O Caso de Imad Elawar, pARTE 1 (1974 – Relatório Completo)
Este é um alegado caso de reencarnação estudado por Ian Stevenson, e talvez o mais discutido por céticos e crentes. Aqui apresento o caso completo como publicado na 2ª edição do livro “Vinte Casos Sugestivos de Reencarnação” (1974). Em seguida apresentarei artigos do antropólogo James G. Matlock, do cético Leonard Angel, a réplica de Ian Stevenson a Angel e uma análise do biólogo brasileiro Julio Siqueira levando em consideração a análise de Angel e a réplica de Stevenson.
O Caso de Imad Elawar
Sumário do Caso e sua Investigação
Durante uma visita de investigação que fiz ao Brasil, em 1962, um jovem intérprete de inglês-português, nascido no Líbano, muito me auxiliou, demonstrando também interesse por minhas investigações. Contou-me que, em sua aldeia natal no Líbano, Kornayel, ocorrem numerosos casos do tipo que me interessava, isto é, de crianças que alegam recordar-se de uma vida anterior. Deu-me um cartão com uma nota, em árabe, para seu irmão, naquela aldeia. Com aquele cartão como minha única apresentação, fui à aldeia de Kornayel, em 16 de março de 1964. Investigando, vim a saber que o irmão do meu amigo tinha ido para Beirute, ali passar o inverno, como faz muita gente das aldeias do Líbano situadas nas montanhas muito mais frias, a leste da cidade. Quando contei o que me interessava às pessoas a quem perguntávamos o caminho, algumas delas imediatamente disseram que uma criança de sua comunidade estivera fazendo tais alegações quanto a uma vida pregressa. Aconteceu que o Sr. Mohammed Elawar, pai da criança, Imad Elawar, era primo do homem que eu procurava e do meu amigo intérprete do Brasil. A família de Imad convidou-me a ouvir os pormenores de suas declarações sobre sua vida anterior.
Naquela noite, 16 de março, tomei, portanto, notas escritas de tudo o que o pai e a mãe de Imad me contaram sobre as declarações deste, juntamente com alguns testemunhos corroborantes ou adicionais prestados por outros parentes presentes à entrevista. Naquela ocasião, porém, eu tinha comigo apenas um chofer, com um deficiente conhecimento de francês e de inglês, e que, muito pior, demonstrava falta de atenção cuidadosa aos detalhes. Por isso decidi utilizar-me de guias experimentados, e nos outros quatro dias seguintes a esta visita tive excelentes intérpretes. Estes guias, o Sr. Clement Abushdid e o Sr. Wadih Rabbath, ambos educados em escolas francesas de Beirute, falavam francês corretamente e inglês sofrivelmente. Quis-me parecer que teríamos um alcance mais seguro de termos técnicos se nos utilizássemos do francês, por isso falei nessa língua com eles durante toda a investigação. Ambos se interessaram pelos detalhes do caso e dedicaram-lhe meticulosa atenção, pelo que vi, para me proporcionarem traduções exatas do que era dito pelos informantes. Estes falavam todos apenas o árabe, com exceção de um que falava um pouco de francês.
Em agosto de 1964, voltei ao Líbano para reexaminar o caso e para ver se conseguia mais alguma evidência adicional da parte da família da personalidade anterior, de vez que o depoimento em março tinha se limitado às declarações de uma única testemunha. Nesta segunda visita, contei com a competente assistência do Dr. Sami Makarem, membro do Departamento de Estudos Árabes da Universidade Americana de Beirute. O Dr. Makarem, formado pela Universidade de Michigan, tem um excelente domínio do inglês e atuou como meu intérprete durante esta visita. Reexaminei com ele cerca da quarta parte dos itens declarados nos depoimentos das testemunhas, quanto ao que Imad havia dito e feito, e também entrevistei várias outras testemunhas da vida da personalidade anterior do caso. Assim, para muitos dos itens obtive informação através de três intérpretes diferentes em diferentes ocasiões, o que me permitiu comparar as traduções umas com as outras. O excelente conhecimento que o Dr. Makarem tinha do inglês e do árabe permitiu-me igualmente analisar e compreender algumas discrepâncias no testemunho, as quais comentarei mais adiante. Nessa segunda visita ao Líbano, o Sr. Wadith Rabbath novamente auxiliou-me como intérprete (do árabe para o francês), durante um dia.
Na primeira entrevista com a família de Imad, eu soube que ele nascera em 21 de dezembro de 1958. Tinha, portanto, pouco mais de cinco anos na ocasião de minha primeira visita. Entre um ano e meio e dois anos, ele havia começado a fazer referências a uma vida anterior. Tinha mencionado um número considerável de nomes de pessoas e alguns acontecimentos daquela vida, assim como vários itens quanto a propriedades que alegava ter possuído. Às vezes falava consigo mesmo sobre pessoas cujo nome dizia, perguntando-se a si mesmo, em voz alta, como ia indo essa gente. Afora tais solilóquios, suas declarações sobre a vida anterior ocorreram em momentos inesperados, aqui e ali, quando algo parecia estimulá-lo a isso. Parece que também falava sobre o assunto durante o sono. Ele ainda fazia declarações sobre a vida pregressa, na época de minhas visitas. Imad havia dito o nome da aldeia (Khriby) em que alegava ter morado, e o da família (Bouhamzy) à qual alegava ter pertencido; tinha pedido insistentemente à sua família que o levasse a Khriby.
O pai de Imad contou-me que ele próprio havia ralhado com Imad por ser um mentiroso, contando aquelas histórias de uma outra vida. O menino, então, aprendeu a evitar o assunto com o pai, e, conseqüentemente, falava mais com a mãe e os pais paternos, que moravam com seus pais.
Certo dia, um morador (Salim el Aschkar), da aldeia de Khriby, na qual Imad dizia ter morado, veio a Kornayel e Imad, vendo-o na rua, reconheceu-o na presença de sua avó paterna. (Para detalhes deste reconhecimento, vide Tabulação 1, item 57). Este reconhecimento inesperado fez aumentar, nos pais de Imad, a credibilidade de suas declarações sobre sua vida pregressa. Mas, ainda assim sua família não deu nenhum passo para averiguar suas declarações. Algum tempo depois, aconteceu que eles encontrassem uma mulher de Masser el Chouf, aldeia próxima de Khriby a qual havia ido a Kornayel,
Visto Imad haver citado um número considerável de nomes, sua família procurou encaixá-los em algum tipo de laços de família. As primeiras palavras que ele havia falado foram “Jamileh” e “Mahmoud”, e tinha falado em Jamileh repetidas vezes, e comparado sua beleza com a aparência menos atraente de sua mãe. Falou também num desastre em que um caminhão atropelara um homem, quebrando-lhe as duas pernas e causando-lhe outros ferimentos que o levaram à morte, pouco tempo após o desastre. Imad havia falado de uma briga entre o motorista do caminhão e o homem atropelado, e ele se inclinara a achar que o motorista tencionava matar o homem acidentado, atropelando-o propositadamente com seu caminhão. Imad tinha também se referido a um desastre de ônibus. Disse pertencer à família Bouhamzy, de Khriby. E, mais tarde, demonstrara uma estranha alegria em poder andar, repetindo sempre quão feliz se sentia por isto.
Sua família reunira todas essas declarações, como segue. Achavam que ele alegava ser um tal Mahmoud Bouhamzy, de Khriby, que tinha uma esposa chamada Jamileh, e que fora fatalmente acidentado por um caminhão depois de uma briga com o motorista do mesmo. Aconteceu que Imad nunca realmente disse que o acidente fatal com o caminhão ocorrera com ele; apenas o descrevera vivamente. Nem dissera especificamente que Jamileh fora sua mulher; apenas referia-se a ela constantemente. A família de Imad determinou outras colocações em sua “família anterior” para algumas das pessoas cujos nomes ele mencionara. Assim, acharam que duas das pessoas mencionadas foram seus filhos. Posteriormente tiraram outras conclusões que se revelaram errôneas e cujos detalhes anotarei na tabulação sumarizada e na discussão adiante. Embora eu procurasse saber exatamente o que o próprio Imad havia dito, seus pais me comunicaram, como tendo sido ditas por ele, algumas das conclusões que eles próprios haviam tirado em sua tentativa de encontrar uma feição coerente para toda a história. Aconteceu, porém, que erros nas conclusões tiradas pela família de Imad contribuem consideravelmente para a evidência de sua sinceridade, e também para a improbabilidade de que eles próprios tivessem servido de fonte ou canal das informações transmitidas por Imad.
Depois de minha primeira conversa com a família de Imad, propus-lhes que no dia seguinte fossemos em pequeno grupo, com Imad, à aldeia de Khriby, para lá verificar, se possível, as declarações que ele havia feito e para observar se era capaz de reconhecer algumas pessoas ou locais da região. Concordaram prontamente com isso e a 17 de março voltei a Kornayel e tive uma segunda entrevista com os membros da família de Imad, com um novo intérprete, A impressão que eu já havia sentido quanto à exatidão dos detalhes que havia anotado na noite anterior, levou-me a repassar todos os pontos principais novamente, com a família e o competente intérprete, antes de seguirmos para Khriby. Quando partimos para Khriby, eu já tinha uma versão correta de tudo o que os pais puderam lembrar-se de ter sido dito por Imad acerca da vida pregressa. Durante o caminho rumo a Khriby, para onde, no fim, apenas Imad e o pai vieram comigo e o intérprete, Imad fez mais umas poucas declarações relativas à vida anterior, e seu pai também relatou alguns itens adicionais. Tomei nota de tudo isso no carro, antes de chegarmos a Khriby. Ainda mais alguns itens surgiram mais tarde, depois de começada a averiguação, pois a família de Imad recordou-se de mais alguns pormenores relativos a declarações ou comportamento dele, os quais haviam esquecido antes ou haviam omitido. Anotei estas várias diferenças ao registrar os dados na Tabulação 1, adiante.
Antes do resumo da narrativa de minhas pesquisas, apresentarei uma digressão preambular acerca das aldeias em foco e das comunicações entre elas.
Fatos Geográficos Importantes e Meios Normais de Comunicação Possíveis Entre as Duas Famílias.
A aldeia de Kornayel onde moram Imad e sua família fica nas montanhas, 24 quilômetros a leste de Beirute. A aldeia de Khriby, na qual Imad alega ter vivido, fica a 32 quilômetros a sudeste de Beirute. As duas aldeias são separadas pela distância de 24 quilômetros em linha reta, mas a estrada extremamente sinuosa que fica entre elas nas montanhas tem mais de 40 quilômetros. Ambas se acham em estradas de terra batida, razoavelmente boas, com linhas de ônibus para Beirute Mas nenhum tráfego regular direto liga as duas aldeias. Uma outra cidadezinha, Baadaran, que figura de modo importante nos depoimentos, fica perto de Khriby, a cerca de 5 quilômetros de distância.
Os drusos têm o costume de convidar membros de outras aldeias para assistirem funerais. Os parentes do morto enviam mensageiros às aldeias nas quais possam estar morando membros de sua família, ou haver parentes por afinidade, convidando-os para o funeral. Somente as pessoas da outra aldeia, que têm alguma ligação com a família do morto, são comumente convidadas a essas exéquias, a menos que o morto venha a ser pessoa de excepcional importância. Neste caso, habitantes de todas as aldeias podem receber convite. Como já foi dito, um convite mais ou menos público para o funeral de Said Bouhamzy, de Khriby, em dezembro de 1963, foi o que provocou a primeira visita do pai e do tio-avô de Imad a Khriby. Parece muito improvável que tivesse havido qualquer intercâmbio entre as duas aldeias, exceto por motivo dos tais funerais ou de algum casamento eventual entre pessoas das mesmas. Estes detalhes quanto às possibilidades de contato entre as aldeias adquirem importância na apreciação de como Imad veio a obter a informação que demonstrou possuir quanto a pessoas e locais de Khriby.
Procurando por pessoas que pudessem ter conhecido as duas famílias, (embora ambas negassem conhecer-se uma à outra), eu soube de duas, já mencionadas, que conheciam alguma coisa sobre a família Bouhamzy de Khriby, e que tinham ido a Kornayel e estado com a família Elawar. Descobri uma outra pessoa que conhecia as duas famílias, e assim contarei pormenores de suas relações com ambas, conforme eu os soube.
O Sr. Kassim Elawar, avô paterno de Imad, tem um parente, o Sr. Faris Amin Elawar, que tinha sabido de um acidente de ônibus que correspondia ao acidente narrado por Imad. Esse fato ocorrera na aldeia de Baadaran, próximo de Khriby (vide item 23, da Tabulação 1). O Sr. Faris Amin Elawar ia a Baadaran de tempos a tempos, a negócios, e tinha algum conhecimento não muito íntimo, com a família Bouhamzy daquele lugar. Ele também visitava freqüentemente a família Elawar,
A Primeira Visita a Khriby
Na minha primeira visita a Khriby, no dia 17 de março, entrevistei dois informantes da aldeia, o Sr. Kassim Mahmoud el Aschkar e o Sr. Khalil Lateif. Eles eram conhecidos da família Bouhamzy e comprovaram que um tal Said Bouhamzy, de Khriby, havia de fato morrido (em junho de 1943) depois de ter sido atropelado por um caminhão. Este Said Bouhamzy era amigo do Said Bouhamzy (também de Khriby), que morrera em dezembro de 1983, como já foi dito. Confirmaram igualmente a existência de várias pessoas da aldeia, cujos nomes correspondiam aos mencionados por Imad. Deram a Jamileh, incorretamente como se evidenciou, a posição da esposa de Mahmoud Bouhamzy (parente de Said Bouhamzy) em vez da de esposa de Said Bouhamzy, o homem morto pelo caminhão. Para outros itens, seus depoimentos foram deficientes ou inexatos quando confrontados com os do filho de Said Bouhamzy, a quem entrevistei no dia seguinte. Este informante, Sr. Haffez Bouhamzy, tinha ido a Beirute no dia de nossa primeira visita. A única pessoa que pude entrevistar naquela ocasião foi o Sr. Yousef el Halibi, um senhor de idade, preso a uma cama já havia muitos anos e com um enfraquecimento de memória muito acentuado. Confirmou ter sido amigo de Said Bouhamazy, mas não pôde fornecer outras confirmações de detalhes das narrativas de Imad com respeito à vida anterior. Nesta ocasião, Imad apontou corretamente na direção da casa em que dizia ter morado, e fez mais duas outras declarações sugestivas de um conhecimento paranormal da aldeia, mas não esteve com nenhum membro da família Bouhamzy1.
A Segunda Visita a Khriby
No dia seguinte, 18 de março, voltei a Khriby com o Sr. Abushdid, que atuou como intérprete, mas sem pessoas da família Hawar. O Sr. Haffez Bouhamzy tinha voltado a Khriby e forneceu-me muitas informações pormenorizadas sobre a família Bouhamzy. Eu havia sabido no dia anterior, que não fora Mahmoud Bouhamzy mas sim Said Bouhamzy a pessoa morta pelo caminhão. Agora, soube de duas outras embaraçantes informações. Primeiro, que Said Bouhamzy, que fôra morto pelo caminhão, não tinha tido nenhuma ligação com a mulher chamada Jamileh; além disso, detalhes descritivos de “sua” casa, dados por Imad, não correspondiam aos da casa de Said Bouhamzy,
O Sr. Haffez Bouhamzy, porém, procurou enquadrar as declarações de Imad a outras pessoas da família, como Mahmoud Bouhamzy, em um tal Salim Bouhamzy, ambos residentes
Farei mais tarde uma revisão desses aspectos de comportamento, em grupo, mas tornarei a citar aqui as repetidas expressões de prazer, por parte de Imad, pelo fato de ser capaz de andar. No dia 18 de março, eu soube pelo Sr. Haffez Bouhamzy que a morte, depois do desastre de caminhão do amigo e parente de Ibrahim, Said Bouhamzy, ocorrido no dia 8 de junho de 1943, havia afetado muito a Ibrahim Bouhamzy. Mas isso não me ajudou a compreender por que, se havia alguma relação entre a personalidade de Ibrahim e a de Imad, este (Imad) expressaria tanta alegria por poder andar: Ibrahim Bouhamzy, cuja vida parecia coincidir com as declarações de Imad, não havia quebrado suas pernas. Havia, na verdade, morrido tuberculoso, quando tinha cerca de vinte e cinco anos, depois de passar mais ou menos um ano num sanatório. Como foi feita referência a uma doença nas costas, ocorreu-me perguntar, no dia seguinte, se por acaso Ibrahim tinha tido tuberculose na espinha. O Sr. Haffez Bouhamzy contou, então, que Ibrahim tivera tuberculose na espinha e que, durante a moléstia, tinha grande dificuldade para andar; nos últimos dois meses de sua vida ficara completamente impossibilitado de caminhar. Neste lastimoso estado, Ibrahim lamentava-se por estar doente, parecendo sentir certa injustiça no fato de uma criatura tão jovem e antes tão forte, estar assim inutilizada. O Sr. Haffez Bouhamzy ouviu-o certa vez dizer que, se Deus o curasse, ele se tornaria sacerdote. O Sr. Fuad Bouhamzy irmão de Ibrahim, quando foi entrevistado mais tarde, não confirmou a declaração de Haffez de que Ibrahim tivesse tido tuberculose de espinha ou tivesse ficado impossibilitado de andar. Segundo ele, a tuberculose afetara apenas os pulmões e o pericárdio. Ibrahim tinha podido andar, até pouco antes de sua morte, disse ele. Estava, contudo, debilitado, e passou os últimos seis meses de vida no hospital, a maior parte do tempo, de cama. Saiu do hospital para a casa dos seus, pouco antes de morrer3. A alegria de Imad por poder “estar de pé e andando” (quando aprendeu a andar) correspondia assim, com a derradeira moléstia e atitudes de Ibrahim Bouhamzy.
A Terceira Visita a Khriby
Finalmente, depois de ter encontrado uma pessoa com detalhes de vida, de atitudes e de haveres que correspondiam exatamente aos descritos ou demonstrados por Imad, pareceu-me importante observar se este poderia fazer reconhecimentos dos membros ainda vivos da família de Ibrahim Bouhamzy, ou reconhecer o interior da casa na qual tinha morado e para a qual fora trazido de volta para morrer, dois dias antes de seu falecimento. Deste modo, a 19 de março voltei a Kornayel, e persuadi o Sr. Mohammed Elawar a acompanhar-me a Khriby novamente, com Imad. Quanto a Imad, devo dizer, não foi preciso persuadi-lo, porque fazia anos que ele pedia aos pais que o levassem a Khriby, e a proposta de uma outra viagem para lá iluminou-lhe a face com sorrisos de satisfação. Em Khriby, Imad tornou-se tímido e ficou mesmo perturbado ao entrar na casa de Said Bouhamzy, para onde fomos em primeiro lugar. Não demonstrou nenhum sinal de reconhecer qualquer dos aspectos da casa e não conseguiu reconhecer nenhuma dentre as várias fotografias da família de Said Bouhamzy, num álbum que lhe foi apresentado. Aos poucos foi se acalmando, porém, e, ainda na casa, mostrou grande interesse por duas perdizes em uma gaiola, as quais ele queria levar para sua casa, e teria levado se o pai (ou o dono delas) tivesse permitido. Caminhamos então até a casa de Ibrahim Bouhamzy, que era próxima. Eu tinha esperado arranjar uma apresentação em série, de membros da família de Ibrahim ao menino, sob condições que pudessem excluir a transmissão de quaisquer indiretas ou sugestões a ele. Infelizmente, quando chegamos a casa, as coisas fugiram ao meu controle porque três senhoras, residentes na aldeia, apareceram inesperadamente e levaram o menino com elas pela casa adentro. Eram a mãe e a irmã de Ibrahim Bouhamzy e uma vizinha. Nestas circunstâncias, o intérprete e eu seguimos o pequeno grupo, que incluía ainda apenas o Sr. Haffez Bouhamzy e o Sr. Mohammed Elawar. O intérprete (naquele dia o Sr. Wadih Rabbath) fez todo o possível para controlar tudo o que diziam a Imad enquanto lhe faziam perguntas. Depois me relatava o que fora dito e eu fazia as anotações no momento. Imad fez treze reconhecimentos ou outras declarações posteriores exatas quanto à vida de Ibrahim Bouhamzy, nessas circunstâncias. Na maior parte deles, o Sr. Rabbath sentiu-se seguro de ter ouvido todas as importantes trocas de palavras entre Imad e as senhoras que o interpelavam, e de que elas não fizeram indiretas ou sugestões às respostas dele. Quanto aos itens restantes, o Sr. Kabbath não pôde ouvi-los (talvez por estar descrevendo o item precedente, para mim) e só soubemos depois, através dos informantes, o que Imad havia dito. Indiquei essas alterações nas observações da Tabulação 2, adiante.
