verdadeiras e cristalinas: “That the propagation of this doctrine [Reincarnation] by Kardec was a matter of strong predilection is clear; from the beginning, Reincarnation has not been presented as an object of study, but as a dogma; to sustain it he has always had resource to writing mediums, who it is well known pass so easily under the psychological influence of preconceived ideas…”.

    Se ainda houver alguma dúvida quanto a isso, então está lançado o seguinte desafio: tomando-se a primeira edição de “O Livro dos Espíritos”, a de 1858, que se mostre, para cada questão, o que cada médium respondeu; mais ainda, mostrem-se os critérios objetivos e operacionais seguidos por Kardec para a consolidação, a harmonização, a aceitação ou a rejeição das informações obtidas a partir das comunicações dos diferentes médiuns, até se chegar à redação final, que constou na edição comercial. Mostrem-se também as tábuas comparativas, por assunto e por médium, bem como as estatísticas pertinentes. Ao fim, mostrem-se as comparações, que Kardec, como “cientista”, deveria ter feito, para cada questão, entre o texto final consolidado e outras comunicações, obtidas por outros médiuns, de outros círculos, aos quais poder-se-ia ter acesso pela imprensa espírita/espiritualista da época. Afinal, o professor Rivail era um pedagogo, escreveu, antes de se tornar “Kardec”, livros didáticos sobre vários assuntos, inclusive Matemática. Não se pode alegar que não tivesse conhecimentos técnicos apropriados (porque didática, inteligência e capacidade de análise e de síntese, com certeza, ele tinha) para levar adiante um estudo dessa natureza, e com esse nível de detalhe – um estudo, de fato, verdadeiramente “científico” e “racional”. Por que não o fez?

    Tudo isso quanto à “ciência”. Quanto à religião, e mesmo à filosofia, não há praticamente nada novo na “revelação kardecista” que já não tivesse constado quer na visão geral acerca de Deus que o Cristianismo esposava, quer na própria filosofia neo-reencarnacionista, evolutiva, de Lessing, de Leroux e de Reynaud, como aliás os simples extratos mostrados já deixam perfeitamente claro. Os (pretensos) “espíritos” repetiram o que os filósofos já havia algum tempo diziam…

    Portanto, a rigor, a única originalidade de Kardec foi de índole mercadológica – costurou num produto atraente a filosofia reencarnacionista evolutiva (fruto do Iluminismo e do otimismo diante do “progresso”), o magnetismo animal que se desenvolvia na França desde imediatamente antes da Revolução, e o “New Spiritualism” mais recente, de origem norte-americana. Foi um bom vendedor dum produto atraente – disso não há dúvida, muito mais hábil que os filósofos reencarnacionistas evolutivos fincados no socialismo utópico, com seus grossos e às vezes enfadonhos volumes, ou que os mesmerizadores que hipnotizavam “sonâmbulos”, ou mesmo que os “espiritualistas” da velha escola. Mas isso não significa, em absoluto, que tenha sido um bom teólogo, ou um bom filósofo, muito menos um bom cientista. De fato, não foi nada disso, porque não há originalidade alguma nos aspectos “religiosos” e “filosóficos” que fez constar no seu Espiritismo; e, quanto a ser “científico”… bem, aqui já se mostrou, “ad nauseam”, que esse não foi o caso. E não foi “científico”, e nem o Espiritismo pode sê-lo, não só pela ausência duma metodologia efetivamente “científica” na análise das comunicações, mas também, e principalmente, pelo fato de não se poder dispor de nenhum critério objetivo minimamente viável, do ponto-de-vista operacional, para o discernimento das mensagens (o único que poderia, talvez, sê-lo, o do consenso das comunicações mediúnicas, falhou miseravelmente desde o início, mostrando comunicações bem distintas nos dois lados do Canal da Mancha).

    Fica, ao fim, faltando apenas analisar a questão da “lógica” e do “bom senso”; diante da falência absoluta dos outros critérios (o da “linguagem digna e nobre”, que, diga-se de passagem, é risível, e o do “consenso das comunicações”, algo que não ocorreu no princípio, justamente quando esse critério teria chances de ser efetivamente testado, isto é, antes que influências de auto-sugestão ou de ambiente pudessem obscurecê-lo), essa poderia ser a “tábua de salvação” – o reencarnacionismo cíclico evolutivo é “lógico”, muito mais “lógico” do que as doutrinas concorrentes, e, por isso, inclusive, acabou ganhando terreno e enfim prevalecendo sobre elas.

    Tal questão da “lógica” e da, por assim dizer, “excelência” do reencarnacionismo, pode ser examinada sob dois aspectos. Um, inclusive, já foi levado a efeito nesta mensagem: uma doutrina pode ser “lógica” e até “consoladora”, mas isso não significa, em absoluto, que seja “verdadeira”. A “verdade” é o que o consenso das comunicações dos espíritos “superiores” informa acerca da Ultratumba – seja “lógico” ou não, seja “consolador” ou não. Não obstante, não se consegue sequer saber quais são, de fato, os tais espíritos “superiores”, e nem como (operacionalmente) identificá-los; se se seguisse simplesmente o número, como inclusive já se notou, a resposta a essa pergunta, em 1857-58, seria a de que o Além é não-reencarnacionista… Pode-se até argumentar que o reencarnacionismo cíclico evolutivo seja “lógico” e “consolador”; pode-se até dizer que ele é “útil”, mas nada disso o faz, necessariamente, “verdadeiro”. Afinal – só lembrando esse detalhezinho –, “verdadeiro” é o que, DE FATO, ocorre na Ultratumba (supondo-se, ao fim e ao cabo, que “algo” ocorra, e que uma “Ultratumba” de fato exista…).

    Mas, agora, analisemos a “lógica” pretensamente “superior” do reencarnacionismo.

    Basicamente, os defensores do reencarnacionismo cíclico evolutivo o têm como “lógico” pelo fato de poder dar respostas razoáveis acerca da justiça divina e do assim considerado “problema do mal”: a) não haveria uma “condenação eterna”, mas sim a oportunidade de que os espíritos fossem progredindo e aprendendo com seus erros; e b) coisas ruins ocorrem a pessoas boas quer como purgação de pecados pretéritos, quer como uma “missão especial” de auto-melhoria.

    Claro, o parágrafo anterior resume bastante, e até simplifica, a questão; mas, basicamente, é isso o que se alega. E esses argumentos são, de fato, argumentos de peso. Mas, tão atraentes quanto possam vir a ser à primeira vista, não são, em absoluto, isentos de contestação.

    Pode-se inicialmente contestar o fato de que a “evolução do espírito” tenha que se dar, necessariamente, no regresso a vidas terrestres. Por que, necessariamente, teria de ser assim? Pode-se considerar que, uma vez que um espírito passou por uma vida terrestre, tendo “provado da carne” e “do mundo físico”, por mais que sua vida tivesse sido viciada ou virtuosa, poderia continuar sua evolução com maior proveito (e mesmo levando suas experiências “carnais”) “noutras esferas”. Por que não? Foi justamente isso que Howitt quis dizer quando se referiu à viagem de Paris a Londres, mencionando que os reencarnacionistas consideravam necessária várias idas e vindas entre Paris e Calais. O argumento não é, sr. Arduin, como o sr. supôs, pueril. Se é, então prove, logicamente, e detalhadamente, que um espírito NÃO PODE evoluir passando apenas POR UMA ÚNICA VIDA FÍSICA, ao menos usualmente (claro, no caso, p.ex., duma criança que tenha morrido muito cedo, ou então no caso de retornos de alguns espíritos para “missões especiais”, poder-se-ia admitir uma reencarnação – E ISSO O “NEW SPIRITUALISM”, p.ex., no caso de Stainton Moses, ADMITIA… Reencarnação eventual NÃO É sinônimo de reencarnacionismo, muito menos de reencarnacionismo cíclico evolutivo…).

    Não, o sr. não pode provar a “puerilidade” da visão não-reencarnacionista (embora, eventualmente, admitindo reencarnações esporádicas…) do “New Spiritualism”, tal como apresentada por Howitt, ou por Stainton Moses. Sim, por que (em regra) repetir, no mesmo mundo físico, as mesmas coisas, com as mesmas limitações, que já foram vividas numa vida anterior? Não estaria o espírito, após uma vivência no mundo material, apto (ao menos como regra) para prosseguir em sua evolução “noutras dimensões”? Se já conseguiu chegar a Calais, para quê retornar a Paris, se seu destino é Londres? Por que o “Summerland”, ou as “cidades celestiais”, são mais absurdas, ou menos lógicas, do que reencarnar-se sucessivamente, sem se lembrar das vidas anteriores? Por quê?

    Também pode-se contestar o reenarnacinismo justamente pela falta de lembranças das vidas passadas. Ora, se reencarnamos para purgar pecados passados, ou, em geral, para evoluirmos a partir das experiências passadas (boas ou más), então por que não nos lembramos, absolutamente, desses pecados, e dessas experiências? Se temos uma “missão especial” a cumprir, por que, raios, não sabemos absolutamente nada acerca dela? Dizer que “sabemos disso tudo” quando estamos na “Ultratumba” é risível, porque não é lá que, usualmente, purgaremos nossas faltas e evoluiremos, ou cumpriremos nossa “missão”; a questão é que o dogma reencarnacionista nos joga (pretensamente) de volta a uma vida física na qual somos punidos por erros dos quais não nos lembramos, e dos quais não fazemos a mínima idéia, ou na qual temos uma “missão” a cumprir, missão essa que também ignoramos completamente. Aqui, no teatro da “purgação”, sofremos coisas às vezes terríveis, e somente podemos imaginar que “merecemos” isso, por termos “nalguma outra vida”, pecado (embora não nos lembremos absolutamente de nada a esse respeito); ou, então, que estamos nalgum tipo de “missão” especial, cujas características nos são desconhecidas e cujos objetivos nos são ignorados. Isso é razoável? Isso é lógico? Isso é condizente com um aprendizado? Ou, ao contrário, é mais condizente a levar o ser humano ou à revolta, ou à resignação bovina? Tanto num caso (a revolta diante de sofrimentos cuja causa não se sabe) ou noutro (a resignação diante dos sofrimentos, já que “nós os merecemos”…), que tipo de ser humano se forma a partir daí? Um revoltado, se não aceita o dogma reencarnativo, ou um resignado, se o aceita – e é só isso que podemos ser? E é só isso que é a vida?

    Pois mesmo nos códigos penais mais draconianos, mesmo entre os povos mais bárbaros, os criminosos condenados sabem por que o foram. Quando um pai castiga um filho, diz-lhe a razão. PORQUE É JUSTAMENTE O CONHECIMENTO DA RAZÃO DA PUNIÇÃO QUE PODE SERVIR COMO APRENDIZADO. Reencarnar para (pretensamente) purgar erros anteriores, ou para cumprir algum tipo de missão ignota, SEM SABER QUAIS ERROS estão sendo purgados, ou SEM CONHECER EM QUE TIPO DE MISSÃO SE ESTÁ, é o mesmo que dar a um menino de sete anos uma equação complicada para resolver, e, sem ensinar-lhe como fazê-lo, moê-lo de pancada cada vez que, tentando resolvê-la, ele (obviamente) não conseguir – porque, pretensamente, “em sonhos” ele foi ensinado a fazê-lo…

    Ah, mas não nos lembramos agora; não obstante, muitas vezes nós mesmos escolhemos o tipo de vida e as provações pelas quais passaremos… Pior a emenda que o soneto: pois isso significa que, de algum modo que seja, nossa vida aqui não é ditada pelo livre-arbítrio, que tanto os fatos ocorridos quanto nossas decisões acerca deles foram já tomadas, pretensamente, de antemão, ao menos nalguma medida. Ou seja, aqui em nossa vida material somos marionetes, sofrendo (sem saber a razão…) por crimes que supostamente praticamos, dos quais absolutamente não nos lembramos, ou numa missão que, também, nos é igualmente impenetrável, numa tragédia já programada, pretensamente escolhida por nós mesmos (ou a nós imposta pelos tais “espíritos superiores”, ou por qualquer Vontade Divina, ou por qualquer “Lei”, ou por qualquer maldito mecanismo que seja, tanto faz) mesmo antes de encarnarmos. Se isso é a “lógica” e o “bom senso” da reencarnação, sinceramente, prefiro ser um demente…

    Caríssimo sr. Arduin, não listei os argumentos acima para “fechar a questão” acerca do reencarnacionismo, apenas para lembrá-lo de que, do mesmo modo que os argumentos do “New Spiritualism” não são, absolutamente, pueris, o arcabouço “justiceiro” do reencarnacismo não é, em absoluto, isento de dificuldades – e de críticas bem fundamentadas. O sr. pode achá-lo “lógico”, e ele até pode assim parecer, mas, se o sr. se der ao trabalho de analisar a questão mais a fundo, poderá verificar que as coisas não são tão fáceis, ou cristalinas, como aparentam. É muita pretensão, quero crer, dizer que o reencarnacionismo é “lógico”, ao passo que outras possibilidades “não o são”…

    Para concluir, vejamos suas próprias palavras: “Se cada nascido era uma alma nova em folha, então o progresso humano só era devido à educação apenas, já que o nascido não trazia qualquer herança de vida anterior. Mas, ao longo do tempo, Kardec compilou situações onde observou que crianças ou adultos traziam alguma bagagem que não seria fruto do meio em que se educaram. Foi daí então que surgiu o tal ‘reencarnacionismo cíclico-evolutivo’”.

    Toda essa questão é sumamente complexa, mas creio que seu argumento, sr. Arduin, absolutamente não se sustenta. Pois, para se supor que uma alma humana traria uma “bagagem que não seria fruto do meio em que se educaram”, dever-se-ia demonstrar, cumulativamente:

    a) o fato de que, no Além, as almas foram criadas absolutamente sem conhecimento algum, e também sem nenhuma tendência específica (“tabula rasa”). Mas, se é assim, como é que algumas almas simplesmente “se dão melhor” na “corrida evolutiva”, se foram todas elas criadas simples, sem conhecimento algum, sem nenhuma tendência específica, uma “tabula rasa”? E,

    b) o fato de que, nesta vida (ou em cada vida física), diante das experiências específicas, o ser humano completo (alma e corpo) não pudesse, por ação de sua inteligência apenas, quer ADAPTAR-SE a novas situações naturais, quer MODIFICAR as próprias situações naturais, em seu proveito.

    Porque, se as almas não são criadas como “tabula rasa” (i.e., se existe, intrínseca em cada alma, uma noção de “certo-e-errado”, consubstanciada, aliás, na Lei Natural, que é a mesma para qualquer ser humano, e que, apesar de suas multivariadas manifestações, sempre esteve presente em todas as civilizações), e se a inteligência humana é capaz não apenas de adaptação, mas também, ao longo da vida, de “evolução” (que é a modificação das próprias condições naturais em seu proveito), todo o seu argumento desaba. Não ganhamos nosso conhecimento “não-aprendido”, necessariamente, “ao longo de várias vidas”; já viemos assim ao mundo, quer com a noção do certo e do errado (e, portanto, elegíveis para o prêmio ou para a punição PARA OS ATOS QUE AQUI PRATICAMOS E QUE VIOLEM A LEI NATURAL – não para pretensos “erros” passados dos quais NÃO NOS LEMBRAMOS), e também com a capacidade de transcendermos às próprias condições naturais, não apenas nos adaptando, mas também evoluindo.

    Assim, basta supor que a alma humana não é, em absoluto, uma “tabula rasa” (e há ao menos algum suporte empírico para isso, tendo em vista que, em civilizações diversas, sem contato conhecido entre si, e em épocas diversas, mesmo que os detalhes organizativos, e mesmo morais, variassem muitíssimo, emergiu um “núcleo moral” notavelmente idêntico, base, aliás, dessa já citada “Lei Natural”), e que a inteligência humana (a intelecção, a inteligência teorética) é capaz, por si só, não apenas de se adaptar e de também de apreender as cadeias de causa-e-efeito, mas também, a partir daí, de modificar as condições naturais em seu próprio favor, que “outras vidas” torna-se uma explicação totalmente dispensável para tanto.

    Assim, devolvendo-lhe a frase que o sr. tão gentilmente me endereçou, “o buraco é mais embaixo”, sr. Arduin…

    Com minhas mais cordiais saudações,

    JCFF.

  50. Marcos Arduin Diz:

    Sabe o que é, Antônio Gê, você disse que POA não era a cidade de Poá, mas alguma coisa aí de Aeronáutica do RS. Eu não sei se Poa é nome de lugar ou alguma sigla… Por isso faço as minhas gozações com os nick e falo em Aeronáutica de Poá…
    .
    Quanto ao Kardec, sei pouco das biografias dele e desconheço alguma que trate do aspecto religioso de sua vida pré Espiritismo. Há biografias cheias de erros e fantasias, como a de Henri Sause, que fala que Kardec defendeu uma tese de doutorado em Medicina e com muito brilho… Mas ninguém jamais soube que tese foi essa e Kardec JAMAIS exerceu o ofício de médico. Depois do caso lá das falsas fotografias, Leymarie inventou essa aí do médico e até incluiu o advogado… Desespero para tentar vender a ideia (falsa) de que Kardec era um cara de formação profissional de muito prestígio.
    .
    No século XIX era charmoso entre o pessoal de cultura considerar religião uma coisa equivalente a superstição. Só os governantes não podiam se dar a esse luxo, pois precisavam do apoio dos crentes. Kardec, contudo, mostrava repulsa contra o Materialismo, mas invocava razões morais. Com a confrontação filosófica que fazia entre os dogmas da Santa Madre Igreja e do Espiritismo, mostrava-se bem afastado do Cristianismo. Só reconhecia, e nisso estava inteiramente certo, a universalidade dos ensinamentos morais de Jesus.

  51. Antonio G. - POA Diz:

    JCFF:
    Grande texto! Em ambos os sentidos. Quando você abdica de pregar a doutrina da SMICAR, seus argumentos (assim como seu estilo) são admiráveis.
    À frase “É preciso ter muita, muita fé, para se ser um kardecista”, eu apenas acrescentaria um breve complemento: …”bem como para se esposar qualquer outra doutrina religiosa”.
    Sds.

  52. Antonio G. - POA Diz:

    Arduin, entendi o seu ponto.
    .
    POA é a abreviatura que designa o aeroporto de Porto Alegre. Assim como GIG é o símbolo do Galeão do Rio de Janeiro, e BSB é do aeroporto de Brasília, por exemplo. Só isso. rsrsrsrs

  53. Gorducho Diz:

    Ei, Balofo
    Há algum problema com os EVENTUAIS DOGMAS na DE?O que importa se algo é dogma? Importa apenas se é útil ou inútil, se nos dá alguma razão para sermos bons ou maus, etc e tal…

    Professor, aparentemente o Sr. não percebeu que eu estava me dirigindo ao Analista Matusalém, o qual dissera:
    sinceramente falando discordo amplamente de que KARDEC foi DOGMÁTICO + Ô gorducho, dogmas não se mudam, e esta não é a proposta de Allan Kardec. Entendeste?

    Não, nada contra dogmas; e sim, concordo com o Sr. que a Ciência utiliza dogmas pois (como aparentemente é também o seu caso), não consigo diferenciar dogma vs axioma vs postulado. Exceto a tradição de utilizar esse termo em contextos religiosos – diferenciação meramente estética (cada Arte tem sua própria Estética, como diz um conhecido meu).
    Relativamente ao grifo que fiz na sua frase, creio que entendo sua peculiar “lógica”. Me parece semelhante à do William James [aqui me baseio na História da Filosofia Ocidental do Russell]. Para o Sr., como para ele, “verdadeira” é toda crença cujos efeitos sejam bons. Diz o Russell: “It assumes that a belief is ‘true’ when its effects are good. (…) No wonder the Pope condemned the pragmatic defence of religion”. Então o Papai Noel existe, pois o efeito da existência do mesmo é ótimo para a felicidade, bom comportamento e aplicação escolar das crianças.
    Porém, como também sublinha o Russell, agora particularizando para o contexto religioso, que é o da “DE”, não corresponde ao pensamento dos Verdadeiros Crentes. Quando um Crente diz que crê em Deus, ele crê que Ele está lá na 11ª. Esfera, anotando nossos atos e pensamentos. Deus, para ele, é um Ser real, não meramente uma ideia humana útil para manter os pedestres consolados, esperançosos e disciplinados.
    Claro, também partilhava essa “lógica” de vocês o respeitável Platão com suas “nobres mentiras” socialmente úteis. Portanto vocês estão em ótima companhia desde o ponto de vista filosófico. Só não creio que a imensa maioria dos seus Irmãos em Fé partilhe essa lógica…

  54. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Sr. Antônio G,

    Eu não utilizo este “blog”, nem nenhum outro, para pregações católicas, ao contrário de outros, que dele fazem uso para pregações anti-católicas e anti-religiosas, muitas vezes com argumentos dúbios e com fatos incorretos.

    E aproveita para complementar ainda mais sua frase, acrescentando o ateísmo militante. Sds,

    JCFF.

  55. Antonio G. - POA Diz:

    JCFF,
    Como eu já fui uma pessoa religiosa (primeiro católico, e depois espírita), eu bem sei que é mesmo preciso uma enorme dose de fé e abstração para se crer no transcendental e seus derivados (dogmas, doutrinas e religiões). Sei que o crente depara-se permanentemente com a dúvida entre o crer e o concluir (plageando o nosso amigo Vitor). É duro para as pessoas inteligentes “engolirem” os mandamentos dogmáticos, especialmente aqueles mais improváveis (se é que faz sentido alguma forma de hierarquização de absurdos). Ser crente não é fácil. Ser ateu (eu prefiro o termo cético) é muito mais confortável. É só deixar-se conduzir pela razão, pela lógica, pelas evidências. Não precisa crer em fantasias. Só em fatos. Os céticos têm muito menos culpa, menos dúvidas e mais certezas. São mais “leves”. Eu vivo bem melhor agora, sem Deus, dogmas e doutrinas. E, principalmente, vivo sem medo.
    Sds.

