A Letra Fantasma (2022), por Thiago Gasparino

O perito criminal Thiago Gasparino faz uma reanálise minuciosa do estudo do grafocopista Carlos Augusto Perandréa em torno de algumas das cartas psicografadas por Chico Xavier, em que supostamente incorporava o espírito de Ilda Mascaro Saullo, uma italiana. Thiago chegou a uma conclusão completamente divergente da de Perandréa. Um trabalho semelhante já havia sido feito por Moizés Montalvão (aqui), mas o Thiago certamente trouxe novos elementos que reforçam boa parte das conclusões a que Montalvão chegou, embora não todas. Para ler o ótimo artigo do Thiago, clique aqui. Para outro artigo do Montalvão com evidências de plágio de Chico, clique aqui.

11 respostas a “A Letra Fantasma (2022), por Thiago Gasparino”

  1. MC Diz:

    Belo artigo! Sobre o caso dessa carta, é possível encontrar alguns elementos que demonstram amplo espaço para que uma fraude intencional tenha sido produzida. Utilizarei relato do caso no livro “Claramente Vivos, do ano de 1979.
    Primeiro, o filho e nora de Ilda, aparentemente, já frequentavam círculos espiritualistas, podendo, com isso, conhecer pessoas em comum com Chico Xavier:
    .
    Em junho de 1977, viajei novamente para lá, e sua alegria era tanta, que suas lágrimas demonstravam uma possível despedida. Naquela ocasião minha esposa e eu, estávamos FREQUENTANDO e lendo os livros de filosofia orientalista.
    .
    Mas há, também, indícios de que já conheciam e frequentavam encontros com Chico tempos antes da morte de Ilda. Possivelmente Xavier já sabia da doença e da morte iminente, tendo tempo de sobra de se preparar:
    .
    “Em setembro de 1977, com o caso gravíssimo de saúde de minha esposa, FOMOS ENCAMINHADOS AO CHICO XAVIER, para nos ajudar na decisão, e fomos iluminados porque sua orientação abriu novos caminhos em nossas vidas. Em dezembro de 1977, dia 22, fomos avisados por telefone do desenlace de mamãe”. (pág. 25)
    .
    Interessante notar o FOMOS ENCAMINHADOS AO CHICO XAVIER, ou seja, é bem possível que conhecidos em comum, portanto conhecedores de informações da família, tenham sido esses encaminhadores.
    Ou seja, não só teve tempo de se preparar, possivelmente sabendo da situação de saúde de Ilda, como também foi informado pelo próprio filho em mais um encontro anterior ao do recebimento da carta em italiano. Nesse encontro, Chico “psicografa” uma mensagem genérica de Ilda:
    .
    “Consegui chegar no enterro no dia 23 em Roma. De volta ao Brasil, FUI À CASA DE NOSSO QUERIDO IRMÃO CHICO XAVIER, que SEMPRE nos acolhe com imenso carinho e amor. Pedi notícias de minha querida mãezinha, a resposta dizia: ‘Que se encontrava em refazimento espiritual com a ajuda de seus familiares. Em outra oportunidade recebemos a mensagem”. (pág. 25)
    .
    Após esses primeiros encontros com Chico (no mínimo 2), o filho e a nora recebem, então, a carta em italiano, objeto do artigo em questão. A família se impressiona por ser em italiano, ter mencionado nomes dos familiares e acham que teve semelhança na grafia:
    .
    “Da outra vez, no entanto, a mensagem veio em italiano, através do lápis de Francisco Cândido Xavier. (…) Da. Maria Teresa; acredita na autenticidade, em primeiro lugar, porque foi recebida em italiano; em segundo lugar, pela semelhança flagrante da letra, da assinatura, como também de frases peculiares, que podem se comprovar PELAS SUAS CARTAS RECEBIDAS PERIODICAMENTE. E ainda – segundo o Sr. Ortensio – pela citação do nome de seu sogro Salvatore Saullo.” (pág. 25)
    .
    Ou seja, Ilda enviava cartas periodicamente para a família no Brasil. A família frequentava círculos espíritas já há algum tempo, sem faslar que Foram ENCAMINHADOS ao médium. Também encontraram-se algumas vezes com ele antes de receberem a carta.
    Logo, não é impossível que uma das cartas da Ilda viva também tenha sido “encaminhada” ao Chico, e, esse, muito do esperto, sabendo do estado de saúde debilitado da senhora e, posterioemente, já tendo sido avisado de sua morte, tenha praticado a imitação de parte da caligrafia da falecida, além de ter decorado o italiano duvidoso para a confecção da carta.
    .
    Outra parte que chama atenção, é que se vê também oportunidade para que Chico tenha trazido a carta já pronta e depois, espertamente, misturado nos bolos de outras cartas. Não há nenhuma espécie de controle nesses pacotes de papéis. Logo, não é improvável que algo assim acontecesse:
    .
    “Na reunião pública do Grupo Espírita da Prece em Uberaba, Minas, aos 4 de março de 1978, o médium Francisco Cândido Xavier, acabava de receber, noite alta, vários ditados psicografados. Habitualmente, logo depois, fora de transe mediúnico, ele organizava OS PACOTES DE LAUDA ESCRITAS, SEPARA AS MENSAGENSe as lê em seguida. Assim aconteceu. Mas, a última, o destinatário da referida mensagem, é chamado à cabeceira da mesa para recebê-la. No ato da entrega, o médium pediu-lhe para ler e traduzir par ao público presente à reunião, pois, a mesma estava escrito em italiano. Com a autorização de Ortensio, a mensagem aqui está, reproduzida fotograficamente numa única página. No dia em que recebeu esta cartinha, durante a viagem de São Paulo a Uberaba, Otensio ‘sentiu que receberia mensagem de sua mãe’. HÁ 6 MESES ELE VINHA FREQUENTANDO TRABALHOS ESPÍRITAS e, inclusive, 1 mês antes, tinha estado em Uberaba, em reunião pública do Grupo Espírita da Prece” (pág. 21)
    .
    Ou seja, não é possível afastar a possibilidade de fraude de maneira convincente, pelo contrário, só com esses poucos elementos indiretos e relatatados de maneira descompromissada, é possível ver várias brechas em que isso possa ter acontecido.