A Visita a Raha, Síria.
No final da terceira visita a Khriby, eu havia relatado quase todos os nomes mencionados por Imad, a pessoas conhecidas de Ibrahim Bouhamzy. Porém três nomes ficaram sem colocação. Estes nada sugeriam ao Sr. Haffez Bouhamzy. Meus informantes os atribuíram à vida intermediária na qual, segundo insistiam, Ibrahim havia vivido no período entre a sua morte, em 1949, e o nascimento de Imad, em 1958. Eles consideravam aqueles nomes os vestígios daquela vida intermediária, que, para eles, era uma certeza, não uma hipótese. Mas a mim pareceu possível que aqueles nomes também poderiam ter uma colocação na vida de Ibrahim, e que Sleimann Bouhamzy, que alegava ter sido Said Bouhamzy renascido, poderia talvez fornecer alguma informação tirada quer de seu estoque de informações como sobrinho de Said Bouhamzy, quer daquilo que ele próprio alegava lembrar-se da vida pregressa de Said Bouhamzy. Também me pareceu importante saber mais alguma coisa sobre suas alegações de reminiscências de uma vida anterior, embora ele (nascido em 3 de dezembro de 1943) fosse naquela época um homem adulto. Para isso, no dia 20 de março, fui com o Sr. Wadih Rabbath e o Sr. Mohammed Elawar à aldeia de Raha, no Djebel Druso da Síria. Esta aldeia fica a sudoeste de Damasco, na Síria, e a cerca de 144 quilômetros a sudeste de Beirute. As estradas de Beirute e de Damasco chegam a ela num trajeto cheio de voltas, sendo que, em linha reta fica apenas a 46 quilômetros a leste de Khriby.
Em Raha, o Sr. Sleimann Bouhamzy descreveu-nos o que se lembrava de sua experiência de parecer recordar-se da vida de Said Bouhamzy. E realmente contribuiu para a verificação das declarações de Imad. Voltarei a falar nessa narração em uma secção mais adiante neste relatório.
A Quarta Visita a Khriby e Circunjacências
No fim de minha estada no Líbano, em março de 1964, as verificações das declarações atribuídas a Imad Elawar partiram em grande parte de apenas uma testemunha, o Sr. Haffez Bouhamzy. Conquanto eu tivesse me encontrado com a irmã e a mãe de Ibrahim Bouhamzy, e elas tivessem participado, como já expliquei, da segunda visita de Imad a Khriby, eu não as havia entrevistado. Eu não tinha nenhuma razão para duvidar do depoimento de Haffez Bouhamzy, mas achava que devia confrontá-lo com o de outras testemunhas. Por isso, resolvi voltar novamente, o que fiz em agosto de 1964. Nessa ocasião, além de reexaminar alguns dos detalhes com a família de Imad em Kornayel, tornei a ir a Khriby. Lá consegui entrevistar o Sr. Nabih Bouhamzy (irmão de Haffez Bouhamzy), que fala inglês, o Sr. Fuad Bouhamzy (irmão de Ibrahim Bouhamzy), que fala inglês e francês, e (ligeiramente) a irmã de Ibrahim, a Sra. Huda Bouhamzy. Falei também com outras testemunhas menos importantes. Estas novas testemunhas confirmaram, excetuando alguns pequenos detalhes, o depoimento do Sr. Haffez Bouhamzy, e também alguns itens, antes obscuros ou aparentemente discordantes. Surgiram alguns itens de declarações feitas por Imad completamente novos (isto é, não relatados anteriormente) e foram submetidos a verificação nesta última oportunidade também.
Pessoas Entrevistadas Durante a Investigação
Em Kornayel, entrevistei:
Imad Elawar.
Sr. Mohammed Kassim Elawar, pai de Imad.
Sra. Mohammed Kassim Elawar, mãe de Imad.
Sr. Ali Hussain Elawar, primo do Sr. Mohammed Elawar.
Sr. Kassim Elawar, avô paterno de Imad.
Sra. Naile Elawar, avó paterna de Imad.
Sr. Majeed Toufic Elawar, primo do avô paterno de Imad.
Em Khriby, entrevistei:
Sr. Haffez Bouhamzy, filho de Said Bouhamzy e primo de Ibrahim Bouhamzy.
Sr. Nabih A. Bouhamzy, filho de Said Bouhamzy e primo de Ibrahim Bouhamzy.
Sr. Fuad Bouhamzy, irmão de Ibrahim Bouhamzy.
Sra. Huda Bouhamzy, irmã de Ibrahim Bouhamzy (casada com pessoa do mesmo nome).
Sra. Lateife Bouhamzy, mãe de Ibrahim Bouhamzy.
Sr. Kassim Mahmoud el Aschkar, vizinho de Ibrahim Bouhamzy.
Sr. Khalil Lateif, vizinho e primo de Ibrahim Bouhamzy.
Em Baadaran (próximo a Khriby), entrevistei:
Sr. Yousef el Halibi.
Sr. Mohammed Abuhassan.
Sr. Daukan el Halibi, filho de Yousef el Halibi.
Sr. Milhem Abuhassan.
Em Raha, Djebel Druso, Síria, entrevistei:
Sr. Sleimann Bouhamzy, sobrinho de Said Bouhamzy.
Sr. Assad Bouhamzy, pai de Sleimann Bouhamzy.
Verificação das Declarações Originais Feitas por Imad Elawar sobre a Vida em Khriby
Nas tabulações adiante dispus os detalhes de todas as declarações feitas por Imad, referentes à sua alegada vida pregressa em Khrriby, juntamente com comentários sobre a verificação das declarações ou outros aspectos concernentes a elas. Imad fez quase todas aquelas declarações antes de deixarmos Kornayel para ir a Khriby em nossa primeira visita, mas algumas o foram durante o caminho ou mais tarde, e algumas outras só foram lembradas pela família posteriormente. Mencionei estes diferenças nas tabulações.
Dos cinqüenta e sete itens da primeira tabulação, Imad fez dez das declarações no carro, a caminho de Khriby, quase todas na primeira ida a Khriby, antes de chegarmos àquela aldeia. Mas dessas dez, três foram inexatas. Quanto aos restantes quarenta e sete itens, Imad se enganara apenas em três. Parece-me muito passível que, com a excitação da viagem, e talvez sentindo de nossa parte a expectativa de ouvir mais declarações, ele fizesse confusão de imagens da “vida anterior” com lembranças de sua “vida atual”. De qualquer modo, seu “escore” nesse grupo de declarações foi positivamente inferior às quarenta e sete feitas antes de sairmos de Khriby.
Declarações e Reconhecimentos Feitos por Imad Elawar, em Khriby.
Na minha primeira visita a Khriby, como já mencionei, o Sr. Haffez Bouhamzy não estava disponível e não fui nem à casa de Said Bouhamzy (atualmente ocupada por seu filho, Sr. Haffez Bouhamzy), nem à de Ibrahim Bouhamzy. Imad, em verdade, fez duas declarações, nessa ocasião, as quais demonstraram algum reconhecimento da região. Porém, é certo que não identificou de modo positivo a casa de Ibrahim Bouhamzy, pela qual passamos na estrada. De um ponto mais adiante da casa, olhando em sua direção e do outro lado do pequeno vale, alguém pediu a Imad que mostrasse onde era a “sua” casa. Ele apontou para a direção geral, com bastante exatidão. Enquanto apontava, Imad chamou a atenção para uma casa com venezianas pintadas de verde vivo, mas que não era geminada à de Ibrahim; a casa de Ibrahim, no entanto, não tinha venezianas verdes. Se Imad quis indicar a casa com as venezianas verdes como sendo a sua da vida anterior, ele acertou quanta à direção geral mas errou quanto à casa exata.
TABULAÇÃO 1 |
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SUMÁRIO DAS INFORMAÇÕES DE IMAD, ANTES DA CHEGADA A KHRIBY |
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Nota: A menos que declarado em contrário, o Sr. e a Sra. Mohammed Elawar foram, isoladamente ou juntos, os informantes de todas as declarações feitas por Imad. Contudo, em muitas das declarações estavam presentes um ou vários outros membros da família Elawar, principalmente os avós paternos de Imad, como testemunhas verbais ou tácitas do relato dos pais de Imad. |
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Item |
Informantes |
Verificação |
Comentários |
1. Seu nome era Bouhamzy e morava na aldeia de Khriby. |
Mohammed Elawar, pai de Imad. Nassibeh Elawar, mãe de Imad. |
Haffez Bouhamzy, primo de Ibrahim Bouhamzy. |
Várias famílias de nome Bouhamzy moravam ern Khriby. Há uma outra aldeia de nome Khriby, perto de Kornayel, mas, quando o inquiriram sobre isto, Imad disse que sua aldeia ficava “longe”. Parece que Imad nunca mencionou o primeiro nome de “Ibrahim”. |
2. Mahmoud (nome mencionado por Imad). |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy, primo de Ibrahim Bouhamzy |
Mahmoud Bouhamzy era tio de Ibrahim Bouhamzy. |
3. Tinha uma mulher chamada Jamileh. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. Fuad Bouhamzy, irmão de Ibrahim Bouhamzy. |
A amante de Ibrahim Bouhamzy chamava-se Jamileh. O Sr. Milhem Abuhassan prestou um depoimento discrepante quanto a esse item, mas modificou sua declaração quanto ao item, duas vezes, e gabou-se de conhecer muito Ibrahim, o que não foi comprovado por suas respostas a perguntas que lhe foram feitas para testar esse conhecimento. Duas outras testemunhas da redondeza, que não eram membros da família, também prestaram depoimentos discordantes quanto às relações com Jamileh. |
4. Jamileh era linda. |
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Haffez Bouhamzy. |
Jamileh era famosa, na região, por sua beleza. A opinião do Sr. Haffez Bouhamzy foi apoiada polo testemunho de uma mulher da aldeia, Masser el Chouf, onde Jamileh morara, a qual havia falado na beleza de Jamileh ao Sr. Mohammed Elawar. Em uma terra de mulheres belas, como é o Líbano, este detalhe pode parecer falho em especificidade, porém assim não parecia àqueles que tinham conhecido Jamileh. |
5. Jamileh vestia-se bem e usava saltos altos. |
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Haffez Bouhamzy. |
Usar salto alto chamava a atenção para uma mulher drusa nas aldeias. Mesmo hoje em dia isto não é comum. |
6. Jamileh usava roupas vermelhas. Ele sempre lhe comprava coisas vermelhas para seu uso. * |
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Haffez Bouhamzy. |
O Sr. Haffez Bouhamzy recordou-se de Jamileh usando um lenço vermelho na cabeça. |
7. Tinha um “irmão”, Amin. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Amin Bouhamzy é parente próximo de Ibrahim Bouhamzy. Os parentes próximos e amigos íntimos podem se chamar de “irmão”. É também possível que os pais de Imad tenham deduzido o parentesco de irmão como fizeram corn o de filho, com relação a outras pessoas, cujos nomes Imad mencionou. Veja comentários nos itens abaixo. |
8. Amin morava em Trípoli. |
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Haffez Bouhamzy. |
Trípoli é uma cidade litorânea, ao norte de Beirute. |
9. Amin trabalhava no edifício do Fórum, em Trípoli. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Amin era funcionário do Departamento de Topografia do governo libanês. Seu emprego era no edifício do Fórum, em Trípoli. Era vivo, mas aposentou-se em 1964. Ocorreu aqui um erro de dedução por parte dos pais de Imad. Declararam primeiramente que Imad havia dito que Amin era “juiz” em Trípoli. O Sr. Mohammed Elawar disse mais tarde que Imad realmente apenas declarara que Amin trabalhara no edifício do Fórum e eles disso deduziram que ele fosse juiz. |
10. Havia alguém de nome Mehibe. |
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Nabih Bouhamzy. Sleimann Bouhamzy, primo de Ibrahim Bouhamzy (que obtivera a informação de sua mãe, não diretamente entrevistado por mim). |
Mehibe era a prima de Bouhamzy. Os pais de Imad tinham pensado que Mehibe fosse a filha da personalidade anterior. |
11. Tinha um “filho” chamado Adil. |
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Sleimann Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Ibrahim teve um primo chamado Adil. Outro erro de inferência por parte dos pais de Imad. Disseram eles mais tarde, que Imad tinha mencionado os nomes de “Adil” e “Talal” ou “Talil” e eles presumiram que fossem os filhos da vida pregressa. |
12. Tinha um “filho” chamado Talil ou Talai. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Ibrahim teve um outro primo chamado Khalil (Khalil como parente de Ibrahim também verificado por Sleimann e Bouhamzy*) e Shekk Assad Bouhamzy, pai de Sleimann Bouhamzy). Veja o comentário do item nº 11, quanto à questão do parentesco com Talil. A família de Emad não se lembrava exatamente se Imad tinha dito “Talil” ou “Talai”. Se foi o primeiro, ele bem poderia estar tentando dizer “Khalil” do qual a primeira consoante é gutural e poderia ter sido ouvida com o som de “T”. Os avós de Imad sustentam essa suposição, dizendo que quando começou a falar sobre a vida anterior, Imad havia dito que era de “Tliby” (Khriby) antes que conseguisse pronunciar o nome da aldeia corretamente. |
13. Tinha um “irmão”, Said. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Ibrahim conheceu duas pessoas com o nome de Said Bouhamzy. Uma, seu primo, foi morto por um caminhão, em |
14. Tinha um “irmão” chamado Toufic. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Toufic é primo de Ibrahim Bouhamzy. (Veja o comentário no item 7). |
15. Tinha um “filho”, chamado Salim. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
O tio de Ibrahim, com quem ele morava, chamava-se Salim Bouhamzy. (Veja o comentário no item 7). Os pais de Imad depois disseram que ele nunca havia especificamente mencionado ninguém como seus “filhos”. Eles é que deduziram aquele parentesco. |
16. Tinha um “filho”, chamado Kamel. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Kamel é irmão de Toufic e Khalil Bouhamzy, portanto outro primo de Ibrahim Bouhamzy (Vide comentários nos itens 7 e 15). |
17. Tinha uma “irmã”, chamada Huda*. |
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Estive com Huda Bouhamzy, irmã de Ibrahim Bouhamzy, em Khriby. |
Aqui os informantes deduziram corretamente o parentesco da pessoa mencionada com a personalidade anterior. Possivelmente foram ajudados, porque, quando nasceu a irmã de Imad, ele pediu à família que dessem à criança o nome de Huda. As testemunhas não se recordam se Imad tinha usado especificamente a palavra “irmã” ao mencionar Huda. |
18. Tinha um amigo Yousef el Halibi. |
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Não verificado, mas provável. |
Yousef el Halibi era ainda vivo em 1964, e recordava-se de amizade com Said Bouhamzy. Provavelmente era também amigo de Ibrahim Bouhamzy, mas este ponto não foi especificamente verificado. O Sr. Fuad Bouhamay disse que conhecia Yousef el Halibi, de modo que é provável que seu irmão Ibrahim o tivesse conhecido também. |
19. Tinha um amigo, Ahmed el Halibi. |
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Não verificado independentemente, mas vide comentários. |
Não verificado independentemente. Em agosto de 1964, o Sr. Mohammed Elawar contou-me que o filho do Sr. Yousef el Halibi tinha confirmado, em março, que seu pai teve um irmão chamado Ahmed el Halibi, mas não ouvi isto diretamente naquela ocasião. |
20. Um caminhão atropelou um homem, fraturou-lhe as duas pernas e esmagou-lhe o tronco. |
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Haffez Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. Sleimann Bouhamzy.** |
Verdadeiro quanto a Said Bouhamzy, cujo acidente e morte eram do conhecimento de Ibrahim Bouhamzy. |
21. Foi para o “lugar onde estão os médicos” e foi aí operado. |
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Haffez Bouhamzy. Sleimann Bouhamzy.*** |
Depois do acidente, Said Bouhamzy foi levado a um hospital onde sofreu duas operações, uma cerebral e outra abdominal, mas mesno assim morreu poucas horas depois das operações. |
22. O acidente deu depois de a briga, e o motorista tencionava matá-lo. |
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Inexato. |
Inexato, mas não é certo que o próprio Imad fizesse ligação da briga com o acidente. Parece possível que Imad ou os pais confundissem ou ligassem imagens do fatal acidente de caminhão a Said Bouhamzy e o acidente de ônibus ao ônibus de Ibrahim, (Vide itens 23 e 24 e a discussão no texto). Imad nunca disse especificamente que o acidente de caminhão fora com ele. O motorista foi julgado e teve uma pena leve, por negligência, mas não considerado culpado de agressão. Isto seria muito provavelmente uma suspeita. Ibrahim, que tinha um temperamento brigão, poderia devido a isso ter atribuído ao motorista um motivo hostil. Sleimann Bouhamzy* declarou que, quando estava morrendo, Said Bouhamzy rogou aos que estavam a sua volta que tratassem o motorista com brandura, pois temia que ele fosse acusado falsamente de má fé. |
23. Seu ônibus tinha saído da estrada e houve um acidente. Mas ele próprio não estava na direção na hora do acidente. Morreu gente no desastre.* |
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Nabih Bouhamzy. Ali Mohammed Abouhassan. Fuad Bouhamzy. Mohammed Elawar (relatando verificações do filho de Yousef el Halibi, Daukan el Halibi). |
Certa vez Ibrahim desceu do ônibus que estava dirigindo, ainda com passageiros. Seu ajudante estava no ônibus e possivelmente no controle. O freio de emergência falhou, rodou em marcha-a-ré por um barranco e os passageiros se feriram. Ajuntou-se uma multidão (praticamente a aldeia toda) e veio a polícia. Um dos informantes, o Sr. Habih Bouhamzy, disse que depois desse acidente Ibrahim ficou muito apreensivo e não dirigiu mais o ônibus. Não muito depois, teve a sua moléstia irreversivelmente fatal. Em março de 1964 eu soube que o acidente tinha sido com um caminhão (não um ônibus), mas em agosto ficou bem claro que havia um acidente do ônibus, tanto pelo que foi declarado por Imad como por ter sido verificado que ocorrera com o ônibus de Ibrahim, não com caminhão. Não morreu ninguém no acidente. |
24. Tinha havido uma briga, porque o motorista havia insultado sua irmã. Ele esmurrara o motorista e o derrubara, chegando a polícia e seu amigo Ahmed el Halibi. |
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Mohamed Elawar (citando o filho de Yousef el Halibi, Daukan el Halibi) |
Nenhum informante confirmou os detalhes de tal briga entre Ibrahim e o motorista de ônibus, mas o fato é bem característico da natureza briguenta de Ibrahim. Depois do acidente a polícia veio investigar os danos. Em agosto eu soube que, em março, o Sr. Daukan el Halibi, filho do Sr. Yousef el Halibi, havia confirmado que o pai e o tio tinham ido ao local do acidente, mas o intérprete não me passou essa informação durante a entrevista. Acredito (sem ter certeza) que Ahmed el Halibi e Yousef el Halibi eram irmãos. Isto aconteceu após o acidente de ônibus citado no item 23. |
25. O motorista era cristão. |
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Nabih Bouhamzy. |
Inexato, se se referir ao motorista do caminhão que matou Said Bouhamzy. Ele era muçulmano. Imad eleve ter confundido o homem que dirigia o caminhão que matou Said Bouhamzy com um outro homem. Ibrahim de fato tinha um amigo chegado que era motorista de ônibus e era cristão. |
26. Era amigo do Sr. Kamel Joumblatt. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Tanto Ibrahim como Said Bouhamzy eram amigos daquele conhecido filósofo e político druso. O Sr. Joublatt mora numa aldeia não distante da região meridional de Khriby. Imad ficou muito emocionado quando, um dia, para testá-lo, um vizinho afirmou (falsamente) que o Sr. Joublatt havia falecido. |
27. Gostava muito de caçar. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. |
Ibrahim gostava apaixonadamente de caça. Imad pede freqüentemente ao pai para levá-lo a caçar. Na casa de Said Bouhamzy, Imad demonstrou muito interesse por duas perdizes. As perdizes são a principal caça da região. |
28. Tinha uma espingarda de dois canos.* |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. |
Exato. Imad costumava juntar dois dedos para mostrar o que queria dizer quando descrevia a espingarda de cano duplo. |
29. Tinha também um rifle.** |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. |