  56. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Quem é o pregador?

  57. Antonio G. - POA Diz:

    É… acho que sou um pregador.
    Sds.

  58. Toffo Diz:

    Muito bom o seu texto, JCFF, eu não falaria melhor. Realmente a questão da reencarnação, como a DE expõe, cíclica-purgativa-evolutiva, é algo muito difícil de engolir, já que fere preceitos fundamentais do direito terreno (que se supõe inferior à Justiça Divina que a reencarnação pretende representar), que consiste em o punido saber por que está sendo punido, de que está sendo acusado e por quem. Ou seja, o “due process of law”, o devido processo legal, uma conquista da civilização que a “lógica” de Kardec parece olvidar. E se a punição tem efeito pedagógico, como pretende a doutrina kardecista da reencarnação, ela tem de ser imediata. Como vou punir meu filho uma semana, um mês depois de ele ter feito uma travessura? Qual a pedagogia de tal ato? E tem mais: como alguém pode ser punido por ter cometido um delito como Antônio, numa outra encarnação em que ele é José, tem outra identidade civil, outra formação cultural, vive em outra época e em outro meio, em que talvez aquele delito não seja mais considerado crime, oitenta, cem, duzentos anos depois de ter o delito sido cometido?

    Outra coisa importante no seu texto é a identificação da autoria do prof. Rivail. Não há nenhum indício de que aquele corpo de doutrina – que Rivail chamou oportuna e oportunisticamente de spiritisme – seja fruto de uma criação coletiva, senão fruto da mente de uma pessoa só. É evidente que é, e Flammarion na sua juventude estava mais do que certo em ousar dizer, em seu discurso à beira do túmulo de Kardec, que aquela era uma “obra pessoal”. Não tem como negar.

  59. Marcos Arduin Diz:

    Seu Ex-Toffado…
    “E se a punição tem efeito pedagógico, como pretende a doutrina kardecista da reencarnação, ela tem de ser imediata. Como vou punir meu filho uma semana, um mês depois de ele ter feito uma travessura? Qual a pedagogia de tal ato?”
    – Pois é, meu caro… Há uma certa figura chamada PRESCRIÇÃO, em que após certo tempo o crime prescreve, ou seja, não cabe mais punição ao criminoso. Essa é outra grande “conquista” jurista moderna… Romero Jucá foi usado por Fernando Henrique o Garboso como líder no Congresso, mesmo tendo sido advertido de que ele era um ladrão. Lembram lá de que ele e um sócio fizeram um empréstimo, dando como garantia uma fazenda lá no quinto andar? Pois é: o banco ficou no prejuízo, pois tal crime já prescreveu…
    .
    E aí eu lhe pergunto: Qual é o efeito pedagógico desta tal prescrição?
    Resposta: faz a alegria dos Grandes Advogados do Brasil.
    Sim, pois um Grande Advogado NÃO DEFENDE o seu cliente sabida e comprovadamente culpado: ele apenas ENROLA, vai empurrando com a barriga, usando de todos os artifícios para adiar os julgamentos, beneficiando-se da lerdeza da nossa justiça. Aí então passa o prazo, o crime prescreve e o culpado sai morrendo de rir.
    .
    Esses Grandes Advogados devem estar putos da vida com o julgamento do Mensalão: não foi seguido o script previsto para esses casos. Era para se prescrever tudo e não se julgar nada. Desacostumados a defender réus, esses Grandes Advogados fizeram defesas pífias ao meu ver. Exemplo: “Não sabia que o dinheiro era de origem ilegal”. E daí? Como não sabia? No mínimo dá pra se desconfiar quando uma empresa de publicidade (e não o PT) deposita um cheque numa conta e vai a esposa do cara sacar em dinheiro vivo. Alguma coisa está errada… Ninguém percebeu não?
    .
    Bem, Ex-Toffado, se a nossa generosa justiça terrena, embalada pela política de defesa dos Direitos Humanos (mais corretamente: direitos dos manos) faz tudo para beneficiar a bandidagem, as vítimas dos bandidos não conhecem essa figura prescrição em seus íntimos: querem ver essa conta ser cobrada um dia.
    .
    É o que acontece na reencarnação. Kardec pode ter dado a impressão de que Deus seria o gerente das punições, talvez por influência da fé cristã. Mas não nada disso. Quem topa com seus desafetos, vai ter de se virar com eles se não quiseram perdoar. Mesmo que estes perdoem, existe uma tal de consciência, que é uma “juíza” preguiçosa, dorminhoca, difícil de se despertar, mas quando desperta e veste a toga, sai debaixo, pois é a “juíza” mais implacável que existe. Assim então, sofrendo o que fez sofrer, o espírito culpado consegue acalmar essa “juíza”.
    .
    “E tem mais: como alguém pode ser punido por ter cometido um delito como Antônio, numa outra encarnação em que ele é José, tem outra identidade civil, outra formação cultural, vive em outra época e em outro meio, em que talvez aquele delito não seja mais considerado crime, oitenta, cem, duzentos anos depois de ter o delito sido cometido? ”
    – As PERSONALIDADES são TEMPORÁRIAS, porém o espírito é a entidade PERENE. Portanto será ele quem pagará a conta, não importa qual personalidade esteja vestindo. Que pensaria você do argumento:
    _ Não pode ser julgado pelo estupro, pois cometeu-o quando vestia calça jeans; agora veste terno e gravata…
    .
    Ah! Sim… O antigamente e o hoje em dia. Certo, bruxaria hoje em dia é folclore, tolice, superstição… Mas nos tempos idos e passados era um crime gravíssimo. Então digamos que uma jovem foi acusada de bruxaria, não confessou o crime e por isso vai ser torturada “de leve” e se confessar aí vai ser torturada “por castigo” e finalmente morrerá na piedosa fogueira cristã.
    Fosse ela culpada ou não do crime, seus torturadores, julgadores e algozes com o tempo e a evolução espiritual, sentirão que foram muito além das medidas em oposição aos fatos. Certo, agiram de boa fé. Naqueles tempos as coisas eram assim. Mas eles e suas condenadas são espíritos imortais e estão uns diante dos outros. E aí então vão ter de se acertar, seja na base da vingança, seja por remorso, e reparar o mal feito.
    .
    É assim que a coisa funciona, ô meu caro Ex-Toffado. Sugere coisa melhor?

  60. Antonio G. - POA Diz:

    É a Justiça Retributiva Divina. É Deus exercendo o seu “jus puniendi” pela via da “Lei de Talião”. Coisa perversa… É por essas e outras que eu cortei relações com Ele.

  61. Gorducho Diz:

    É assim que a coisa funciona, ô meu caro Ex-Toffado. Sugere coisa melhor?
    É maravilhoso… A Reencarnação Romântica existe porque o Kardec e o Professor não conseguem imaginar “coisa melhor” para o funcionamento do Universo! Prefiro rir ao invés de chorar! 🙂

  62. Toffo Diz:

    Eu não tenho o que te dizer, Arduin. Seja feliz nesta encarnação para conseguir uma boquinha melhor na próxima. Parafraseando Pirandello: assim é, se lhe parece!

  63. Antonio G. - POA Diz:

    Dois pensamentos relacionados às questões abordadas nos últimos posts:
    .
    “A AIDS é uma retribuição justa para uma conduta sexual imprópria.” Madre Teresa de Calcutá.
    .

    “Acreditar é mais fácil do que pensar. Daí existirem muito mais crentes do que pensadores.” Bruce Calvert.
    .
    Sds.

  64. Antonio G. - POA Diz:

    Toffo, quanto a esta questão de crer ou descrer, eu penso que os adultos devem ter total liberdade para acreditar no que quiserem. Mas eu acho que nós deveríamos proteger mais as nossas crianças.

  65. Marcos Arduin Diz:

    Pois é, seu Antônio Gê de Porto Alegre (está certo agora?). O toma lá e dá cá é a justiça da nossa consciência e/ou o confronto dos desafetos. Agora que Justiça melhor você propõe? Veja bem, meu caro, que não é por gozação que estou fazendo essa pergunta, pois as dores e desgraças humanas são coisas presentes que têm embaraçado os filósofos e confundido as religiões. Eles não conseguem achar uma resposta para elas dentro de um padrão de justiça aceitável ao povão. É uma coisa que desde sempre a Humanidade tem buscado.
    .
    Por isso então fico no aguardo de que me seja apresentado esse padrão pelos meus debatedores.

  66. Antonio G. - POA Diz:

    Complementando:
    É do senso comum que, por mais que legitimemos o pátrio poder, um pai ou uma mãe não tem direito de ensinar a um filho de 7 anos a fumar ou a beber cachaça. A maior parte das pessoas não hesitaria em intervir diante de tal perversão. No entanto, não temos o mesmo cuidado ao saber que um pai manda seu filho para uma aula de catecismo ou de evangelização. Ensinar um infante a não pensar não é tão malévolo quanto induzí-lo a um vício odioso?

  67. Toffo Diz:

    As dores e desgraças humanas sempre existiram de todos os tempos e nunca foram superadas. Uma justiça reencarnacionista, que transcende a vida e pune e premia em outra, a) não resolveu, não resolve e nunca resolverá essa questão; b) não é menos injusta do que a ordem terrena. Uma noção de justiça transcendente, ou divina, é um mito criado a partir da incapacidade humana de fazer a justiça completa: não podendo exercer a justiça plena, o homem transfere a um poder superior aquilo que não consegue realizar. Embora jamais veja o resultado dessa justiça superior, o homem conserva a esperança de que ela se realizará num futuro que espera alcançar. As religiões, entre elas o espiritismo, nada mais fazem do que inculcar em seus adeptos essa noção de uma justiça futura perfeita, um derivatório para que as pessoas possam suportar as grandes e as pequenas injustiças do mundo. É uma ilusão, uma fantasia imaginar que a reencarnação vai botar no lugar uma ordem bagunçada ou injusta do passado. Se assim fosse, isso já seria realidade, já seria mais que tempo para se observar que isso iria acontecer.

  68. Antonio G. - POA Diz:

    Arduin, dê uma olhada no conceito de Justiça Restaurativa.

  69. Antonio G. - POA Diz:

    Quanto à ideia de justiça divina, nada a declarar.

  70. Antonio G. - POA Diz:

    Toffo, eu não havia lido seu último post. É perfeito.
    Sds.

  71. Toffo Diz:

    Mas é isso: a justiça pretendida pela reencarnação é tão imperfeita quanto a justiça terrena, porque parte de uma premissa falsa: a de que as vidas sucessivas vão tornando o ser humano melhor, por força do entendimento positivista da lei do progresso. Não existe nenhuma evidência de que o ser humano tenha se tornado melhor no correr dos séculos, pelo fato de que a natureza humana sempre foi e sempre será a mesma. O desenvolvimento da tecnologia, da técnica, da indústria, o aparecimento das legislações sociais, enfim, todo o progresso realizado pelo ser humano não modificaram a sua essência, que continua a ser uma alternância de zonas de luz e de sombra. Essa história de que nos tornaremos anjos de luz é uma das fantasias utópicas do século 19 que sobreviveram no espiritismo.

  72. Antonio G. - POA Diz:

    É como eu também vejo. A expectativa por uma justiça perfeita (a divina) é a acomodação da frustração pela falibilidade da justiça humana. Uma espécie de terceirização. É a solução “mágica” para o que não conseguimos obter pelas vias “normais”. SMJ.
    Sds.

  73. Marcos Arduin Diz:

    Ex-Toffado e Antônio Gê de Porto Alegre e Saltitante…
    Como disse, as dores humanas têm embaraçado os filósofos e confundido as religiões. Não pretendemos, nós espíritas, afirmar que temos as respostas perfeitas a elas, mas cremos que a maior luz sobre o assunto veio do Espiritismo. As demais religiões, sobre esse ponto, apresentam-nos elucubrações de lastimável pobreza e impossível aceitação.
    .
    Primeiramente, Ex-Toffado, HÁ PROGRESSO NA HUMANIDADE SIM SENHOR. Isso é difícil de as pessoas perceber, pois o que vemos do passado é o pouco que nos é dado pelos livros de História, alguns mal e porcamente escritos, com ideias e ideologias tendenciosas. As justiças de antigamente diziam que cabia ao réu provar sua inocência e não o Estado ou seus acusadores a culpa. Os sistemas de governo primavam pelo absolutismo dos governantes, que só tinham de ficar de olho em volta pra saber se não tinha alguém com punhal ou veneno por perto para lhe usurpar o poder. Crimes de guerra eram vistos como coisas normais e naturais. Era a lei do quem pode (ou phoode) mais, chora menos.
    .
    A coisa não é simultânea em todos os povos e culturas, mas há um senso moral coletivo hoje em dia que não é o mesmo dos tempos idos e passados. Soldados ou generais que cometem ou ordenam que se cometam crimes, acabam sujeitos a cortes internacionais. Claro, há aqui o quem pode mais, chora menos: alguém imagina um soldado ou general americano sendo levado a uma corte internacional? Mesmo assim, está sujeito a responder às leis militares do seu país.
    .
    Quanto ao progresso científico, intelectual, etc e tal, acho que não preciso comentar, né? Pois então é só analisar o passado moral da Humanidade, com vistas ao coletivo, e seremos obrigados a admitir que houve evolução sim.
    .
    Antônio, você falou numa tal de Justiça Restaurativa. Vi lá na Wiki, mas não entendi lhufas. Vamos imaginar que seria algo assim: o garoto _ que será um futuro professor de filosofia marxista _ em vista da sua infinita burrice, aceitou o desafio dos colegas para pichar um muro. Mas foi pego no flagra e aí vai pra FEBEM… Opa! Peraí… Não precisa mandar pra FEBEM não. Vamos fazer o seguinte: os pais dele compram, ou ele compra com o dinheiro da sua mesada, lata de tinta e rolo e pinta o muro, apagando a pichação. Assim então, o dono do muro não fica no prejuízo e não haveria motivo para ele ir em cana. Seria isso um exemplo de Justiça Restaurativa?
    É… Poderíamos fazer assim: o bandido em vez de ser condenado a uma pena específica de anos de cadeia, ficaria preso somente o tempo em que juntasse, com seu trabalho na cadeia, o valor equivalente ao prejuízo que causou aos terceiros. Mas temos lá uns problemas. Se foi um filhinho de papai, a família poderia cotizar e pagar o prejuízo e assim o filhinho do rico não ficaria em cana. Já um pé rapado acabaria ficando 30 ou 40 ou mais anos preso, pois por mais que trabalhasse, não conseguiria ressarcir o prejuízo que causou. Complicado, não?
    .
    Como fica essa Justiça Restaurativa no caso de assassinatos? Não se pode devolver a vida a um morto. E no caso de mutilações? Alguns jovens de classe média alta às vezes saem de madrugada para agredir a outros. São os “pitboys”. Como fazer a Justiça Restaurativa nesses casos?
    .
    É… Pode-se não gostar ou achar que é primitivismo, mas a lei de talião tem lá a sua lógica, faltando apenas o bom senso do juiz. Esse aí é mercadoria um tanto rara e cara…
    Mas quando a lei de talião é aplicada pela dona Consciência, não tem conversa e NÃO TEM ERRO. Portanto, o sistema reencarnacionista espírita é lógico neste ponto.
    Sacou?

  74. Antonio G. - POA Diz:

    Arduin, minha menção ao conceito de justiça restaurativa foi no sentido de responder a sua pergunta sobre se haveria alguma forma melhor de justiça do que a proposta pela DE, que é essencialmente retributiva (punitiva). Minha resposta é: Sim, existe um conceito muito mais inteligente e útil que este da Lei de Talião, que é um processo onde as partes conjuntamente determinam uma forma de melhor reparar o dano sofrido pela parte prejudicada. É um processo mediado, onde as possibilidades são bem amplas, podendo, inclusive, mesclar mais de uma forma de reparação/punição. Não é, concordo, um método perfeito, especialmente quando a transgressão implica a morte ou dano físico permanente em alguém. Mas ainda assim é mais eficaz do que punir o criminoso apenas com pena de restrição de liberdade, que nenhuma forma de reparação traz ao ofendido, a não ser a do sentimento de vingança.
    .
    Segue um link, caso seja de seu interesse ler um pouquinho mais sobre o conceito:

    http://jus.com.br/revista/texto/7359/justica-restaurativa-no-brasil
    .
    Sds.

  75. Toffo Diz:

    Arduin, o homem continua a se matar, a se escravizar e se aniquilar, a exterminar animais e plantas, a destruir o planeta, a dizimar a natureza por pura ganância. Mudaram as roupas, mudaram as armas, mas a essência é a mesma. Onde o humano progresso vai, vai junto a humana estupidez… é da qualidade da nossa espécie. Agora, você acha que nesses 700, 800 anos desde a Idade Média, quer dizer, cerca de 3200 gerações, a reencarnação não melhoraria a índole dos homens? Pura ilusão, meu caro. O passado moral da humanidade é tão sujo quanto o presente. Não faz nem 20 anos, tivemos a horrenda guerra na Bósnia. Diante dos nossos olhos, a Síria se desintegra neste momento, milhares de crianças e civis inocentes mortos sem a menor piedade. Quem disse que melhoramos? Quando você fala Não pretendemos, nós espíritas, afirmar que temos as respostas perfeitas a elas, mas cremos que a maior luz sobre o assunto veio do Espiritismo. As demais religiões, sobre esse ponto, apresentam-nos elucubrações de lastimável pobreza e impossível aceitação, só reproduz o discurso soberbo dos espíritas que eu estou cansado de ouvir na minha vida. É a tal história: a fé é emulativa, a minha fé é sempre melhor que a fé do meu vizinho. É isso.

  76. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Apenas levando em conta o “lado ocidental”: mais de dois mil e seiscentos anos de filosofia (incluindo-se aí, no lado “reencarnacionista”, Pitágoras, Platão e, principalmente, Plotino…), e uns dois mil de teologia (incluindo-se aí Fílon de Alexandria, o Novo Testamento, os Santos Padres, Agostinho, a Escolástica…), e tudo o que se pode dizer é que “as dores humanas têm embaraçado os filósofos e confundido as religiões”; que “a maior luz sobre o assunto veio do Espiritismo”; e, para culminar, que “as demais religiões, sobre esse ponto, apresentam-nos elucubrações de lastimável pobreza e impossível aceitação”… É duro…

    Fiquemos apenas em sistemas que admitam a reencarnação (para evitar qualquer acusação de “pregação”) – dizer que as elucubrações espíritas kardecistas se possam comparar, no mínimo que seja, p.ex., ao sistema neoplatônico de Plotino, sinceramente, me faz sentir mal.

    JCFF

  77. Antonio G. - POA Diz:

    Ops! Toffo, acho que você contou algumas gerações a mais, não? rsrsrs
    .
    Bom dia, para todos!
    .
    Sds.

  78. Antonio G. - POA Diz:

    Está terminando agosto! Um mês a menos na contagem regressiva para o Juízo Final…

  79. Gorducho Diz:

    (…) a maior luz sobre o assunto veio do Espiritismo. As demais religiões, sobre esse ponto, apresentam-nos elucubrações de lastimável pobreza e impossível aceitação.
    Eis um exemplo da humildade e tolerância de “alguns” Espíritas 🙂

  80. Toffo Diz:

    Sim, Antônio, são 32 e não 3200 gerações. Foi um erro de digitação. Considerando-se 4 gerações por século, tem-se 32 gerações em 800 anos. Tempo suficiente para mudar alguma coisa no ser humano, né? Mas não mudou muita não.