  2. Vitor Diz:

    Ótimos comentários, MC!

  3. MC Diz:

    *Na primeira citação, faltou a página:
    .
    “Em junho de 1977, viajei novamente para lá, e sua alegria era tanta, que suas lágrimas demonstravam uma possível despedida. Naquela ocasião minha esposa e eu, estávamos FREQUENTANDO e lendo os livros de filosofia orientalista.” (pág. 24)

  4. montalvão Diz:

    Quando se pensava que a “prova científica” de Perandrea se esgotara por si mesma pela falta de fundamento, eis que aparece um belo trabalho a apontar falhas no estudo/pesquisa do grafotécnico espírita! Decerto que ainda há muitos espíritas proclamando demonstração da mediunidade calcada na ciência, referindo ao estudo do Perandrea!

    Devo agradecer por ter lembrado que meu questionamento às alegações do grafotécnico fora postado nesse site, o que rendeu comentários interessantes.

    Porém o link que remeteria a esse estudo, para que interessados pudessem acompanhar, não expõe o trabalho, apenas um comentário a respeito dele!

    Quem tenha curiosidade no assunto ficará sem saber se o autor falou coisa que mereça consideração ou escorregou na maionese!

    O autor, no caso, é este que vos fala.

  5. montalvão Diz:

    O autor da “Letra Fantasma” cita as controvérsias em relação à Marte, que teriam sido divulgadas por Maria João de Deus, mãe de Chico, em viagem que encetara pelo sistema solar e adjacências.
    .
    Lembro que um estudo que fiz sobre esse tema também foi publicado nesse site, o título era “Chico Xavier e os Seres interplanetários”, não recordo se aqui fora dado outro título.
    .
    Já que tem gente nova no blog, caso alguém se interesse, seria recomendável que pusesse link também para esse trabalho.

  6. Vitor Diz:

    Montalvão disse: “Porém o link que remeteria a esse estudo, para que interessados pudessem acompanhar, não expõe o trabalho, apenas um comentário a respeito dele!”
    .
    O link está abaixo do comentário, em “Open publication”

  7. MONTALVÃO Diz:

    Achei alguns pontos em comum entre o estudo do Gasparino e o meu, para exemplificar, destaco os que seguem:
    .
    ——————————-
    GASPARINO: “Ainda na primeira página, Perandréa afirma que “constatou-se a ineficácia da aplicabilidade do método convencional de exames para a determinação da autoria gráfica”. Em seguida o que se vê é uma exposição sobre como, para conciliar o que ele está vendo com a conclusão que quer chegar, ele ignora a boa prática da grafoscopia – que nunca foi perfeita, e era ainda pior naquela época – e se aprofunda nos princípios do espiritismo! É isso mesmo, temos citação de doutrina kardecista em uma publicação que pretende ser científica. E, não. Não é revista de estudos religiosos, antropologia da religião, ou algo do tipo.
    .
    Ele se baseia em doutrina espírita e usa isso como princípio para guiar a sua análise grafoscópica. Assim, encontra justificativas para: ignorar as evidências contrárias à conclusão desejada, racionalizar as diferenças como se fossem algum tipo de “distorção ou ruído de canal” (neste caso, de “médium”), e apenas procurar semelhanças. Procurar e as encontrar até onde elas não existem, diga-se de passagem. Logo chegaremos a isso.
    .
    Traduzindo: ele não “usou a mesma técnica usada por bancos e tribunais” para determinar a autoria do escrito, como os defensores do espiritismo costumam dizer. Não! Pelo contrário. Ele falou que a técnica não é adequada, partiu do princípio de que a psicografia é real, e distorceu uma técnica que já não era muito confiável de princípio, para concluir que a letra era dela.
    ======================
    /
    /