Exato. |
30. Ele tinha escondido a espingarda.*** |
Kassim Elawar. |
O lugar onde Ibrahim havia guardado a espingarda me foi mostrado por sua mãe, Lateife Bouhamzy. |
Exato. Esse item provavelmente se refere ao rifle, cuja posse era ilegal para um civil, no Líbano. Ibrahim tinha escondido a sua arma. |
31. Tinha um cão de caça castanho. |
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Nabih Bouhamzy. Haffez Bouhamzy. |
O cachorro era castanho claro, mas não era um cão de caça. Outra inferência da família de Imad. Imad tinha dito que gostava de caçar que tinha uma espingarda e um cão. A família deduziu que fosse um cão de caça, mas, de fato, era um tipo de cão pastor. |
32. Ele próprio certa vez havia batido em um cachorro*. |
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Nabih Bouhamzy. |
Exato. Um outro cachorro tinha brigado com o cachorro de Ibrahim e este batera nele. |
33. Sua casa era na aldeia de Khriby. |
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Casa que eu próprio visitei. |
A casa fica na parte central da aldeia, não nos arredores. No primeiro dia de inquirições foi dito ter Imad declarado que a casa ficava fora da aldeia, mas isto foi corrigido antes de chegarmos a Khriby e foi provavelmente um erro de tradução. |
34. Logo antes casa há uma ladeira**. |
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Casa que eu próprio visitei. |
A estrada apresenta um declive bem acentuado logo antes de chegar à casa de Ibrahim. |
35. Havia dois poços, na casa; um cheio e um vazio***. |
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Nabih Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. “Poços” vistos por mim, na casa. |
Durante a vida de Ibrahim havia dois poços, cujos locais nos foram mostrados. Os “poços” haviam sido cobertos desde a morte de Ibrahim. Não eram poços de água, mas simples escavações ou tanques de concreto usados para armazenar suco de uva. Eles eram usados alternadamente, durante a estação chuvosa, um desses recipientes enchia-se de água, mas o outro, mais raso, não se enchia, porque a água evaporava. Assim, um ficava vazio, enquanto o outro ficava cheio. |
36. Estava fazendo um novo jardim, na ocasião de sua morte. |
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Haffez Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. |
Por ocasião da morte de Ibrahim, estavam reformando o jardim da casa. |
37. Havia cerejeiras e macieiras, no novo jardim. |
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Haffez Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. As macieiras e cerejeiras me foram mostradas nas visitas a Khriby. |
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38. O caminhão estava cheio de pedras, que estavam sendo usadas no trabalho de construção do jardim. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Inexato ou duvidoso. O Sr. Haffez Bouhamzy lembra-se de que estavam usando e recolocando as pedras nos terraços que já existiam no jardim. Não se recordava se estavam retirando as pedras de um caminhão. Imad poderia estar se referindo ao caminhão que atropelara Said Bouhamzy, mas parece que ele estava vazio e não cheio de pedras na ocasião do acidente. |
39. Ele tinha dinheiro, terras, mas nenhum emprego fixo. |
|
Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Correto, de modo geral, porém Ibrahim realmente tinha um caminhão com o qual trabalhava comercialmente. Ele também foi motorista de ônibus por algum tempo. |
40. Tinha um automóvel amarelo pequeno. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. |
Exato. |
41. Tinha um ônibus*. |
Kassim Elawar. |
Fuad Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Exato. |
42. Tinha um caminhão. |
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Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. Fuad Bouhamzy. |
Exato. Ibrahim Bouhamzy não usava aqueles veículos simultaneamente, mas sucessivamente. Na realidade não era o “dono” deles, pois pertenciam à família, mas a família tinha muitas propriedades em comum. |
43. Usava o caminhão para transportar pedras**. |
Kassim Elawar. |
Nabih Bouhamzy. |
Exato. |
44. Não era ele quem dirigia o caminhão. |
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Incorreto. |
Ele mesmo dirigia o caminhão. É provável que este item se refira ao acidente de ônibus citado nos itens 23 e 24. Aparentemente, Imad queria ressaltar que ele (Ibrahim) não estava no ônibus (isto é, dirigindo o ônibus) quando este saiu da pista, e que o ajudante (motorista) foi o responsável pelo acidente. Houve alguma confusão quanto a Imad ter se referido a um ônibus ou a um caminhão. |
45. Há duas garagens na casa***. |
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Os dois galpões a que provavelmente se referiam, foram examinados por mim. |
Inexato, mas talvez um “acerto” parcial. lbrahim deixava seus veículos ao ar livre. Abaixo da casa, havia dois galpões e Imad estava, provavelmente, procurando referir-se a eles, Isto parece tanto mais passível pelo fato de Imad haver se referido anteriormente a “salas com tetos arredondados” aparentemente no mesmo contexto, e aqueles galpões mais abaixo da casa tinham tetos arredondados, como pude ver quando examinei pessoalmente um deles. |
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Não verificado. |
A casa possui um sótão e é possível que Ibrahim guardasse lá uma chave sobressalente. Sua irmã não conseguiu verificar este ponto. Essa teria sido uma chave dos galpões do item 45. |
47. Há uma entrada com um tipo de abertura circular**. |
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Esta abertura foi examinada por mim. |
Acima da porta principal que dá para o quintal, há uma abertura que dá no sótão, e que é quase semicircular e fechada por uma janela. Esta parece poder ser removida para dar acesso ao sótão, ao qual também se podia ir por um pequeno alçapão atrás da porta dianteira da casa. Conquanto exato, aberturas deste tipo dando para o sótão existem em outras casas da região. |
48. As ferramentas para os carros estavam nesse lugar de abertura arredondada***. |
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Huda Bouhamzy, irmã de Ibrahim Bouhamzy. Lateife Bouhamzy. |
O Sr. Haffez Bouhamzy, primo de Ibrahim, não sabia que ele guardava as ferramentas no sótão. É possível que o item 46 fosse uma tentativa de fazer a mesma referência e que uma confusão tenha surgido em conseqüência do fato de que em francês, a palavra “clef” é usada tanto para chave como para chave de fenda. O árabe, que usou muitos termos técnicos do francês, usa a mesma palavra “clef” em ambos os sentidos. De qualquer modo, Imad estava completamente certo quanto ao item 48; o detalhe do item 46 não pôde ser verificado, mas talvez também estivesse correto. |
49. Em sua casa havia um fogão a óleo****. |
Majeed Toufic Elawar, primo do avô paterno de Imad. |
Fuad Bouhamzy. |
Perguntamos a Imad se havia um fogão a lenha na família anterior, e ele respondeu que não, mas que havia um forno a óleo. Seu comentário mostra que ele não se deixou enganar. O pormenor em si não é específico, uma vez que muitas casas, no Líbano, incluindo a de Imad, têm fornos a óleo. |
50. Tinha uma cabra e a cabra tinha um filhote (cabritinho)*. |
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Fuad Bouhamzy. |
Quando Ibrahim era jovem, a família tinha tido um rebanho de cabras. |
51. Tinha um carneiro.** |
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Fuad Bouhamzy. |
A família de Ibrahim possuía também carneiros, quando ele era jovem. |
52. Tinha ao todo cinco filhos. |
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Nabih Bouhamzy. |
Não verificado. Ibrahim não tinha filhos registrados. Ele não se casara mas tinha pelo menos um filho. O Sr. Nabih Bouhamzy o ouvira admitir isso. Quando Imad estava falando em filhos, ergueu cinco dedos, indicando o número deles, em resposta a uma pergunta. Possivelmente ele estava se referindo aos cinco filhos de seu amigo e primo, Said Bouhamzy, de quem Ibrahim gostava muito. |
53 Ele estava “bem de vida”. |
|
Haffez Bouhamzy. Nabih Bouhamzy. |
Um ponto não muito específico mas comparado a muitas das famílias da aldeia, Ibrahim teria sido considerado rico. |
54. Tinha uma fazenda. |
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Nabih Bouhamzy. |
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55. “Sei falar inglês”.*** |
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Inexato. |
Incorreto para Ibrahim, que falava bem o francês mas não falava nada de inglês. O Sr. Abushdid disse que Imad fizera esse comentário no carro, depois de ouvir o Sr. Abushdid e eu trocarmos algumas frases em inglês. O pai, que estava guiando o carro no momento, não ouviu Imad fazer tal comentário, mas o ouviu dizer quase no mesmo momento: “Sei falar como o senhor”, referindo-se ao francês, língua em que o Sr. Abushdid e eu falávamos usualmente. Imad estava aprendendo francês no seu primeiro ano na escola e sabia contar até vinte, corretamente, nessa língua. Existem, portanto, dúvidas quanto a este item, e de qualquer modo é possível que Imad não estivesse se referindo à vida pregressa. O pai de Imad nunca o ouviu dizer que sabia falar inglês, em ocasião alguma. |
56. Vai-se a Khriby por Hammana. |
Naile Elawar, avó paterna de Imad. |
Mapas de estrada do Líbano. |
Correto. Hammana é uma aldeia a sudeste de Kornayel, e passa-se por ela no caminho para Khriby, vindo de Kornayel. O pai de Imad insistiu que ele não tinha saído anteriormente de Kornayel por aquele lado da aldeia. É estranho que, considerando que Hammana não seja próximo de Khriby, “a personalidade de Ibrahim” se lembrasse dessa relação. Seria uma orientação mais característica, para alguém que morasse em Kornayel, que estivesse procurando Khriby no mapa e visto o caminho a ser seguido para chegar lá partindo de Kornayel. Parece, portanto, possível que Imad tenha obtido esta informação ao ouvir seu pai mencioná-la. Talvez o importante é que ele tenha retido essa informação em função do seu grande interesse por Khriby e pelo seu desejo, freqüentemente manifestado, de ir até lá. (Veja a discussão no texto sobre a evidência de que Imad pudesse ter visitado Khriby anteriormente). |
57. Reconhecimento de Salim el Aschkar, de Khriby. |
Naile Elawar. |
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Salim el Aschkar, natural de Khriby, tinha-se casado cora uma moça de Kornayel, e às vezes vinha a esta aldeia. Quando Imad tinha mais ou menos dois anos de idade, estava na rua com a avó, quando Salim el Aschkar passou. Imad correu para ele e abraçou-o. “Você me conhece?” perguntou Salim, ao que Imad respondeu: “Sim, você foi meu vizinho”. Aquele homem havia sido vizinho da família de Ibrahim Bouhamzy, mas não morava mais perto da casa deles. |
Nessa visita, fomos além de Khriby, à próxima aldeia, Baadaran, onde mora o Sr. Yousef el Halibi. No caminho para lá, Imad comentou que aquele era o caminho para Baadaran. Há uma sinalização à beira da entrada de Baadaran, indicando a aldeia, mas quando Imad fez aquela declaração, nós havíamos acabado de sair de Khriby para um percurso de 5 quilômetros, de modo que ele não poderia ter lido a sinalização. É provável, porém, que ele tivesse lido alguma sinalização que não tivéssemos notado ou que tivesse ouvido alguém dizer que íamos a Baadaran com o propósito de ver o Sr. El Halibi. Portanto, não considero essa declaração de Imad sugestiva de qualquer conhecimento paranormal.
Como já mencionei, na secunda visita, de Imad a Khriby, fomos às casas de Said Bouhamzy e de Ibrahim Bouhamzy, as quais, novamente, Imad não pareceu reconhecer exteriormente. O Sr. Haffez Bouhamzy não achou que isto era motivo para surpresa, visto que, segundo ele, a aldeia tinha mudado muito nos quinze anos que decorreram após a morte de Ibrahim Bouhamzy, especialmente no que se refere a ruas. No quintal da casa de Ibrahim e dentro da casa (que foi aberta para nós), Imad efetivamente fez quatorze outras declarações ou reconhecimentos, que relacionei na Tabulação 2, adiante, juntamente com duas que acabei de mencionar, feitas na primeira visita a Khriby.
Nos dezesseis itens de declarações ou reconhecimentos ocorridos em Khriby, Imad foi exato em quatorze, meio vago em um deles (reconhecimento do exterior da casa), e falhou num teste de reconhecimento (da mãe de Ibrahim). Devemos, talvez, por de lado dois outros itens em que o depoimento foi discordante (episódio do ferimento no dedo), ou em que houve muita possibilidade de fontes normais de informação (o trajeto para Baadaran). Com isso, ficam faltando ainda doze itens, alguns de natureza altamente pessoal, relativos à casa e à vida de Ibrahim Bouhamzy. Ao analisar o conhecimento que Imad demonstrou ter da casa, antes de ir a Khriby e no interior dela quando lá estivemos, os leitores devem lembrar-se de que a casa permaneceu fechada durante alguns anos. A informação que Imad possuía só poderia ter sido obtida normalmente através de alguma pessoa que tivesse conhecido a casa, e não através de um exame da área externa.
TABULAÇÃO 2 |
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SUMÁRIO DAS DECLARAÇÕES E RECONHECIMENTOS FEITOS POR IMAD EM KHIRBY |
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Nota: Os seguintes reconhecimentos e declarações ocorreram na presença do intérprete ou na minha própria, ou nos foram contados em poucos minutos. O Sr. Haffez Bouhamzy, a Sra. Huda Bouhamzy e a Sra. Lateife Bouhamzy verificaram a exatidão do que Imad disse ou fez. Os itens seguidos de asterisco (*) foram testemunhados diretamente pelo intérprete; outros itens só foram relatados mais tarde por testemunhas. |
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Item |
Comentários |
58. Reconhecimento do local da casa da vida anterior (*). |
Casa de Ibrahim Bouhamzy, vista posteriormente. Imad indiscutivelmente apontou a direção geral correta em que ficava a casa, de uma distância de mais ou menos 300 jardas. Mas falhou na identificação da casa, especificamente. |
59. Reconhecimento da estrada de Khriby para Baadaran.(*) |
Declaração feita durante o trajeto de Khriby a Baadaran. Item não significante, pois Imad poderia ter visto alguma sinalização apontando o caminho, ou talvez ter ouvido alguém mencionar a direção. |
60. Reconhecimento do lugar onde Ibrahim deixava seu cachorro. (*) |
No quintal da casa, perguntaram a Imad: “Se você tinha um cachorro aqui, onde o deixava?” Ele corretamente indicou o lugar no quintal. |
61. O cachorro ficava preso por uma corda. (*) |
Quando perguntaram como o cachorro ficava preso, Imad disse: “Por uma corda.” Muitos cães da região ficam presos com correntes, não cordas. |
62. Reconhecimento da cama de Ibrahim Bouhamzy. (*) |
Havia duas camas no quarto. Imad apontou para a de Ibrahim. |
63. Declaração quanto a antiga posição dessa cama. (*) |
Perguntaram a Imad: “Como estava disposta a cama quando você dormia nela?” Ele então mostrou que a cama ficava em posição transversal à posição atual, completamente diferente desta. (Vide o item seguinte). |
64. Declaração de como os amigos conversavam com Ibrahim (*). |
Durante sua moléstia infecciosa, os amigos não podiam entrar no quarto de Ibrahim, e por isso conversavam com ele através de uma janela, e a cama foi disposta de modo que ele pudesse ver e falar com os amigos, pela janela. Quando perguntaram a Imad: “Como conversava com seus amigos?”, ele apontou para a janela e disse: “Por ali.” |
65. Lugar onde Ibrahim Bouhamzy guardava sua espingarda (*). |
Imad, quando lhe perguntaram onde guardava “sua” espingarda, apontou para o fundo de um armário embutido numa parede divisória. Ele não apontou para as portas do armário, mas estava perfeitamente certo quanto ao armário. A mãe de Ibranim disse que apenas ela e Ibrahim sabiam onde estava guardada a espingarda. O Sr. Haffez Bouhamzy, primo de Ibrahim, não sabia deste fato. |
66. Não reconhecimento da mãe de Ibrahim Bouhamzy. |
Na presença da mãe de Ibrahim, perguntaram a Imad: “Conhece esta senhora?” E ele disse: “Não”. Disseram-lhe, então, que fosse cumprimentá-la, o que ele fez. Depois, quando lhe perguntaram se gostava dela, respondeu: “Sim, muitíssimo.” |
67. Reconhecimento da irmã de Ibrahim, Huda. |
A irmã de Ibrahim perguntou a Imad: “Você sabe quem eu sou?” e ele replicou: “Huda”. |
68. Reconhecimento de um retrato de Fuad, irmão de Ibrahim. |
Mostraram primeiramente a Imad um retrato bem pequeno de Fuad, em uniforme militar. Ele não reconheceu esta fotografia. Mas, quando lhe perguntaram de quem era o retrato em um grande quadro a óleo dependurado na parede, ele disse corretamente; “Fuad”. |
69. Reconhecimento de um retrato de Ibrahim Bouhamzy. |
Quando lhe mostraram uma fotografia de Ibrahim Bouhamzy, relativamente grande e lhe perguntaram quem era, Imad disse: “Eu.” Neste caso foi feita insinuação de que era de seu irmão ou de seu tio, mas ninguém deu a entender que era de Ibrahim. |
70. Declaração das últimas palavras ditas por Ibrahim antes de morrer. |
A Sra. Huda Bouhamzy perguntou a Imad: “Você disse alguma coisa pouco antes de morrer. O que foi?”’ Imad replicou: “Huda, chame o Fuad” Estava exato, pois Fuad havia deixado o quarto pouco antes, e Ibrahim queria vê-lo novamente, mas morreu naquele instante. |
71. Menção dos nomes de dois irmãos de Ibrahim. (*) |
Perguntaram a Imad: “Quem são seus irmãos?” e ele respondeu: “Fuad e Ali,” ambos corretamente. Parecia não lembrar-se de um terceiro irmão, Sem, o caçula. |
72. Declaração de onde Jamileh morava. (*) |
Imad apontou corretamente com o dedo em direção à aldeia vizinha de Masser el Chouf, onde Jamileh morava. |
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Quanto a este item ouvi testemunhos antagônicos, no que se refere ao que Imad dissera e ao que realmente sucedera durante a vida de Ibrahim. Uma das testemunhas disse que Imad se recordava de ter machucado “seu” (de Ibrahim) dedo. A Sra. Huda Bouhamzy declarou que Imad recordava-se de que a mãe de Ibrahim havia esmagado o dedo na porta. Isto de fato ocorreu, e a mãe de Ibrahim ainda tinha a extremidade de um dedo achatada, quando a vi durante uma de minhas idas a Khriby. |
A cena da visita de Imad à casa de Ibrahim e o reconhecimento de membros da família do mesmo, não evocou nos participantes tanta emoção como aconteceu em outras “reuniões” desta espécie4. A mãe e a irmã de Ibrahim pareceram muito interessadas
Ibrahim tinha amado especialmente sua mãe, sua irmã Huda e seu irmão Fuad. Os reconhecimentos de Huda e do retrato de Fuad feitos por Imad, harmonizam-se com essas preferências de Ibrahim. A mãe de Ibrahim talvez tivesse mudado mais, na aparência física (sendo, em 1964, uma senhora notoriamente idosa) do que Huda.
Durante a cena na casa, quando Imad não sabia a resposta a uma pergunta, ele não tentava adivinhar e se não reconhecia algum objeto que lhe mostravam, nada dizia. Podemos considerar isto também como um outro ponto contra a hipótese de lhe haverem dado quaisquer sugestões ou indiretas quanto aos reconhecimentos as quais, se estivessem pairando à sua volta, o levaria talvez a fazer muito mais declarações – quer fossem corretas ou não – do que ele realmente fez.