  81. Marcos Arduin Diz:

    Seu Antônio Gê de Porto Alegre e Saltitante:
    – Nenhum sistema de justiça humano será perfeito. Em sendo possível, esta tal justiça que mencionou até seria bom negócio… QUANDO POSSÍVEL. Mas quando não é possível, o jeito é ir pro pau. Então o pitboy arrebentou a cara de um sujeito por gosto sádico. Qual seria a melhor justiça neste caso? Arrebentar igualmente a cara do pitboy. O assaltante matou o assaltado porque ele não tinha dinheiro. Qual a melhor justiça? Matar o assaltante. O cara estuprou várias moças. Qual a melhor justiça? Fazer ele virar mulher dos bandidos lá na cadeia. Não melhoraria a situação das vítimas, mas daria a elas ou a seus parentes a boa sensação de que a justiça foi feita.
    Claro, virão os chorosos dereitos omanos dizendo que isso não é justiça: é vingança! Claro que é! E qual a melhor justiça que não a vingança? Dizem os dereitos omanos que isto não resolverá o problema da criminalidade. Claro que não resolverá: criminalidade NÃO É PROBLEMA. Problema é uma coisa complicada, mas bem ou mal pode-se achar uma solução para ela. Problema que não tem solução não é problema: é TRAGÉDIA. E criminalidade é TRAGÉDIA: NÃO TEM SOLUÇÃO. Os dereitos omanos exigem impunidade aos criminosos, invocando tais e quais teses sociológicas… Não não explicam porque essa impunidade seria solução para a criminalidade.
    .
    Vejo que há um foco muito direto só no aspecto punitivo da reencarnação. Antes de mais nada, a reencarnação é um RECURSO PARA A EVOLUÇÃO DO ESPÍRITO. É como uma escola: ela fornece os recursos para a aprendizagem, mas quanto e em que ritmo o aluno quer aprender, aí é com ele. E dá margem para que seja feita a justiça. Veja bem que a DE prevê que a coisa não precisa ser sempre na base do toma lá e dá cá. O espírito culpado pode pagar pelos seus erros em serviço ao próximo. Lá no livro Ação e Reação, do André Luís, há um capítulo intitulado Resgate Interrompido, onde um espírito constituiu família tendo encarnado nela outros espíritos aos quais prejudicou em vida passada. Mas ele não se emendou e desprezava a esposa, odiava o filho e só tinha algum apreço pelas filhas. Pretendendo matar a esposa para ficar com a amante, fracassou no intento, e sua esposa concordou com a separação. André Luís, perguntando ao instrutor o que seria o espírito faltoso se os espíritos da esposa e filhos vencessem as dificuldades e alçassem a um mundo mais feliz, como ele pagaria o débito que lhe onerava? A resposta foi:
    _ Embora estejamos uns diante dos outros em processo de reparação de faltas mútuas, somos acima de tudo devedores de Deus em nossas consciências. Se os espíritos da esposa e dos filhos vencerem a situação difícil que atravessam e conquistarem uma situação mais feliz, ainda assim o faltoso os verá tristes e infelizes quais os tornou e atormentado pelas recordações, pagará EM SERVIÇO a outros espíritos necessitados.
    .
    Assim, um cara que roubou e arruinou uma família, em vida futura, tendo se regenerado, reunirá bens com seu trabalho honesto e terá como herdeiros os espíritos da família que arruinou em vida passada. O safado que iludiu uma moça e a abandonou, em outra vida lhe dará o casamento honrado prometido. E assim por diante. Sim, a tal Justiça Restaurativa é também presente no sistema reencarnacionista previsto pela DE. Estranha-me nunca terem ouvido falar nisso.
    .
    Quanto à lastimável pobreza, bem. Discutindo com um presbítero da Assembleia de Deus, perguntei-lhe se Adolf Hitler, já na Berlim cercada pelos russos, em vez de ficar enfurnado na sua fortaleza, saísse para ver e incentivar suas tropas. Numa dessas, durante um bombardeio, ele se abrigou num porão, onde um pastor protestante fazia uma pregação. Tocado pelas palavras do pastor, ele quis saber mais e no fim aceitou a Cristo, passou pelo batismo, não se suicidou, mas devido à infecção de seus ferimentos, morreu de septicemia pouco depois. Perguntei:
    _ Hitler, sob essas condições, salvar-se-ia ou acabaria no Inferno em vista de todos os crimes que cometeu?
    E o presbítero confirmou que Hitler se salvaria, pois aceitou a Cristo como e seu Salvador. E seus crimes e pecados, sob essas condições, tornar-se-iam nada…
    .
    E aí? Concordam com esse ensinamento cristão? É ele mais rico e aceitável que o proposto pela DE?
    .
    Ex-Toffado, os crimes de guerra e outros eram vistos como coisa NATURAL E ESPERADA pelos povos de antigamente. Já hoje existe uma repulsa mais geral. Note que apesar de TODA a doutrinação antissemítica que os nazistas impuseram ao povo alemão, ainda assim os assassinatos em massa dos judeus e outros tiveram de ser levados EM SEGREDO. Tanto assim, que no Julgamento de Nuremberg, a DEFESA dos réus convocou para depor o antigo comandante de Auschwitz, que calmamente falou dos crimes lá cometidos a ponto de converter a corte num gélido bloco de horror. O motivo da convocação de tal figura foi justamente para abonar a tese de que tudo foi feito em segredo… até dos réus líderes nazistas ali em julgamento.
    .
    O caso da Bósnia foi a mesma coisa, tanto que os sérvios até tentaram mudar as sepulturas coletivas de lugar quando as suspeitas foram levantadas.
    .
    O caso da Síria hoje é um problema… econômico. A Europa está caindo pelas tabelas, a Rússia e a China são países DITATORIAIS, que têm interesses por lá e por isso melam qualquer iniciativa do Conselho de Segurança no sentido de intervir no conflito. O Brasil… o lulopetismo fez a nossa diplomacia virar lixo com o seu ideário esquerdista.
    .
    Então, Ex-Toffado, ainda que não tanto, a humanidade progrediu sim. Só que tem mais uma coisa: os espíritos que realmente se curaram de seus males, não têm mais porque ficarem aqui: vão para mundos melhores e deixam este para os endividados se resolverem ou, ao contrário, comprarem sua passagem para um mundo pior.
    .
    É isso.

  82. Toffo Diz:

    Volto a dizer, Arduin: assim é, se lhe parece. Não dá para discutir artigos de fé.

  83. Marcos Arduin Diz:

    Vejamos o que é possível, seu Zé.
    “Ou seja, terão consciência de como as coisas, de fato, são no Além (e, se de fato há reencarnação, lembrar-se-ão de suas vidas passadas, e de tudo de bom e de mau que porventura fizeram, etc.). ”
    – Apenas para esclarecimento: isso não acontece em todos os graus. Os menos evoluídos pouco sabem de seu passado e têm pouca capacidade de compreender o horizonte no além, pois também ficam limitados a lugares e em meios de se deslocar.
    .
    “terão, ao fim, consciência do que lhes ocorreu, e mais, saberão qual é, afinal, “a Verdade”.”
    – É uma baita simplicação. Essa verdade aí comporta muitas aspas…
    .
    – Lá no Livro dos Espíritos está dito que a autoridade que os espíritos superiores têm sobre os inferiores é IRRESISTÍVEL. E na pergunta seguinte, se eles teriam como resistir a isso, foi novamente enfatizado: _ Eu disse IRRESISTÍVEL. Portanto, sim senhor, os espíritos superiores poderiam sim impedir a manifestação de espíritos inferiores, zombeteiros, fanáticos, etc e tal, que poderiam corromper revelações verdadeiras e nos induzir a erro.
    Contudo, Kardec já sacou isso desde o início. Está no Livro dos Espíritos e em outros escritos dele. Ele mesmo faz a pergunta: _ Não seria lógico que Deus nos mandasse os bons espíritos para nos ensinar e permitisse a comunicação dos maus para nos testar?
    É esse o princípio da coisa. Os ensinamentos dos bons espíritos são as aulas; a intervenção dos safados são as provas teórica e prática.
    .
    Com relação aos critérios para se avaliar as comunicações, meu caro, sugere você algum melhor? Certo, eu suponho que pessoas cultas, educadas, inteligentes, sensatas, etc e tal, ao nos falar, dirão coisas aproveitáveis, numa linguagem clara e concisa. Já um que nos queira enganar, mesmo tendo cultura e saber consideráveis, vai acabar tropeçando em algum lugar. O Ramatis, por exemplo, é réu confesso: diz ele que os espíritos pseudossábios são prolixos e verborrágicos… Exatamente o que ele é.
    .
    Quanto à questão Kardec x todos os outros, isso vai DO GOSTO DE CADA UM. Acho o Kardec o mais lógico e sensato da turma, mas com que direito vou impor isso aos outros? E nem é uma questão de direito: é inviável fazer com que los outros pensem o que gostamos só por nós gostamos. O que posso criticar é quando se misturam alhos com bugalhos e querer insistir que “também é Espiritismo”, como é o caso dos antigos febeanos, que sustentavam que o espiritocatolicismo de Roustaing é uma “pósgraduação” em Espiritismo.
    .
    Como se pôde ver na Copa do Mundo, a voz do polvo é a voz de Deus… Mas com relação a voz dos espíritos e uma suposta maioria, vejamos melhor a coisa. Kardec quis recorrer a um critério de mais consulta, ou seja, usar mais de um médium e consultar mais de um espírito sobre certos ensinamentos. E discutia e exigia explicações, etc e tal. Se isso não teve a amplitude que se gostaria que tivesse, ainda assim foi melhor do que se servir de um só médium e supostamente de um só espírito. Roustaing serviu-se de apenas uma médium e contou com vários “espíritos superiores”, incluindo os dos próprios apóstolos, e montou uma obra espúria, que só foi bem aceita pela FEB por contrabandear dogmas católicos para o Espiritismo. Hercílio Maes, trabalhando SOZINHO, recebeu mensagens de Ramatis e de alguns cupinchas próximos a ele e fez VÁRIAS obras espúrias. Entendeu o problema que Kardec quis apontar?
    .
    Kardec não disse isso em nenhum dos seus escritos, tanto quanto eu saiba, mas ele MATOU A CHARADA DA REVELAÇÃO BÍBLICA. Sacomé: a Bíblia é a PALAVRA DE DEUS, EXATA E INFALÍVEL, ABSOLUTAMENTE VERDADEIRA SOBRE TUDO QUANTO O QUE SE MANIFESTA. Bem, se na sua Santa Madre Igreja já não é mais assim, UM DIA FOI, e ao menos em considerável segmento dos protestantes ainda é. Mas como explicar os absurdos científicos, as leis cretinas e outras tantas coisas censuráveis presentes no texto bíblico? Muito simples: não havia Deus algum ditando a profetas credenciados o que eles deveriam escrever como verdade absoluta. O tal “Deus” eram apenas ESPÍRITOS TRIBAIS, no mesmo nível evolutivo moral e científico de seus pares encarnados. Tal como é hoje, tal como era nos tempos de Kardec.
    .
    Sobre o reencarnacionismo cíclico evolutivo, como eu disse, Kardec viu que nele HÁ LÓGICA. E foi taxativo em afirmar que se não houvesse lógica alguma nele, O REJEITARIA, MESMO SENDO UM ENSINAMENTO DOS ESPÍRITOS. A mim, Zé, só me interessa saber o que de melhor os espíritos não reencarnacionistas opuseram ao reencarnacionismo cíclico evolutivo do Kardec. Apresentaram coisa melhor? Refutaram a lógica de tal ensinamento? Não? Então por que Kardec deveria ser vaquinha de presépio e curvar-se à maioria (suposta ou real) do que diziam os espíritos falantes por médiuns anglossaxônicos? Essa era a diferença entre Kardec e os profetas bíblicos. Enquanto estes só diziam MUUU! ao que lhes era revelado por “Deus”, Kardec se sentia livre para questionar. Em vários parágrafos de suas obras ele salienta a cautela quanto a comunicações recebidas dos espíritos.
    .
    Bem, Zé. Acho que o INVERSO também seria verdadeiro. Os modern spiritualists poderiam escrever a Kardec e questioná-lo sobre essa questão de reencarnação. Quanto a ser científico, meu caro, não vejo como poderia sê-lo neste caso. Ele apenas obtinha comunicações de espíritos que lhe revelavam ter feito tal e qual coisa certa ou errada em vidas passadas e por isso pagaram suas contas assim, assado, frito ou cozido. Kardec não tinha ainda como verificar vidas passadas em pessoas vivas. Isso só aconteceu posterior a ele. E tem mais uma coisa: há diferenças entre a primeira edição do Livro dos Espíritos e a segunda, ou seja, o Espiritismo pode ter surgido em 1857, mas não PRONTO E ACABADO. Infelizmente muito do que se fez no início do Espiritismo está perdido, mas ele é hoje o que é, independente de como tenha começado.
    .
    Zé, o chamado “científico” no Espiritismo tem outra significação que não é a forma de trabalho conforme vista nos tempos modernos e mesmo naqueles tempos antigos. Em geral, o cientista atual, dependendo da área em que atua, trabalha sozinho ou no máximo com a colaboração de colegas próximos. Eu, como assessor de periódicos científicos, já me deparei com trabalhos contendo falhas que até me lembram o que você me descreveu sobre o método de trabalho de Kardec. Quanto a isso, ALGUÉM tinha de fazer o que ele fez: ler, reunir, classificar, compilar e decidir o que seria melhor para se consolidar uma ideia, um conceito, UMA DOUTRINA. Eu não sei o que ficou nas mãos de Silvino Canuto Abreu, que quando passou por Paris, pouco antes de estourar a Segunda Guerra Mundial, recebeu dos espíritas de lá uma série de documentos dos tempos de Kardec para que guardasse, salvando-os de serem destruídos pelos nazistas. E olha que estes destruíram muita coisa que ficou de posse dos espíritas franceses. Canuto Abreu, contudo, manteve o que recebeu em segredo, pois não queria se indispor com a espiritólica FEB, já que entre esses documentos havia coisas contrárias a Roustaing.
    É preciso ter muita fé para ser um espírita segundo você só porque Kardec fez o seu trabalho? Bem, desde que comecei a discutir com o pessoal cético, notei que fé é uma coisa MUITO PRESENTE na mente desse pessoal. Então, em matéria de fé, não saímos perdendo para ninguém.
    .
    Bem, Zé, talvez por você estar influenciado pelo mecanismo de revelação bíblica e/ou dos santos, imagina que se deveria ser assim, com um “padrão” revelativo semelhante em se tratando de espíritos reveladores de verdades do além. A coisa não é assim. O fato de espíritos não estarem limitados pelo corpo carnal não significa que não tenham outras limitações, nem que saibam tudo e se tornem moralmente inatacáveis. E já lhe falei mais de uma vez do PRECONCEITO dos médiuns. Assim como você acusa Kardec de ter sido um artífice individual da Doutrina Espírita, saiba que o mesmo faziam os médiuns anglossaxônicos. Cada um fazia sua própria escola a partir de suas próprias ideias. Em geral, esses médiuns trabalhavam como a tal Srta Japhet, como consultores pagos. Estavam lá pra satisfazer freguesia e não necessariamente fundar uma doutrina. Se eram de formação cristã, mesmo burlando a proibição de falar com os mortos, compreende-se que repudiassem a reencarnação se esta lhes fosse revelada. Já lhe falei do Edgar Cayce a título de exemplo.
    .
    Quanto às suas três hipóteses, Zé, acho que vou me servir do Einstein: “_ Há duas coisas que são infinitas: o Universo e a estupidez humana, e não estou certo quanto ao Universo.” Cada um que escolha a hipótese que melhor lhe agradar e não tenho nada a censurar quanto a isso. Gosto não se discute, lamenta-se. O máximo que posso fazer é ler e analisar o assunto e ver o que as opiniões concordantes ou discordantes dizem e usar DO MEU CRITÉRIO para fazer a minha escolha. Os outros que façam uso dos seus próprios critérios. E vivamos felizes as nossas vidas.
    .
    Só fazendo uma retificação: o Espiritismo NÃO É religião; é uma DOUTRINA FILOSÓFICA COM CONSEQUÊNCIAS MORAIS. Religião é um amontoado de dogmas e rituais que tem por função RELIGAR o homem a Deus. Só que na concepção espírita, NUNCA houve desligamento e, portanto, não há o que religar. Quem fez do Espiritismo uma religião foram os espiritólicos da FEB.
    .
    O científico no Espiritismo RESUME-SE ao estudo do mediunismo. Ao analisar as hipóteses apresentadas para explicar o fenômeno mediúnico, Kardec fez uso de uma avaliação científica, que pode até ser discutível, mas que fazia sentido. Não foi por meio científico que ele chegou a validar a reencarnação. Quanto aos aspectos filosóficos e morais, não me parece que Kardec houvesse dito que INOVAVA quanto a isso.
    .
    Quanto a ESPÍRITOS SUPERIORES, Zé, eles são como o Deus da Bíblia falando a seus profetas credenciados. Certo, Kardec apresentou sua obra magna, o Livro dos Espíritos, como sendo uma revelação de “espíritos superiores”, mas tal como o Deus da Bíblia falando a seus profetas, o TEMPO cuidou de testá-los e em muitos aspectos, NÃO PASSARAM NO TESTE. Daí então, tal como a Bíblia, HÁ REVELAÇÕES DE ESPÍRITOS SUPERIORES, mas NEM TUDO QUE LÁ ESTÁ é essa dita revelação. Assim como me deparo com erros científicos na Bíblia, também me deparo com erros científicos no Livro dos Espíritos. Por que os espíritos superiores não os corrigiram? Lá mesmo está a resposta: não cabe aos espíritos fazer o trabalho que cabe aos gênios fazê-lo. Se a tudo que quiséssemos saber, bastasse perguntar aos espíritos superiores, por esse preço, qualquer imbecil se tornaria um Einstein. Só que os espíritos não fazem o que nos compete: nossa evolução intelectual e moral depende dos nossos esforços. Assim então, quando nos deparamos com erros no LE ou em qualquer outra obra de Kardec, é só incluir uma nota de rodapé de advertência e vamos em frente.
    .
    Vou substituir o exemplo infantil, imbecil e despropositado do Howitt por este outro: a criança entra na creche, brinca, se diverte e aprende algumas coisas, como letras e numerais. Depois vai para o primeiro grau, onde numa série de oito anos aprende várias coisas sobre o seu idioma, matemática, história, geografia, ciências… Depois vai para o ensino médio, onde tais conhecimentos obtidos são revistos de forma um pouco mais profunda. E aí escolhe em qual área quer se especializar e pode fazer vestibular, ir pra faculdade, ou fazer um curso técnico e firmar-se numa profissão, etc etc. Se cuidou de estudar bem, termina esses estudos no prazo estipulado. Se foi reprovado porque não estudou direito, então repete de ano e tem de recomeçar e se atrasa pro seu futuro. Pois bem, transporte isso para a reencarnação cíclica evolutiva. É o que acontece: os espíritos podem aprender e evoluir com as experiências das vidas em que reencarnam ou ficar estacionários e perder o seu tempo. Ficou mais claro agora? Quanto às bobagens ditas pelos anglossaxônicos contra a reencarnação, veja lá: seriam exatamente idênticas as condições de aprendizado e progresso para um espírito que reencarnou como escravo de um nobre da Roma Antiga e para aquele outro espírito que reencarnou como filho de um Lord Kelvin? Entendeu o princípio da coisa ou preciso ser mais claro?
    .
    Zé, você leu o que o Livro dos Espíritos diz a esse respeito do esquecimento do passado? Vou de novo recorrer à escola: a vida de espírito é a AULA TEÓRICA, a vida encarnada é a PROVA PRÁTICA. Só que não é justo fazer uma prova levando uma cola. É através dela que provamos haver aprendido a lição ou não. Não esquecemos ao longo das reencarnações O QUE aprendemos e sim o COMO aprendemos. O esquecimento das vidas passadas NÃO AFETA A MORAL. Falou você em uma tal de LEI NATURAL para me fazer ver que as almas não seriam um ponto zero, como é o princípio inteligente… Bem dois irmãos podem receber os mesmos ensinamentos morais de seus pais. O irmão A vê dinheiro cair do bolso de uma pessoa, sem que esta a perceba, mas ele pega esse dinheiro e o devolve àquela pessoa. Já o irmão B, ao contrário, pega esse dinheiro para si. Por que a tal LEI NATURAL funcionou com o primeiro, mas falhou com o segundo, já que ambos receberam os mesmos ensinamentos? Na concepção reencarnacionista haveria algo a dizer: o irmão A aproveitou melhor experiências que lhe fizeram ver que vale a pena ser honesto; o que ainda não aconteceu com o irmão B.
    O esquecimento do passado é FUNDAMENTAL para que o espírito manifeste suas tendências reais. É como o ditado corrigido: a ocasião REVELA o ladrão. Então o espírito solicita uma prova perigosa, como por exemplo, ser um fazendeiro rico por herança, comprometendo-se a ser justo com seus empregados e vizinhos e não se deixar levar pela ganância. Se ele reencarnasse com plena lembrança desse compromisso, então o cumpriria, pois estaria ciente das consequências se falhar nela. Mas aí é como fazer a prova com a cola na mão. Sem essas lembranças, começando aparentemente do zero, ele mostrará suas disposições íntimas REAIS. Se de fato venceu em sua consciência o egoísmo e a ganância, então será bem sucedido na prova por ele escolhida. Mas se apenas PENSA que venceu essas coisas, muito provavelmente fracassará nesta prova. Vai achar que sua fortuna é sua mesmo e só tem que gastar consigo mesmo e que se dane se empregados estão com filhos doentes, ou mal conseguem sustentar suas famílias, etc e tal. E deixará na Terra a sua herança material e levando para o mundo espiritual um bando de desafetos ressentidos. Vai ter muito mais dor de cabeça agora e muito mais dificuldades para reparar os erros que acumulou. E se queixará lá no mundo espiritual:
    _ Mas eu não sabia que as coisas eram assim…
    E a resposta que terá:
    _ Mas você aprendeu o catecismo, teve muitos ensinamentos contrários à ganância e a ajuntar tesouros que as traças roem, não os pôs em prática por quê? Só lhe cabe dizer: “Agora você acreditou, Tomé, porque viu; felizes os que não viram e creram.”
    .
    Sobre livre arbítrio, meu caro, andam por aí umas teses meio estranhas a dizer que ele não existe, mas nem as conheço direito. O espírito tem o livre arbítrio de escolher sua missão, mas uma vez encarnado, não pode mais recuar da sua escolha. Faz sentido, não? Ainda quanto a isso, na Reforma houve um dilema interessante. Lutero, fundamentando-se nos textos paulinos, formulou a tese do “de servo arbitrio”, entendendo que Deus nos predestina a sermos o que somos. Lembra lá o exemplo de Paulo sobre os vasos de barro, onde uns são para fins nobres (guardar azeite, por exemplo) e outros para fins vergonhosos (guardar bosta, por exemplo) e não cabe ao vaso nesta condição questionar o oleiro de porque motivo foi feito para esse fim. Mas Lutero não tinha como conciliar tal imposição Divina com a Justiça Divina. Se um bebê recém nascido foi predestinado a ser católico, luterano, judeu, muçulmano, herege, soldado, bandido, trabalhador ou ladrão etc e NADA pode mudar isso, então que culpa tem as pessoas que estão nessas condições? Como dizer que Deus é justo dessa forma? Lutero não sabia responder. Deixou a questão para:
    _ Ser-nos-á revelado quando estivermos diante de Deus.
    É a mesma resposta que ouvi em livros protestantes contra a reencarnação quando todas as desculpas para justificar o sofrimento humano falhavam.
    Já outro clérigo, Desidério Erasmo, defendia o “de libero arbitrio”, no qual entendia que não somos predestinados, e podemos fazer de nossas vidas o que escolhemos fazer, para bem ou para o mal. Mas Erasmo também topava com um problema: como um débil mental pode fazer escolhas conscientes? Quanto livre arbítrio ele teria? Ambos, Lutero e Erasmo, ficaram sem saber como resolver essas questões, pois lhes faltava a chave: a reencarnação.
    .
    Os atos que cometemos em nossa vida atual, de nossa livre escolha, para o bem ou para o mal, CRIARÃO UM DETERMINISMO para o futuro desta mesma vida ou para as vidas seguintes. Diz você que as punições só têm efeito pedagógico apenas se forem correlacionadas conscientemente ao ato que lhes deu causa. Mas reencarnação não é apenas punição: é o recurso para possibilitar a aprendizagem do espírito. Isso exige o esquecimento do passado. Então caberá ao espírito, ao retornar à vida espiritual, inteirar-se do que motivou o seu sofrimento. Além disso, ao contrário do que se possa imaginar, não há um tribunal celeste que define os veredictos e as penas: os espíritos estão diante de suas consciências e de seus desafetos. São eles que vão resolver as pendências conforme seus respectivos graus evolutivos.
    .
    Sua queixa sobre estamos aqui sofrendo sem livre arbítrio por conta de provas escolhidas ou de erros a pagar só esbarra num problema: estamos aqui de fato sofrendo em maior o menor grau, tendo apenas explicações de causas físicas, biológicas, genéticas, etc e tal, mas SEM NENHUM HORIZONTE MORAL para elas. Isso é FATO. Aquele que nasce com Mal de Parkinson, com hemofilia, ou outra doença genética qualquer que lhe causa muito sofrimento, pode no máximo saber da causa genética e só. Mas por que ele teve de levar essa vida sofrida, enquanto seus irmãos, carnais ou não, são perfeitamente normais e felizes? Chiar contra o que propôs Kardec não vai tornar as coisas melhores. Como eu disse, não pretendemos que tais circunstâncias estejam plenamente resolvidas, mas cremos que a maior luz sobre esse problema veio justamente desta proposta reencarnacionista do Kardec, como queira. Pretende ter você uma resposta melhor? Já ouvi coisas do tipo:
    _ Os nossos sofrimentos são a parte que pagamos a Cristo pelo que ele sofreu por nós.
    Só que uns pagam mais e outros pagam BEM MENOS. Qual o critério de escolha para esse pagamento? Ou esta advertência que me fez uma jovem católica quando eu lhe disse que minha vida é feliz, sem sofrimentos:
    _ Deve ter cuidado! Uma história, nada a ver com o Espiritismo, diz de uma mulher que também teve uma vida toda feliz e foi pro Inferno. Em sonho, ela teria revelado a uma amiga que sua vida feliz foi a paga que Deus lhe deu pelas boas ações que praticou…
    .
    A palavra agora é sua.