    MONTALVÃO: Na introdução de seu livro Perandréa apresenta ponderações que cabem ser avaliadas, vejamos o que foi dito (os realces são de nossa autoria):
    .
    ————————————–
    PERANDREA: “Os resultados iniciais pareciam não fazer sentido dentro dos princípios básicos da grafoscopia. Procurou-se saber as causas. Não obstante as dificuldades, ficava caracterizada a necessidade de melhor se compreender alguns pontos fundamentais da própria psicografia. E, para tanto, foram buscadas nas obras de Allan Kardec as respostas para o entendimento e desenvolvimento desse trabalho.”
    .
    “Em decorrência desse novo estudo, constatou-se a ineficácia da aplicabilidade do método convencional de exames para a determinação da autoria gráfica. Sabe-se que nos exames de escritas cursivas normais, segundo técnica largamente aconselhada, o examinador inicialmente levanta os dados da cultura gráfica e do grau de firmeza, ao tempo em que a dinâmica e a própria gênese gráfica vão se revelando aos olhos experimentados do especialista.”
    .
    “Comprovou-se que a técnica de conferência mais adequada é a aplicada para os exames das escritas em alfabetos ideográficos e em escritas numéricas, ou seja, parte-se dos exames da gênese gráfica reforçados pelos demais exames.”
    .
    “Confirmou-se a necessidade da valorização de alguns pontos de grafoscopia, como a cultura gráfica, as causas modificadoras do grafismo, a mão amparada, a mão guiada e principalmente o pivô da escrita, todos analisados a partir da gênese gráfica.”
    ————————————–
    .
    A não ser que haja melhor interpretação desse proferimento ? a qual desconhecemos ?, o que o técnico está a dizer é que a grafoscopia não ampara a exótica tese que defende ? a do hibridismo gráfico (mistura de grafismos) como autenticação de escritos psicografados ?; então, foi necessário buscar em outras fontes apoio para o que se postula. Assim, Perandréa “adaptou” técnicas de exame em alfabetos ideográficos para a escrita cursiva (o que parece arbitrário), e, pior, foi buscar nas obras ? de quem? ? de Allan Kardec as respostas que necessitava! Ora, ora, com todo o respeito que cabe a Kardec, é óbvio que os escritos da codificação nada dizem sobre grafoscopia!
    .
    Nas referências bibliográficas, Perandréa cita 29 obras. Destas 5 são livros técnicos; 3 não identificamos (os títulos estão em alemão), provavelmente sejam também técnicos, e, 21 são especificamente espíritas, algumas tratando especificamente de reencarnação, o que parece não ter relação com a tese em estudo. Portanto, a maioria dos subsídios do estudo foi extraída de material espiritista, não técnico!
    .
    O que Perandréa apresenta, em suma, é uma obra predominantemente espiritista, com pinceladas de grafotecnia, e apresentada indevidamente como “trabalho científico”. Uma associação de assuntos díspares, que certamente especialistas da área não corroborariam.

  8. montalvão Diz:

    VITOR DISSE: “O link está abaixo do comentário, em “Open publication””
    .
    COMENTÁRIO: o difícil é achar a “open publication”, mas tudo bem, se ninguém demonstrar interesse pelo artigo deixa quieto.

  9. montalvão Diz:

    No meu texto de exemplificação, em parte dele, o sistema transformou travessão em interrogação, creio que dá para entender…

  10. montalvão Diz:

    Outra similaridade nos estudos. Postei conforme consta nas duas pesquisas, mas as imagens não vão aparecer no Obras, que não consegue lidar com elas. Quem quiser conferir terá que ir onde o trabalho foi publicado.
    /
    /
    ————————————-
    GSPARINO: A seguir, o autor diz que “Todas as peças apresentam semelhanças nos gramas constitutivos do símbolo ‘F’,(…)” (acredito que ele quis dizer símbolo ‘f’), e oferece como evidência imagens de algumas ocorrências da palavra “famiglia” (família), que aparece uma vez na carta psicografada (Q) e duas na carta de Ilda (P). Ao contrário do que ele alega, os ‘f’ são muito diferentes nas duas cartas.
    .
    Na figura abaixo eu mostro todas as ocorrências da letra ‘f’ nas duas cartas. Na linha de cima as de Xavier, na de baixo as de Ilda. Ilda tem certa uniformidade na forma como desenhava seus ‘f’, chamando a atenção a forma como fazia o laço inferior. Xavier apresenta mais variabilidade e em nenhuma das versões da letra ‘f’ produzidas por ele o desenho é como o de Ilda.
    .
    A tendência dele é fazer o laço inferior para a direita (Q1, na imagem abaixo) e uma voltinha para chegar por cima (Q2) e fazer o corte. Ela faz um laço inferior para a esquerda (P1) e chega por baixo para fazer o corte (P2). São construções muito diferentes, e não servem como suporte à tese defendida no artigo, muito pelo contrário.
    =================
    /
    /
    MONTALVÃO: Perandréa destaca os termos “famiglia” e “famigliar” vertidos por ILDA e os compara com a escrita psicografada. A respeito deles afirma:
    .
    ————————————
    PERANDRÉA: “Todas as peças apresentam semelhanças nos gramas constitutivos do símbolo “f”, inclusive no grama de ligação com a letra “a”; verificam-se, ainda, no símbolo “m”, as mesmas formações de sentidos e tendências genéticas, com semelhanças também na inclinação dos eixos gramáticos.”
    ——————————–
    .
    Ora, uma descompromissada olhadela no “f” nos mostra coisa diferente. O “f” de ILDA é formado divergentemente ao de Chico. O próprio aspecto mostra isso. Veja abaixo as diferenças:

    ILDA ILDA XAVIER
    .
    ILDA faz o “f” como se fora um “j”; o de Chico é mais estilizado; neste, antes do grama que parte para a letra “a”, existem dois “nós” bem característicos. O ataque inicial de ILDA situa-se próximo ao “tronco” da letra, o de Xavier é mais aberto. Se pudermos verificar em outras reproduções desses grafismos as características observadas, teremos sobejas razões para discordar da declaração de Perandréa de que “Todas as peças apresentam semelhanças nos gramas constitutivos do símbolo ‘f’”.
    .
    Note-se, ainda, a progressão do traço de ILDA é desarmônica com a de Chico: do ataque inicial, ILDA parte em sentido ascendente (subindo) até o ápice da letra; de lá desce até a base, onde descreve curva para A ESQUERDA, ou seja, para o lado de “fora” da palavra (Siga com o dedo o traçado).
    .
    Chico inicia de um ponto mais aberto, segue em traço curvo-ascendente até um ponto de onde inicia a subida ao topo; de lá desce à base, descreve curva À DIREITA.
    .
    A propensão do “f” de ILDA é formar uma “barriga” na base da letra; o de Chico é dar um “nó” na base.
    .

    Vejamos como se comportam os “efes” de ILDA e de Chico em outras palavras encontradas nos textos constantes do livro de Perandréa.
    .
    Primeiramente Chico Xavier: [AS FIGURAS NÃO APARECEM AO POSTAR NO SITE]
    .

    .

    Agora, ILDA: [AS FIGURAS NÃO APARECEM AO POSTAR NO SITE]

    .

    Percebe-se muito bem: nos “f” de ILDA estão presentes as características de assemelhar-se a um “j” e formar uma “barriguinha” na parte inferior e sair com o traço para a esquerda. Os de Chico variam: em dois espécimes o traço é rápido, quase “nervoso”; nos outros três o traçado é peculiar e em nada assemelhado ao de ILDA: e a saída da base é sempre para a direita.
    .
    Quanto a inclinação Perandréa está correto, realmente se equivalem, porém isso é pouco em vista das dessemelhanças.
    .
    Observe-se que ILDA mostra claro pendor para redigir as palavras com um só ataque; em Chico as paradas e retomadas são evidentes, e isso pode ser considerado divergência geral entre os escritos dos dois autores. Nos exemplos destacados, coisas parecidas podem ser ditas sobre a letra “g”. Apenas no segundo “figli” traçado por Chico há ligeira semelhança entre os “gês”, embora este seja anguloso, enquanto o de ILDA é curvilíneo.
    .
    PORTANTO, FICA PREJUDICADA A ASSERTIVA DE PERANDRÉA DE QUE AS LETRAS “F” GRAFADAS POR CHICO E AS TRAÇADAS POR ILDA SE HARMONIZAM.

  11. montalvão Diz:

    Lendo o texto do Gasparino vejo que ele fez referência ao meu trabalho, embora discorde de algumas assertivas que fiz, pareceu-me que no geral concordamos nos pontos de vista.

Deixe seu comentário

Entradas (RSS)