Relatos e Observações de Importância sobre o Comportamento das Pessoas Relacionadas ao Caso.
Além de anotar, antes de irmos a Khriby, as declarações sobre a vida anterior atribuída a Imad, anotei também vários itens sobre seu comportamento, relatados por seus pais ou pelos avós, como sendo presumivelmente provenientes das experiências e atitudes da personalidade anterior.
Sob este cabeçalho, devemos notar antes de tudo o interesse de Imad por Khriby, e pela gente de lá. Ele pediu insistentemente aos pais que o levassem ali e falara muito de várias pessoas que alegava ter conhecido naquela aldeia. Na minha última visita a Kornayel, em agosto de 1964, Imad me pedira que o levasse a Khriby, visto seus pais, disse ele, não o fazerem. Uma manifestação digna de nota de seu interesse por Khriby ocorreu quando ele se encontrou com Salim el Aschkar na rua de Kornayel, e atirou-se a seus braços; uma outra foi quando uma mulher procurou pôr à prova suas reações, declarando-lhe falsamente que o Sr. Kemal Joublatt (o atacadista druso que Imad alegava ter conhecido e que Ibrahim de fato conhecera muito) havia morrido. Ouvindo isto, Imad ficou extremamente zangado, e procurou enxotar a mulher da casa. E, em dezembro de 1963, ocorreu ainda um outro episódio desse tipo, quando chegou notícia a Kornayel de que Said Bouhamzy (o segundo cidadão de Khriby com esse nome) tinha morrido. Imad mostrou-se muito interessado pela notícia. Depois disse, pensativamente: “Fiquei ainda com um irmão.” (Esse último comentário presumivelmente se referia a Amin ou Kemal, os sobreviventes do círculo de amigos íntimos e primos de Ibrahim, que se chamavam um ao outro de “irmão”.) Eu próprio vi o sorriso de alegria no rosto de Imad, quando lhe propusemos a viagem a Khriby. Em Khriby, excetuando duas ocasiões em que alguma coisa — não sei bem o quê — o irritou, ele mostrou constantemente os maiores sinais de alegria.
Dentre todas as pessoas mencionadas por Imad como pertencendo à vida anterior, Jamileh ocupava o lugar mais proeminente. Seu nome foi a primeira palavra que enunciou claramente quando começou a falar, e desde então estava sempre em seus lábios. Falava em comprar roupas vermelhas para ela e comparava sua beleza e suas roupas com as de sua mãe que, por exemplo, não usa salto alto como Jamileh usava. A saudade de Imad com relação a Jamileh chegou à sua expressão máxima quando, um dia, deitado numa cama ao lado de sua mãe, pediu-lhe repentinamente que ela fizesse como Jamileh fazia. Não sei as palavras que usou para dizer isso era árabe, mas a sentença, traduzida para o francês, foi “Maman, faites comme si vous étiez Jamileh.” Este fato ocorreu quando Imad tinha de três a três anos e meio.
Na visita a Khriby, Imad não pediu para ver Jamileh, que havia muito tinha se casado e mudado da região. Isto, porém, não é para causar surpresa, se recordarmos que Jamileh havia sido apenas amante de Ibrahim, e suas relações haviam sido um grande escândalo na comunidade. Não seria de esperar, portanto, que Ibrahim (ou Imad sob a influência, das experiências deste) insistisse em falar nas suas relações com Jamileh, quando na presença de parentes femininos. Em Khriby, Imad indicou corretamente a direção em que ficava a casa onde Jamileh morara, mas não mencionou o nome dela espontaneamente, como o fizera tantas vezes
Os pais de Imad comentaram a notável fobia por grandes caminhões e por ônibus, que Imad mostrara mesmo quando bem pequeno. Ele corria e se escondia desses veículos, antes de conseguir falar e exprimir seu temor. Gradualmente perdeu esse medo e, na idade de quatro ou cinco anos, estava completamente livre dele. Os pais de Imad davam como causa dessa fobia por veículos grandes a suposição de ele haver sido atropelado e morto por um caminhão, em sua vida anterior. Porém, como vimos, foi Said Bouhamzy, e não Ibrahim, quem encontrou a morte desta maneira. Ibrahim, entretanto, vivia ainda na ocasião da morte de Said no desastre de caminhão, e a morte do primo e amigo o tinha mortificado extremamente. Além disso, Ibrahim havia dirigido tanto caminhão quanto ônibus. Em certa ocasião, quando ele tinha saído do ônibus, os freios falharam e o veículo rodou ladeira abaixo, capotando com seu ajudante (de Ibrahim) dentro (vide item 23, tabulação 1). (Um dos informantes testificou que Ibrahim tinha ficado tenso depois desse acidente, conquanto um outro não confirmou essa conseqüência). Embora o próprio Ibrahim não se tivesse machucado, esse acidente perigoso juntamente com a morte de Said, podiam muito bem ser os responsáveis pelo medo de grandes veículos motorizados, por parte de Ibrahim. Afora este acidente, Ibrahim também participara de um acidente de automóvel. Assim sendo, o comportamento de Imad com relação a veículos parece coerente com o que seria de esperar à vista das experiências de Ibrahim.
Os pais e avós de Imad comentaram a surpresa e a alegria demonstradas por estes, quando começou a andar. Ele fazia observações como: “Olhem! já consigo andar”, como se estivesse surpreso, realmente, de poder andar. Aqui, novamente, seus pais, durante os anos em que pensaram ter a personalidade anterior de Imad fraturado as pernas e sido morto por um caminhão, atribuíram esta alegria de poder andar ao fato de mal conseguir ele acreditar que as pernas quebradas estavam sãs. Porém, como vimos, Ibrahim também havia ficado inválido e não pouco antes de sua morte, mas durante um grande período de incapacidade devido à tuberculose. Imad, que até agora nada disse sobre a promessa de Ibrahim de tornar-se sacerdote caso Deus o curasse, parece ele próprio não compreender como e por que agora pode andar com desembaraço. Um dia, perguntou à mãe: “Mamãe, a senhora fez alguma operação que a possibilitasse andar de novo?” Ora, Said Bouhamzy, depois do desastre de caminhão que lhe esmagou o tórax e lhe fraturou as pernas, foi submetido a uma operação abdominal depois do acidente mas, apesar disso, morreu algumas horas depois. Ibrahim teria sabido disso, e Imad igualmente demonstrou ter conhecimento dessa operação após o acidente. Parece possível, por isso, que ele tenha concebido a idéia de que ele próprio ficara perfeito devido a uma operação cirúrgica. Merece também ser considerada a possibilidade de uma fusão de imagens na mente de Imad, de “memórias” relacionadas com a doença de Ibrahim e o fatal acidente de seu amigo Said. Como já fiz notar, Imad parece ter tido presentes em seu consciente várias imagens e então, algumas vezes articulava as palavras, dirigidas a si mesmo ou a outras pessoas. Com toda a certeza os pais fizeram, em suas mentes, uma fusão das cenas da morte de Said Bouhamzy com outras declarações de Imad, e ligaram a morte violenta de Said à personalidade anterior de Imad. Fusão semelhante pode ler ocorrido na mente do próprio Imad.
A suposição precedente encontra apoio no detalhe de ter havido uma briga, antes do desastre com o caminhão, entre seu motorista e o homem acidentado e morto pelo caminhão (item 22, Tabulação 1). Conforme os pais de Imad relataram esse item, Imad havia acusado o motorista do caminhão de asaassínio voluntário, atropelando deliberadamente o homem que foi ferido. Imad havia igualmente descrito uma briga na qual dizia que ele (na vida anterior) tinha derrubado um motorista de caminhão (ou ônibus). Na verdade, o motorista do caminhão que matara Said Bouhamzy, não havia brigado com este, e Said Bouhamzy, em seu leito de morte (segundo Sleimann Bouhanizy), tinha expressamente isentado de culpa o motorista. Mas, como o próprio Ibrahim era briguento por natureza, seu temperamento poderia tê-lo feito atribuir prontamente a causa do acidente e a morte do amigo a maldade por parte do motorista. Outras pessoas tiveram também esta suspeita, mas um julgamento no tribunal acusou o motorista de negligência apenas. Portanto, a inclusão feita por Imad, de um detalhe inexato referente à briga antes do acidente de caminhão, pode ter surgido de uma fusão em sua mente, de imagens do acidente de caminhão com as de uma briga de Ibrahim com um motorista, ou poderia ter nascido de uma interpretação do acidente feita por Ibrahim, incorreta, porém em harmonia com o temperamento beligerante de Ibrahim, e que foi transmitida à mente de Imad. E ainda, como uma terceira explicação, devemos considerar a possibilidade de os próprios pais de Imad fazerem uma ligação entre a briga, como foi descrita por Imad, e o desastre descrito por ele. Segundo eles, Imad falava muito mais da briga do que do acidente.
Imad mostrava grande interesse por caçadas, e freqüentemente pedia ao pai que o levasse a caçar. Declarou, corretamente, que Ibrahim possuíra uma espingarda e um rifle, e indicou com certeza onde Ibrahim guardara uma das armas na casa. Já relatei o grande interesse demonstrado por Imad pelas perdizes da gaiola na casa de Said Bouhamzy. (Perdizes são a principal caça da região). Segundo o Sr. Haffez Bouhamzy, Ibrahim gostara imensamente de caçar, participando dessa atividade sempre que podia. Mas devemos notar que o Sr. Mohammed Elawar, pai de Imad, tem uma espingarda e vai à caça, de modo que o interesse de Imad pode ser motivado pelo conhecimento das atividades do pai. Mais digno de nota é a intensidade do gosto do menino pela caça.
Anotei os precedentes aspectos do comportamento de Imad, antes que se iniciasse a verificação de suas declarações. A família de Imad relatou alguns outros itens dignos de nota depois de eu ter sabido de características semelhantes
Imad, segundo a família, é precoce na escola, e, para a sua idade, está especialmente adiantado
O Caso de Sleimann Bouhamzy
Sumário do Caso e Comparação do Comportamento de Sleimann Bouhamzy com o de Imad Elawar quando Crianças.
Antes de continuar a discussão do caso de Imad Elawar, quero apresentar um sumário do caso de Sleimann Bouhamzy, que me foi relatado. Como disse acima, em minha segunda visita a Khriby, eu soube que Sleimann Bouhamzy já tinha estado ali muitos anos antes, e lá estívera freqüentemente depois disso, tendo satisfeito a todos quanto à sua alegação de ser Said Bouhamzy, renascido depois de morto no acidente de caminhão. Infelizmente, os principais episódios do caso haviam ocorrido uns dezesseis anos antes de minha visita, e não posso apresentá-lo como sendo tão bem testemunhado por depoimentos da época, como o caso de Imad Elawar. Apesar disso, o primeiro relato do caso que me foi feito pelo Sr. Haffez Bouhamzy, em Khriby, coincidiu em linhas gerais e em quase todos os detalhes, com o relato independente feito na Síria pelo próprio Sr. Sleimann Bouhamzy. Tive a forte impressão de que, se eu tivesse estado presente em Khriby por ocasião dos principais eventos relativos ao caso, poderia tê-lo achado ainda mais importante do que o de Imad Elawar. No atual estado de coisas, porém, só posso apresentar um sumário do caso, e faço-o principalmente para comparar certos detalhes de comportamento, da parte de Imad Elawar e Sleimann Bouhamzy, quando eram pequenos.
Said Bouhamzy faleceu em 8 de junho de 1943, após o acidente de caminhão, em que teve o tórax esmagado e quebradas ambas as pernas. No hospital, sofreu duas operações, na cabeça e no abdome; depois delas, recuperou a consciência, o suficiente para mandar buscar sua esposa e filhos, mas morreu poucas horas depois. Said Bouhamzy tinha apenas um parente: uma irmã, de quem muito gostava. Em 3 de dezembro de 1943, esta irmã, morando então na Síria onde se casara com um parente que tinha o mesmo nome do irmão, deu à luz Sleimann Bouhamzy.
Na primavera de 1964, o Sr. Sleimann Bouhamzy era um rapaz de vinte anos, que espontaneamente repetia o que ainda se lembrava da vida anterior e do seu próprio comportamento durante ela, quando criança. Declarou que as lembranças que tinha da vida anterior como Said Bouhamzy tinham se dissipado, em grande parte, de sua mente. Além disso, negou estar sempre certo quanto a recordar-se realmente de algo que anteriormente lembrara com referência à vida anterior, ou simplesmente recordar-se do que outras pessoas — os pais, por exemplo — lhe haviam contado mais tarde ter ele dito com relação àquela vida. Mesmo confirmando certos pormenores relativos à vida de Ibrahim Bouhamzy, o Sr. Sleimann Bouhamzy nem sempre tinha certeza do que se lembrava como sendo da vida de Said Bouhamzy ou se lembrava de coisas que ele, como Sleimann Bouhamzy, havia ouvido da mãe, que afinal, era irmã de Said Bouhamzy e prima por afinidade de Ibrahim Bouhamzy. Em resumo, o Sr. Sleimann Bouhamzy fez a narração do que se lembrava sobre a vida de Said Bouhamzy com acentuada falta de confiança e independência nas alegações quanto à exata proveniência das aparentes recordações que narrava. É com essas sinceras ressalvas, pois, que apresento o seguinte relato.
O Sr. Sleimann Bouhamzy lembrava-se da vida de Said Bouhamzy, de uma ocasião em que viera do Líbano para a Síria em visita à irmã. Naqueles tempos a viagem era muito mais demorada do que hoje. Ele se recordava de que viajara a cavalo e que usava um típico traje sírio, diferente do que ele usava no Líbano. Recordava-se também de uma vez
O Sr. Sleimann Bouhamzy recordava-se de alguns pormenores do seu próprio comportamento em criança, relativamente à vida de Said Bouhamzy. Quando bem pequeno, tinha achado cinco berinjelas e duas batatas e deu-lhes respectivamente os nomes dos cinco filhos e das duas filhas de Said. Ficava zangado quando alguém mexia nesses legumes e queria guardá-los indefinidamente. Os nomes dos sete filhos de Said foram quase as primeiras palavras que ele pronunciou.
Ele se recordava de um acentuado temor por veículos motorizados, de qualquer tipo. Quando pequeno, nem mesmo chegava perto de um automóvel. Aos onze ou doze anos, esse temor começou a diminuir, primeiro com relação a veículos menores e, finalmente, com relação aos grandes, como caminhões e ônibus. Em 1904, não tinha nenhum resquício de medo de veículos5.
Entretanto, ainda conservava um acentuado horror a sangue e a ataduras. Certa vez desmaiou quando visitou um amigo num hospital e o viu com a cabeça enfaixada com ataduras. Segundo o Sr. Sleimann Bouhamzy, Said Bouhamzv tinha sido enfaixado em bandagens, após o acidente de caminhão. O Sr. Fuad Bouhamzy viu o corpo de Said Bouhamzy logo depois de ter este morrido e quando estava sendo enfaixado.
O Sr. Sleimann Bouhamzy recordou-se ainda de uma grande saudade de Khriby e do prazer que sentia em estar lá. Ele ainda vai freqüentemente a Khriby, e o Sr. Haffez Bouhamzy confirmou o enorme prazer que o Sr. Sleimann Bouhamzy sente em estar em Khriby, que visita longamente todo verão e que deixa com grande relutância para voltar para sua aldeia de Raha, na Síria. Na realidade, a atração que Sleimann Bouhamzy sente por Khriby faria provavelmente que ele se mudasse para lá, se as oportunidades de educação fossem as mesmas que em Raha, onde ele freqüentava um colégio de ensino secundário.
Quando o Sr. Sleimann Bouhamzy era pequeno, foi a Khriby pela primeira vez6 e lá reconheceu e deu corretamente os nomes de todos os membros sobreviventes da família de Said Bouhamzy, bem como de alguns outros moradores da aldeia. Depois indicou com exatidão os limites das terras de propriedade de moradores da aldeia, nas fazendas e vinhedos circunvizinhos. O Sr. Haffez Bouhamzy testemunhou a narrativa, feita por Sleimann Bouhamzy, quando criança, dos pormenores do acidente e morte de Said Bouhamzy; testemunhou também os reconhecimentos feitos por Sleimann, dos filhos de Said Bouhamzy (inclusive ele próprio) e de outras pessoas da família e da aldeia; recordou-se ainda do fato de o menino Sleimann, colocado no centro de Khriby, ter achado o caminho para a casa de Said, sem o auxílio de ninguém, na qual reconheceu não apenas várias pessoas, mas também reclamou ou reconheceu coisas pertencentes a Said Bouhamzy, tais como seu revólver e um tipo especial de capa que ele possuía. Sleimann, bem pequeno àquela época, adotava uma atitude paternal para com os filhos de Said, que, na ocasião, eram muito mais velhos do que ele. Ele chamava a mãe (irmã de Said Bouhamzy) de “irmã” em vez de “mãe”. O Sr. Haffez Bouhamzy, o penúltimo filho de Said Bouhamzy, tinha então uns onze anos de idade.
O Sr. Sleimann Bouhamzy contou-me que, em sua visita a Khriby, havia reconhecido o Sr. Milhem Abouhassan, grande amigo de Said Bouhamzy, que morava na aldeia de Baadaran, próximo de Khriby. O Sr. Haffez Bouhamzy confirmou este reconhecimento. O próprio Sr. Milhem Abouhassan também o fez, insistindo
A família de Said Bouhamzy aceita plenamente Sleimann Bouhamzy como o pai que voltara. Regozijam-se com suas visitas, têm lhe dado presentes e pretendem patrocinar sua educação. O interesse dos filhos de Said Bouhamzy por ele ultrapassa em muito o que se poderia esperar nas atitudes para com um primo.
Vamos agora a mais ampla discussão do caso de Imad Elawar.
Comentários sobre a Evidência de Conhecimento Paranormal da Parte de Imad Elawar.
Podemos com segurança excluir neste caso uma das possibilidades que se apresenta em muitos casos sugestivos de reencarnação. Refiro-me a erros retrospectivos de memória ao reconstituir posteriormente (depois de terem as duas famílias se encontrado e comparado as informações) exatamente o que a criança disse, antes da verificação das declarações que se lhe atribuem. Neste caso, anotei por escrito todas as declarações atribuídas a Imad, com exceção de umas poucas sem maior importância. E tanto o intérprete como eu testemunhamos a maioria dos eventos ocorridos quando Imad visitou a casa em Khriby, e dos quais tomei nota imediatamente. Nas poucas exceções que não foram observadas diretamente, eu ainda tomei notas, dentro de minutos, do que as testemunhas disseram ter acontecido. Seja o caso lá o que for, estou certo de que não é uma reconstrução retrospectiva de declarações e eventos imaginários.
Quero também chamar a atenção para o fato de que o pai de Imad, meu primeiro intérprete e eu fomos todos a Khriby na primeira visita, na expectativa de que as declarações de Imad se relacionassem à vida de uma pessoa de nome Said Bouhamzy. Mas, na realidade, vimos que nossa suposição era errada. Não se pode dizer, portanto, penso eu, que o caso fosse elaborado forçando-se as observações do menino para se aplicarem a uma determinada personalidade falecida.
Porém devemos considerar a seguir, a possibilidade de terem os pais de Imad distorcido ou mesmo falsificado, de certo modo, as informações atribuídas a Imad. Entre os muçulmanos e cristãos que o cercam, os drusos têm extraordinária reputação de honestidade, reputação que é realmente difícil de atribuir a povos que não dão tanto valor a essa virtude. Apesar disso, devemos examinar cuidadosamente a hipótese de fraude. Dentro de tal hipótese devemos imediatamente supor uma conspiração em que tomassem parte tanto os pais de Imad como seus avós paternos e dois primos, tendo todos eles prestado testemunho quanto a algumas ou muitas das declarações ou atitudes atribuídas a Imad. Teríamos ainda que supor um longo treino preliminar de Imad para poder realizar os reconhecimentos que fez na casa de Ibrahim Bouhamzy.