  84. Antonio G. - POA Diz:

    Arduin, seus argumentos são interessantes, sem dúvida. Mas eles têm um problema: Partem do prossuposto de que “tem que haver, afinal, justiça”. Aí é que eu acho que eles estão errados. Seria ótimo que realmente a justiça sempre fosse feita, nem que fosse lá no último capítulo, como acontece nas novelas (nem sempre, todavia). Mas “na vida real”, não é assim. O universo não tem qualquer compromisso com a justiça. As coisas simplesmente são assim ou assado, justas ou injustas. Aleatoriamente. Tão casualmente quanto foi o ato da sua e da minha concepção. Você poderia jamais ter nascido, mas um acaso determinou que você estivesse aqui, abrilhantando o blog com sua inteligência. E eu, “enchendo o seu saco”. Tudo por mero acaso, por mais estranho que pareça. Mas você pode acreditar que existe uma vontade inteligente por trás de tudo. Um “maestro”. Eu acho que não.
    .
    Sds

  85. Antonio G. - POA Diz:

    Na 2ª linha: “prossuposto” foi uma injustiça aleatória.

  86. Gorducho Diz:

    Daí então, tal como a Bíblia, HÁ REVELAÇÕES DE ESPÍRITOS SUPERIORES, mas NEM TUDO QUE LÁ ESTÁ é essa dita revelação. Assim como me deparo com erros científicos na Bíblia, também me deparo com erros científicos no Livro dos Espíritos.
    O que é Revelação de “Espíritos Superiores”?

  87. Gorducho Diz:

    Dos dogmas que identifiquei na Religião Kardecista: {Deus Escolástico, Reencarnação Romântica, Lei do Progresso, Código Penal dos defuntos, Fluídos}; só o código penal dos finados [O Céu e o Inferno, FEB, cap VII, pg 90] não identifiquei a fonte. Talvez seja isso então o que os “Espíritos Superiores” “Revelaram” ao Kardec…

  88. Marcos Arduin Diz:

    Eu sei, Antonio Gê de Porto Alegre e Saltitante.
    Podemos ficar sim com essa postura de que a coisa existe por existir, sem uma causa oriunda de um causador inteligente. Esta é uma postura contra a qual nada posso dizer. Quem está satisfeito com ela, está.
    .
    Eu me dirijo aos que vão além dessa postura, querendo ver algum sentido na vida, algo que lhe defina um horizonte moral. E também não tenho porque criticar escolhas outras que não as mesmas que fiz, pois como já disse: gosto não se discute, lamenta-se.

  89. Toffo Diz:

    Não entendi uma coisa: por que para ver um sentido na vida, um horizonte moral, é necessário acreditar que há uma inteligência suprema que tudo criou, que há uma justiça perfeita e acabada (que nunca vimos), que tenha uma religião? Não seria possível dar o melhor sentido à vida, fazendo dela a mais útil para a coletividade, acreditando que a vida é algo raro e precioso e, portanto, é necessário vivê-la da melhor forma possível, sem acreditar em Deus e em religião alguma? Viver uma vida impoluta e inatacável sendo o mais empedernido dos céticos? Acho que moralidade nada tem a ver com teísmo ou religiosidade.

  90. Antonio G. - POA Diz:

    Certo, Toffo. Como eu já disse outra vez, solidariedade, respeito e decência não têm relação direta com o grau de religiosidade do sujeito. Existem pessoas religiosas boas e más. Assim como existem céticos bons e maus. Algumas das melhores pessoas que eu conheci são totalmente céticas, não acreditam em Deus e querem distância das religiões. E, entre os indivíduos mais abjetos que eu tive o desprazer de cruzar estão alguns “cristãos de carteirinha”. Entre estes, católicos, espíritas, evangélicos, mormons, etc.
    Também não entendo porque é que “tem que haver” um criador e um propósito para a existência. Especialmente porque não existe nenhum indício de que haja. Mas, como diz o Arduin, gosto não se discute. E eu nem digo que lamento. Eu realmente defendo o direito de cada um crer no que bem entender. Só lastimo, mesmo, pelas crianças. Deveria haver uma lei contra envolvê-las nesta confusão toda.

  91. Marcos Arduin Diz:

    Ex-Toffado…
    Sabe, eu tenho um corsa velho, de 1997, mas pouco rodado, com ar condicionado e direção hidráulica. Por ele ter sido pouco rodado em vista do falecimento do antigo proprietário e da demora do inventário, tive alguns problemas mecânicos, mas que foram resolvidos. Pois bem… Sou porcão, mas da parte mecânica eu não descuido. Se o motor aguentar bem e o resto também, não sofrer nenhum acidente, nem nada, meus planos são entregá-lo ao ferro velho quando já não achar mais peças de reposição. Não sei se isso levará uns 20 anos, mas tomara.
    Veja então que minha necessidade é apenas de transporte. Meu carro serve só pra isso. Não tenho a menor necessidade de me exibir, de trocar de carro a cada três ou quatro anos. Sou como o Garrincha. Sua esposa, um atriz cheia de grana, deu-lhe de presente uma mercedes. Ele, para contentar a mulher, deu uma volta no quarteirão com ela. Mas diz a lenda que esta foi a única vez que a usou. Pensava ele:
    _ Pra quê vou sair com essa cara mercedes, se meu fusquinha me leva onde quero ir?
    .
    Então, Ex-Toffado, as necessidades das pessoas são distintas. O que é necessário para uma é supérfluo para outra. E por mais que haja intelectualizados e sorbonizados que proclamem a não necessidade e até a malignidade da religião, esta está enraizada na necessidade das pessoas. Faz parte delas, gostemos ou não. Alguns países podem ter baixo índice de religiosidade, como os escandinavos. Já outros, como os EUA, têm uma ampla porcentagem de gente cheia de muita fé, inclusive de que o Universo tem só 6.000 anos de existência…
    .
    Então vai uma dica pra você e por Antônio de Porto Alegre e Saltitante: é inútil discutir as necessidades das pessoas, pois nem sempre elas podem ser definidas por parâmetros lógicos-racionais.

  92. Marcos Arduin Diz:

    Balofo…
    “O que é Revelação de “Espíritos Superiores”?”
    – O que pode ser válido a toda a Humanidade, sem se deter a questões particulares de credo ou cruz credo.
    .
    “Dos dogmas que identifiquei na Religião Kardecista: {Deus Escolástico,”
    – Há algum problema nessa concepção de Deus? Como é dito lá no LE, do ponto de vista humano, essa seria a concepção mais completa que cabe na mente do ser humano. Porém já veio a advertência de que há atributos e qualidades que DESCONHECEMOS em vista de nosso limitado progresso.
    .
    “Reencarnação Romântica,”
    – Defina reencarnação romântica. E por que seria romântica? Seria porque Kardec a concebeu durante o período em que estava em voga movimento de arte Romantismo?
    .
    “Lei do Progresso,”
    – Algum problema?
    .
    “Código Penal dos defuntos,”
    – Pois é: já que eram os defuntos que davam as comunicações, nada mais lógico do que nos revelar o que se passava com eles quando pisavam na bola.
    .
    ” Fluídos};”
    – Bem, isso era uma concepção do fluxo energético, cuja natureza e mecanismo ainda era desconhecidos. Chamavam de fluidos (sem acento, a pronúncia é flúidos) em referência a coisas de FLUEM, se deslocam de forma não visível. Por isso falam em “fluido elétrico”, “fluido magnético”, etc. Simplesmente um problema científico da época. Mais nada.
    .
    “só o código penal dos finados [O Céu e o Inferno, FEB, cap VII, pg 90] não identifiquei a fonte. Talvez seja isso então o que os “Espíritos Superiores” “Revelaram” ao Kardec…”
    – Não necessariamente: foram os próprios falecidos que relataram suas experiências.

  93. Antonio G. - POA Diz:

    Arduin,
    Desde que poupem as crianças das aulas de catecismo e evangelização, para mim, está tudo bem.
    Sds.

  94. Gorducho Diz:

    Não necessariamente: foram os próprios falecidos que relataram suas experiências.
    Eu me admiro e louvo a paciência do Napoleão III – talvez em consideração à alma do tio que trabalhou como consultor… Se me aparecesse um cara com um Code Pénal de les Fantômes eu emitia na hora uma lettre de cachet remetendo o Autor pra Salpêtrière…
    Agora, de saco-para-mala, se alguém precisa de crenças para se manter consolado e esperançoso dentro desse Universo doido, ok… É uma maneira de se acomodar ao meio hostil. Até entendo.

  95. Marcos Arduin Diz:

    E quando as próprias crianças perguntam sobre Deus e as outras coisas relacionadas (sabe, não dá pra colocá-las numa redoma e isolá-las do Mundo…)? Devo me recusar a responder, ou inventar mentiras a la Papai Noel, chamar o Dawkings…?
    .
    IH, Balofo… O que têm os Napoleões a ver com os leões? Acomodar-se ao meio hostil… Bem, o General George Smith Patton Jr foi uns dos melhores táticos americanos, era um homem de coragem, pedante, orgulhoso, avesso à informalidade americana, etc e tal… Mas tinha um costume estranho: em seu quarto, AJOELHAVA-SE e orava com muita fé a Deus. Será que foi Deus quem lhe deu as dicas para vencer as batalhas e ser o mais temido dos generais entre os alemães? E ser inclusive o único general aliado que era chamado entre os alemães por um posto equivalente (Armeegruppen Patton)? Os evangélicos falam, comovidos, daquela vez em que o Brasil ganhou a Copa e os jogadores, dirigentes, técnico & Cia Bela se ajoelharam no campo em agradecimento a Deus… E agora na Olim Piada de Londres, também houve a oração da vitória…
    .
    Bem, a meu ver Deus nada teve a ver nem com a guerra que Patton travou, nem com as vitórias dos nossos atletas (e derrotas também: Diego Hipólito diz que não venceu pois foi a… vontade de Deus).
    Mas as necessidades psicológicas dos seres humanos são distintas entre si. E tenho dificuldades de acreditar que de fato não exista ninguém neste Universo doido que não precise de crenças. Afinal se o Universo é doido…

  96. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Então, caro sr. Arduin, vamos às minhas palavras. Para facilitar, seguirei sua linha de raciocínio, citando os trechos pertinentes de sua última mensagem.

    O sr., inicialmente, enfatiza o parco grau de compreensão que, mesmo na Ultratumba, têm os “espíritos menos evoluídos” (que eu posso, creio, supor que sejam A MAIORIA numérica dos espíritos, não?). Nesse caso, não se poderiam tomar suas mensagens (ou, ao menos, as suas informações acerca de como são as coisas “do lado de lá”) como verdadeiras, quer por ignorância, quer por malícia, quer por zombaria, quer por uma mistura desses três sentimentos.

    Muito bem. Mas isso não influi, absolutamente, no fato de que ALGUMA COISA acontece aos espíritos na Ultratumba (de novo, supondo que espíritos existam; que sobrevivam à morte física de seus “invólucros materiais”, vulgarmente chamados “corpos físicos”; que mantenham, mesmo após abandonarem o referido invólucro, suas personalidades; e que possam se comunicar sensorial e fisicamente conosco, a partir de sua vontade, e mediante certas pessoas dotadas de qualidades especiais, os “médiuns”). Ou seja, apesar da ignorância, ou da malícia, de (muitos?) espíritos, há algo que, EFETIVAMENTE, acontece, há uma “Verdade”. Ou reencarnamos cíclica, purgativa e evolutivamente, ou não. “Tertium non datur”…

    E, se a estupidez ectoplasmática é uma mera continuação da estupidez humana física, como o sr. assevera, eu lhe pergunto: como saber quais as mensagens que devem ser consideradas? Aquelas mensagens que informam acerca dum reencarnacionismo cíclico evolutivo, p.ex., são oriundas de “espíritos superiores” ou, ao contrário, vêm de “espíritos confusos/tapados/maliciosos/zombeteiros”? Como se pode, inequivocamente, estabelecer isso?

    Estou falando de critérios efetivamente objetivos e operacionais, sr. Arduin; não me venha com “lógica”, porque:

    a) tal conceituação (“lógica” e “bom senso”) é, como já comentei, e demonstrei, bastante subjetiva – o que uma pessoa acha “lógico” (podendo apontar boas razões para tanto), outra não acha (também podendo apontar boas razões para isso). Assim, p.ex., uma pessoa pode asseverar que o reencarnacionismo cíclico evolutivo é “lógico”, porque permite sempre uma nova chance à alma (ao contrário duma danação eterna), dando-lhe oportunidade de melhorar (e isso é, de fato, um forte argumento lógico), ao passo que outra pode contrapor afirmando que, sem o conhecimento do que se está purgando, ou da missão que se está efetivando, não há nenhuma possibilidade de aprendizado, já que o aprendizado pressupõe o conhecimento do erro (e isso também é um forte argumento lógico);

    b) não é por ser (pretensamente) “mais lógica”, ou “mais consoladora”, ou mesmo “mais útil” que uma informação acerca da Ultratumba é, necessariamente, verdadeira. Repito: VERDADEIRO É O QUE OCORRE, DE FATO, NA ULTRATUMBA, SEJA OU NÃO “LÓGICO” (para nós), SEJA OU NÃO “ÚTIL” (para nós), SEJA OU NÃO “CONSOLADOR” (de novo, para nós…); igualar “lógico” (que já é, por si só, um conceito subjetivo, e que, na prática, é “o que nos agrada, e o que nos parece razoável”) a “verdadeiro” não passa ou de arrogância, ou de “wishful thinking”;

    c) enfim, se o que vale é a (nossa) “lógica” e “bom senso”, então não há nenhuma necessidade de se evocarem espíritos – pois os consideraremos “bons” se se alinharem com nossa lógica, ao passo que os descartaremos se não o fizerem; por conseguinte, a evocação é algo absolutamente secundário, e mesmo desnecessário, já que não levaremos em conta o que dizem os espíritos, mas sim o que a nossa “lógica” e o nosso “bom senso” ditarem. A evocação, assim, para todos os efeitos práticos, passa a ser apenas um adereço, uma “mise-en-scène” maravilhosa para “fisgar” adeptos, na melhor das hipóteses uma “ancilla fidei”, QUE APENAS CONFIRMA O QUE JÁ SABEMOS, MAS QUE NÃO SERVE, ABSOLUTAMENTE, PARA NOS ENSINAR O QUE NÃO SABEMOS. Algo inútil, portanto, como fonte de conhecimento (embora não como fonte de espetáculo…), sendo que podemos perfeitamente construir toda uma teoria “reencarnacionista” (como Plotino), ou mesmo “reencarnacionista evolutiva” (como Leroux e Reynaud) sem evocarmos um único “espírito” sequer…

    Portanto, sr. Arduin, informe-me os critérios, critérios objetivos e operacionais, que os espíritas devem, ou deveriam, utilizar para separar o trigo do joio. Pois há “espíritos” e “espíritos” – como, aliás, eu mesmo já havia apontado. Então, volto a perguntar-lhe: como estabelecer, operacionalmente, a “verdade”?

    Continuando: em sua mensagem, caríssimo sr. Arduin, o sr. diz que, conforme a doutrina kardecista, “a autoridade que os espíritos superiores têm sobre os inferiores é IRRESISTÍVEL”. Ou seja, poderiam, se quisessem, impedir (ou, no mínimo, reduzir substancialmente) a manifestação de espíritos inferiores, zombeteiros, etc.

    Por que, então, raios, não o fazem?

    A “explicação” de que Deus (ou o Inefável Incorpóreo, ou o Uno, ou a Suprema Ordem Universal, ou qualquer outro nome que se lhe queira dar) “manda os espíritos bons para nos ensinar, e os espíritos mais para nos testar” não tem sentido; tal farrapo de justificativa teria (algum) peso se, de fato, houvesse um meio de, se não inequivocamente, ao menos com um bom grau de plausibilidade, poder separar as mensagens “boas” das mensagens “más”. E eu volto a perguntar-lhe, sr. Arduin: QUAL É ESSE MEIO? QUAL É ESSE CRITÉRIO?

    Pois note bem: os espíritos “superiores” têm poder IRRESISTÍVEL sobre os inferiores; não obstante, deixam que esses últimos “façam a festa”, enganando as pessoas. Que tipo de aprendizado é esse? Mais, que tipo de exigência se pode, nesse caso, fazer aos pobres mortais? Como então culpar os seres humanos quando, de boa-fé, levam em consideração comunicações pretensamente “espirituais” oriundas de “espíritos inferiores” como se fossem de espíritos “superiores”, quando não há NENHUM CRITÉRIO OPERACIONAL viável para as distinguir, e quando os que poderiam ajudá-los, os tais benfazejos espíritos “superiores” se recusam a usar seu “irresistível poder”?

    Levando isso ao extremo: como pode essa mesma informação passada a Kardec (a de que os “espíritos superiores” têm poder “irresistível” sobre as manifestações dos “inferiores”) ser, no duro, considerada como ela própria tendo emanado de “espíritos superiores”? Pode ter sido, mas também pode não ter sido – qual o critério efetivo para provar quer uma hipótese, quer outra? Além do ASQEKEESMMM (“Acredite Se Quiser Em Kardec E Em Suas Médiuns Moçoilas Mesmerizadas”), o que mais há para apoiá-la? Nada. Nada. Nada.

    Percebe agora o beco sem saída que é o conjunto das (pretensas) comunicações mediúnicas, sr. Arduin, sem um critério efetivo de validação? O sr. não tem MEIO NENHUM de verificar se uma mensagem, qualquer mensagem, é ou não oriunda dum “espírito superior” e, portanto, “digna” e “verdadeira” (isso, claro, supondo-se de antemão que haja mesmo “mensagens” de espíritos); na prática, ou o sr. apela à quantidade, ou apela à lógica. Se apelar à quantidade, pode ser facilmente refutado com o argumento de que “maioria” não significa necessariamente “verdade”; se apela à lógica… bem, já vimos o que isso significa.

    Não há saída dessa contradição. Pois, a menos que se possa estabelecer a) um consenso inequívoco, nas mensagens, acerca do que é a Ultratumba, ou então b) um critério OPERACIONAL e OBJETIVO de seleção de mensagens “boas”, todo o edifício do Espiritismo desaba. Quanto a “a”, já se viu que não houve um consenso (ou melhor, Kardec NÃO SEGUIU o consenso primitivo, preferiu o ponto-de-vista, então ainda minoritário, de seu conventículo de sonâmbulas adolescentes parisienses…); quanto a “b”, bem, ainda estou esperando o tal critério… Mostre-m’o, sr. Arduin!… Faça a luz brilhar nas trevas de minh’alma!…

    De fato, volto a afirmar, a única chance minimamente operacional de se conseguir construir algum tipo de consenso seria apelar para a maioria, para o “consenso das comunicações” – AINDA MAIS SE, COMO O SR. MESMO DISSE, OS ESPÍRITOS “SUPERIORES” TÊM UM PODER “IRRESISTÍVEL” SOBRE AS MANIFESTAÇÕES DOS “INFERIORES”.