Poderíamos também pensar num conluio mais definido por parte dos intérpretes. Mas esta hipótese defronta duas sérias objeções. Primeiro, cada um dos três primeiros intérpretes, inclusive o chofer que me auxiliou na primeira noite, foram escolhidos para realizar o trabalho à última hora e sem qualquer chance de “preparação”, a menos que todos fossem uns atores consumados. E quando fui ao Líbano pela primeira vez, em março de 1964, conheci o Dr. Makarem, mas não sabia então que ele se dispusesse ou pudesse atuar como meu intérprete,
Fora essas considerações, entretanto, o caso apresenta alguns outros aspectos que tornam a hipótese de fraude extremamente improvável.
Primeiro, e de menos importância, vem a posição da família Elawar em sua comunidade. Vários membros da família ocupam, no Líbano, posições de destaque como profissionais, jornalistas e negociantes. Um dos membros da família é representante do distrito no Parlamento do Líbano. A família Bouhamzy em Khriby goza de posição semelhante na comunidade. Tanto a família Elawar como a Bouhamzy nada teriam a ganhar e teriam muito a perder arquitetando um caso desse tipo. Ambas sabiam que eu travara conhecimento com pessoas importantes da comunidade drusa
Entre eles devemos notar primeiramente certos detalhes do caso que dificilmente fazem honra à família de Imad e que não encontrariam inclusão em um caso planejado. Refiro-me em particular ao papel de Jamileh. Os pais de Imad declararam que pensavam que Jamileh fosse esposa de um respeitável xeque druso, mas, segundo a identificação das testemunhas em Khriby, ela apenas tinha a condição de amante de Ibrahim Bouhamzy, que por seu lado tinha a reputação de ser um rixento “playboy” de aldeia e perseguidor de mulheres. (Ao voltar a Kornayel após a segunda ida a Khriby, achei-me no dever de contar à mãe de Imad que Jamileh, longe de ser a esposa de um importante xeque, tinha sido apenas amante de seu primo. Esta notícia produziu na face da mãe de Imad uma expressão mista de pena e regozijo, o que me convenceu de que ela estava ouvindo o fato pela primeira vez.) Imad narrou uma briga e uma luta em que alegou ter tomado parte na vida anterior, fato pouco recomendável para ele ou para sua família, porém que, embora não especificamente confirmado, era perfeitamente característico de Ibrahim.
Além do mais, os próprios enganos dos pais de Imad em suas conclusões testificam sua ignorância de pormenores reais da vida de Ibrahim Bouhamzy. Afora o erro que cometerem quanto à condição social de Jamileh, cometeram outros ao declarar que o cão pertencente à personalidade anterior tinha sido um cão de caça; ao declarar que Amin era juiz em Trípoli, quando ele apenas trabalhava como funcionário do Fórum daquela cidade; e ao atribuir o fatal acidente de caminhão à personalidade anterior. Se eles tivessem qualquer conhecimento prévio dos verdadeiros fatos relacionados a estes detalhes, não me teriam comunicado as declarações feitas a respeito deles e que atribuíram a Imad. Finalmente, não teriam parecido acreditar, nem teriam levado Imad a Khriby enquanto parecessem acreditar, que a personalidade anterior a ele relacionada tinha morrido depois de atropelada por um caminhão, se tivessem sabido que uma outra pessoa (Sleimann Bouhamzy) também tinha alegado ser Said Bouhamsy renascido. Se os pais de Imad tivessem feito em Khriby entrevistas secretas suficientes para os tornarem conhecedores de fatos particulares corretamente narrados por Imad (ou a ele atribuídos), inevitavelmente teriam ouvido falar nessa outra pessoa que alegava ser Said Bouhamzy renascido. Qualquer caso planejado, que se relacionasse a um Bouhamzy em Khriby, teria focalizado uma só pessoa e não misturaria os dados de duas vidas bem distintas.
Finalmente, a hipótese de fraude deve explicar-nos como a família de Imad poderia ter adquirido as informações corretas que este demonstrara ter — ou que tinha atribuído a ele — acerca da vida de Ibrahim Bouhamzy. Segundo a mãe do Sr. Haffez Bouhamzy, viúva de Said Bouhamzy (conforme me contou o Sr. Haffez Bouhamzy), não apareceu nenhuma notícia no jornal, do fatal acidente, em 1943. Nem os pais de Imad (que então eram jovens e podiam não se lembrar) nem os avós paternos recordavam-se de ter ouvido falar na morte de Said Bouhamzy, naquela época. (É possível que pessoas de Khriby tenham sido convidadas para os funerais, mas se o foram, elas também não se recordam disso). Mas, mesmo supondo que tivesse chegado a Kornayel alguma notícia sobre a morte de Said Bouhamzy, ficam restando ainda muitos detalhes, de natureza bastante pessoal, quanto à vida e à casa de Ibrahim Bouhamzy, atribuídos a Imad. A casa de Ibrahim Bouhamzy tinha ficado desde então longo tempo fechada e desabitada, os poços selados e abandonados. As mulheres da família de Ibrahim, sua mãe e sua irmã, viviam ainda, mas as mulheres drusas são totalmente inacessíveis a interrogatórios da parte de homens estranhos. Além disso, os pormenores conhecidos de Imad espalharam-se durante certo período de tempo. Imad sabia não somente as últimas palavras proferidas por Ibrahim antes de morrer, como também que ele havia espancado um cachorro, episódio que deve ter se dado no mínimo seis meses antes de sua morte, visto ele ter ficado por esse espaço de tempo no sanatório de tuberculosos, antes de voltar para casa, para morrer. Imad sabia também que Ibrahim tinha um carrinho amarelo, um ônibus e um caminhão, mas Ibrahim havia possuído aqueles veículos em diferentes épocas de sua vida, e não simultaneamente. Imad sabia pormenores do fatal acidente de caminhão que matou Said Bouhamzy, porém isso ocorreu seis anos antes da morte do próprio Ibrahim. Imad sabia da existência de Jamileh, amante de Ibrahim enquanto este teve saúde, e também quanto ao novo jardim que estava sendo construído com cerejeiras e macieiras, na época da morte de Ibrahim. Em resumo, Imad tinha mais do que um conhecimento restrito de um período da vida de Ibrahim; estava a par de vários fatos que foram divulgados durante certo período daquela vida. Não acho que exagero quando insisto em que um conhecimento assim detalhado e amplo só poderia ter sido adquirido por meios normais através de demorados interrogatórios da família Bouhamzy ou talvez de uns poucos amigos íntimos e vizinhos. Mesmo vizinhos e amigos íntimos, como o próprio Sr. Haffez Bouhamzy, não sabiam que Ibrahim Bouhamzy guardava ferramentas no sótão de sua casa, ou onde na casa guardava sua espingarda. Em suma, posso assegurar com confiança que qualquer trama para planejar o caso teria tido que incluir a família Bouhamzy. Porém esta família, como já declarei, goza de uma “bona fides” não inferior à da família Elawar. Nem têm motivo para alvitrar que um menino, morando numa aldeia a 40 quilômetros de distância, seja Ibrahim Bouhamzy renascido, e que voltara para tornar público seu comportamento um tanto escandaloso na comunidade.
As duas famílias insistem em que nunca haviam se encontrado anteriormente, ou mesmo sabido da existência uma da outra antes de eu as haver reunido
Como já disse, a caminho de Khriby, Imad fez vários comentários aparentemente relacionados com a vida pregressa. Além desses comentários, o intérprete (o Sr. Abushdid, nesta ocasião) ouviu Imad dizer: “O senhor pode arranjar coca-cola em Barouk.” (Barouk é uma aldeia no trajeto de Kornayel a Khriby, porém muito mais próxima de Khriby). O pai de Imad, pouco antes deste comentário, tinha nos contado que Imad jamais havia saído de Kornayel pelo lado que levava a Khriby, e também a Barouk. No entanto, o comentário de Imad sugeriu familiaridade anterior com Barouk, que iria contradizer a afirmação de seu pai. Como foi declarado na Tabulação 1 (item 56), Imad sabia que uma outra aldeia, Hammana, fica no caminho de Kornayel a Khriby. O seu conhecimento quanto a estas duas aldeias entre Kornayel e Khriby pode ter se originado de informação relativa à vida anterior, ou ele pode talvez ter obtido a informação por ouvir seus país se referirem a elas.
Surgiu, entretanto, a possibilidade de Imad ter de fato ido a Khriby antes, com o pai. O intérprete havia me perguntado previamente se ele deveria fazer apenas as perguntas que eu propunha ou se poderia interrogar testemunhas por sua conta, caso se lembrasse de algum ponto que merecesse ser aprofundado. Achando que poderiam surgir mais informações em uma troca de palavras mais espontânea, autorizei-o a acrescentar outras perguntas quando julgasse poderem contribuir para o estudo do caso. Todavia, eu não esperava uma pergunta que o Sr. Abushdid fez a Imad, quando o pai saiu do carro, nas divisas de Khriby, para pedir orientação quanto ao caminho. O Sr. Abushdid virou-se então para Imad e prometeu-lhe uma garrafa de coca-cola se ele lhe dissesse que já havia estado antes na aldeia de Khriby. Ouvindo isto, Imad respondeu então que tinha estado lá antes, uma vez, de automóvel, com a mãe e o pai. A circunstância do oferecimento de uma tal propina a um pequeno com sede torna bastante possível que Imad tivesse respondido de modo falso para satisfazer ao Sr. Abushdid. O próprio Sr. Abushdid, contudo, a princípio considerou a declaração de Imad como contradizendo a afirmação de seu pai de que ele nunca havia estado em Khriby antes.
Nesse momento, porém, o Sr. Mohammed Elawar, que havia saído do carro para se informar quanto ao caminho, demonstrou aparentes sinais de genuína hesitação e confusão quanto à sua orientação na aldeia. Ele não tinha certeza se reconhecera corretamente a casa do Sr. Kassim el Aschkar, a qual, conforme ele mesmo dissera, tinha visitado somente três meses antes, por ocasião dos funerais de Said Rouhamzy, que falecera em dezembro de 1963. Nem Imad nem o pai mostraram qualquer sinal de reconhecer as casas de Ibrahim ou de Said Bouhamzy, embora tenhamos passado bem pela porta de uma e próximo da outra. Do pequeno vale, no outro lado da aldeia, Imad apontara corretamente a direção das casas, mas o Sr. Mohammed Elawar não mostrou sinal algum de estar familiarizado com estas, mesmo depois daquela indicação. No dia seguinte, quando Imad e o pai se encontraram com o Sr. Haffez Bouhamzy, todos se comportaram como se lá se encontrassem pela primeira vez. O Sr. Abushdid, falando árabe, estava em muito melhores condições do que eu para avaliar se era genuína a hesitação que o Sr. Mohammed Elawar demonstrara ao procurar locomover-se
Resta considerar se Imad poderia ter obtido algumas ou todas as informações que mostrara ter sobre a vida de Ibrahim, através de alguma pessoa, afora os pais, que tivesse ido a Kornayel. Já mencionei as únicas três pessoas que consegui descobrir, que poderiam ter fornecido aquelas informações. A primeira era o Sr. Salim el Aschkar, natural de Khriby, que se casara com uma moça de Kornayel e que tinha também um tio morando lá. De tempos a tempos visitava sua família ou a da mulher,
A terceira fonte possível de informação normalmente transmitida era o Sr. Faris Amin Elawar, que conhecia muito bem a família de Imad, sendo parente distante deles. Ele havia estado em Baadaran e, naquela região, ficara conhecendo ligeiramente alguns membros da família Bouhamzy. Porém ele e a família de Imad não haviam falado sobre a família Bouhamzy ou sobre as declarações feitas por Imad anteriormente à minha primeira visita a Kornayel, em março de 1964 e, quando o fizeram, o Sr. Faris Elawar confirmou o que Imad havia dito acerca de um acidente de ônibus, mas não outros itens de suas declarações.
No que acabei de expor tive trabalho e despendi tempo para apresentar pormenores dos depoimentos do caso. A responsabilidade das pessoas relacionadas a este e o fato de as declarações da criança serem registradas antes de qualquer verificação, fazem como que o caso pareça mais autêntico do que muitos outros desse tipo. E isto também justifica nossa preocupação em considerar todas as possibilidades remanescentes com respeito à comunicação, através de meios normais, das informações sobre Ibrahim Bouhamzy a Imad Elawar.
Mas, acreditando-se, como eu acredito, na honestidade das pessoas relacionadas ao caso, então outra hipótese normal importante que resta é a da criptomnésia combinada com a personificação da parte de Imad, da personalidade anterior. Aqui parece-me que os erros de inferência cometidos pelos pais de Imad ao reunir as declarações dele pesam não somente contra a fraude, mas igualmente contra a criptomnésia. A vista do fato de Imad ter começado a falar sobre a vida pregressa quando tinha de um ano a ano e meio de idade (antes do que, ele teria estado quase que continuamente na companhia da mãe ou da avó, ou ambas), não podemos imaginar que ele tenha obtido informações importantes diretamente de alguém fora da família, sem que os pais soubessem quem era tal pessoa. Em resumo, a teoria de criptomnésia neste caso, como na maior parte de outros em que estão envolvidas crianças muito pequenas, deve supor que os pais tinham a informação, transmitindo-a para a criança de algum modo, e depois eles mesmos se esqueceram completamente de que já tinham possuído a informação, a qual emergiu após um período de incubação, dos lábios da criança. Por vezes há pessoas que leram certos livros e depois insistem em que não os leram, e mais tarde encontraram anotações, ou outra evidência, que demonstraram claramente que tinham, no entanto, lido tais livros. No presente caso, as informações apresentadas por Imad não existiam em livros ou jornais, mas mesmo assim os pais poderiam tê-las ouvido de algum conhecido ou de outras pessoas de quem posteriormente se esqueceram. Parece muito improvável, todavia, que os pais de Imad tivessem sabido de todas aquelas informações, que totalizavam uns setenta detalhes, em dada época, e que não identificassem nenhuma delas quando voltaram a ser mencionadas por Imad mais ou menos um ano depois. E a prova de não a reconhecerem mais tarde está nas várias suposições incorretas que fizeram quando juntaram os pedaços da narrativa de Imad. Se, por exemplo, eles tivessem sabido algum dia que não foi Mahmoud, mas sim Said Bouhamzy que fora morto por um caminhão, certamente teriam corrigido Imad em vez de me contarem a dedução que fizeram neste sentido. De igual modo, teriam notado alterações nos pormenores quanto às relações de Jamileh, ao situar Amin como “juiz” e ao declarar que o cachorro era um cão “de caça”. Estes enganos, temos de notar, não são erros de imaginação (em alguns outros podem ser) por parte de Imad. Os pais depois declararam que eles haviam deduzido relacionamentos, em seus esforços para dar sentido às declarações dele.
À parte destes detalhes, já expliquei porque acho ser virtualmente impossível para a família Elawar ter adquirido tais detalhadas e íntimas informações sobre a vida de Ibrahim Bouhamzy como Imad mostrou a menos que tivessem feito inquéritos deliberados. Esta linha de pensamento nos leva de volta a criptomnésia e fraude, as quais rejeitei anteriormente como hipóteses não razoáveis.
Se podemos pôr de lado tanto a fraude e a criptomnésia, como hipóteses para o caso, ficam-nos restando como sérios competidores para explicá-la, algum tipo de percepção extra-sensorial ou a personificação, a possessão ou a reencarnação. Considerarei mais extensamente essas hipóteses, que rivalizam na Discussão Geral a seguir.
Duas Entrevistas Posteriores com Informantes Adicionais
Em março de 1968, consegui encontrar o Sr. Faris Amin Elawar e também seu filho, Saleem, em Kornayel. O Sr. Farias Amin Elawar ia a Khriby de vez em quando e era familiarizado aí com um primeiro primo de Ibrahim Bouhamzy, mas não podia lembrar (se algum dia soube) como ele morreu. Negou qualquer intimidade com a família Bouhamzy em Khriby. E negou veementemente, contrariando o relato de seu primo, Kassim Elawar, saber qualquer coisa sobre o acidente de ônibus em Baadaran.
Saleem Elawar lembrou a morte de Said Bouhamzy e disse ele, junto com quatro ou cinco outros membros da sua família, que tinham ido de Kornayel assistir o enterro de Said Bouhamzy
Sou incapaz de explicar a discrepância entre a declaração do avô de Imad que Faris Amin Elawar tinha verificado alguns detalhes do acidente de ônibus no qual Ibrahim Bouhamzy esteve envolvido e a própria negação de Faris Amin Elawar, quatro anos depois, que tivesse qualquer conhecimento de tal acidente de ônibus. Possivelmente durante esses quatro anos ele esqueceu o que sabia e esqueceu que tinha conhecimento sobre este acidente de ônibus. E possivelmente o avô de Imad atribuiu a verificação que recebeu sobre o acidente de ônibus à pessoa errada.
O Desenvolvimento Posterior de Imad
Não encontrei Imad nem sua família entre 1964 e 1968. Mas no último ano, eu os visitei novamente e também os encontrei em visitas subseqüentes ao Líbano em 1969, 1972 e 1973.
Em março de 1968, Imad estava com nove anos e alguns meses. Naquele ano, encontrei somente ele e sua mãe; seu pai não estava. Imad estava indo bem na escola. Sua mãe disse que ele ainda estava falando sobre a vida anterior e, em sua opinião, falando “ainda mais do que antes” (isso não correspondeu com a impressão que tive, de que ele deixara de falar sobre a vida anterior na época de minhas visitas em 1964). Imad expressou decepção com o fato de o irmão mais velho de Ibrahim Bouhamzy, Fuad, nunca ter ido a Kornayel para visitá-lo.
Imad falava muito de Jamileh nesta época e expressou o desejo de vê-la (ela havia se casado e estava vivendo em Aley, 13 quilômetros de Kornayel). Ele lembrava sobre o relacionamento de Ibrahim com ela e disse que ele (como Ibrahim) estivera pronto para fugir com ela e tinha uma licença, mas a sua família encontrou a licença e a rasgou.
Imad disse que a família de Ibrahim não queria que ele se casasse com Jamileh, porque sua família pertencia ao partido dos drusos, contrário àquele do da família Bouhamzy. Os Bouhamzy pertenciam ao grupo Joumblati dos drusos, enquanto Jamileh era do grupo Yazbaki, como por acaso são os Elawar (o avô materno de Imad, que esteve presente em parte da entrevista, opinou, dizendo que Ibrahim não teve permissão de se casar com Jamileh porque ela era de uma classe inferior à dele, pois os Bouhamzy de Khriby eram pessoas proeminentes e abastadas; mas como ele era de Kornayel e não de Khriby, acredito que sua opinião deve ser secundária sobre esse assunto).
Imad também continuava a pedir pelo rifle de Ibrahim, que afirmava pertencer a si. Ele alegou que o havia comprado! Gostava de caçar tanto quanto antes. Tinha perdido totalmente o medo de caminhões demonstrado no passado.
A família de Imad estava tentando fazer com que ele se esquecesse da vida anterior e não conversavam sobre isso com ele. Ele próprio começava a falar sobre Jamileh, não eles.
A mãe de Imad deu exemplos de sua contínua identificação com Ibrahim Bouhamzy. Um desses exemplos ocorria quando Imad expressava pesar pela morte de um membro do grupo Joumblati. Em outra ocasião, quando alguém de sua família falou mal de Kemal Joumblat (o líder dos Joumblatis), Imad explodiu: “Dane-se seu Bashir Elawar”. (Bashie Elawar de Kornayel era um deputado no parlamento libanês e importante político que depois passou a ser um ministro do gabinete). Enfatizando o “seu”, Imad claramente separava a si mesmo como um Joumblait de sua família, os Yazbakis. Um terceiro exemplo que demonstrou a continuidade das memórias de Imad ocorreu durante minha visita. Falávamos sobre levá-lo novamente a Khriby onde ele não estivera desde que eu o levei até lá, em 1964. Quando Imad ouviu isto, acrescentou: “E a Aley, também”. Ele pretendia ver Jamileh lá.
Ao encontrar Imad e sua família mais uma vez em fevereiro de 1969, sua mãe disse que ele ainda falava sobre a vida anterior e principalmente sobre Jamileh, a quem desejava ver. Ainda não a havia visto. Imad tinha planos diferentes e dizia que gostaria de casar com a filha de Jamileh! Ainda queria caçar e continuou pedindo a seu pai que lhe comprasse uma arma. Nessa época sua família tentava, sem sucesso, convencê-lo a parar de falar sobre sua vida anterior.