    Se isso fosse verdade, então poder-se-ia tirar algum tipo de ensinamento consensual – que seria, volto a repetir, o do espiritismo anglo-saxão. Porque, de novo, além do ASQEKEESMMM, não há nada, absolutamente NADA, que apóie a doutrina kardecista. Já o Espiritismo anglo-saxão, antes mesmo de Kardec começar a escrivinhar, na solidão de sua meditação, a Codificação, já possuía quase dez anos de manifestações espirituais…

    E que belos espíritos “superiores” são esses, que deixam os seres humanos deliberadamente vagar às tontas, errando e se enganando não por incúria ou maldade, mas justamente por tentarem entender o sobrenatural e dele obter conhecimento moral – única e exclusivamente porque (sabe-se lá a razão…) os “espíritos superiores” não usam o seu “irresistível” poder para definir os contornos doutrinais…

    Note bem, sr. Arduin, quando me refiro à definição de contornos doutrinais, não estou em absoluto falando de revelações bombásticas, como a cura de doenças, ou a predição de desgraças, ou a confecção de teorias físicas – não, nada disso, não estou falando de coisas que competem a nós, aqui, fazermos; estou falando, única e exclusivamente, dos contornos gerais do que ocorre na Ultratumba, ainda mais levando-se em conta que, caso haja mesmo reencarnação, disso não nos lembramos aqui nesta vida mortal. Parece que esses bondosos “espíritos superiores” têm um prazer especial em fazer com que as pessoas errem: durante quase dez anos (c.1848-1857) abstiveram-se de qualquer manifestação, deixando consolidar-se nos EUA e na Inglaterra, os berços do Espiritismo, e até mesmo na França, uma visão não-reencarnacionista (escola de Piérart), para só então darem o ar de sua graça num conventículo parisiense dum tal de professor Rivail…

    O que é mais “lógico”, sr. Arduin: supor tudo isso, ou supor que, simplesmente, não houve comunicação alguma (ou virtualmente nenhuma) com a Ultratumba?

    Continuando: com relação aos critérios de avaliação das comunicações, o sr (retoricamente) me pergunta se eu poderia sugerir outro melhor, além dos três elencados (“linguagem digna e nobre”, “lógica e bom senso” e “consenso das comunicações”). Ora, sr. Arduin, não compete a MIM elencar um critério melhor; são os ESPÍRITAS, que postulam a possibilidade de comunicação entre os vivos e os mortos, a partir da vontade de pelo menos uma das partes, e mediante o concurso de pessoas dotadas de poderes especiais a esse respeito, os “médiuns”, que devem fazê-lo. Eles (e o sr. incluído), que criaram e/ou seguem tal doutrina, que elaborem os indispensáveis critérios de autenticação… Esse é o SEU fardo, não o MEU.

    Pois, para mim, sr. Arduin, nenhuma dessas (pretensas) comunicações advém dos “espíritos dos mortos”, porque, para mim, as almas dos mortos, sendo imateriais, não têm como atuar no mundo físico. Se antes atuavam (quando as pessoas estavam vivas), o faziam mediante o “espírito” (“pneuma”, “spiritus”), que é uma “força vital” IMPESSOAL diretamente oriunda de Deus, e que mantém “alma” (“psychê”, “anima”) e “corpo” (“sôma”, “corpus”) por assim dizer unidos e funcionalmente operantes como um conjunto. Deus pode fazer isso porque, tendo criado tanto o mundo material quanto o mundo imaterial, tanto o mundo físico quanto o mundo metafísico, tanto o mundo corpóreo quanto o mundo incorpóreo, Ele os contém e em ambos está presente. Com a morte, retirado o “espírito” (i.e., a “força vital”, o “pneuma”, “spiritus”), a alma simplesmente não tem mais como atuar no mundo físico por sua própria vontade. Há várias passagens das Escrituras que dão apoio a essa visão; e ela também pode ser obtida, independentemente, quer em Aristóteles, quer mesmo nalgumas visões ainda mais antigas (p.ex., o “ba” e o “ka” dos antigos egípcios). Não vou me alongar nisso. O que quero dizer é que, em termos “lógicos”, não há como explicar, numa visão dualista e simplificada do ser humano (“corpo e alma”) o modo pelo qual algo imaterial, como a alma, consiga atuar sobre qualquer coisa que esteja ainda no mundo material, espaço-temporal. Volto a citar aquele trecho de Leonardo da Vinci:

    “Ó matemáticos, esclarecei bem tal erro: o espírito não tem voz, porque onde há voz deve haver um corpo, e onde há um corpo o espaço tem de ser ocupado, e isso impede o olho de ver o que se encontra por trás desse corpo; portanto, o ar circundante é preenchido por esse corpo, ou seja, pela sua imagem. E não pode haver voz onde não há movimento ou percussão do ar; não pode haver percussão do ar onde não há um instrumento, e não pode haver um instrumento incorpóreo. Portanto, um espírito não pode ter nem voz, nem forma e nem força. Ainda, se o espírito assumir um corpo, ele não poderá igualmente penetrar ou entrar onde as passagens se encontrem obstruídas. E, quanto àqueles que afirmam que um espírito pode mover-se pelo ar, comprimindo-se e compactando-se à vontade, assumindo corpos de muitos formatos, e desse modo podendo comunicar-se e mover-se – para esses eu replico que onde não há nervos e ossos não pode haver uma força, de qualquer espécie que seja, que venha a ser exercida, ou movimento, de qualquer tipo que seja, que venha a ser efetivado, por esses espíritos imaginários. É necessária cautela com tal tipo de especulação, pois ela não é confirmada de modo algum pela experiência”. (cf. Richter, Jean-Paul, “The Notebooks of Leonardo da Vinci”, vol. II, itens 1.211 e 1.212, págs. 303 e 304, Dover Publications, Nova York, s/d., tradução livre minha. A palavra “espírito”, nesse trecho, está sendo utilizada na acepção comum de “ser incorpóreo”).

    Para realizar a “interação” entre o “espírito” (i.e., entre a “alma não encarnada”) e o corpo, o Kardecismo criou o conceito de “perispírito”, que nada mais é do que uma extrema simplificação do conceito dos “veículos” (“ochêmata”) ou “corpos astrais” que, desde Numênio de Apaméia, vinha se desenvolvendo no neo-platonismo:

    “… envolve-o [o espírito] uma substância, vaporosa para os teus olhos, mas ainda bastante grosseira para nós; assaz vaporosa, entretanto, para poder elevar-se na atmosfera e transportar-se aonde queira. Envolvendo o gérmen de um fruto, há o perisperma; do mesmo modo, uma substância que, por comparação, se pode chamar perispírito, serve de envoltório ao Espírito propriamente dito”. (“O Livro dos Espíritos”, questão nº 93)

    Quanto a esse “perispírito”, ele é formado “… do fluido universal de cada globo, razão por que não é idêntico em todos os mundos. Passando de um mundo a outro, o espírito muda de envoltório, como mudais de roupa”. (“O Livro dos Espíritos”, questão nº 94)

    E, no que concerne à natureza desse perispírito, é digno de ser citado o seguinte comentário:

    “Numerosas observações e fatos irrecusáveis, de que mais tarde falaremos, levaram à conseqüência de que há no homem três componentes: 1º, a alma, ou Espírito, princípio inteligente, onde tem sua sede o senso moral; 2º, o corpo, invólucro grosseiro, material, de que ele se revestiu temporariamente, em cumprimento de certos desígnios providenciais; 3º, o perispírito, envoltório fluídico, semimaterial, que serve de ligação entre a alma e o corpo. A morte é a destruição, ou, antes, a desagregação do envoltório grosseiro, do invólucro que a alma abandona. O outro se desliga deste e acompanha a alma que, assim, fica sempre com um envoltório. Este último, ainda que fluídico, etéreo, vaporoso, invisível, para nós, em seu estado normal, não deixa de ser matéria, embora até ao presente não tenhamos podido assenhorear-nos dela e submetê-la à análise. Esse segundo invólucro da alma, ou perispírito, existe, pois, durante a vida corpórea; é o intermediário de todas as sensações que o Espírito percebe e pelo qual transmite sua vontade ao exterior e atua sobre os órgãos do corpo. Para nos servirmos de uma comparação material, diremos que é o fio elétrico condutor, que serve para a recepção e a transmissão do pensamento; é, em suma, esse agente misterioso, imperceptível, conhecido pelo nome de fluido nervoso, que desempenha tão grande papel na economia orgânica e que ainda não se leva muito em conta nos fenômenos fisiológicos e patológicos. Tomando em consideração apenas o elemento material ponderável, a Medicina, na apreciação dos fatos, se priva de uma causa incessante de ação. Não cabe, aqui, porém, o exame desta questão. Somente faremos notar que no conhecimento do perispírito está a chave de inúmeros problemas até hoje insolúveis. O perispírito não constitui uma dessas hipóteses de que a ciência costuma valer-se, para a explicação de um fato. Sua existência não foi apenas revelada pelos Espíritos, resulta de observações, como teremos ocasião de demonstrar. Por ora e por nos não anteciparmos, no tocante aos fatos que havemos de relatar, limitar-nos-emos a dizer que, quer durante a sua união com o corpo, quer depois de separar-se deste, a alma nunca está desligada do seu perispírito”. (“O Livro dos Médiuns”, 2ª parte, capítulo I, item 54)

    Bela ciência, não?

    Assim, o perispírito é de natureza “semimaterial” (o que não quer dizer muita coisa, e apenas “desloca” o problema da interação entre o material e o imaterial em mais uma etapa, não o resolvendo em absoluto – afinal, como é que uma parcela “material” e outra “imaterial” interagem para formar algo “semimaterial”, como é o perispírito?).

    E quanto à alma?

    “Quanto à natureza íntima da alma, essa desconhecemo-la. Quando se diz que a alma é imaterial, deve-se entendê-lo em sentido relativo, não em sentido absoluto, por isso que a imaterialidade absoluta seria o nada. Ora, a alma, ou o Espírito, são alguma coisa. Qualificando-a de imaterial, quer-se dizer que sua essência é de tal modo superior, que nenhuma analogia tem com o que chamamos matéria e que, assim, para nós, ela é imaterial”. (“O Livro dos Médiuns”, 1ª parte, capítulo IV, item nº 50)

    O trecho acima é paradigmático, e trai a essência CORPOREÍSTA, ou seja, MATERIALISTA, do Espiritismo Kardecista. Pois torna-se assim evidente, considerando-se os trechos citados, mais especialmente o último, que a “resposta” kardecista à dificuldade lógica da interação alma-corpo, ou seja, da interação entre algo que é “imaterial” e algo que é “material”, por baixo duma série de termos ambíguos que procuram manter um verniz espiritualista, é francamente materialista. Com efeito, o ser humano é composto por um corpo, um perispírito e um espírito. O corpo, obviamente, é material; o perispírito é dito “semimaterial”, misto entre a condição do espírito (dita “imaterial”) e a do corpo (dita “material”), possuindo, ao menos em parte, natureza “material”; mas, como ele é formado “do fluido universal de cada globo”, parece ter, ao fim e ao cabo, uma constituição inteiramente material, embora não tão “material” quanto a da “matéria grosseira” de que os corpos são constituídos. E mesmo o adjetivo “imaterial” atribuído ao espírito/alma não pressupõe (para o Kardecismo) nenhuma “transcendência”, já que o espírito “é alguma coisa”, como bem diz o “Livro dos Médiuns” no trecho citado imediatamente acima – e, lendo-se o trecho, é evidente que se quer dizer ALGUMA COISA MATERIAL (embora o Codificador, ou os “espíritos” que o informaram, não tenham tido a coragem de dizer isso abertamente).

    Assim, trata-se, no fundo, em todos esses casos (espírito, perispírito, corpo…), de graus diferentes de materialidade, ou melhor, de corporeidade, graus esses que, num crescendo de sublimação, passam da matéria “bruta”, grosseira a níveis cada vez mais etéreos nos diversos estágios de perispírito, até se chegar a uma forma totalmente “quintessenciada” na alma/espírito.

    Portanto, para o Kardecismo, quando se o examina bem, TUDO É MATERIAL, tudo encontra-se no nível do corpóreo, embora com graus diferentes de “sublimação”. A escala evolutiva funcionaria assim como uma espécie de “alambique metafísico”, se se quiser usar tal símile, purgando os espíritos sucessivamente de suas ligações materiais até se chegar ao “absinto” dos espíritos “puros”… E nem podia deixar de ser dessa maneira, já que, diante da simplificação que uma visão “corpo-alma” da composição da individualidade humana comporta, a única solução para se justificar, com um mínimo de coerência filosófica (e lógica) a interação desses dois elementos é considerá-los ambos como “materiais”, ou seja, “corpóreos” – isto é, essencialmente da mesma natureza. Isso “resolve” a aporia, e também possibilita, como bônus, a explicação para a “interação” entre o “espírito” e a “matéria”, para a manifestação física (pois é sempre física) das almas dos mortos no mundo físico.

    Mas, se tudo é, ao fim e ao cabo, físico, corpóreo, material (e é, como ficou claro a partir das citações anteriores), então tudo (espíritos inclusive) ocupa lugar no espaço, e pode ser medido, pesado, verificado, detectado fisicamente, quer de modo direto, quer indiretamente (via instrumentação adequada). Eu pergunto: após esses mais de 150 anos, onde estão as medições, as psicometrias, as EVIDÊNCIAS CORPÓREAS, devidamente quantificadas, pesadas, descritas, desses “espíritos erráticos” e tanto de seus perispíritos (“semimateriais” e oriundos dos “fluidos de cada globo”…) quanto de seus próprios espíritos (que, afinal, “são alguma coisa”)? E, além disso, onde estão as evidências físicas e mensuráveis das várias colônias espirituais, inclusive daquelas que, de acordo com a revelação dos “espíritos superiores”, existiriam inclusive em planetas de nosso sistema solar? Onde estão? Mostre-me um fragmento de construção do “Nosso Lar”! Ou uma florzinha ectoplasmática de seus jardins!

    Portanto, até aqui, pelo que me consta, faltam: a) os critérios objetivos e operacionais para se distinguirem as mensagens “boas” (dos espíritos superiores) das “más” (dos espíritos inferiores), e b) as evidências científicas, experimentais, físicas (que já deveriam ser muitas, e se acumularem em grandes números, em 150 anos de atividade ectoplasmática…) do peso e da composição, ao menos, dos perispíritos, bem como da localização das “colônias espirituais”, além, claro, da vida nos vários planetas, que os tais dos “espíritos superiores” informaram a Kardec (note bem, sr. Arduin, se erraram nisso, NO QUE MAIS TERIAM ERRADO? Nunca lhe ocorreu essa dúvida? Será que não erraram também na reencarnação? Por que não? E não me venha com “lógica”…)

    Volto a perguntar-lhe, sr. Arduin: é mais fácil acreditar nisso tudo, ou admitir que tudo isso não passa (se não totalmente, ao menos quase totalmente) de fantasia, de “wishful thinking”, de engano? Que não houve “comunicação” alguma? O que lhe parece mais “lógico”? O que está mais condizente com o “bom senso”?

    Continuando: o sr. diz que Kardec “quis recorrer a um critério de mais consulta, ou seja, [quis] usar mais de um médium e consultar mais de um espírito sobre certos ensinamentos”. Isso não é absolutamente verdadeiro; ele não consultou muitos médiuns; de fato, em menos de um ano, compilou a primeira edição de “O Livro dos Espíritos” (mais ou menos entre maio de 1856 e abril de 1857), pretensamente com “mais de dez médiuns” (de novo: especificamente, quantos? Quem? Quem disse o quê? Etc.), embora, haja fortes evidências de que três moçoilas tenham tido um peso bem maior, as duas irmãs Baudin (Julie e Caroline, com c.16 e c.18 anos, respectivamente, em 1857) e a srta. Céline Japhet (1837-1885; a que depois seria entrevistada pelo Conselheiro Aksakov, e que diria cobras e lagartos acerca de Kardec e de seu processo de “codificação”…). Se o sr., sr. Arduin, considera isso suficiente, tudo bem; eu, pessoalmente, preferiria mais tempo, mais médiuns (bem identificadas…) e, principalmente, mais comparação com QUASE DEZ ANOS DE MENSAGENS, que vinham se processando desde c.1848 nos EUA, na Inglaterra e na própria França; afinal, quem era esse tal professor Rivail para achar que seu grupinho de sonâmbulas era “melhor” que os outros grupos, os quais já vinham de há muitos anos recebendo revelações da Ultratumba? Não me parece que Kardec tenha utilizado um critério de “mais consulta” – ele utilizou, isso sim, o critério de “os meus médiuns são melhores que os médiuns dos outros [já que eu os controlo melhor]”, ou, o que é o mesmo, “os meus espíritos são melhores que os espíritos dos outros [já que confirmam aquilo em que eu já acredito, e que é, obviamente, algo “lógico” e cheio de “bom senso”]”… Faltou um pouco de humildade, não?

    Mas, no frigir dos ovos, como não há NENHUM critério objetivo e operacional para se dizer se uma “comunicação” (supondo que ocorra, que a alma “imaterial” consiga, mediante o perispírito “semimaterial”, atuar na matéria…) é ou não “boa”, ou seja, oriunda dos bondosos e inefáveis “espíritos superiores”, o número não diz nada – como a concordância não diz nada, e, no fundo, nada diz nada. Basta um médium e um espírito, porque, SE o médium é legítimo (prove-se que não é!!!), e SE o espírito é “hiper-ultra-sábio-superior” (prove-se que não é!!!), O QUE ELE REVELAR É A “VERDADE” DA ULTRATUMBA, e ponto final…

    Percebe o beco sem saída em que cai o Espiritismo, quando não se dispõe dum critério objetivo e operacional para a autenticação das mensagens, sr. Arduin? Tudo é possível, já que nada se pode provar…

    Depois, sr. Arduin, o sr. volta a falar de exegese bíblica, afirmando que Kardec “matou a charada” da revelação bíblica – o tal “Deus” eram apenas “espíritos tribais”. Legal! Baseado em quê? De novo na “lógica”? Quer dizer então que, ao longo de centenas e centenas de anos, “espíritos tribais” mentiram impunemente sobre suas identidades, induzindo os pobres seres humanos a erro, e os inefáveis e bondosos “espíritos superiores” não fizeram absolutamente nada? É isso? Com base em quê o sr. (ou Kardec) afirmam isso, assim de modo tão taxativo? Apenas no fato de que o que eles, muitas vezes, ensinam, lhe desagrada, como desagradava ao Codificador? Se não presta para mim, é de “espíritos inferiores” ou de “espíritos tribais”? É isso? Diante dessa afirmação gratuita, basta outra: quem garante que, ao contrário, os espíritos que se revelaram às moçoilas mesmerizadas de Paris (supondo, mais uma vez, que tenha havido espíritos…) é que eram “espíritos tribais” gauleses, que aproveitaram uma brechinha e um cochilo dos “espíritos superiores” para “fazer a festa” no meio daqueles idiotas crédulos em reencarnação? Por que não? Viu, sr. Arduin? Eu também acabei de “matar a charada” da revelação kardequiana!… Tal como é hoje, tal como era nos tempos de Kardec! Cada um tem o ectoplasma que merece!!!

    A seguir, o sr. diz que, para a Igreja, a Bíblia é a Palavra de Deus, exata e infalível, absolutamente verdadeira sobre tudo quanto se manifesta. Falso. Não sobre tudo, apenas quanto à revelação divina e à lei moral. Não inclui revelações de índole científica, falando, ao contrário, de todos os assuntos, com a linguagem (e o conhecimento) dos autores e da época, e mais, de acordo com o gênero literário de cada livro, ou trecho de livro, e numa revelação progressiva. O que o sr. diz é FALSO. E não é assim apenas recentemente – NUNCA FOI ASSIM. Procure se informar. A exegese bíblica, além de não se poder fiar em apenas um único versículo, tendo de levar em conta trechos lógicos, às vezes longos, às vezes vários, bem como o contexto, o estilo literário, as passagens semelhantes noutros livros, etc., sempre deve procurar discernir, na passagem em análise, tanto o seu sentido literal quanto os seus outros sentidos, de ordem espiritual: o sentido alegórico, o sentido moral e o sentido anagógico. Isso, desde Orígenes, passando por Eusébio de Cesaréia, Agostinho, Tomás de Aquino, etc. Se, desde a Reforma, uma série de seitas enveredou por interpretações exclusivamente literalistas da Bíblia, vá entender-se com elas, mas não transforme tudo, como é de sua tendência, sr. Arduin, num único espantalho. Ao menos, procure conhecer aquilo que critica.

    Sobre “leis cretinas” e “coisas censuráveis”, deve-se levar em conta que a) nem sempre a narração de algo, por parte do autor bíblico, indica a sua concordância com o que é narrado, e que b) a Revelação divina é histórica e progressiva – essa é a maneira de Deus se manifestar aos homens. Histórica e progressiva, mas nem por isso menos verdadeira. E sempre sem mentir sobre a identidade do Revelador. Como em qualquer aprendizado.

    O sr. então assevera, em seu comentário, que, ao contrário dos profetas bíblicos, que aceitaram bovinamente tudo o que lhes era revelado por “Deus”, Kardec sentiu-se livre para questionar. Engano seu, sr. Arduin, Kardec não questionou absolutamente nada, ele impôs um dogma. Não houve discussão alguma acerca do reencarnacionismo; Kardec não admitiu (como o Espiritismo Kardecista não admite) discussões a respeito desse assunto – e sua própria postura quanto a isso, sr. Arduin, perceba o sr. ou não, é dogmática, apenas envernizada com um (aparente) apelo à “lógica” e à “justiça”, que aqui funcionam apenas como “ancillae fidei”. Nisso o sr. é um perfeito kardecista.

    Mas, voltando à questão da “veia questionadora” do Grande Druida, leia de novo minha mensagem – Kardec, fosse de fato um pesquisador, teria documentado detalhadamente (e até mesmo justificado filosoficamente) suas revelações, e as teria enviado para as várias publicações espíritas, iniciando no meio espírita mais amplo um debate – MAS ELE NÃO FEZ ISSO; NUNCA HOUVE DEBATE, HOUVE A CODIFICAÇÃO DUMA ESCRITURA CANÔNICA E A IMPOSIÇÃO DUM DOGMA. Concordo com o sr. quando o sr. diz que Kardec não foi “vaquinha de presépio” – ele foi o líder duma seita, que codificou (e exigiu obediência de seus adeptos quanto a isso) o Caminho, a Verdade e a Vida. Quanto a “cautela”, creio que não teve nenhuma – impôs como a Verdade o reencarnacionismo cíclico evolutivo sem levar em conta o restante das comunicações que então se conheciam, na França e noutros países, e que, majoritariamente, eram CONTRÁRIAS ao que ele obtinha de seu conventículo. O líder duma seita, não um pesquisador, ou debatedor. Seita bem sucedida, sem dúvida, mas ainda assim uma seita – sem base empírica alguma no “grande movimento” espírita, sem nenhuma base “lógica” ou “filosófica” inquestionável (além, claro, da usurpação das idéias reencarnacionistas evolutivas “à la” Leroux e Reynaud – nem nisso ele foi original…), e muito longe do consenso das comunicações espirituais que eram, então, conhecidas, e que vinham sendo recebidas há vários anos, por vários grupos. Dentro do próprio Espiritismo, ele era um heresiarca, que mandou às favas todas as comunicações espirituais das quais não gostava, para impor o seu DOGMA favorito.

    Não obstante, deixemos, quanto a isso, que o Codificador fale por suas próprias palavras, mostrando o quão aberto a “críticas” e a “debates” ele era:

    Uma questão que se apresenta em primeiro lugar no pensamento é a dos Cismas que poderão nascer no seio da Doutrina; o Espiritismo deles será preservado? Não, seguramente, porque terá, no começo sobretudo, que lutar contra as idéias pessoais, sempre absolutas, tenazes, lentas em se harmonizarem com as idéias de outrem, e contra a ambição daqueles que querem ligar, mesmo assim, o seu nome a uma inovação qualquer [observação minha: mas, raios, e o que é que o próprio Rivail/Kardec fez? Não foi justamente ISSO? Não ligou ele uma INOVAÇÃO a seu próprio nome, ou melhor, ao seu “nom de plume” pseudo-druídico???]; que criam novidades unicamente para poderem dizer que não pensam e não fazem como os outros; ou porque o seu amor-próprio sofre por não ocupar senão uma posição secundária [observação minha: não façam o que EU fiz, pois um só é o seu Chefe, e esse um sou EU…].

    (…)

    Há a se notar que os numerosos sistemas divergentes, eclodidos na origem do Espiritismo, sobre a maneira de explicar os fatos, desapareceram à medida que a Doutrina foi completada pela observação e por uma teoria racional [observação minha: quanta pretensão! Tudo o que “não é” Kardecismo simplesmente é ignorado; sem dúvida, bastante aberto ao “questionamento” e ao “debate”…]; é com dificuldade, hoje, se esses primeiros sistemas encontram alguns raros partidários [observação minha: quantidade É critério de veracidade, então… ou seja, por conseguinte, a posterior decadência do Kardecismo na França, em seu próprio solo natal, é, assim, “prova” de sua falsidade???]. Aí está um fato notório de onde se pode concluir que as últimas divergências se apagarão com a completa elucidação de todas as partes da Doutrina [observação minha: isso ocorreu?]; mas haverá sempre dissidentes de caso pensado, interessados, por uma causa ou por outra, em constituir bando à parte [observação minha: os opositores se reúnem em “bandos”… bem aberto ao “debate”, não, sr. Arduin?]: é contra essa pretensão que é preciso se premunir.

    Para se assegurar da unidade no futuro, uma condição é indispensável, é que todas as partes do conjunto da Doutrina sejam determinadas com precisão e clareza, sem nada deixar no vago; para isso fizemos de modo que os nossos escritos não possam dar lugar a nenhuma interpretação contraditória, e trataremos que isso seja sempre assim [observação minha: o Codificador, inequivocamente, apresenta aqui a infalibilidade das suas Sagradas Escrituras… Pax tibi, Caratace, Evangelista meus!]. Quando se tiver dito, com firmeza e sem ambigüidade, que dois e dois são quatro, ninguém poderá pretender que se quis dizer que dois e dois fazem cinco. Poderão, pois, se formar, ao lado da Doutrina, seitas [observação minha: SEITAS! Os opositores são “seitas”! O Kardecismo é a Ortodoxia! Bem científico, racional e aberto ao debate, não, sr. Arduin?] que não lhe adotem os princípios, ou todos os princípios, mas não na Doutrina pela interpretação do texto, como se formaram tão numerosas sobre o sentido das próprias palavras do Evangelho. Aí está um primeiro ponto de uma importância capital.

    (“Obras Póstumas”, “Constituição do Espiritismo”, item II, “Dos Cismas”)

    [Mas há mais, e há melhor – veja-se a seguir:]

    A condição absoluta de vitalidade para toda reunião ou associação, qualquer que seja o objeto, é a homogeneidade, quer dizer, a unidade de vistas, de princípios e de sentimentos, a tendência para um mesmo objetivo determinado, em uma palavra, a comunhão de pensamentos. Todas as vezes que homens se reúnem em nome de uma idéia vaga, jamais chegam a se entender, porque cada um compreende essa idéia à sua maneira. Toda reunião formada de elementos heterogêneos leva em si os germes da sua própria dissolução, porque ela se compõe de interesses divergentes, materiais, ou de amor-próprio, tendendo a um objetivo diferente, que se combatem, e muito raramente estão dispostos a fazer concessões ao interesse comum, ou mesmo à razão; que sofrem a opinião da maioria se não puderem fazê-lo de outro modo, mas que não se reúnem jamais francamente.

    (…)

    Dar-se por Espírita convicto, não indica, pois, de nenhum modo, a medida da crença; essa palavra é muito dita por uns, e muito pouco pelos outros. Uma assembléia na qual se convocasse todos aqueles que se dizem Espíritas, apresentaria um amálgama de opiniões divergentes que não saberiam se assimilar e não desembocariam em nada de sério; sem falar dessas pessoas interessadas em nela semear a discussão, às quais abriria suas portas.

    (…)

    Hoje, que se fixou, entre todos, os pontos fundamentais da Doutrina [observação minha: ou seja, os MEUS pontos…], e sobre os deveres que incumbem a todo adepto sério, a qualidade de Espírita pode ter um caráter definido que não tinha antes [observação minha: caráter esse que EU vou definir – EUZINHO vou dizer quem é que é “espírita” e quem é que não é “espírita”… Isso é ou não é o comportamento dum agrupamento religioso, sr. Arduin?]. Um formulário de profissão de fé pode ser estabelecido, e a adesão, por escrito, a esse programa, será um testemunho autêntico da maneira de encarar o Espiritismo [observação minha: repetirei aqui as palavras do Mestre, para que não paire nenhuma dúvida a respeito: UM FORMULÁRIO DE PROFISSÃO DE FÉ PODE SER ESTABELECIDO, E A ADESÃO, POR ESCRITO, A ESSE PROGRAMA, SERÁ UM TESTEMUNHO AUTÊNTICO DA MANEIRA DE ENCARAR O ESPIRITISMO]. Essa adesão, constatando a uniformidade dos princípios [observação minha: note bem, sr. Arduin, “uniformidade dos princípios” – e o debate, onde fica???], será, além disso, o laço que unirá os adeptos numa grande família, sem distinção de nacionalidades, sob o império de uma mesma fé [observação minha: IMPÉRIO DUMA MESMA FÉ!!!], de uma comunhão de pensamentos, de vistas, e de aspirações. A crença no Espiritismo não será mais uma simples aquiescência, freqüentemente parcial, a uma idéia vaga, mas uma adesão motivada, feita com conhecimento de causa, constatada por um título oficial entregue ao adepto [observação minha: “carteirinha oficial” de aquiescência dogmática!!! O sr. tem a sua em mãos, sr. Arduin? Pode nos mandar uma cópia, para a mostrarmos aqui?]. Para evitar os inconvenientes da falta de precisão da qualidade de Espíritas [observação minha: FALTA DE PRECISÃO DA QUALIDADE!!!], os signatários da profissão de fé tomarão o título de Espíritas professos [observação minha: o sr. é um “Espírita Professo”, sr. Arduin? Se não é, deveria pensar seriamente em providenciar a sua carteirinha de aquiescência dogmática, porque senão o espírito de Kardec, fazendo bom uso de seu perispírito “semimaterial”, pode vir a puxar seus pés à noite…].

    Essa qualificação, repousando sobre uma base precisa e definida, não dá lugar a nenhum equívoco, permite aos adeptos que professem os mesmos princípios e caminhem no mesmo caminho, se reconhecerem sem outra formalidade senão a declaração de sua qualidade, e, havendo necessidade, a produção de seu título. Uma reunião composta de Espíritas professos será necessariamente tão homogênea quanto o comporta a Humanidade. Um formulário de profissão de fé, circunscrito e nitidamente definido, será o caminho traçado; o título de Espírita professo será a palavra de união [observação minha: “Espíritas Professos de todo o Mundo, uni-vos!”].

    (“Obras Póstumas”, “Constituição do Espiritismo”, item VIII, “Do Programa de Crenças”)

    Até aqui, falou Kardec. E falou muito bem, não?

    Claro, sr. Arduin, brincadeiras à parte, Kardec estava tentando estabelecer a unidade doutrinária, inclusive como meio de fortalecer seu “grupo”. Nada contra isso; a unidade doutrinal, ao menos no que diz respeito a alguns pontos básicos, não sujeitos a discussão, mas sim a aceitação (comunicação dos espíritos, reencarnação, etc.), foi, indubitavelmente, um fator agregador e fortalecedor dos grupos kardecistas, como ocorre, aliás, para qualquer grupamento de índole religiosa, que procede sempre de modo semelhante (ateus militantes inclusive). Mas então não se apresente o Kardecismo como fruto de experimentação, de debates incessantes e de consenso – apresente-se-o como o que ele foi, uma SEITA, ou, se se quiser, um grupo de características RELIGIOSAS, com seus dogmas próprios (comunicação dos espíritos, reencarnação, etc.), não sujeitos a questionamentos.

    Que o Espiritismo Kardecista, então, assuma-se como o que é (uma religião), e não se arvore no que não é, e nem nunca foi (uma “corrente filosófica”; muito menos, “científico-experimental”). Quando puder apresentar critérios objetivos e operacionais, consistentes e verificáveis, para a aferição da veracidade das mensagens espirituais; e também quando puder mostrar estudos científicos de medição e de composição do perispírito e do próprio espírito, cientificamente reconhecidos, então, aí sim, poder-se-á pensar em falar num outro patamar…

    A seguir, mais uma vez, o sr. discorre sobre a oposição entre as escolas espíritas kardecista (reencarnacionista) e anglo-saxã (não reencarnacionista). Note bem, sr. Arduin, os espíritas da escola anglo-saxã refutaram, sim, o reencarnacionismo cíclico evolutivo de Kardec (NÃO a reencarnação…); utilizaram argumentos que me parecem lógicos, e que já mencionei; mas, mais especialmente, eles se basearam (MUITO MAIS DO QUE KARDEC) no consenso das comunicações dos espíritos que então eram conhecidas. Esses “espíritos” (por que não seriam “espíritos superiores”?), em inumerabilíssimas comunicações que já se estendiam por quase dez anos, não ensinavam o reencarnacionismo evolutivo, sequer o reencarnacionismo; admitiam a reencarnação como exceção, para alguns casos muito especiais (p.ex., para crianças que morriam muito cedo), mas não como uma necessidade imperiosa para a evolução, a qual poderia dar-se noutras dimensões, p.ex., na “Summerland”. Querer repetir vidas materiais, ao menos como regra, para se evoluir parecia-lhes algo supérfluo (daí o sentido de se “ir de Paris a Calais” várias vezes). Sinceramente, o quê isso tem assim de tão “ilógico”?

    A escola anglo-saxã estava, isso sim, sendo mais fiel do que Kardec à própria essência do Espiritismo – como a doutrina comunicada pelos espíritos. As comunicações dos espíritos, esmagadoramente, por anos e anos, colhidas em inúmeros grupos, não ensinavam o reencarnacionismo, muito menos o reencarnacionismo evolutivo; portanto, eles o rejeitaram; o sr. não pode negar que tinham uma boa base “efetiva” e “operacional” para tal. E Kardec? Que base tinha para esposar sua doutrina? De novo, NENHUMA. Quanto à “linguagem digna e nobre”, faça-me o favor. Quanto à “lógica”, já se examinou isso “ad nauseam” – a própria reencarnação cíclica purgativo-evolutiva tinha tremendas dificuldades de ordem lógica, e mesmo de bom senso, que aqui já foram expostas. Enfim, quanto ao consenso das comunicações, ele era, inicialmente, repetindo, FRANCAMENTE CONTRÁRIO a Kardec. Os espíritas da escola anglo-saxã seguiram, principalmente, aquilo que, como espíritas, tinham que seguir – o consenso das comunicações espirituais, já que (lembrando esse detalhezinho) o Espiritismo é a doutrina consubstanciada a partir das comunicações dos espíritos. Kardec, o Heresiarca Bem-Sucedido, fundou um “novo” Espiritismo, sem levar em conta o consenso das comunicações dos espíritos que então eram conhecidas; ele simplesmente as ignorou, e apenas levou em consideração o que os “seus espíritos” informaram. De novo: com base em quê? Quem era ele para fazer isso? Que autoridade tinha? Respondendo: sem base nenhuma; ele não era ninguém melhor do que qualquer outro “magnetizador”; e ele não tinha nenhuma autoridade especial. Fala-se dele apenas porque foi bem sucedido na França (por um certo tempo), e porque sua doutrina, transplantada para o Brasil, aqui se aclimatou relativamente bem (com algumas “adaptações” necessárias…) e se transformou “no” Espiritismo…

    De fato, a única coisa que justifica Kardec é que sua visão tornou-se majoritária na França, enquanto lá houve algo como um “Espiritismo”. Isso significa, necessariamente, que é verdadeira? É esse o seu critério para a “Verdade”, sr. Arduin? Então, se uma certa religião, ou corrente filosófica, tem três vezes mais adeptos que o Kardecismo, ela é “três vezes mais verdadeira” que ele? É isso?

    As razões (efetivas) para o triunfo de Kardec já foram aqui examinadas – tinham muito a ver com o atendimento a anseios psicológicos específicos de certas camadas da sociedade, e nada, a meu ver, com a “verdade” acerca da Ultratumba (se é que há uma Ultratumba…). Sua posterior decadência na França também esteve ligada a mudanças na atitude da sociedade diante do mundo espiritual, não ao fato de o Kardecismo ser “falso”. Não sei quanto ao sr., mas eu procuro não ligar “sucesso” a “verdade”; isso é bem perigoso… E a situação é, a meu ver, semelhante no que diz respeito à prosperidade do Kardecismo no Brasil. Instalou-se aqui porque éramos, à época, colônia cultural da França, só por isso (se fôssemos já, naquela altura, apêndice cultural periférico norte-americano, como hoje, teríamos nestas plagas, ao menos no princípio, um Espiritismo nas linhas da escola anglo-saxã, eis tudo…); desenvolveu-se nas terras de Pindorama porque pôde se adaptar a alguns anseios de índole “espiritual” da classe média urbana então nascente, e que, entre outras “modas” francesas importadas indiscriminadamente (como o próprio Kardecismo), cultivava, ainda que desajeitadamente, o positivismo e o anti-clericalismo; e expandiu-se bastante quando agregou a um verniz formalmente kardecista, pseudo-“racional” e pseudo-positivista uma série de adereços, ou penduricalhos, não apenas daquele já vetusto (e, nalguns casos, esclerosado e decadente) catolicismo popular (“muita reza e pouca missa; muito santo e pouco padre”), mas também do misticismo exacerbado (sentimental e anti-intelectualista) e do “contratualismo espiritual” (“acendedor de velas” a qualquer coisa que funcionasse e que, “dobrando” o Além, permitisse a obtenção de benefícios materiais) típicos, ainda hoje, da mentalidade brasileira mediana. Ao contrário do que o sr. possa supor, sr. Arduin, nós brasileiros não somos “religiosos”; somos bastante práticos e materialistas – e desse modo bem prático, utilitário e materialista é que tratamos o “Outro Lado”. O Kardecismo, aqui, simplesmente se adaptou a isso – e adaptou-se muito bem, diga-se de passagem. Não estou sendo cínico, sr. Arduin; estou apenas mostrando os fatos, tais como eu os vejo.

    O sr. faz menção, caríssimo sr. Arduin, aos documentos que o pesquisador Silvino Canuto de Abreu teria obtido em Paris. Não vou me aventurar a comentar acerca disso, até que tais documentos tenham sido, efetivamente, publicados, e mais, que tenham sido autenticados (quando for o caso, ou seja, quando se tratarem, p.ex., de autógrafos de Kardec, e não de cópias de manuscritos de Kardec). Isso já devia ter sido feito (aliás, devia ter sido feito pelo próprio Canuto de Abreu), não? Mesmo que ele, por quaisquer razões que fossem, se abstivesse de divulgar documentos que se referissem a Roustaing, poderia tê-lo feito com os demais documentos… Por que não o fez? Será que, ao fim e ao cabo, uma boa parte desses tais documentos não seriam apenas capazes de fornecer informações secundárias, ou mesmo informações de segunda mão, posteriores a Kardec (“sobre” Kardec, mas não “de” Kardec)? Não sei; pode ser que sim, pode ser que não. O fato é que eles deveriam ser publicados e analisados criticamente. Custa-me a crer que não haja nenhum adepto da “fé raciocinada” com vontade e com influência suficientes para convencer a família de Abreu a permitir o seu manuseio.

    Enfim, para concluir, o sr. tenta justificar o fato de esquecermos nossas vidas passadas. O que me parece, sr. Arduin, é que sua argumentação se apresenta como uma tentativa de justificação “a posteriori” dum fato que é, em si, injustificável e ilógico. Porque permanece intocado o cerne da objeção: o aprendizado apenas é possível se se conhecem, e se reconhecem, os erros cometidos; apenas assim se pode adquirir inclusive uma experiência que permita que tais erros não venham a ser novamente cometidos. Porque, em não se sabendo que tal ou qual ação é errada, ou que tal ou qual erro foi o que, especificamente, que cometemos, a probabilidade de, mais uma vez, errarmos em nossa jornada material (já que de nada nos lembramos…) NUNCA DIMINUI. Podemos vir a praticar vezes sem conta os mesmos erros, e continuaríamos eventualmente a praticá-los, já que não poderíamos nunca fazer uso duma experiência passada que nos ajudaria a evitá-los…

    O próprio exemplo da “escola”, que o sr. fornece, mostra justamente isso! Ao avançar, o aluno NÃO ESQUECE (ao menos, em linhas gerais) o que anteriormente aprendeu, tanto em termos teóricos quanto em termos práticos; ao contrário, faz uso continuamente de seu conhecimento passado (sua “experiência”) quer para ir adiante, quer para não cometer os mesmos enganos. A progressão escolar dum aluno, sr. Arduin, é um símile totalmente inadequado para ilustrar o reencarnacionismo cíclico evolutivo; um símile válido seria o seguinte: após um período letivo, o aluno ESQUECE tudo o que aprendeu antes, e passa para o período letivo seguinte, onde, claro, provavelmente cometerá substancialmente os mesmos enganos que antes havia cometido, e onde qualquer avanço que porventura consiga será ANULADO ao passar para o próximo período letivo, já que ESQUECERÁ totalmente o anteriormente aprendido. Nesse símile, o aluno somente se recordaria do que aprendeu nas “férias” de final de ano, no intervalo entre dois anos letivos (como a alma somente haveria de se lembrar de suas vidas passadas entre duas encarnações…). ESSE exemplo seria um símile válido para o reencarnacionismo cíclico “evolutivo”; e, sinceramente, se ele lhe parece estranho e absolutamente sem sentido (um aluno esquecendo, a cada ano letivo, o que lhe foi ensinado…), não seria igualmente o reencarnacionismo evolutivo-purgativo também algo estranho e absolutamente sem sentido? Pense a respeito…

    Creio, sr. Arduin, que abordei virtualmente todos os tópicos que constaram de sua última mensagem; se faltou algo, avise-me. Agora, a palavra está com o sr. Sds,

    JCFF.

  97. Toffo Diz:

    Arduin, não são só os uspianos e sorbonizados que são céticos e não precisam de deuses. Aliás conheço um monte deles que são crédulos de dar dó. Tem muitos simples que também não estão nem aí para deuses e espíritos e vivem muito bem. Gosto não se discute, sem dúvida. Mas se educa.