Em fevereiro e março de 1972, tive outros dois encontros com Imad e sua família. Durante esta visita ao Líbano, também reencontrei alguns dos informantes anteriores do caso do lado Bouhamzy, o Sr. Haffez Bouhamzy e Sr. Fuad Bouhamzy, e um novo informante, Sr. Mahmoud Bouhamzy, o tio materno de Ibrahim.
Imad tinha treze anos e três meses de idade. Estava na quinta série do colégio e afirmava ser o quinto ou sexto melhor colocado numa turma de vinte e cinco alunos. Seus pais disseram que ele ainda falava o “tempo todo” sobre Khriby. Quando perguntei diretamente a Imad sobre o enfraquecimento de suas lembranças, ele afirmou não ter esquecido nada (na verdade, como ficará claro mais adiante, nesse período ele já estava esquecendo ou já tinha esquecido grande parte das lembranças).
Ele também disse que ainda lembrava alguns detalhes da “vida intermediária” que afirmava ter vivido em Dahr el Ahmar, entre a morte de Ibrahim e seu próprio nascimento. O Sr. Fuad Bouhamzy disse, em 1969 que Imad havia mencionado sua vida intermediária durante sua primeira visita a Khriby, em 1964. Ele próprio não estava presente quando Imad visitou Khriby naquela ocasião, e, portanto, era uma testemunha secundária. Mas relatarei o que ele disse para mostrar que Imad não deu detalhes da “vida intermediária” pela primeira vez apenas em 1972. Imad associava os nomes de Adil (item 11 da Tabulação 1) e Talal (item 12 da Tabulação 1) com a “vida intermediária”. Imad disse que eles eram seus irmãos naquela vida. Os nomes deles não são incomuns no Líbano e é possível que tenham existido pessoas com tais nomes relacionadas à personalidade da “vida intermediária”, se ela existiu, e à vida de Ibrahim Bouhamzy. Imad não conseguia se lembrar do nome que tivera na vida em Dahr el Ahmar nem das causas de sua morte. Os detalhes que ele deu não bastavam para justificar qualquer tentativa de localizar sua “vida intermediária”.
No verão de 1970, Imad encontrou, pela primeira vez, o Sr. Mahmoud Bouhamzy, tio materno de Ibrahim. Quando o Sr. Mahmoud Bouhamzy foi apresentado a Imad, perguntaram se ele conseguia reconhecer aquele senhor, ele respondeu que não. Mostraram a ele uma velha fotografia do Sr. Mahmoud Bouhamzy, tirada na época em que usava um bigode, que havia tirado. Imad disse que a fotografia era “do meu tio Mahmoud”. O Sr. Mahmoud Bouhamzy, então, convidou Imad para passar alguns dias com ele em Khriby. Era a primeira vez dele ali, desde que eu o levara, em 1964. Em Khriby, Imad se sentiu à vontade e saiu para caçar com os filhos do Sr. Fuad Bouhamzy, usando a velha arma de caça de Ibrahim! Ele demonstrou muito apego com o Sr. Fuad Bouhamzy e ficou perto dele por muito tempo, mesmo quando ele (Sr. Fuad Bouhamzy) ficou de cama, doente.
Um fato ocorrido durante essa visita a Khriby impressionou o Sr. Mahmoud Bouhamzy, que foi meu informante. Certo dia, andando na rua, Imad reconheceu um homem e pediu permissão do Sr. Mahmoud Bouhamzy para conversar com ele. O Sr. Mahmoud Bouhamzy perguntou a Imad: “O que você quer falar com aquele homem? Ele já foi um soldado”. Imad respondeu dizendo que aquele era o motivo pelo qual queria falar com o homem. Mencionou o nome dele, mas o Sr. Mahmoud Bouhamzy tinha esquecido o nome em 1972. Imad e o homem conversaram por muito tempo e o próprio homem se declarou satisfeito com o que Imad havia lhe dito. Ele confirmou ao Sr. Mahmoud Bouhamzy que ele e Ibrahim haviam entrado no exército (francês) no mesmo dia e tinham sido amigos próximos durante o tempo em que passaram servindo o exército.
Os fatos mencionados confirmam a afirmação de Imad de que preservara pelo menos algumas memórias da vida anterior, mas outros itens daquela época mostraram que ele estava perdendo clareza e confundindo os detalhes. Os pais de Imad descreveram mais dois itens – uma afirmação e um reconhecimento – feitos por Imad em Khriby, em 1970. Imad estava na sala quando esses itens foram declarados e acredito que ele concordou totalmente com o que os seus pais disseram a respeito do que ele havia dito e feito. O Sr. Fuad Bouhamzy, que estava em Khriby durante a visita de Imad, não confirmou o relato dos pais de Imad.
A falta de clareza de algumas das lembranças de Imad ficou ainda mais evidente em um terceiro item que procurei averiguar sozinho. Os pais de Imad (novamente na presença de Imad) disseram que haviam sabido a respeito da morte recente de um certo Abu Naim, em um vilarejo de Maaser el Shouf. (Maaser el Shouf está localizado no Distrito de Shouf, do Líbano, onde Khriby está localizado e fica no “território” dos Joumblati e dos Boyhamzy). Quando Imad escutou a notícia da morte deste homem, disse: “Oh, o pobre companheiro. Ele era um merceeiro que tinha quebrado uma perna e usava uma postiça, de madeira”. A família de Imad não tinha verificado estes detalhes, mas eu decidi tentar fazer isso.
O Sr. Haffez Bouhamzy, a quem vi pela primeira vez em Khriby, aparentemente se lembrava de ter escutado sobre a recente morte de um certo Abu Naim em Maaser el Shouf e disse que ele quebrara uma perna. Outro informante em Khriby, um merceeiro, disse que também tinha sabido que um merceeiro chamado Abu Naim, que tinha uma perna quebrada, morrera em Maaser el Shouf. Chegando a Maaser el Shouf, não encontrei pista alguma de Abu Naim ou de um merceeiro com outro nome que tivesse morrido recentemente na região e que tinha uma perna postiça. Havia ocorrido uma morte no vilarejo um ou dois meses antes, mas o falecido não era um merceeiro e não tinha quebrado uma perna.
Quando perguntei ao Sr. Mahmoud Bouhamzy sobre estas declarações, ele disse que lembrava que na época de Ibrahim havia um comerciante com uma perna postiça vivendo no vilarejo de Mrasti. (Mrasti não é longe de Khriby, na direção de Baadaran). O Sr. Fuad Bouhamzy mencionou, ainda, outra pessoa que poderia ter se encaixado nessa descrição. Era um merceeiro chamado Abu Hassan Naim, que vivera em Goiedih, outro vilarejo do Distrito de Shouf. Ele havia sido assassinado no verão anterior. Não tinha perna postiça. O Sr. Fuad Bouhamzy também soube de um sapateiro chamado Lebien (não tenho certeza se anotei o nome corretamente), que vivera em Maaser el Shouf e tinha uma perna postiça, mas ainda estava vivo.
Procurei investigar detalhes deste item para deixar claro que o conteúdo das afirmações de Imad pode ter surgido de pessoas reais conhecidas de Ibrahim. É possível que, quando soube da morte do homem que viveu em Maaser el Shouf, na mente de Imad tenha ocorrido uma grande seqüência de associações. E ele confundiu as imagens que lhe ocorreram. Isto havia acontecido muito antes, principalmente na confusão que ele fez da morte de Said Bouhamzy (em um acidente de caminhão) como se isto tivesse acontecido a Ibrahim (para fazer justiça a Imad, devo dizer que pelo menos em alguns aspectos envolvidos na confusão, em 1964, seus pais começaram o conflito fazendo inferências erradas a respeito das alegações de Imad).
Resumindo a evidência a respeito da preservação das lembranças de Imad com 14 anos, em 1972, eu diria que ele ofereceu boas evidências de que ainda tinha lembranças claras, pois fez reconhecimentos de pessoas conhecidas a Ibrahim Bouhamzy. Isso não costuma ser comum mesmo entre os casos de drusos, nos quais as lembranças das vidas anteriores (por motivos que não finjo entender) parecem sumir mais lentamente do que ocorre com indivíduos de outras culturas. Ao mesmo tempo, a evidência não apoiava a afirmação de Imad de ter retido todas as memórias com perfeição. Ele era, podemos dizer, obediente a seus pais, que atribuíam a ele três aspectos que não pude verificar. Levando em conta a exatidão de detalhes de sua vida anterior em 1964, seu desempenho, de modo geral, havia diminuído.
Em abril de 1973, fui a Kornayel para fazer mais uma visita a Imad e sua família. Imad cursava o primeiro ano do colegial. Ainda estava entre os cinco primeiros alunos de uma sala de 22. Ainda queria ir a Khriby (e ficar mais tempo por lá do que ficara em sua última visita, em 1972) e ainda falava sobre se casar com a filha de Jamileh (ele ainda não havia encontrado Jamileh, nem a filha dela). Alguns meses antes, Lateife Bouhamzy, mãe de Ibrahim Bouhamzy, havia falecido. Imad não recebeu convite para o funeral (os enterros de mulheres drusas costumam ser fatos simples com poucos convites distribuídos a pessoas de fora da família da falecida). Ele se sentiu triste com a morte dela e chateado por não ter sido convidado para o funeral. Enquanto falávamos sobre a morte de Lateife Bouhamzy, uma onda de pesar tomou conta de Imad e ele chorou por um momento, demonstrando que ainda sentia apego pela família anterior.
Além de ter lembranças de uma vida anterior, algo não incomum entre os drusos, uma vez que muitos deles têm essas lembranças, Imad, entre 1972 e 1973, até onde eu pude analisar, estava se desenvolvendo normalmente para um rapaz de sua idade.
1 Veja, entretanto, o relatório dado posteriormente de minhas entrevistas com o Sr. Farias Amin Elawar e seu filho, Saleem, em 1968.
2 Ocultei o nome verdadeiro da amante de Ibrahim sob o pseudônimo de “Jamileh”, que, apropriadamente, significa em árabe “linda moça”.
3 A acentuada discordância nos testemunhos do Sr. Haffez Bouhamzy e do Sr. Fuad Bouhamzy quanto à última doença de Ibrahim Bouhamzy levou-me a discutir o assunto com dois dos intérpretes. Infelizmente, eles estiveram presentes em diferentes entrevistas. Mas é provável que a discordância quanto ao fato de Ibrahim Bouhamzy estar apenas preso ao leito ou estar realmente incapacitado de andar, tenha surgido de um erro de tradução, ocasionado provavelmente por algum sentido duplo, em outras línguas, de uma frase árabe. Por outro lado, o Sr. Wadih Rabbath lembrou (assim como nas minhas notas) que o Sr. Haffez Bouhamzy tinha dito positivamente que Ibrahim Bouhamzy tinha tuberculose na espinha. Quanto a este ponto, o Sr. Fuad Bouhamzy seria testemunha mais fidedigna. Era irmão de Ibrahim (Haffez era primo) e além disso tinha alguma prática de medicina e trabalhara no corpo médico do exército libanês. Estas duas testemunhas prestaram depoimentos concordes sobre outros assuntos para os quais forneceram informações.
* Este item não foi registrado por escrito antes de sua verificação.
* Verificação de Sleimann Bouhamzy, por alegar recordar-se da vida de Said Bouhamzy.
* Este item não foi registrado por escrito antes de sua verificação.
** Verificação de Sleimann Bouhamzy, por alegar recordar-se da vida de Said Bouhamzy.
*** Idem, idem.
* Este item não foi registrado por escrito antes de sua verificação.
* Registrado depois da verificação ter começado, mas antes de verificado.
** Este item não foi registrado antes de sua verificação.
*** Idem, idem.
* Mencioando por Imad durante a viagem a Kornayel a Khriby.
** Idem, idem.
*** Idem, idem.
* Este item não foi registrado antes de sua verificação.
** Idem, idem.
*** Mencionado por Imad durante a viagem de Kornayel a Khriby.
* Mencionado por Imad durante a viagem de Kornayel a Khriby.
** Mencionado por Imad durante a viagem de Kornayel a Khriby, anotado depois da verificação ter começado, mas antes de terminada.
*** Mencionado por Imad durante a viagem de Kornayel a Khriby.
**** Registrado depois de a verificação ter começado, mas antes de terminada.
* Mencionado por Imad durante a viagem de Kornayel a Khriby.
** Idem, idem.
*** Idem, idem.
4 Vide, por exemplo, relatos das emoções manifestadas durante tais “reuniões” nos relatórios dos casos da Índia e do Ceilão, apresentados em outros pontos desta monografia.
5 Na diminuição de intensidade da fobia por veículos motorizados, manifestada por Sleímann Bouhamzy, ressaltam dois detalhes de interesse psicológico. Primeiro, ele conservou o medo que sentia pelos veículos, por muito mais tempo do que Imad Elawar, que perdera o seu temor aos quatro ou cinco anos. Isto concorda com as alegações das duas crianças de haverem sido, respectivamente, alguém que foi morto por um caminhão, e alguém que teve um amigo que foi morto por um caminhão e que esteve envolvido, mas não machucado, em um acidente de ônibus. Segundo, a perda do medo quanto aos estímulos para os quais ocorreu generalização (ex.: pequenos veículos) antes da perda do medo ligado ao estímulo traumático original (ex.: veículos grandes) está de acordo com observações experimentais da extinção conseguida após o exercício de libertação do trauma. Veja, por exemplo, M. Flesher e H. S. Hoffman “Stimulus Generalization of Conditioned Suppression.” Science, Vol. 133, 1961, 753-755. Mas algumas outras experiências deram resultados discrepantes.
6 Ocorreu uma discrepância no depoimento quanto à idade do Sr. Sleimann Bouhamzy, por ocasião de sua primeira ida a Khriby. O Sr. Haffez Bouhamzy disse que Sleimann tinha “de três a quatro anos” e o próprio Sr. Sleimann Bouhamzy declarou que tinha “de seis a sete anos” naquela época.
setembro 5th, 2011 às 8:17 PM
Vítor,
Eu já vi, ainda que superficialmente, que este artigo teu é muito bom. Ainda não pude lê-lo, mas vou fazer isto com prazer.
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Vou pedir licença no blog, pra colocar aqui, como havia dito, os comentários do senhor Luciano dos Anjos, a quem, desde já e em público, agradeço a atenção.
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Quanto a tudo o que ele diz, não tenho condições, no momento, de fazer uma análise mais apurada. Deixo esta, para os internautas que visitam o teu blog, aqueles que comentam e aqueles que não comentam (a maioria, acredito eu).
Como eu disse, no post anterior, no finalzinho lá, descobri outro “plagiato” como diz o Luciano dos Anjos. Assim, que for possível, estarei passando o artigo pra ti analisar.
Porém, desde já, fica o seguinte registro: Luciano dos Anjos, confirmou os “plágios” – só que ele, continua afirmando que foi uma forma utilizada pelo espírito (aliás pelos espíritos) em diversas obras do Chico. Cada um que chegue à sua própria conclusão. Mas, registro, também, que isto me soa muito estranho, muito esquisito, muito confuso!!!
Agradeço, mais uma vez ao senhor Luciano dos Anjos, pela atenção.
Abraços a todos.
setembro 5th, 2011 às 8:20 PM
Vítor,
Outra coisa, eu poderia colocar o email no post anterior, mas acho que ficaria meio “despercebido”. Caso, porém, você julgar que assim deve ser, fique à vontade.
Um abraço!
setembro 5th, 2011 às 8:36 PM
EM DEFESA DE FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER E DA
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SUA OBRA MEDIÚNICA
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Prezado Eduardo José Biasetto.
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Sempre respondo aos que me escrevem, embora às vezes com bastante atraso. De início intrigado, aquilatei depois serem equivocadas, mas honestas as suas desesperadas críticas. Daí que vou procurar dar minhas respostas às novas questões que me enviou. São, no entanto, bastante complexas e demandariam extensa argumentação impossível de ser reduzida a um simples e-mail. Vou me esforçar para ver se consigo a melhor síntese possível, sem deixar de ser claro, contando, porém, com sua benevolência e sua percepção aguda. Seguirei passo a passo as suas questões.
******************************************************************EDUARDO DIZ:
– Caro Luciano, não quero incomodá-lo, apenas quero saber tua opinião sobre minhas indagações..
No mais, como já disse, gostei muito de teu livro “A Anti-História…” – Caso escreva sobre o André Luiz, vou ler, pode ter certeza!
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R – Cheguei à conclusão de que você, mesmo decepcionado porque nem todo mundo aceitou seus argumentos, é um homem de bem. Vou, pois, responder a todos os itens que você levantou. Quanto ao meu livro, tenho a certeza de que você o lerá.
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EDUARDO DIZ:
– As respostas e informações que recebo de ti, eu repasso no blog do Vítor, porque considero tudo muito significativo e relevante. Espero que não se incomode com isto e com o direito que tenho de comentar os teus comentários.
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R – Eu nada envio para blogs e sites, muitos deles sérios e de grande credibilidade. Mas não é meu estilo. Nada obstante, não me oponho que outros enviem meus textos, como já tem acontecido. Portanto, não se preocupe. Mesmo porque você tem, sim, esse direito, tanto mais que está sendo meu interlocutor e não se afastou da cordialidade e da nobreza de intenção. Ao mesmo tempo estou pedindo licença a você para distribuir estas minhas respostas aos relacionados na minha caixa de e-mails.
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EDUARDO DIZ:
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– As descobertas que fiz sobre os livros do Chico foram como levar um soco na cara, daqueles bem fortes. Até agora, estou meio atordoado.
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R – Sei que dói muito. Já passei por isso no estudo do espiritismo. Vou contar uma história. Em meados da década de 60, promovi uma série de sessões de pesquisa de materialização, aqui no Rio e fora. Foi um bom e proveitoso trabalho. À época, utilizei o snooperscope, aparelho óptico que emite raios infravermelhos (chamados luz negra) e que hoje está reduzido a um simples par de óculos. Foram sempre usados em manobras de guerra. O que eu tinha era do conhecido parapsicólogo norte-americano Andrija Puharich que, vindo ao Brasil, deixou-o comigo e com meu amigo Osmar Ramos Filho. Levei-o para quase todas as sessões. Os médiuns nunca sabiam que estavam sendo observados. Eu mesmo selecionava e manietava os médiuns, organizava e dirigia as pesquisas. Vou resumir. A exemplo do que registraram os metapsiquistas do passado, cataloguei 80 por cento de fraudes (8 em cada 10). Restaram 20 por cento de fenômenos extraordinários, inequívocos, chocantes. Mas, logo no início, deparei com uma médium que era bem conceituada, mas a flagrei fraudando espetacularmente. “Foi como levar um soco na cara. Fiquei meio atordoado.” Pois bem; noutra ocasião, pela mesma médium, acompanhei uma fantástica materialização. Por que aconteceu? Volto a resumir: perguntado, nem o espírito, agora de fato materializado, sabia me dizer a razão da fraude. Ao término de todas as minhas pesquisas, diante desse e outros casos, já eu estando mais acostumado com as reviravoltas das situações, tirei cinco conclusões: 1. Embora sem percepção clara nossa, o fenômeno tem sempre alguma inteligência mais acima com controle ou, pelo menos, observação do que está ocorrendo, ainda que não se manifeste nunca; 2. Determinados fármacos ingeridos pelo médium dificultam e até impossibilitam a realização do fenômeno; 3. A materialização de espíritos superiores é raríssima (nas sessões científicas de pesquisa) e as demais ocorrem sempre com espíritos de mediana ou nenhuma cultura, pouco evoluídos, flagrantemente levianos; 4. O mental dos participantes tem força de aglutinação e de dispersão ectoplasmática; 5. O fenômeno de materialização não tem lógica, pelo menos a nossa lógica.
Esta última conclusão foi a mais importante, a mais fundamental. E, então, esqueci o soco na cara, e nunca mais fiquei atordoado. Entendi de vez que nossa lógica não é a lógica do fenômeno e do plano espiritual. Assim, prezado Eduardo José, à conta da extensão dos meus estudos, entendo também que tudo o mais na observação dos mecanismos e da existência fora das minhas dimensões não as vou conseguir nem poder ajustar com exatidão às matrizes da nossa lógica. É que a criação de Deus é infinitamente (repito: infinitamente) mais complexa do que supõe a nossa vã limitação terrena. Deus é Deus e isso é maior do que todas as minhas finitas abstrações.