  98. Toffo Diz:

    por que está tudo em itálico?

  99. Gorducho Diz:

    Deve ter pifado o interpretador HTML do sítio. Da metade em diante da minha msg ictalizou-se…

  100. Vitor Diz:

    Consertei!

  101. Antonio G. - POA Diz:

    Arduin, é mais fácil ensinar uma criança a ser crítica, a não ir acreditando em qualquer coisa que lhe digam, do que fazer um adulto dar-se conta de que está equivocado sobre determinada crença religiosa. Você mesmo deu a dica: Basta tratar a fantasia do Papai do Céu da mesma forma que a gente trata a do outro Papai, o Noel. No momento certo, a gente conta prá ela que o Papai Noel é apenas uma brincadeira, uma fantasia. E Deixar a criança curtir a fantasia de Deus até lá pelos seus 6 ou 7 anos de idade, não trará maiores consequências, se, da mesma forma que a gente

  102. Antonio G. - POA Diz:

    Meu post anterior saiu truncado. Enviei involuntariamente, quando estava reescrevendo uma frase. Mas acho que deu para passar a ideia.
    .
    O importante é dizer à criança que ela não deve aceitar as coisas apenas porque os outros dizem que ela tem que acreditar. Estimulá-la a pensar com independência e a não ter medos infundados é a melhor ensinamento que um educador pode legar a uma criança, eu acho.

  103. Antonio G. - POA Diz:

    Arduin, já que você falou no Dawkins, já leu a carta que ele escreveu para a sua filha Juliet, sobre “as boas e más razões para se acreditar”? Se não leu, recomendo. É só procurar no Google.
    Sds.

  104. Gorducho Diz:

    Se antes atuavam (quando as pessoas estavam vivas), o faziam mediante o “espírito” (“pneuma”, “spiritus”), que é uma “força vital” IMPESSOAL diretamente oriunda de Deus, e que mantém “alma” (“psychê”, “anima”) e “corpo” (“sôma”, “corpus”) por assim dizer unidos e funcionalmente operantes como um conjunto. Deus pode fazer isso porque, tendo criado tanto o mundo material quanto o mundo imaterial, tanto o mundo físico quanto o mundo metafísico, tanto o mundo corpóreo quanto o mundo incorpóreo, Ele os contém e em ambos está presente. Com a morte, retirado o “espírito” (i.e., a “força vital”, o “pneuma”, “spiritus”), a alma simplesmente não tem mais como atuar no mundo físico por sua própria vontade.
    ——————————————————————
    Pneuma: para los estoicos, Dios como espíritu o aliento vital que llena, legisla y dirige el Universo.
    [e-torredebabel]
    ——————————————————————
    Pois que se incorre em heresia proferindo palavras desordenadas, por isso me parece necessário prosseguir com muita cautela e modéstia ao mexer com essa tese…

  105. José Carlos Ferreira Fernandes Diz:

    Meu caro sr. [Adiposo],

    Estou preparando um esclarecimento, tão resumido quanto possível, acerca do uso desses termos. Não queria entrar nesse assunto, mas vejo que isso se torna necessário. Peço que tenha um pouco de paciência. Sds,

    JCFF.

  106. Antonio G. - POA Diz:

    Ô “adiposo” … Pronto! Mexeu com a fera. Um “esclarecimento tão resumido quanto possível” não é garantia de um breve textículo. Vai precisar de testículo roxo para encarar! Valha-nos Nossa Senhora dos Iletrados !!! rsrsrs

  107. Antonio G. - POA Diz:

    Só para não deixar passar em branco: Como todos sabemos, a mais aceita teoria científica sobre o surgimento do universo, a do Big Bang, estabelece que isto ocorreu há cerca de 14 bilhões de anos, e que nada, absolutamente NADA, precedeu a tal fato. Não havia espaço, nem matéria. Nem mesmo o tempo existia. Tampouco um Criador. Claro, isto é só a conclusão de cientistas, baseada em evidências, análises e cálculos matemáticos. Não tem nada de “revelação” transcendental nesta proposição.

  108. Toffo Diz:

    Na verdade, os caras do século 19 não imaginavam um universo sem tempo e sem espaço. Perguntassem ao Kardec o que ele achava do big-bang, ele responderia: mas o que tinha antes? Nunca iria passar pela cabeça dele, nem na dos espíritos da coorte kardecista, que tempo e espaço eram relativos, e que a noção de espaço estava relacionada com a de tempo. Ou seja, antes do big-bang não existiria nem tempo e nem espaço. Vai falar isso pro pessoal do 19!

  109. Marcos Arduin Diz:

    Ei Antônio Gê de Porto Alegre e Saltitante…
    Eu vi a carta e fiz uns comentário lá no Religião é Veneno. http://rv.cnt.br

  110. Marciano Diz:

    Antonio, o cálculo mais recente, que eu saiba, é de 13,7 bilhões de anos. Mas isto ainda vai dar muito pano pra manga, não é fácil estabelecer a idade do universo, há 250 anos não se sabia a idade da Terra ou do Sol.
    Astrônomos e geólogos divergiam, os geólogos ganharam.
    Eles não conheciam energia nuclear, daí o erro, mas os geólogos fizeram bem o dever de casa.

  111. Marciano Diz:

    Arduin, indica a página, assim fica difícil achar teus comentários.

  112. Marcos Arduin Diz:

    Está em: http://religiaoeveneno.org/discussion/989/o-metodo-cientifico-explicado-a-uma-crianca-de-10-anos/p1

  113. Antonio G. - POA Diz:

    Marciano: Sim, as estimativas quanto à idade do universo variam um pouco, mas o número mais aceito é, como eu citei, algo próximo de 14 bilhões de anos. Mas, é certo que este número pode estar “redondamente” errado. O Big Bang é apenas uma teoria. E pode nem ter havido. O universo pode mesmo ter sido criado por uma inteligência suprema, um pai celestial, eterno, onisciente, onipresente e onipotente, além de soberanamente bom e justo. E que ama a todos nós, suas divinas criaturas. Logo, como obra desta inteligência, o universo deve ter mesmo um sentido, uma utilidade, um propósito. Mas, já que não existe um “manual de instruções”, cada um lida com a questão do jeito que achar melhor. As religiões estão aí para “dar uma força”.
    .
    Sds.

  114. Antonio G. - POA Diz:

    Arduin, li o seu debate no site Religião é um Veneno. Como sempre, são bons os seus argumentos. O que não significa, claro, que eu concorde com eles… E acho que o debate descambou para uma disputa do tipo: “ciência ou religião, onde está o bem?”. Não me parece que tenha sido este o propósito de Dawkins ao escrever a carta à filha Juliet. Eu apenas entendo que ele procurou passar à menina a mensagem de que ela não deveria sair acreditando em qualquer coisa que lhe dissessem apenas por uma questão de “autoridade, tradição ou revelação”, mas que deveria procurar ser crítica, independente e pensar com sua própria inteligência. Particularmente, eu acho este um excelente conselho de um pai para uma filha(o).
    .
    Sds.

  115. Marciano Diz:

    Arduin, concordo com o que o Antonio disse. Você é um excelente debatedor, argumenta bem, é honesto, mas eu também não concordo com suas conclusões.
    Quanto a Galton, Gobineau e outros, não estavam inteiramente errados, mas o que fizeram com suas ideias, com certeza, foi erradíssimo.
    Você conhece o assunto muito melhor do que eu, mas eu acho que por uma razão lógica, a seleção natural é a coisa mais eugênica que existe, quem não está adaptado ao ambiente, perece, só se beneficiam os que, por mero acaso, sofrem mutações que os favorecem no ambiente.

  116. Marcos Arduin Diz:

    De Marte, é o seguinte:
    Durante muito tempo, o homem de Neanderthal foi usado como uma demonstração do nosso passado animalesco, pois nossos “ancestrais” eram brutos, com cara simiesca, curvado, etc e tal. Com base no que foi dito isso? No fato de ter sido achado um fóssil de homem de Neanderthal que tinha tais características. Só MUITO TEMPO DEPOIS é que caiu a ficha: esse fóssil é o de um VELHO (provavelmente entre 60 e 65 anos), TERRIVELMENTE DEFORMADO PELA ARTRITE. Foi com base nisso que se fez a reconstrução toda animalesca do nosso “ancestral”. A reconstruções modernas tornaram o homem de Neanderthal tão parecido com o humano atual, que ele poderia passar por nós como um cidadão cearense comum, com aquela cabeça chata.
    .
    Agora vem a questão: como aquele velho todo artrítico chegou àquela idade e naquelas condições? Porque ALGUÉM CUIDOU DELE. Essa foi a nossa conquista sobre os animais: a experiência dos velhos foi repassada aos jovens. Assim os velhos deixaram de ser abandonados, pois os jovens tinham o que aprender com eles.
    De Gaule percebeu isso. Logo após a Segunda Guerra Mundial, quando ele estava reorganizando a França, veio lá um ministro dizer que as escolas estavam num caos, pois muitos dos professores morreram na Guerra e não tinha mais ninguém para ensinar às crianças. E De Gaule respondeu:
    _ Temos sim! Temos os velhos. Vamos usá-los como professores então!
    .
    Pois bem, de Marte. Ao cuidarmos uns dos outros, aumentamos o potencial de progresso da sociedade. A Eugenia foi o retrocesso à era pré Neanderthal: deixemos que a seleção natural-artificial melhore a nossa gente… Essa justificativa científica ditava a política. Por que as autoridades inglesas queriam que os trabalhadores ingleses e irlandeses e suas famílias morressem de fome e na miséria? Porque a Ciência dizia que não haveria comida para todos e aí era importante que parte das pessoas morressem para que as outras tivessem o que comer. Entendeu como é que a política pode fazer uso da Ciência pro bem ou pro mal?

  117. Marciano Diz:

    Arduin, tu entendeste-me erroneamente, irmão, eu não defendo a eugenia, eu só disse que fizeram muitas coisas erradas, como no exemplo que deste.
    Claro que cuidarmos dos velhos ajuda o indivíduo (o velho) e a coletividade, mas se as pessoas que tem defeitos genéticos não procriassem, não passariam o defeito genético adiante. O indivíduo não seria sacrificado, poderia viver até quando sua saúde, os cuidados médicos e a ajuda dos demais lhe permitisse, mas a coletividade sairia ganhando.
    Mais ou menos como a natureza fez com os silvícolas pré-colombianos. Quem não tinha boa saúde (como dever ter sido no caso dos neandertais) ou não deixava prole ou deixava uma prole menor.
    Eu não sou eugenista, mas a natureza é.

  118. Marciano Diz:

    E tu sabes disso, afinal, é tua área de conhecimento, tu conheces seleção natural muito melhor do que todos aqui juntos.

  119. Marcos Arduin Diz:

    Bem, Zé, demorei a responder, pois tenho de cuidar das aulas na UFSCar e veja se segue esse conselho de Winston Churchill:
    _ Das frases, as mais curtas; das palavras, a menor.
    E eu acrescento: use as palavras de significado mais simples e direto e as frases em ordem direta, curtas e sem tantos parênteses explicativos. Se já falou uma coisa uma vez, não precisa de repetições constantes para tentar me convencer da pataquada…
    .
    Indo ao que interessa. Bem, Zé, segundo entendi do começo do seu texto, você está ressabiado com essa situação de suposta fragilidade que nos encontramos de não dispormos da segurança necessária e infalível de estarmos em contato apenas com espíritos bem informados e evoluídos. Admitimos estarmos sujeitos a nos “instruirmos” e a sermos induzidos a erro pela atuação de espíritos ignorantes ou malícia. E você também estranha o fato de que os espíritos superiores são omissos em impedir a atuação desses espíritos inferiores. É isso?
    .
    Bem, vou recorrer ao Cristianismo, ou pelo menos ao grosso dele, já que decerto irá me lembrar das particularidades nele existentes.
    A verdadeira fé cristã diz que os seus três Deuses _ Pai, Filho e Espírito Santo Amém _ ditaram um livro sagrado _ a tal Bíblia _ a seus profetas credenciados. Diz essa verdadeira fé cristã que esses Deuses criaram o Diabo e os seus demos, que se dedicam a bagunçar o coreto divino. Claro, há todo um malabarismo exegético e hermenêutico para “explicar” essa baita burrada divina. Recorre-se a certos versos bíblicos, acho que localizados em Isaías 14 e em Ezequiel 28, cujo contexto NADA tem a ver com o Diabo e seus demos. Querem os exegetas e hermenêutas cristãos fazer crer que ali se diz que o Diabo e os demos eram anjos puros, bonzinhos, certinhos, etc e tal. Só que deram pra trás e viraram demônios. Como Kardec mesmo comenta no seu livro O Céu e o Inferno, isso é o reconhecimento pelos cristãos de que os seus três Deuses NÃO SÃO PERFEITOS, pois pretendiam criar seres bons, mas falharam no processo.
    .
    Queixa-se você da omissão dos espíritos superiores em relação a ação dos inferiores contra nós… Porém os seus três Deuses, assim como os outros anjos que AINDA não se tornaram maus, não impedem a atuação dos demônios. Tanto que homens, mulheres e crianças podiam ser acusados de… bruxaria, resultado da possessão demoníaca sobre certas pessoas. Como nem os padres e nem os pastores tinham recursos para lidar com tal problema, o jeito era assar o embruxado… É… Parece que neste ponto, nem o Cristianismo nos oferece mais segurança do que o Espiritismo. Uma pena.
    .
    Bem, Zé, os seus três Deuses criaram um casal humano tão “burro” quanto os atuais grandes gênios intelectuais esquerdistas. Nem sabiam diferençar Bem de Mal. Proibiu esse casal de comer de uma certa macieira, mas deixou à solta o tal Diabo, que falou através de uma serpente e, por ser tão “burro”, o casal humano caiu na conversa e saiu praguejado do Éden e, de quebra, seus descendentes levaram a culpa também. Bom, esse episódio da mordida da maçã ocorreu há 5.800 anos. Ao contrário do “burro” primeiro casal humano, os seus descendentes, ao menos uma parte deles, já atingiram certa maturidade intelectual para lidar com os tais espíritos. Assim, os espíritos superiores não consideram SEMPRE NECESSÁRIO intervir quando os maléficos ou ignorantes atuam. Deixam que nós usemos de nosso raciocínio, tirocínio, inteligência, etc e tal, para recebermos as ditas mensagens e julgá-las segundo nossos critérios ou gostos. Dizem uns espíritas que espíritos católicos medievais, no interesse de desabonar o Espiritismo, passaram ensinamentos espúrios e contrabandearam dogmas católicos ao Roustaing. Ele e sua cupinchada acharam linda e maravilhosa essa mescla doutrinária. Gosto não se discute: lamenta-se. Mas não se pode enganar a todos o tempo todo. Sempre aparece algum “chato” que constata que o quadro não está tão bonito assim.
    .
    No que deu esse tal Rustenismo? Na França, NADA. Roustaing é um completo desconhecido por lá. No Brasil, os primeiros espíritas eram egressos do Catolicismo e embora aceitassem a DE, sentiam falta de coisas da Fé Católica, principalmente da Deusa Mãe, a Virgem Santíssima. Como Roustaing resgatou a eterna virgindade dessa Deusa e outras pataquadas, como a pureza e quase divindade de Cristo, esses antigos espíritas aceitaram tudo isso numa boa, sem pensar, e tentaram impô-las como parte da Doutrina Espírita. Eles dominaram por várias décadas a Federação Espírita Brasileira, mas seus esforços tiveram pouca repercussão. A grande maioria dos espíritas no Brasil ficou e ainda fica com Kardec. Outro exemplo é o orientalista Ramatis, que falou de um planeta Marte habitado por uma civilização avançada e pregou que no fim do século XX haveria a verticalização do eixo da Terra e outras tantas tolices. No que deu nisso? Restou um grupo restrito de fãs tendo de descascar esse abacaxi e só.
    .
    Portanto, Zé, as falhas e absurdos doutrinários que espíritos ignorantes ou maliciosos passaram até conseguem alguma aceitação, mas depois perdem sua força. E a Doutrina Espírita permanece firme e forte. Então, Zé, já que você me pede critérios, eu lhe digo que só o tempo é quem dá a palavra final sobre a consistência doutrinária, caso outros fatores não o façam. Porém, uma doutrina fornece, NO MÁXIMO, um alicerce para nos sentirmos justificados por tal ou qual atitude. Kardec temia o Materialismo, pois fazendo crer que só esta vida é o que há, isso abriria uma brecha para se justificar os excessos de todo o tipo. Assim o malandro não teria razões para temer um castigo espiritual por suas malandragens, pois não crê que tal futuro exista. Mas o que faltou a Kardec aí foi não considerar o progresso moral que o espírito acumulou em suas existências. Se um espírito aprendeu a ser bom, a crença materialista não fará dele um mau caráter. E se continua mau, a crença na espiritualidade futura não o impedirá de ser um mau caráter, pois sempre inventará uma brecha para isso (como dizia Lutero: peca, mas crê…).
    .
    Pergunta você se os espíritos superiores, por terem um poder irresistível sobre os inferiores, não os impedem de atuar maliciosamente contra os pobres ingênuos humanos. Vou lhe devolver a pergunta: crê a sua Fé Católica, assim como a Fé Cristã em geral, que há o Diabo e seus demos, certo? E que eles atuam contra nós, tentando-nos e nos induzindo ao Mal. Médiuns, espíritas ou não, são acusados de serem agentes dessas maléficas criaturas espirituais. Será isso muito diferente da situação espíritos superiores x espíritos inferiores? Como você me explica que os seus três Deuses não tomam nenhuma atitude contra o Diabo e seus demos e os deixam atuar livremente? Seus Deuses “escolheram” um povo, o hebreu, e deixaram todos os outros ABANDONADOS, sem luzes para se defenderem do Diabo. E aí tivemos esse tal Paganismo, levando muitas pessoas à perdição eterna. É como já disse alguém por aí: _ Se Deus fosse bom, amá-lo não seria um mandamento.
    .
    Sobre a questão de comunicação da Ultratumba, Zé, vamos deixar claro umas coisas. Não posso procurar um padre ou um pastor para ter algum contato com meu falecido pai ou outros parentes meus que se foram. Meu contato com eles está definitivamente rompido, certo? Mas no Espiritismo isso é uma possibilidade. Várias pessoas obtiveram, a pedido ou espontaneamente, comunicações desse estilo. Carlos Imbassahy, no seu livro À Margem do Espiritismo (FEB), relata a comunicação que recebeu da sua falecida avó, interrogando-a e suas respostas se confirmaram ponto por ponto. Lembra ele que os homens da fé dizem que isso é obra de Satã. E Imbassahy pergunta: _ Por que Deus permite que nos seja maculado o que temos de mais caro e sagrado? Por que ao Diabo foi dado o monopólio de nos trazer as provas da nossa continuidade espiritual, quando as igrejas cristãs, que deveriam elas nos trazer tais provas, são neste ponto DA MAIS LAMENTÁVEL INDIGÊNCIA? _ É a pergunta que faço a você, Zé.
    .
    A Ultratumba é apenas um mundo paralelo ao nosso. Lá há tantas verdades “absolutas” quanto há por aqui. Da mesma forma que há pessoas que acham válidas doutrinas vindas de um Hitler, Marx, Stalin, Opus Dei, Cientologia, etc e tal, da Ultratumba vêm doutrinas de pensadores lá existentes e, pelo fato de não terem corpo físico, nem por isso mesmo têm uma visão melhor e mais ampla da realidade. Kardec já dizia isso desde o início. A confirmação da identidade de um parente falecido é a prova de nossa continuidade espiritual e é o que há de melhor e de mais sólido que podemos obter.
    .
    Faz você uma longa digressão sobre alma e espírito, citando as Escrituras, Aristóteles e uns outros tantos aí, cuja AUTORIDADE e CONFIABILIDADE no que afirmam ainda aguardo comprovação. Que razão você me dá para crer na Bíblia? Quanto à questão da alma no Espiritismo, à pergunta do que ela seria, a resposta foi: _ O espírito enquanto encarnado. _ Mas como nem sempre o serviço editorial é dos bons, nem temos a pretensão de sermos perfeitos e inerrantes, não raro nos confundimos ao falar de alma e espírito. O espírito é a condição NÃO ENCARNADA.
    .
    E fala de que no Espiritismo tudo é material… Bem, Zé, a matéria é algo que os cientistas dos nossos dias AINDA estão descobrindo o que é. Agora vá imaginando as coisas nos tempos de Kardec. Sinceramente não sei o que o incomoda neste caso. Kardec simplesmente constatou um fato: espíritos podem se comunicar. Se podem dar seus pitacos a gente encarnada _ material portanto _, então supostamente eles não devem ser entes de uma natureza TOTALMENTE imaterial como disseram os autores por você apontados. A concepção de imaterial é algo que ainda não cabe na nossa mente. Dizemos que Deus é imaterial porque a matéria é algo sujeito a mudanças e um dos atributos de Deus é de ser IMUTÁVEL. Portanto, trata-se de um malabarismo lógico e não de algo demonstrável por qualquer meio conhecido, já que não temos ideia de como seria a natureza de algo imaterial.
    .
    Zé nós ficamos nesse círculo contínuo de “uns dez médiuns”, como se a consulta feita a 20, 50, ou 100 médiuns fosse uma garantia absoluta de inerrância. Kardec sabia pensar e achou que o que recebeu, discutiu e compilou fazia sentido. Da mesma forma, muito teólogo por aí fundou a sua igreja ao deduzir isto ou aquilo do que leu das Escrituras, escritas por uns 40 e pouco autores, todos credenciados pelos seus Deuses para falar em nome deles…
    .
    Zé, um dos meus textos favoritos para desmoralizar a Bíblia como palavra de Deus, exata e infalível, inclusive neste aspecto moral é o texto de 1 Samuel 15:1-9, onde Deus ordena a Saul para que massacrasse todo o povo amalequita e assim vingar um incidente ocorrido 500 anos antes. Pergunto a você se este texto foi de fato uma ordem dos seus três Deuses e como ela se justifica moralmente. Responda-me isso e depois falaremos dos espíritos tribais.
    .
    A exatidão e infalibilidade Bíblia são como uma mola na sua Santa Madre Igreja: é esticada ou encolhida para caber em qualquer a situação… Se o que a Bíblia diz no âmbito científico NÃO É INFALÍVEL e alega você que SEMPRE FOI assim que a sua Santa Madre Igreja entendeu, voltamos à questão do Galileu. Por que a sua Santa Madre Igreja chiou com ele? Ou com o Giordano Bruno? Bastaria apenas que o Papa e os inquisidores dissessem: _ A Igreja não se pronuncia sobre questões científicas. Se o Geocentrismo está errado e o Heliocentrismo está certo, é coisa pros cientistas resolverem e não com a gente… _ Veja só outro lance que deixou apavorados os seus clérigos: Champolion quebrou o código dos hieróglifos egípcios, permitindo ler o que escreveram. E já pensou se essa leitura revelasse que a Civilização Egípcia era anterior ao Dilúvio (ocorrido por volta de 2.300 AC) e não foi afetada por ele? Pois foi exatamente isso que se descobriu. E agora? Como é que seus clérigos e os protestantes descascam esse abacaxi? E o que a sua Santa Madre Igreja falou do Darwinismo? Quando Darwin lançou o Origem das Espécies, a sua Igreja ficou quieta? Aceitou que o homem é descendente do macaco numa boa? Como ficam Adão e Eva e o pecado original se os macacos são nossos ancestrais e não aquele venerado casal? Não me interessa se HOJE a sua Igreja não se pronuncia mais sobre assuntos científicos. Interessa é como ela se pronunciou ao longo da História. Se houve um tempo que ela emprestou às Escrituras o qualificativo de infalibilidade e hoje não mais, então sua Igreja muda com o tempo… O que não é um pecado, mas compromete a afirmativa de que é dona da verdade, pois a verdade não pode estar sujeita a mudanças.
    .
    Ô Zé! Uma coisa é um autor bíblico narrar um evento que testemunhou, goste dele ou não, e muito outra é repassar uma ordem divina ou narrar um evento divino moralmente questionável. Já citei o texto lá de Samuel. Tem um outro texto gozado também, 1 Reis 22:20-23:
    20. E o SENHOR dizia: ‘Quem enganará Acab, para ele vá à guerra e caia em Ramot de Galaad? ’. E um dizia uma coisa, e outro, outra. 21.Veio então um espírito e apresentou-se diante do SENHOR, dizendo: ‘Eu o enganarei’. — ‘De que maneira? ’, perguntou-lhe o SENHOR. 22.Ele respondeu: “Ao ir até ele, serei um espírito de mentira na boca de todos os seus profetas’. E o SENHOR disse: ‘Engana-o e terás sucesso. Vai e faz assim’. 23.Assim o SENHOR pôs um espírito de mentira na boca de todos os teus profetas aqui, e o SENHOR decretou a tua ruína”. http://www.bibliacatolica.com.br/02/11/22.php#.UFMEvZ892wg
    Reclama você dos espíritos superiores não darem um chega pra lá nos inferiores, mas o seus próprios Deuses aí mandam espíritos mentirosos para causar prejuízo às pessoas? Por que não mandaram uns anjos darem uma dura no Acab, na Jezebel, nos profetas de Baal & Cia Bela? Diga-me aí: esse texto é UMA REVELAÇÃO DIVINA? Sim ou não e por quê?
    .
    Eu já disse, Zé, que não se vendem doutrinas cheias de “se e mas”. Doutrinas vêm com a pretensão, descabida ou não, de resolver certas dúvidas, ainda que inevitavelmente deixem outras sem solução. Mas naquilo que pretende resolver, tem de ser enfática. Daí então não se justificaria Kardec fazer TODO um tratado científico e/ou filosófico, confrontando ideias divergentes, ouvindo a todo mundo e… aceitando a opinião de todos? Como ele iria fazer isso? Como agradar a quem diz sim e a quem disse não ao mesmo tempo? Ele pegou o que achou melhor e foi em frente. Quem concordou, ficou com ele; quem não concordou, caiu fora. Algum problema nisso? Você esperaria algo diferente disso?
    .
    Obviamente ele não era um profeta bíblico, tidos por infalíveis pelos cristãos (crença boba, pois os profetas bíblicos eram infalíveis. Ex: Miquéias, no capítulo 5 de seu livro, previu a vinda de um Messias que nasceria em Belém _ e este Messias NUNCA VEIO). Kardec acertou quando disse que grupelhos se formaram e se desfizeram ou ficaram minoritários. E a decadência do Espiritismo na França é prova de sua falsidade? Então o fato de o Cristianismo ser minoritário na Terra Santa é prova de sua falsidade também, certo? Alguma vez você procurou saber porquê o Espiritismo decaiu na França? Por um motivo muito simples: os espíritas franceses CHUTARAM o Kardec pra lá e abraçaram a Parapsicologia… Resultado, o Espiritismo francês, sob a liderança de André Dumas e seu antecessor, virou um arremedo de Parapsicologia… Por isso, obras francesas sobre Espiritismo são encontradas nas bibliotecas e livrarias francesas entre livros de magia, superstição, folclore…
    .
    Zé, mesmo onde os debates são parte da coisa, chega um momento em que se tem que se fazer escolhas, senão a NADA chegaremos. Em Ciência é assim. Eu já vi muito disso. Há grupos de pesquisadores maiores, que apóiam pontos de vista assim. Mas isso não impede a existência de grupos minoritários, que dão apoio aos pontos de vista assado, frito ou cozido. Kardec, entendo eu, fez lá os seus debates e discussões com companheiros e amigos e espíritos, mas chega um momento que se tem de tirar um denominador comum. Querer afirmar com isso que ele simplesmente mandou a todos calarem a boca e dizer que “aqui mando eu” seria a receita certa para ficar sozinho lá na sua Sociedade Espírita Parisiense. Se ele tinha vários seguidores e seu reencarnacionismo cíclico evolutivo PREVALECEU sobre os outros, então é porque foi um LÍDER e não um CHEFE,
    .
    O Espiritismo não pode ser religião, pois não há pecado original que nos tenha separado de Deus e aí caberia a uma série de rituais e a crença obrigatória em certas elucubrações teológicas para restabelecer esse contato o Divino (ou Divinos). Quanto à filosofia e ciência, já disse quais são os limites dentro do Espiritismo. Fala você em ampla discussão… Como supostamente ela não houve, então o Espiritismo está desqualificado como “corrente filosófica”, se entendi direito. Certo? Eu vejo por aí filosofias classificadas como “marxista”, “freudiana”, etc e tal, e gostaria de saber se os fundadores dessas ditas filosofias alguma fez fizeram “amplas discussões” para construir suas correntes de pensamento…
    Filosofia é uma coisa gozada, quando aplicada na prática e acaba virando dogma de fé mais do que a própria religião. Veja só o marxismo. Pode me apontar um único país onde foi aplicada e resultou numa sociedade melhor, mais feliz, igualitária, etc e tal, conforme os filósofos marxistas tentam me vender? Quando fazia graduação na USP, uma colega me garantiu que havia um país onde o Socialismo deu certo: na Albânia. E minha vontade era perguntar: _ É gozação, é?
    Aqui no Brasil, o PSDB e o PT chegaram a um acordo lamentável: _ Vamos aplicar o método Paulo Freire de educação. Assim determinou-se que não ia mais ter avaliação: os alunos iam passar por decreto. A educação seria “por amor”. O resultado de tal política educacional baseada na filosofia de um filósofo de esquerda? Alunos do ensino médio que nem sabem fazer uma conta de dividir…
    Mas esse pessoal NÃO ARREDA pé. Para eles, Marx não pode estar errado; Paulo Freire não pode estar errado; Jesus não pode estar errado… Fico pensando então onde Kardec teria errado para que o Espiritismo não mereça ser considerado “corrente filosófica”. Será que foi porque ele admitiu que o Espiritismo não é dono da verdade e nem que os espíritos são infalíveis?
    .
    E um bom texto sobre a expressão filosófica dos dias de hoje foi esse aqui, de Ruy Castro:
    FOLHA DE SP – 04/09/2012
    Primeira lição: não existem grandes escritores que não sejam grandes leitores também.
    NO DIA em que terminei de escrever a minha tese de doutorado, enviei o manuscrito para um colega. E pedi uma opinião sincera. Três dias volvidos, ele respondeu: “Você vai ser fuzilado pela banca”. O problema estava na qualidade do texto. A tese estava bem escrita. Pior: bem escrita e totalmente compreensível.
    Eu tinha cometido uma heresia nas ciências sociais: escrever uma tese de doutorado com o propósito honesto de ser lido e compreendido. Sugestão dele para evitar o desastre: reescrever o texto e transformar cada parágrafo em paralelepípedo.
    Lembro essa história agora por dois motivos. Primeiro, porque Barton Swaim escreve na “Weekly Standard” sobre a qualidade da prosa acadêmica. Qualidade atroz, entenda-se. Por que motivo a Fauna universitária faz um esforço tão tortuoso para ser tortuosa? Swaim arrisca três hipóteses. Para começar, as humanidades vivem o complexo de inferioridade que as atormenta desde o século 18, quando as ciências naturais deram o seu salto cosmológico. A impenetrabilidade dos textos humanísticos é uma forma de simular “profundidade”. Depois, existe o problema das influências. Das más influências. O aluno escreve mal porque o supervisor e os seus pares escrevem pior. E porque as revistas da especialidade só publicam esses horrores. Por fim, a hipótese mais provável: a obscuridade obscurece. Quando nada temos de relevante para dizer, só há uma forma de esconder o vazio: com a babugem das palavras.
    Admito que essas hipóteses sejam válidas. Mas se lembro o meu calvário acadêmico é por outra razão: a Morgan Library de Nova York dedica exposição ao escritor Winston Churchill até 23 de setembro. E foi Churchill quem me infetou com o vírus da clareza e da legibilidade. Sim, eu sei: quando falamos de Churchill, surge a imagem clichê do velho premiê inglês com o seu charuto. O prêmio Nobel da Literatura que ele recebeu em 1953 é visto apenas como prêmio político, uma homenagem ao herói da 2ª Guerra. Lamento discordar. Churchill merece o Nobel da Literatura como ninguém. Ele é o único escritor do século 20 que mudou o século com a força das palavras. Basta ler os seus livros e discursos para entender a proeza. Uma proeza que, obviamente, começa por ser o resultado de uma vida inteira de leitura.
    Primeira lição: não existem grandes escritores que não sejam grandes leitores também. E Churchill era um grande leitor. Biografias apressadas dirão que o rapaz foi aluno relapso e uma nulidade em francês ou matemática. Essas biografias esquecem-se de acrescentar o resto: a paixão pela História. Ainda na juventude, e nas primeiras campanhas militares, foram os volumes de Macaulay sobre a história de Inglaterra ou a monumental obra de Edward Gibbon sobre a Roma Antiga que acompanharam e formaram o soldado (e jornalista) Winston. Ler esses primeiros textos de Churchill é sentir, em cada frase, a cadência e a elegância dos mestres da língua inglesa. Mas Macaulay ou Gibbon não lhe forneceram só os instrumentos técnicos do “métier”. Legaram-lhe, sobretudo, uma visão poderosa e inspiradora sobre a grandeza da civilização ocidental -uma grandeza ancorada na liberdade individual e na dignidade da pessoa humana. Armado com tais certezas, Churchill teve a oportunidade de as testar. Primeiro, na denúncia solitária da Alemanha nazista na década de 1930. E, depois, no confronto direto com Hitler, fazendo com que os ingleses acreditassem no inacreditável: a possibilidade de resistir -e vencer. Hoje, quando olhamos para trás, dizemos que a Inglaterra ganhou a guerra com o apoio americano e o incomensurável sacrifício soviético. Verdade. Mas os ingleses ganharam a guerra porque acreditaram também nas palavras de Churchill. Palavras simples sobre a importância da liberdade, da honra e do sacrifício. Como disse Isaiah Berlin em retrato magistral, a proeza maior de Churchill não foi política ou militar. Foi ter recrutado a língua e a história inglesas para a frente de combate. Elas foram tão importantes como as armas. Brindo a ele.
    E, mais modestamente, brindo a mim, que derrotei a banca sem mudar uma vírgula. Cada um trava as batalhas que merece.
    .
    E a Ciência? Zé, por acaso sabe você o que é a Ciência REAL? Vou lhe dar um exemplo:
    O primo de Darwin, Francis Galton, fez um estudo de seus ancestrais e dos ancestrais de outras famílias bem de vida que conhecia e chegou a um resultado interessante: em TODAS ELAS, as pessoas foram ricas, estudiosas, inteligentes, bem formadas intelectual e moralmente, etc e tal. Já quanto aos ancestrais de famílias pobres e miseráveis, predominava sempre a falta de cultura, de empenho e nunca conseguiam formar gente que se tornasse rica e instruída. Concluiu que tal situação não devia ser derivada apenas das condições do meio, mas sim de MÁ QUALIDADE GENÉTICA.
    Desse seu estudo surgiu a EUGENIA, que levou a profundas e lamentáveis políticas públicas dirigidas contra a gente pobre. Na Inglaterra, tomando por base as teses de Malthus, decidiu-se que não se deveriam dar ajuda às pessoas pobres, pois elas competiriam para aumentar a escassez alimentar. Deveriam ser deixadas à míngua, já que estava CIENTIFICAMENTE PROVADO (pelos trabalhos de Galton) que nunca sairiam dessa lamentável situação.
    O Vitor Moura passou-me um texto, citando o caso de Ciryl Burt, um psicólogo que fez pesquisas com gêmeos idênticos que cresceram separados. Com estudos estatísticos, ele constatou que o meio NÃO INFLUENCIA na formação da pessoa: o QI se mantinha o mesmo, tal como esperavam os eugenistas. Seus trabalhos foram feitos entre 1943 e 1966 e em 1971 foi agraciado com o título de Sir! Sua pesquisa corroborava TUDO o que a comunidade científica da época aceitava como válido.
    Mas em 1976 um jornalista curioso notou coisas estranhas: gêmeos idênticos criados separados uns dos outros são mercadoria MUITO RARA. Onde e como Burt teria conseguido encontrar 53 pares deles? Ele falava que tivera ajuda de duas colaboradoras, mas o jornalista não obteve qualquer pista delas. Logo sacou que nunca existiram. E finalmente, quando foi achado um diário pessoal de Burt, lá estava a sua confissão de que TUDO era fraude do início ao fim.
    .
    Zé, esta é A VERDADEIRA CIÊNCIA. A Ciência do dia a dia. A Ciência com a qual temos de lidar. Não é nada do que você pensa: “Quando puder apresentar critérios objetivos e operacionais, consistentes e verificáveis, para a aferição da veracidade das mensagens espirituais; e também quando puder mostrar estudos científicos de medição e de composição do perispírito e do próprio espírito, cientificamente reconhecidos, então, aí sim, poder-se-á pensar em falar num outro patamar…”. Isso aí é IDEALISMO. Idealmente, a Ciência DEVERIA SER ASSIM. Mas não é: Ciência, Zé, é AQUILO QUE A COMUNIDADE CIENTÍFICA DIZ QUE É CIÊNCIA. Esse pensamento eugênico de Galton ERA CIÊNCIA porque era aceito por TODA a comunidade científica. Tão aceito que ninguém desconfiou de pesquisas fraudulentas pelo simples fato de que tais pesquisas confirmavam aquilo no que essa turma acreditava. Para o Espiritismo chamar a atenção da comunidade científica, teria de oferecer aquilo que Michael Prescott, um autor de quem o Vitor parece gostar, apresentou como argumento de que os espíritos não atuam como se deles se espera: não anunciam quando vai ocorrer um terremoto na falha de San Andreas, não completam o Teorema de Farmat, não dizem qual o número do bilhete a ser premiado (Prescott citava isso de outro autor, mas o fez de forma totalmente fraudulenta). Se os espíritos fossem como Gênios da Lâmpada a resolverem nossos problemas para que não tivéssemos o trabalho de fazê-lo, podes crê que seriam MUITO CONSIDERADOS pela Comunidade Científica.
    .
    Mas não são Gênios da Lâmpada. São apenas humanos sem corpo e tão limitados como os que ainda têm corpo físico. Daí então, mesmo quando mais de 200 pesquisadores fizeram experimentos e confirmaram ao menos a validade da mediunidade, isso não despertou interesse na Comunidade Científica. E por que? Porque era uma blasfêmia: contraditava a afirmativa de que nada há após a morte do corpo, amplamente aceita entre os cientistas. Sacou?
    .
    Por que você acha que o reencarnacionismo cíclico evolutivo seria falho e um reencarnacionismo “evolutivo em outras dimensões” seria revelação de “espíritos superiores”? À época de Kardec, isso não foi constatado, mas tempos depois foram pesquisadas pessoas que diziam lembrar-se de vidas anteriores. Em alguns casos, suas afirmativas puderam ser comprovadas. Então reencarnação se dá por aqui mesmo, com espíritos que não faleceram bebês, e não necessariamente em outros planos…
    .
    Ah! A autoridade de Kardec… Diga-me uma coisa: quanta autoridade tinha aquele tal de Jesus para criticar os clérigos de sua época? E em termos de quantidade, bem, o Cristianismo abarca 1/3 da humanidade. Seria isso um critério de verdade? E como ficam os tantos debates entre as seitas cristãs e a falta de uniformidade dogmática do Cristianismo? Onde o seu Cristo errou?
    .
    Não sei quantos tentaram lidar com a família de Canuto Abreu, mas não há nada a fazer. Ela detém a posse dos documentos e se não os quer revelar…
    .
    Zé, digamos que ao topar com esse tal reencarnacionismo cíclico evolutivo, Kardec simplesmente teve o famoso:
    _ Opa! Isso explica uma porção de coisas!
    O FATO, veja bem o que estou dizendo: O FATO é que os humanos são muito distintos entre si. O Immanuel Kant mesmo já tinha sacado essa situação: há pessoas que se comportam moralmente bem pois foram LOGICAMENTE convencidas a se comportarem assim. Porém há outras tantas pessoas que só se comportarão moralmente bem quanto mais certas estiverem de que serão atingidas pelas sanções pelo mal comportamento que tiverem. Por que os mensaleiros estavam todos tranquilos? Por que achavam que ninguém ia saber de nada e, mesmo que soubessem, ninguém se atreveria a enfrentar a popularidade do Mulla e botar a boca no trombone. Mas deu tudo errado. Agora vários deles já receberam o veredito de culpados e só falta definir as penas (e pegar os caras, pois é bem provável que quando chegar nesta fase, a menos que a polícia já esteja de olho neles, vão todos para LINS).
    Agora me explica uma coisa: como é possível CONVENCER uma pessoa da validade de certo comportamento moral? A meu ver não é. Podemos assustar a uma criança, dizendo pra não fazer tal coisa porque “Deus castiga”. Mas quando a criança cresce e começa a PENSAR, será que ela levará a sério tal conselho, especialmente se descrer de Deus?
    Kardec topou com essa situação: há pessoas que são boas, outras más, umas morais, outras imorais, etc e tal e tais coisas são INDEPENDENTES de condições sociais. Há também o que as religiões e filosofias não sabem explicar: por que razão pessoas sofrem sem terem nada contribuído para tal situação? Foi isso tudo que levou Kardec a considerar lógico o reencarnacionismo cíclico evolutivo.
    Se a entidade PERENE é o espírito, então o fato de ele vivenciar suas novas existências, com as lembranças das vidas passadas apagadas, não é obstáculo para que ele acumule e aprenda com as experiências vividas. Cada uma é mais uma conta que se soma ao colar.
    O raciocínio do reencarnacionismo cíclico evolutivo é que o ESPÍRITO é quem retém as lembranças e experiências de suas vivências. Se na vida encarnada ele sofre, digamos de focomelia, ou seja, não tem braços, mas vive a vida o mais normal que pode (eu mesmo tive um colega focomélico que estudou na USP e inclusive conseguiu uma namorada bonita entre as colegas de classe), etc e tal. Ao retornar ao mundo espiritual, toma conhecimento da causa de sua focomelia: em vida passada, foi um rufião e, zangado com uma das prostitutas que o fez de bobo, estrangulou-a. Depois, na vida espiritual, arrependido de seu ato, solicitou como punição nascer focomélico.
    Na sua vida encarnada, tal recordação só seria mais um fator de tormento e vergonha.
    Suponha outra situação: dois espíritos desafetos encarnam numa mesma família para tentar se acertar e vencer a animosidade que nutrem. Isso pode dar certo ou não, mas quanta chance de dar certo haveria se eles se recordassem das existências que tiveram como inimigos?
    Portanto, Zé, o exemplo que dei da escola é para o ESPÍRITO e não para as existências temporárias.

    É isso.

  120. Phelippe Diz:

    Ler o texto do grande professor, mais os comentários, é um incentivo ao ateísmo. E para o marxismo e ateísmo militante é um pulo. Penso que, às vezes, é melhor ficar na ignorância.
    Agora, o professor escreve muuiitttooo bemmm… Ele não só explica, destrói, aniquila, e o faz com uma clareza impressionante.

Deixe seu comentário

Entradas (RSS)