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EDUARDO DIZ:
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– O que pode levar uma pessoa a acreditar que uma obra literária seja psicografia?
Fiz esta pergunta a mim mesmo, e pensei nas seguintes respostas:
1 – Que a obra seja extremamente qualificada, extremamente esclarecedora e extremamente coerente em todas as tuas informações, mesmo que esteja apresentando novidades, porque é isto que devemos esperar do além. Sim, porque se a obra só apresentar “conhecimentos terrenos”, não há motivo algum que justifique a psicografia, pois bibliotecas existem pra tudo quanto é lado, e a internet, hoje, nos permite as mais variadas pesquisas.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Não. O fato de ser uma psicografia não assegura qualificação, esclarecimento e coerência à obra. Também respondo não quanto às expectativas diante do Além, de onde pode emanar qualquer coisa, tudo e nada. Espíritos são livres de ditar o que bem queiram; e médiuns são livres de aceitar o que lhes é ditado. Leio, por exemplo, poesia maravilhosa pelo Chico, pelo Waldo (enquanto em Uberaba), pelo Gilberto Campista Guarino. Reputo os três melhores nessa arte. Mas leio também, por outros médiuns e com a assinatura dos mesmos espíritos, poesias horrorosas, sem inspiração, sem beleza e sem técnica. No restante da pergunta, você exagera. Valem bastante os textos psicografados, mesmo sobre o que já sabemos, do contrário, para que repetirem, mesmo aqui entre os encarnados, que não devemos praticar o mal?
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2 – Que a obra apresente dados, informações, esclarecimentos que estejam muito acima das capacitações e conhecimentos do médium – ainda que esta análise seja sempre uma questão de difícil confirmação.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Também não. A obra não precisa necessariamente estar acima dos conhecimentos do médium. Regra geral está ao nível dele (ver Allan Kardec).
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3 – Que a obra apresente informações originais, comprovando-se sua autenticidade.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Também não. Não precisa apresentar informações originais. E, quando apresenta, podem até ser legítimas, mas não ser possível lhes comprovar a autenticidade; nem por isso, no entanto, se tratará de psicografia a ser descartada.
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4 – Que a obra consiga unir informações científicas com uma moral sábia e elevada, sem ser dogmática ou recheada de lugares-comuns.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Também não. A união da boa informação científica com uma sábia moral seria o ideal, mas nem sempre é assim que funciona, segundo nos demonstram a bibliografia espírita e a realidade da prática mediúnica no mundo inteiro. O sentido dogmático, no bom sentido, às vezes se torna inevitável, como foi para Allan Kardec ao falar do dogma da reencarnação. Nada a ver com a coercitiva dogmática católica. Em filosofia, distinguimos o dogma metafísico exagerado do dogma metafísico moderado (ver, em meu livro Deus é o Absurdo, o capítulo O Dogma Espírita).
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5 – Que a obra resista ao tempo, não perdendo sua qualidade inovadora, mantendo-se contemporânea e atualizada. Que o passar dos anos e as descobertas terrenas caminhem a favor dela, não contra. Ou seja, que as informações oferecidas pela obra, à medida que a sociedade avance, só venham a comprovar sua sublimidade.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – A resistência ao tempo só acontece quando a psicografia ou outro meio de comunicação está apresentando uma revelação (não confundir com profecia). Mas isso até hoje só se deu nas revelações moisaica, cristã e espírita. Só estas informações têm realmente condições de comprovada sublimidade. Quando costumamos falar, por exemplo, das revelações de André Luiz, trata-se de mera força de expressão, constituindo-se, apenas, em desdobramentos. A revelação é tema da filosofia, notadamente das escolas espiritualistas, e todas concordam em que, se revelação existe, ela é e tem de ser eterna e verdadeira, com etapas de conhecimento da verdade objetivando a salvação da humanidade e intermediados por missionários. Scotus Erígena foi dos que mais sobrelevaram o tema, cunhando o termo teofania para definir a revelação como processo de manifestação de Deus no homem e de ascese do homem até Deus. Outros muitos filósofos se ocuparam do fenômeno da revelação. Cito alguns que me agradaram bastante: Maine de Biran (não tenho a obra principal, mas vale ler de Raymond Vancourt La Théorie de la Connaissance chez Maine de Biran, Aubier, Montaigne, 1944); Johan Fichte (La Question de l’Homme et le Fondement de la Philosophie, do filósofo francês contemporâneo Didier Julia, Aubier Montaigne, 1965); e, também – gosto muito – Questions III et IV, de Heidegger, coletânea de textos escritos entre 1946 e 1969, sendo que no III ele expõe o conceito de revelação manifestada na linguagem, conquanto sem caráter religioso, e que representa uma reflexão introdutória ao Ser e Tempo, sua obra máxima, inacabada. No campo específico da doutrina espírita, sugiro a leitura do opúsculo de Allan Kardec Caracteres da Revelação Espírita, e meu artigo “O Livro dos Espíritos – Uma Verdade Inconcussa” (Revista Cultura Espírita, abril de 2010, nº 13).
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Você, Eduardo, está exigindo do Chico uma revelação por cada livro psicografado. Isso não existe. Revelação, propriamente, repito que a humanidade só conheceu as três que citei: a moisaica (limitada ao Deus único e aos Dez Mandamentos), a cristã (limitada aos Evangelhos) e a de Kardec (limitada estritamente a O Livro dos Espíritos).
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EDUARDO DIZ:
– Agora, na minha análise, o que se obtém na obra xavieriana?.
1 – Alguns livros são razoavelmente qualificados, outros um desastre, marcado por informações contraditórias, absurdas e até cômicas.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Somos os dois muito discordantes. Para mim, alguns livros são altamente qualificados; outros não se igualam, mas não chegam a ser desastrosos; apenas fracos. Há neles, sim, informações às vezes contraditórias e, de repente, algumas aparentemente absurdas. Cômicas pode até haver, mas é preciso conferir o contexto para avaliar a validade do tom.
Mas essa é também a realidade, até mais densa, de outros excelentes médiuns. Contudo, há que se tributar essa frustração do bom leitor, em parte ou totalmente, aos autores e não aos médiuns corretos, íntegros e de boa folha corrida. Na verdade, erros têm sido cometidos, em profusão, por aqueles que querem fazer do Chico uma figura divinizada, sem erros, sem carências, sem deficiências, sem culpas. Nada disso é verdadeiro. Já querem até achar que ele era a reencarnação não apenas de Allan Kardec (magnífica bobagem!), mas também de Francisco de Assis (que foi, segundo Pietro Ubaldi, o máximo que a estrutura humana pôde suportar)… Erro grave foi e é, pois, o desse desorientado movimento espírita, principalmente dos falsos líderes, que querem fazer do mais desplumado médium o que ele não foi, não é, nem nunca quis ser.
Inobstante, esse gênero de crítica à obra de amor que nos legou tem seu paralelo – com enfoque bem pior e apresentado também com inacreditável convicção – em estudos sobre o próprio Cristo, como o que tenho em minha biblioteca: La Folie de Jesus, do médico Dr. Charles Binet-Sangle (Paris, A. Maloine, 1908). Sapristi! Que de folie!
Assim é que, não raro, os fatos nos parecem absurdos, cômicos e até dementados porque se chocam com nossos hábitos e escapam à bigorna da nossa percepção. Parece absurdo, por exemplo, que o Cristo, que iria trazer Lázaro de dentro do túmulo, não tivesse poder para afastar a pedra; parece cômico que, com poder de curar o cego de nascença precisasse passar lama nos seus olhos. Mas tudo se explica melhor se nos afastarmos da letra que mata e nos detivermos no espírito que vivifica, como ensina Roustaing. Você quer algo mais paradoxal do que a situação de Deus, todo-poderoso, que não pode criar uma pedra que Ele mesmo não possa levantar? (Em filosofia a questão é considerada à conta de parte do impoder de Deus, mas demanda profundas explicações.)
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EDUARDO DIZ:
2 – Muito se falou que os livros “psicografados” por Chico Xavier não poderiam ter sido escrito por alguém tão pouco letrado. Sabemos, hoje, que Chico foi muito bem alfabetizado, que fazia leituras diversas, que tinha biblioteca em casa, que escrevia bem, falava bem, articulava bem … Portanto, tudo que escreveu (alegando ter recebido do plano espiritual), poderia muito bem ter escrito a partir de seu próprio conhecimento, de suas próprias pesquisas.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Sobre o Chico, você está certo: ele foi bem alfabetizado (“muito bem” não se sabe ao certo, pois os depoimentos nem sempre são completos); que fazia leituras diversas também é certo. Contudo, não temos testemunhos de que suas leituras tratavam de filosofia, alta ciência, grandes clássicos. Tinha biblioteca em casa. É certo. Mas também é certo que bem reduzida. Nunca se ouviu dizer que fosse um acervo de peso. Pela foto que tenho e saiu publicada na imprensa na década de 40, quando o quiseram acusar de letrado, era um cantinho com alguns livros e foi esse cantinho que eu também sempre conheci. Se havia outras estantes e prateleiras, deviam estar muito bem escondidas. Mas você não erra ao afirmar que não era nenhum analfabeto. Isso fica por conta da empolgação dos religiosos de todos os credos. “Escrevia bem” é um pouco relativo. Tenho muitas cartas dele e outras tantas andaram sendo publicadas. Constata-se que não eram mal escritas, mas numa redação absolutamente mediana. Se “podia muito bem ter escrito a partir de seu próprio conhecimento e de suas próprias pesquisas”, tenho minhas dúvidas. Ter escrito, sim; muito bem é hiperbólico.
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EDUARDO DIZ:
3 – A obra (os livros, 400 né?) de Chico Xavier (e seus espíritos-guias) não apresenta as tais novidades, nada, absolutamente nada! Os livros de mensagens, repetem máximas e frases-feitas mais do que manjadas. Os livros com conhecimento histórico não só não apresentam novidades, revelações, como também cometem erros graves. Os “livros de André Luiz” são verdadeiras cópias de outras diversas obras “espiritualistas”, tanto que o próprio Luciano dos Anjos admite isto, mostrando vários e vários exemplos.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – É verdade. Nem todos os quatrocentos livros apresentam novidades. Porém, afirmar que não apresentam absolutamente nada é exagerar e ser contraditório. Afinal, você desenhou do Chico um perfil de quem tinha bons conhecimentos, era bom ledor, falava bem, articulava bem e, de repente, perdeu todo o talento na incapacidade de escrever pelo menos um livro, dos quatrocentos, que apresentasse algum valor…? Como contraponto, penso que bastaria o Parnaso de Além-Túmulo (dele mesmo ou dos poetas que assinam) para credenciá-lo à Academia. E a Antologia dos Imortais. E alguns romances, que não foram escritos ou ditados por nenhum gênio da literatura mundial, mas bem melhores do que tantos que se editaram e editam pelo mundo afora, de lavra terrena. Revelações também nenhum traz, salvo se aceitarmos, como já expliquei, que sejam desdobramentos, interpretações da revelação. Convenhamos, sem radicalismos: A Caminho da Luz é tese muito interessante e, admito com sinceridade, muitíssimo provável, dentro de um processo singular posto que partindo da premissa de que houve migração de espíritos de outros mundos. Tese que está em Kardec e até em outros trabalhos que nada têm de espiritismo. A não ser que tais migrações sejam fantasiosas; mas então teremos de começar do começo começando (permita a aliteração verbal) por saber se o espiritismo está certo. E nessa revisão vai ruir todo o edifício doutrinário. E toda a nossa conversa perde a razão de ser. Teríamos de levá-la a recuos sem fim, partindo ab ovo de outras conceituações. Deus, Verdade, Espírito, Sobrevivência, Mediunidade, Comunicação. Teríamos de redefinir tudo de novo, num procedimento que – exagero de propósito – vai além do tempo que nos resta de encarnados. Ora, não dá… Na tese de A Caminho da Luz é bom lembrar que os estudos até hoje realizados pelos antropólogos, não chegaram ainda a uma conclusão definitiva (a cada nova descoberta e a cada nova pesquisa do DNA as origens são modificadas).
E, garante você, os livros apresentam erros. Sim. No entanto, posso quase afirmar que eles estavam nas fontes consultadas pelos espíritos. Você encontrou erros graves na parte doutrinária? Quais? Pode até ter ocorrido, mas considere exceção. Mesmo porque quando eram gritantes não se deixava passar e eram corrigidos ou cortados. É assim que funciona o trabalho de revisão, recomendado, como já disse, pelo próprio Allan Kardec.
O livro de André Luiz, diz você, é cópia de outras obras. Já o admiti há mais de quarenta anos, mas desde há quarenta anos e, agora de novo, em meu livro O Verdadeiro André Luiz. Evidenciei, todavia, que as partes copiadas foram cópia do óbvio, que não são a essência da obra. Nada de alarmante. E que o Chico foi apenas instrumento dessa obviedade. Já abreviei essa circunstância toda no meu texto anterior para você.
Por último, uma indagação tempestiva: em quatrocentos livros você queria somente obras-primas? Mas isso nem os melhores e mais festejados autores do mundo conseguiram até hoje. Nem Shakespeare criou somente obras-primas. E, voltando a indagar só para arrematar: Francisco Cândido Xavier é capaz, talentoso, inteligente, sabe escreve bem, tem imaginação, tem boa leitura, mas…só para plagiar?
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EDUARDO DIZ:
4 – A obra de Chico Xavier, os livros, estão recheados de um moralismo arcaico-medieval-católico, tosco, infantil e falho, numa clara influência clerical, até “doentia”, centrada num cristianismo-messiânico-salvador, refletindo a sacanagem que fizeram com Jesus Cristo, feito-homem-casto, feito-homem-filho-da-virgem, feito-sofredor, carregador das fraquezas mundanas, pregadas na cruz do martírio, na última gota de sangue, no altar da ilusão com a falácia da óstia-carne e o vinho-sangue, num ritual antropofágico e estúpido, que nos pede a renúncia à nossa natureza animal.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Você fala em moralismo arcaico-medieval-católico centrado num cristianismo-messiânico-salvador. Bem, como você não fez indicações precisas, temos de falar em tese. Sim, um leve ranço católico podemos às vezes encontrar em Emmanuel, o antigo padre Manoel da Nóbrega. Mas ele nunca se declarou nem foi declarado sumidade extragalática. Esse papel foi e é o do Cristo. O dele, bem menor, foi precipuamente o de dar prosseguimento à campanha de cristianização dos povos da terra, desta vez longe das algemas e grilhetas aquecidas na teologia católica. E cumpriu sua missão com galhardia. Por outro lado, o ranço se desvanece completamente no momento corajoso em que dita o precioso Emmanuel, publicação da FEB, e que se constitui até hoje no mais vigoroso libelo contra o clericalismo, contra o papismo, contra a Igreja Católica. No mais, poucos sabem, mas também Kardec foi acusado, inclusive por Flammarion, de ser místico e denotar ranço religioso assim que publicou O Evangelho segundo o Espiritismo.
Cristianismo-messiânico-salvador? Sim, com toda a certeza. Trata-se de fato de doutrina messiânica e salvadora, conquanto bem apartada da firula salvífica jogada pela teologia católica. Na mesma visão cristã se alinha toda a doutrina espírita e não apenas na obra psicografada pelo Chico. Jesus foi casto, mas não à conta do puritanismo tartufizado do catolicismo. Foi casto porque foi. Tal como existiram muitas outras criaturas que também o foram. Mas você fala ainda de um moralismo arcaico-medieval-católico. Eu posso já exibir a cabeça branca, como você lembra, mas por ela vou elencando minhas preocupações. Seria esse moralismo a luta contra o aborto, contra a eutanásia? O planejamento da prole? A restrição ao calão que invadiu até os lares e as salas de ensino? Os excessos dos festejos hedonistas? (refiro excessos, não os ambientes distanciados da concupiscência, como distingo em meu livro O Atalho). A fidelidade conjugal? O amor cortês, que nasceu medieval e nunca deveria ser ridicularizado pela voz dos tempos utilitaristas e pelo exibicionismo da sexolatria? O casamento (lei natural) por amor, infenso às regras promíscuas da Simone de Beauvoir? A sucumbência da célula familiar? Ao mesmo tempo, você infelizmente tem toda a razão diante da ridicularia do dernier cri adotado pelas vestais espíritas (que ainda têm a coragem de atribuí-lo ao Chico) quando juram que Allan Kardec (28 anos) e Amélie Boudet (37 anos) casaram platonicamente e nunca consumaram a relação. Triste espiritismo na boca desses conventualistas hipócritas, espiritismo que, sinceramente, nunca observei na obra de Emmanuel e nem de nenhum autor sério, equilibrado e bem resolvido, tanto da terra como do espaço. O espiritismo jamais pregou o culto à castidade, mas tão somente a atenção à prudência e à responsabilidade nas decisões a dois, em especial dos jovens. Em contrapartida, não há como negar que o Cristo estava acima da craveira cármica humana e seu comportamento e personalidade excepcionais estavam muito distantes das contingências terrenas. Essa era uma questão de fato, não de opção. Não se trata de privilégio, mas de evolução que devemos ter a humildade de entender. E homem filho da virgem é como consta do Evangelho. Virgindade que também não é culto espírita. Maria poderia não ter sido, e nem por isso deixaria de ser o espírito de mulher mais altanado que reencarnou para estar ao lado de Jesus. Assim está grafado nos Evangelhos. Cabe-nos a escolha: ou negamos o Evangelho e a partir daí tudo o mais poderá ser negado nessa revelação; ou vamos buscar uma explicação que não seja a da “obra e graça do espírito santo” e que satisfaça às exigências do raciocínio moderno mais exigente. Porém, essas questões transcendentais, prezado Eduardo, transfiro-as para outra oportunidade, pois extrapolam de muito o espaço de nossa conversa virtual. (Sobre a moral, em todos os sentidos, dos arautos católicos, valeria ler, por oportuno, meu artigo do Reformador, “Os Abomináveis Postulados do Jesuitismo Ético”, também inserido em meu livro Deus é o Absurdo.)
Sofredor, Jesus sem dúvida foi. Ninguém inventou isso, que é fato histórico. Resta entender por que aconteceu e qual foi o sentido do seu sofrimento. Fico com a doutrina cristã-espírita. É nesses termos que está consagrado na matesiologia espírita. “Carregador de fraquezas humanas” não endosso nem o vejo assim. Há explicações notáveis no espiritismo para os momentos paroxísticos do horto das Oliveiras e da imprecação no alto da cruz. Agora, sangue, altar da ilusão, falácia da hóstia-carne e do vinho, ritual antropofágico, bem, isso tudo não é conosco; é com os bispos, os cardeais, os papas e os doutores da Igreja católica. Não! Não nos envolva nessa bizarria teológica. Nem Emmanuel, como Emmanuel, cabe mais nela. E, finalmente, sobre a renúncia à nossa natureza animal, seria preciso você definir bem até que nível vai o limite colocado nessa natureza. Porque o pedófilo alega que seus impulsos fazem parte da sua natureza e são, além disso, amor pelas crianças. A figura da menina freudiana é apenas apaixonada pelo pai e o menino pela mãe. A natureza animal (“a carne é fraca”) nem sempre quer saber do respeito à mulher do próximo ou ao homem da próxima. A natureza animal é poligâmica. A natureza animal é egocentrista, é instintiva, é impulsiva, é violenta, é aquela da razão sem ética da fábula do escorpião e da tartaruga. Valeria, a essa altura da evolução humana, abandonarmos os preceitos cristãos-espíritas e voltarmos à barbárie das cavernas?
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EDUARDO DIZ:
5 – A obra (os livros) de Chico Xavier não resistiu ao tempo, há um Marte desvendado, um monte de informações científicas falhas, uma carta falsa desvendada, um senador romano que nunca existiu… Sempre digo que o “tempo traz a resposta” – e a resposta que o tempo tem trazido a respeito dos livros de Chico Xavier, é muito clara: quanta bobagem há neles! .
Assim, não há motivos, dentro da minha racionalidade, pra acreditar na qualidade psicográfica de Xavier.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Os livros do Chico não resistiram ao tempo? Estranho, pois ainda hoje são procurados por milhões de leitores, mais e menos cultos, dos variados estratos sociais. Qual medida você utilizou para afirmar o que afirma? E você justifica que a superação se deu porque há muita bobagem nos livros. Volto a estranhar. Muita bobagem que, incompreensivelmente, tem valido até para elaboração de teses de mestrado e doutorado, de base para sentenças judiciais, de estudos antropológicos, sociológicos, literários, de roteiros de teatro, cinema e televisão, de inspiração para poetas e letristas, de estímulo à filantropia, de restauração da saúde orgânica e psíquica, de revigoramento da fé e, naturalmente, também de inúmeras críticas, acusações, réplicas, debates, achincalhes. Esse é o mesmo quadro respeitante a muitas obras geniais que a humanidade conhece e não a subliteraturas. Gustave Flaubert – de minha especial predileção – foi processado porque ousou insculpir o realismo literário.
Você alude a um Marte desvendado. Pode ser, mas acho que ainda continua sendo cedo para uma conclusão tão categórica. Que não existe, por lá, hoje, uma humanidade igual à daqui está realmente comprovado. No entanto, talvez valesse a pena você ler em meu livro Deus é o Absurdo o capítulo “Marte e a Defasagem Ontológica”. Ademais, não ignore que quem mais falou de Marte, pelo Chico, não foi nenhum espírito de grandes sabedorias. Foi a mãe dele. Bondosa, sim, mas cuja autoridade sobre o assunto, pelo que sabíamos, era nenhuma.
As informações científicas falhas, na bibliografia do Chico, existem de fato. Até que ponto? Até quando? Mas também não são poucas as provindas dos mais formidáveis cérebros da nossa humanidade. Para citar apenas um caso: claro que você não ignora que o genial e inigualável Einstein desprezou longo tempo as pesquisas de Max Planck. Sufocado pelas evidências, acabou caindo em si e vendo que, nesse particular, todo o seu raciocínio e suas equações eram falhos.
A carta falsa desvendada é por conta de alguns pesquisadores dignos de atenção, mas que são contraditados por outros do mesmo calibre. O senador romano que nunca existiu também está por conta de pesquisa que não é concludente, mantendo em aberto muitos flancos de dúvidas. Anote que Emmanuel não transcreve a carta, mencionando-a apenas. Quantas interpretações podem ser pensadas sobre esse detalhe…? Por fim: tanto quanto Publio Lentulus, também a existência histórica de Jesus é negada por diversos historiadores, pesquisadores, arqueólogos, cientistas.
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EDUARDO DIZ:
– Vítor – Eu estou um tanto decepcionado com a reação das pessoas aqui no blog. Depois que coloquei o email de Luciano dos Anjos aqui, achei que iria chover comentários ridicularizando com os argumentos dele, mas fiquei com a impressão que muitos ficaram um tanto impressionados pelas “revelações” do bom homem dos cabelos brancos.
Mas eu não fiquei não! Nada do que Luciano disse, me fez mudar minha opinião. Muito pelo contrário, serviu apenas pra me mostrar que meus estudos foram coerentes e qualificados. Luciano dos Anjos nos pede que aceitemos a tese de que o espírito André Luiz leu diversas obras “espiritualistas”, incluindo A Vida Além do Véu, pra passar Nosso Lar e Libertação ao Chico. Eu, particularmente, não acredito nisso.
Ele já me respondeu a respeito da análise que solicitei a ele, sobre Libertação x A Vida Além do Véu – sabe o que ele disse? Nada! Ou melhor, ele disse que já havia respondido a tudo, com o email que me enviou.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Entendo a sua decepção diante da reação dos que leram meu texto e se impressionaram favoravelmente. Mas o que você queria, a aprovação unânime ao seu trabalho? Podia até acontecer, mas é bom não desconhecer (sem qualquer intenção grosseira da minha parte) o talento e a verve de Nélson Rodrigues: “Toda unanimidade é burra.”
Você não se impressionou se gaba de não mudar de opinião e até se sentiu fortalecido em sua posição. Tudo bem. Acho normal. Eu espero.
Nada eu disse sobre sua análise do livro Libertação. Discordo. Eu disse tudo o que deveria ser dito, sugerindo que você lesse minha resposta sobre o livro Nosso Lar. Basta substituir os títulos dos dois livros, um pelo outro, e você teria a argumentação completa da minha defesa, cujos trechos copiados eu já os levantara há quase meio século. A dialética é a mesma. Não muda nada.
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EDUARDO DIZ:
– Pois, caro Luciano, afirmo o seguinte:
I – Respeito o teu conhecimento, teu caráter, tua qualidade de escritor – li e tenho em casa o teu livro “A Anti-História…”, o senhor é um bom escritor. Gostei e recomendo tua obra, porque, além das teses que defende, o senhor nos dá muitas informações interessantes, inclusive faz uma retrospectiva muito qualificada da história dos anos 1960/70, mencionando os movimentos jovens e outras passagens da humanidade, nos anos recentes. Porém, o senhor não respondeu às minhas indagações.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Obrigado pelas apreciações à minha obra A Anti-História das Mensagens Co-piadas. Se não respondi antes às suas indagações é porque só agora elas me foram formalizadas neste seu último e-mail. E – repiso – sempre respondo aos que me escrevem. E – mais outra repetição – você me levou à conclusão de que é um homem de bem e escreve de boa fé, além de mostrar capacidade de análise.
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EDUARDO DIZ:
II – O senhor não me respondeu, porque Libertação é uma cópia – a história é uma cópia – dos livros III e IV de A Vida Além do Véu.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Libertação é, nos acessórios, cópia de A Vida Além do Véu, tal qual e pelas mesmas razões também de Nosso Lar. Eu já havia dito e justificado isso. E expliquei por que acontece a cópia.
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EDUARDO DIZ:
III – O senhor não me respondeu, porque o espírito André Luiz, pra contar a história da vida dele, precisou copiar a história de um outro espírito.
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Ele não copiou. Ele contou a vida dele, que é igual à de milhões de outros espíritos. A rigor, história diferente só a do Cristo. O que levou você a supor que a história do André Luiz fosse única numa multidão de cerca de vinte e seis a trinta bilhões de espíritos ligados à história da terra? As circunstâncias são iguais nesse tipo de história. André Luiz fez apenas a inserção da sua trajetória de dor e redenção nesse cenário que é o de milhões de outros espíritos e é do conhecimento de todos esses milhões. Nem o cenário, nem a vida dele são inéditos.
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EDUARDO DIZ:
IV – O senhor não me respondeu porque a “colônia Nosso Lar” faz em muito lembrar a Universidade das Cinco Torres, na obra do Owen. Será que o senhor, com toda a sua capacidade de análise, há tantas décadas, tinha percebido esta similaridade?
Ainda aguardo tuas respostas, pois as que apresentastes não me convenceram em nada, mas convenceram em muito ao meu amigo Roberto Scur, de Caxias do Sul, que ficou maravilhado com tuas informações, inclusive lhe mandou um abraço!
Saudações!
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LUCIANO DOS ANJOS
R – Você repete que não se convenceu ainda. Já disse que compreendo. E renovo as expectativas: continuarei esperando. Temos a eternidade pela frente. Mas, em benefício dos nossos leitores, penso que valem estas explicações todas.
A Universidade das Cinco Torres, constante do Livro 4 e bem anotada por você, tem mesmo muita semelhança com Nosso Lar. Qual o problema? Qual foi criada primeiro? Quantas cidades aqui na terra se assemelham? Recife não é a Veneza Brasileira? Campos do Jordão não é a Suíça Brasileira? Holambra não é a Holanda Brasileira? Desde que a mente humana é, no fundo, uma mesma matriz, dentro de um mesmo sistema de evolução, por que estranhar as semelhanças?
E claro que sempre percebi a similaridade, desde quase há meio século. É flagrante. Digo mais: há outros casos em toda a literatura espírita. Mas suas observações foram inteligentes e certeiras.
Esforcei-me – não sei se fui feliz – para reduzir a um simples e-mail as minhas respostas. Conto com sua benevolência, mas também com sua inteligência. Segui, como prometi, passo a passo as suas arguições. E, ao chegar ao fim, diante das mais importantes colocações que fiz, quero convidar você a um voo muito mais alto. O espiritismo é muito maior do que tanta gente supõe. Consolei-me nele depois de estudar (até por dever de ofício) todas as filosofias e todas as religiões, deixando de optar pelo materialismo (estive à beira) e convencido de velha lição de meu pai: “Filho, se esta estiver errada, ai das outras…” Concito você a não se deixar derrubar por qualquer soco na barriga, por essas surpresas que teve e que tentei evidenciar serem menores em face da extraordinária filosofia, da fantástica ciência e da maravilhosa (até no sentido etimológico que a literatura lhe dá) religião que é o espiritismo. Qual a verdade que você busca? Saber se o Chico era um bom médium? Se o Chico plagiava? Ora, eu convido você a buscar uma verdade maior que essa. Não é justo que, com o seu talento – falo com sinceridade –, sua cultura e seu desejo de saber, percamos a sua proximidade no aprofundamento dessa doutrina, cujo escopo principal é – como proferiu Kardec – produzir o maior número possível de homens de bem. Afinal, eu tenho o dever de saber um pouquinho de filosofia e posso assegurar a você que, malgrado os lances de cópias, plágios e materializações fraudadas, nada se sobrepõe a essa verdade que já alcançamos.
Muitas vezes, prezado Eduardo José, temos de rever conceitos internalizados há milênios. Até mesmo – ouso dizer – alguns arquétipos universais. Certa feita, numa aula de filosofia sobre o Bem e o Mal, uma aluna inteligente me perguntou:
– Professor, e se tudo isto que está acontecendo agora for um sonho, que pode terminar a qualquer momento?
Ela provavelmente nem sabia que filósofos, desde Aristóteles, e que Descartes chegara a duvidar se estava sonhando ou em vigília. Certo é que a boa pergunta deixou a turma intrigada. Dei-lhe a resposta que eu tinha:
– Pode ser. Mas fica tudo bem, porque então significa que existe uma realidade maior e mais sábia, com alguém sonhando. Neste exato momento, alguém está sonhando.
Lembro a passagem para chamar atenção para o fato de que, em tese, outros sonhos podem ocorrer e que, portanto, não podemos liquidar as questões existenciais que muitas vezes disfarçam verdades maiores e bem diferentes daquelas que supomos óbvias. Anote: até o conceito é um conceito.
Faço uma citação que tem a ver com tudo o que acabei de escrever e muito mais a ver diretamente com o próprio André Luiz (mas este detalhe você só vai saber quando sair meu livro O Verdadeiro André Luiz):
“Todas as coisas humanas têm dois aspectos… para dizer a verdade todo este mundo não é senão uma sombra e uma aparência; mas esta grande e interminável comédia não pode representar-se de outro modo. Tudo na vida é tão obscuro, tão diverso, tão oposto, que não podemos nos assegurar de nenhuma verdade.” (Elogio da Loucura, Erasmo de Roterdã, 1509.)
Você cobrou, numa espécie de desafio, que estou para publicar, há décadas, O Verdadeiro André Luiz. É verdade, mas pelas razões que já expus na internet (“Não publique nada”, me recomendou o Chico, nos anos 70). No entanto, é bom saber que o tempo de espera não depõe contra a qualidade de nenhuma obra. Muitas delas, de grande valor (não sei se será o meu caso), levaram anos para ser terminadas. Quando menos por uma questão de zelo. Cervantes começou D. Quixote de la Mancha em 1602 e só terminou em 1615.
Diga ao seu amigo Roberto Scur que agradeço o abraço enviado, que retribuo com muito apreço. E a você, obrigado também pelas saudações, ao tempo em que reafirmo a consideração que lhe tributo, com meus cumprimentos pela pesquisa que realizou.
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EDUARDO DIZ:
– Não faço isto porque me agrade e me traga prazer. Longe de mim querer destruir as crenças e esperanças dos seres humanos. Também sou um dos que procuram respostas e fontes de inspiração para fazer de nossa caminhada terrena algo seguro e confortável. Mas não posso, não devo me calar frente às inúmeras evidências de fraudes, enganos, ensinamentos frágeis e arcaicos presentes nas
religiões, incluindo o espiritismo praticado no Brasil. Sou professor, sou historiador, por várias vezes enganado e envolto em uma atmosfera de medo e angústia, atmosfera de castigo e punição. Sou renascentista, sou iluminista, sou pesquisador. Quero a verdade, a verdade sublime, soberana. Talvez um sonhador, sim! Mas faço de meu sonho uma busca honesta, sem vínculos, sem ganhos materiais. Faço de meu sonho um projeto divino, porque se Deus existe, tenho certeza que Ele não quer a mentira!
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LUCIANO DOS ANJOS
R. O espiritismo, prezado Eduardo, foi codificado exatamente para abrir uma nova visão de tudo o que foi introjetado na alma afligida da humanidade, desde que Constantino precisou oficializar a religião para não perder a coroa. A partir dali, mergulhamos na barbarissonante selvajaria religiosa e aconteceu tudo o que, como historiador, você conhece muito bem. Diante da alvorada de luz chegada com a terceira revelação, deveríamos, a partir de 1857, ter aprendido de vez a lição. Mas, os homens são os homens. Criaturas em queda, arrastamos o fadário da repetição. Católicos e protestantes reencarnados (poucos anos de espiritismo não permitiram ainda que se iniciasse o ciclo de espíritas em múltiplas reencarnações), aí está esse movimento espírita defenestrando tudo o que nos foi ofertado e reabsorvendo tudo o que já vimos que não dá certo. É a síndrome da repetição, que isenta de responsabilidades e faz dos resgates um atalho de ilusões. Nada mais triste e prejudicial. Então, vemos as belezas e verdades da mais extraordinária revelação se transformar em ambições camufladas, silêncios proveitosos, iniciativas meramente comerciais, fraudes desestimulantes, fantasias delirantes. Nesse quadro, pintado por um movimento que se perdeu na postura da obediência fundamentalista e na elitização dos coqueteis, os honestos, os sinceros, os corretos e os persistentes são, dolorosamente, alcançados também pelas ondas da desconfiança e da mesma culpa. Nomes como os de Francisco Cândido Xavier, Divaldo Pereira Franco, Yvonne do Amaral Pereira, Francisco Peixoto Lins, Armando de Oliveira Assis, cada qual em sua área de abnegação total, são arrastados às gemônias da ingratidão e da maledicência, num tenebroso processo de destruição cientificamente programado, nas origens, pelas forças do mal. Interpretam-lhes perversamente as ideias, as atitudes, os conteúdos mediúnicos, as iniciativas filantrópicas e os expõem à ciscalhagem da degradação da suspeição terrível. Pessoas de bem – e incluo você nesse rol – se deixam à vezes estremecer e, na busca da verdade, fazem dela uma versão que não é mentirosa, mas decodificada pelo desânimo, pela desesperança, pela descrença. O trabalho que você realizou, prezado Eduardo, foi bem feito e está correto. Como expus, eu também já o houvera feito. Apenas nos distanciamos na análise dos dados pesquisados. Você quer a verdade, a verdade sublime. É justo, é importante. Pilatos também a quis. Mas ela é de dimensão muitíssimo maior do que a nossa capacidade de percepção e juízo de síntese. A parte que já nos coube é a que nos cabia. E dela, apenas uma boa fração já foi apreendida, de caráter maravilhoso. Toda transcendência, mesmo parcial, é maravilhosa. Não a jogue fora, Eduardo. Realimente o seu sonho. Revigore a certeza de que Deus existe, bastando, nesse aspecto, abandonar todos esses deuses que a humanidade criou por ignorância ou por medo e projete sua busca e sua mente na direção do impessoal e do infinito. Você O encontrará, com certeza, ainda que não Lhe consiga dar forma, momento e posição. Ele é o Ser necessário e Que existe a priori na interiorismo da nossa meditação, do nosso estudo, na metassinfonia de paz que harmoniza o infinito da criação em todas as dimensões do ser. Mesmo, pois, que você queira tirá-Lo de si, daí Ele não sairá nunca.
LUCIANO DOS ANJOS
Rio, 1.9.2011
setembro 7th, 2011 às 3:50 PM
Muito interessante Vítor, as evidências que ele mostra, no que se refere às lembranças do garoto. Sempre fica, porém, aquela pergunta: “será que alguém poderia ter fornecido as informações?”
Mas não resta dúvida, que os trabalhos do Ian Stevenson, ao que tudo indica, sempre foram alicerçados em critérios bastante seletivos e qualificados.
Bela matéria.
setembro 14th, 2011 às 3:37 AM
A precisão técnica e clareza do pesquisador Dr. Ian Stevenson realmente impressiona. E o que me causa mais espanto é que as suas pesquisas não tenham o devido e necessário debate e estudo no meio acadêmico de modo geral, na altura que o grau da pesquisa feita mereceria. Li apenas a primeira parte, amanhã vou ler a segunda. Mas resta óbvio que a perspectiva de fraude é praticamente impossível, é outro nível no que diz respeito ao CX. Vitor, a única explicação que sairia do campo da reencarnação que vejo hoje para os casos da pesquisa do Stevenson seria na linha da Psicometria. O espírito da criança de alguma forma se relacionaria com a energia do falecido e incorporaria a personalidade dele, a sua energia. Não acredito nesta hipótese, mas (…). Gostaria da tua opinião, e do Biasa também e de quem mais entender interessante comentar. É isto.
setembro 14th, 2011 às 4:06 AM
Por pura preguiça, vou reproduzir as palavras de Stevenson sobre tal hipótese de seu livro “Vinte Casos”:
A percepção extra-sensorial somente não pode explicar todos os aspectos dos casos mais ricos, especialmente os aspectos de comportamento, incluindo prolongada identificação do paciente com a personalidade anterior. Temos portanto de considerar a percepção extra-sensorial juntamente com a personificação, visto precisarmos explicar tanto os aspectos informativos como os de comportamento dos casos. Itens isolados de informação dados pelos pacientes podem originar-se de percepção extra-sensorial, tendo como agentes (ou “elos psicométricos”) de tal percepção extra-sensorial. Mas a percepção extra-sensorial per si não explica a organização das informações obtidas pelo paciente em padrões que são característicos da personalidade falecida. Os traços de comportamento que requerem explicação são principalmente várias evidências de sistemática identificação com uma personalidade anterior. As duas personalidades são vividas, como sendo fundidas ou contínuas, não como descontínuas ou substituindo-se uma à outra. Nenhum motivo suficientemente forte para explicar essa espécie de identificação sistemática foi descoberto nos pacientes em apreço. As complicações nas vidas dos pacientes, resultantes da identificação, dão a idéia de que, no cômputo geral, eles perdem muito mais do que ganham com as estranhas identificações. Motivos para impor tais identificações em seus filhos existem por parte de alguns pais que perderam um amigo íntimo ou um parente e desejam que ele retorne e acreditam que possa fazê-lo. Mas, afora os casos presentes e outros do mesmo tipo, não é conhecido nenhum caso de influência dos pais, que se tenha estendido a ponto de fazer com que uma criança afirme possuir uma outra identidade. Além do mais, muitos dos casos mais ricos sugestivos de reencarnação ocorreram quando as famílias de ambas as personalidades eram completamente desconhecidas uma da outra, anteriormente à investigação. Os pais da criança não teriam então nenhum interesse no retorno da personalidade estranha e nenhuma fonte normal de informações acerca da mesma, com a qual talhar-lhe a imagem que esperavam criar no filho. Supondo-se que os pais obtenham essas informações através de percepção extra-sensorial, levanta-se a questão de porque não mostram eles outros indícios de tais poderes.
A teoria da percepção extra-sensorial acrescida de personificação não me parece explicar adequadamente todos os fatos dos casos mais ricos. Sinto preferir para esses casos alguma outra hipótese que possa mais adequadamente explicar a organização das informações e os aspectos de comportamento, situando a origem destes fora da própria criança em sua vida presente e na sua família atual. Isto nos leva aos conceitos intimamente relacionados de possessão e reencarnação.
setembro 14th, 2011 às 4:21 AM
Beleza! Até amanhã.